Três perguntas: Guilherme Matheus (Mafiosa Cervejaria)

por Marcelo Costa

A Mafiosa Cervejaria surgiu (ainda em formato caseiro) em 2013 na cidade de Valinhos, no interior de São Paulo, devido à intensa paixão de alguns amigos por cerveja artesanal. Eles produziam rótulos sempre criados em homenagem a algum filme, personagem, ou até algum detalhe de grandes obras da sétima arte – geralmente filmes ligados, direta ou indiretamente, ao tema “máfia”. Segundo o cervejeiro da casa, Guilherme Matheus, eles até pensaram em montar uma fábrica, mas acabaram tornando-se ciganos.

Produzindo suas receitas na fábrica da Dádiva, em Várzea Grande, a Mafiosa já colocou no copo dos cervejeiros 11 receitas diferentes (três delas premiadas no Festival de Blumenau 2018): da primeiríssima (“E nossa grande queridinha”, diz Guilherme) Don Drino East Coast IPA, que segue disponível o ano inteiro, passando pelas duas versões de A Noiva (inspiradas na personagem dos filmes “Kill Bill”, de Tarantino) e, ainda, Little Valley (Saison), Consiglieri (Imperial IPA – medalha de ouro), Crooner (Strong Ale), Rigolleto (Fruit Beer) além de duas Pre Prohibition Beers, uma Porter (também medalha de ouro) e uma Lager.

Agora é a vez de uma Pastry Stout inspirada em uma cena do filme “O Poderoso Chefão”: logo depois que Rocco assassina Paulie, seu comparsa Clemenza profere a frase antológica “deixa a arma, pegue o cannoli” (o doce italiano é decisivo na trilogia de Coppola). Guilherme conta: “Começamos a pensar como colocar os sabores do Cannoli numa Russian Imperial Stout, e chegamos nesse resultado (uma RIS de 11% de álcool e 70 IBUs) com adição de baunilha, cacau, casca de laranja e pistache”. Nascia a Mafiosa Leave The Gun, Take The Cannoli (parte da produção foi reservada em barricas antes utilizadas para maturar vinho do Porto para um segundo rótulo futuro). Abaixo, Guilherme relembra como começou a produzir cerveja e fala das novidades da Mafiosa.

Como você entrou nesse mundo de cerveja artesanal? Qual foi o turning point?
Sou cozinheiro, e já na época de cozinhar eu testava harmonizações sempre buscando cervejas novas – no interior era difícil encontrar muita coisa diferente. Foi assim, por volta de 2011/2012, que comecei a descobrir sabores diferentes de cervejas e que existiam cervejas diferentes! Um ano e meio depois disso, descobri que era possível fazer cerveja em casa. Em 2013 comecei a pesquisar como fazer cerveja, fiz alguns cursos e comecei a produzir em casa. A paixão foi aumentando e com ela esse desejo de provar coisas novas, de testar alquimias diferentes, sabores diferentes. E você sabe: para o cervejeiro caseiro, o céu e o limite. Você pode fazer a mistura que você quiser. E eu fui me apaixonado por essa coisa toda. Aquela coisa de testar harmonização. Eu bebia e estudava muito mais vinhos na época, porque a aproximação tradicional com gastronomia antigamente era essa, mas fui descobrindo que a cerveja é até mais versátil que o vinho para harmonizar. A primeira cerveja que me chamou a atenção acho que foi uma Flying Dog (cervejaria artesanal localizada em Frederick, Maryland, EUA), uma coisa muito louca, era algo muito diferente. Eu até já tinha experimentado algumas belgas, mas acho que foi com essa Flying Dog que tive pensei: quero aprender a fazer isso. Quando comecei a fazer cerveja em casa mergulhei na produção sem saber o que eu estava tomando. Algo do tipo “vou fazer uma India Pale Ale, mas o que é uma India Pale Ale? Vou estudar e descobrir”. E com isso vinham as histórias, e eu gosto muito de história, os rótulos da Mafiosa contam muita história. Isso foi me cativando, o fato de cada cerveja, cada estilo ter uma história, fazer parte de uma cultura de algum lugar.

Qual foi a sua primeira receita? E como surge a Mafiosa?
Foi a nossa American IPA, a Don Drino, lógico, uma versão muito diferente da que a gente faz hoje. E foi ela que os amigos beberam e começaram a dizer: “Cara, ela é muito melhor do que muitas IPAs que a gente toma, é muito boa, você tem que lançar”. E a gente fazia 20 litros em quatro amigos, imagina, dava seis garrafas para cada um (risos). Era um negócio muito exclusivo, ninguém conseguia beber aquilo porque era muito poucas garrafas. Mas acabou sendo nossa primeira cerveja lançada e está ai até hoje, é a cerveja que a gente mais repetiu. A partir dela, decidi montar uma cervejaria e fui estudar, porque o investimento era muito alto, e descobri que eu poderia terceirizar a produção, e virei cervejeiro cigano. Comecei a produzir cerveja na fábrica da Dádiva e estamos lá até hoje. Foi assim que surgiu a Mafiosa, e acredito que, na verdade, a Mafiosa é que foi nos conquistando. Não foi algo do tipo “vi uma tendência de mercado e vou investir nisso”, mas sim o fato de eu ser apaixonado por fazer e tomar cerveja.

Hoje nós provamos algumas cervejas da Mafiosa e eu gostaria que você falasse um pouco mais sobre a Don Drino, que está de rótulo novo, e contasse sobre o novo lançamento, a Leave The Gun, Take The Cannoli.
A Don Drino é a nossa grande queridinha, desde sempre. Ela é uma receita que foi mudando muito, porque as IPAs foram mudando muito com os tempos. Ela é uma East Coast IPA, uma IPA bem Old-School, com base de malte bastante presente lembrando English IPA, mas com uma lupulagem mais moderna. É uma IPA da região de Nova York, com caramelo, um corpo mais presente, um amargor bem redondinho e aroma mais forte de lúpulo. Já a Leave The Gun, Take The Cannoli é o nosso novo lançamento. Gosto muito de ler sobre tendências de mercado, as novidades, e então eu provei uma Pastry Stout, que são Stouts baseadas em sobremesas, e fui pesquisar sobre elas. Com isso veio a pergunta: Qual seria a Pastry Stout da Mafiosa? Onde eu me inspiraria? E logo me veio a cena do “Leave The Gun, Take The Cannoli” do filme “O Poderoso Chefão”, do Francis Ford Coppola. E começamos a pensar como colocar os sabores do Cannoli numa Russian Imperial Stout, e chegamos nesse resultado, uma cerveja com maltes que trazem lembrança de biscoitos – para lembrar o canudo do Cannoli – além de adição de baunilha, cacau, casca de laranja e pistache (“que acrescenta um leve mentolado”, nota o editor do Scream & Yell) tanto na mosturação quanto em grãos na maturação. Estou muito feliz com o resultado. Acho que conseguimos chegar onde a gente queria.

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