Livro: “Uma Longa Queda”, de Nick Hornby, incomoda muito mais que diverte

por Randall Neto

“Eu queria escrever um livro que chocasse, sobre algo extremamente para baixo, e queria ver se conseguiria tirar esses personagens do fundo do poço sem ser sentimental ou irrealista. Se eu escrevesse um livro sobre depressão completamente depressivo, por que alguém o leria?”. Nick Hornby

Desde “Alta Fidelidade” que cada livro lançado por Nick Hornby é precedido pela enorme expectativa de uma espécie de sucessor da chamada “Bíblia” da Literatura Pop, o que ainda não ocorreu. E nem ocorrerá, pois parece que o universo de um “loser” dono de uma loja de discos foi esgotado ao máximo; sem dizer que esperar um reenquadramento desse tipo de um escritor como Hornby seria reducionismo, e também, caso ele cedesse à tentação Sidney Sheldoniana, um imenso desperdício de talento.

A essa altura, muita gente já deve estar sabendo do que se trata “Uma Longa Queda” (“A Long Way Down”), que foi lançado na gringa em 2005, e acaba de ganhar tradução nacional pela Rocco (assim como todos os livros anteriores do escritor britânico). A história gira em torno de quatro desconhecidos que se encontram casualmente no “suicidódromo” mais notório de Londres, na noite de ano novo e iniciam uma espécie de relacionamento, tão inusitado em sua formação quanto improvável em sua duração.

O romance é todo narrado em primeira pessoa pelos quatro aspirantes a suicidas: Martin, um apresentador de televisão que viu a carreira desabar depois de se envolver em um escândalo; Maureen, uma senhora solitária cuja vida se resume a cuidar do filho que há quase duas décadas se encontra em estado vegetativo; JJ, um músico americano fracassado que sobrevive entregando pizzas; e Jess, uma desequilibrada e passional filha de um ministro.

Algumas tentativas de diálogos terminam de forma desastrosa, outras acabam se tornando lições, e a maioria segue a lógica própria que Nick Hornby sempre apresenta nos seus livros, ainda que politicamente incorretíssimas – e talvez por isso, extremamente divertidas. O título nacional não traduz fielmente seu conteúdo. É melhor que “Ladeira Abaixo”, que foi o primeiro título cogitado pela editora, mas “A Long Way Down” pode até ser traduzido como “Uma Longa Queda”, mas seu significado real deveria ser “O Caminho Mais Longo”, ou algo assim. Por que não é de “queda” que trata o livro, e sim de “caminho”, ou “opções”. Trata de conviver com a ideia de ter escolhido o caminho mais longo e mais difícil.

Hornby não escreve sobre losers – verdadeiros ou potenciais -, apesar deles comumente frequentarem suas histórias; ele escreve sobre a angústia. E na prateleira da angústia, o escritor escolhe a forma mais leve, insípida e indolor de se lidar com o tema, mas ainda assim é angústia que pontua seus livros, não importando se a verdadeira preocupação gira em torno de um recente pé na bunda (“Alta Fidelidade”), as dúvidas de um casal (“Como Ser Legal”) ou o clássico “vale mesmo a pena viver essa vida?”.

Dividido em três partes, o livro incomoda muito mais que diverte, mesmo com as doses cavalares de ironia e o costumeiro sarcasmo. Não é o melhor livro do autor, não é o sucessor de nada, nem tampouco representa alguma espécie de guinada em sua carreira. Mas, até pra não fugir à regra, integraria com honras um Top 5 do que já li esse ano!

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