Por Marcelo Costa
Fotos: Liliane Callegari

Para o show de lançamento de seu terceiro álbum, o duplo “No Chão, Sem o Chão”, no Teatro do Sesc Pompéia, em São Paulo, Romulo Fróes caprichou e convidou as cantoras Nina Becker e Mariana Aydar, o pianista André Mehmari (os três participam dos discos) e um trio de metais para acompanhar seu violão, mais baixo, guitarra e bateria no palco e transformou a noite de gala em um dos momentos mais especiais da música brasileira nos últimos tempos.

As 34 canções de “No Chão, Sem o Chão” caíram na web nos primeiros dias de janeiro, e acabam de ganhar edição em CD divididas em duas sessões: “Cala a Boca Já Morreu” e “Saiba Ficar Quieto”. No palco, Romulo não faz concessões aos seus dois discos anteriores, “Calado” (2005) e “Cão” (2007), concentrando-se no extenso repertório novo. A única faixa “estranha” no show foi “Nada Disso É Pra Você”, dueto explosivo com Mariana Aydar, que lançou a parceria inédita de Romulo e Clima em seu álbum “Peixes, Passaros, Pessoas” (2009).

O mergulho no universo dos artistas plásticos Nuno Ramos e Clima, que assinam a grande maioria das letras de “No Chão, Sem o Chão” começa exatamente com a primeira faixa do primeiro disco (“Cala a Boca Já Morreu”), a ótima “Do Ponto ao Chão” em versão de arrepiar e segue com a também brilhante “Para Fazer Sucesso”, que abre o segundo “Saiba Ficar Quieto”. O repertório intercala canções dos dois discos em versões luxuosas engrandecidas pelo bom som do teatro e pelos ótimos arranjos.

Os metais marcam presença no belíssimo arranjo de “Para Quem Me Quer Assim” com o guitarrista Guilherme Held em perfeita sintonia com trombone, sax tenor e trompete. É Held também que se destaca em “Esse Aí” e no começo do show já fica claro que em um palco com bom som, o trio que acompanha Romulo (além de Held, o baterista Pedro Ito e o baixista Fábio Sá) aproxima-se muito do jazz em competentes intervenções instrumentais.

Então o show chega à sua metade. Romulo chama ao palco Nina Becker, e o tempo para. De vestido longo, ela sobe dançando e reverenciando músicos e público, e se não tivesse cantado “Ninguém Liga”, canção gêmea de “O Que Todo Mundo Quer”, já teria feito a noite valer a pena com seu encanto. Romulo deixa o palco, e Nina segue acompanhada de André Mehmari ao piano em uma versão arrasadora de “Astronauta”, quase quatro minutos de êxtase musical ao vivo. Romulo volta ao palco, mexe no violão, e é brindado por uma microfonia. Ele brinca: “Estou fazendo exatamente o contrário do que acabou de acontecer aqui no palco”. O público ri.

Ele toca mais canções (“Qualquer Coisa em Você Mulher”, “A Anti-Musa”, “Peraí” e “Pierrô Lunático”), aproveita o bom som do local e faz um pequeno set acústico com “Vai”, “Porto” e “Se Eu For” (que no disco conta com a voz de Lulina) e chama Mariana Aydar, com quem faz um dueto – charmoso – em “De Adão Para Eva” e – roqueiro em – “Nada Disso É Pra Você”. O final do show é extremamente roqueiro, com metais em brasa e longos solos de Guilherme Held nas poderosas “Ela Me Quer Bem” e “Sei Lá”, está última com André Mehmari no piano e em perfeita sintonia com o grupo. No bis, a forte “Deserto Vermelho” deixa um zunido no ar.

Para quem acompanha a trajetória de Romulo, chega a impressionar como o músico deixou suas experimentações com o samba tradicional e se aproximou da MPB guitarreira do começo dos anos 70 (simbolizada pelo clássico primeiro disco de Jards Macalé) em altíssimo nível. “No Chão, Sem o Chão” já é um dos grandes discos da música brasileira no ano, e é uma pena que um show como esse (com convidados, bom som e muita qualidade) não possa ser repetido todos os fins de semana pelos barzinhos da Augusta. É um momento mágico que aqueles que amam a música esperam ansiosamente. Não é toda noite que se depara com isso.

Fotos: Liliane Callegari (http://www.flickr.com/photos/lilianecallegari)

Leia também:
– “Cão”, de Romulo Fróes, por Marcelo Costa (aqui)
– My Space de Romulo Fróes – http://www.myspace.com/romulofroes