CALMANTES COM CHAMPAGNE

O Preço dos CDs começa a cair

por Marcelo Costa
24/05/2007

Uma vez, alguns anos atrás, assisti (aqui mesmo no prédio do iG) a uma palestra de André Midani, um dos poderosos presidentes de majors no País entre os anos 60 e 90. Na época (2004, acho), Midani estava em evidência por uma excelente entrevista concedida ao jornalista Pedro Alexandre Sanches, que escancarava o jabaculê, pagamento clandestino feito por gravadoras para que emissoras de rádio e televisão tocassem determinadas músicas. No meio do papo, muito interessante, questionei: "Por que o preço final de um CD de major no Brasil é tão caro?" O argumento do ex-presidente de gravadora era de que as majors haviam padronizado os preços, e que um CD de R$ 39 no Brasil custava US$ 13 nos Estados Unidos (em tempos de dólares a R$ 3).

É lógico que não me convenci. Na época, Wander Wildner vendia o seu CD solo, "Paraquedas de Coração" (prensado em fábrica, com encarte e acabamento profissional), por R$ 15, e gravadoras como a Trama e a (falida) Sum Records chegavam ao mercado com lançamentos, no máximo, a R$ 23. Enquanto isso, a Universal lançava um álbum de PJ Harvey no Brasil por R$ 39. Falei sobre tudo isso para o empresário, além, claro, do óbvio: não dá para comparar a renda norte-americana com a brasileira. Ele, lacônico, disse que – além da padronização de preços – os compradores de CDs pagavam as viagens dos executivos para vários lugares do mundo, hotéis cinco estrelas e jantares regados a tudo que existe de melhor. E você achando que só estava comprando um CD, certo.

O tempo passou, a crise das gravadoras frente à música digital virou pauta de grandes revistas, a venda de CDs caiu assustadoramente (será que ninguém mais "consome" música?) e muitos futurólogos de boteco anunciaram o fim do disquinho prateado aos quatro ventos no mesmo momento em que artistas pop comemoravam 1 milhão de downloads pagos de suas canções. Mesmo assim, os benditos CDs continuavam chegando às lojas, e, pasmen, algumas gravadoras começam a baratear seus preços. Nos últimos dois meses, os lançamentos da Universal (Kaiser Chiefs, Klaxons, Amy Winehouse) chegaram ao patamar dos R$ 23, máximo R$ 25 em uma loja honesta. Na sua cola, a Sony/BMG (Travis, Beyoncé, Avril Lavigne) também baixou a tabela, e suas novidades estão chegando as prateleiras entre R$ 26 e R$ 28. Na seqüência, a EMI (Stooges, Arctic Monkeys, The Good, The Band and The Queen) ultrapassa a barreira dos R$ 30 batendo nos R$ 32, e a independente Slag Records colocou "Néon Bible", dos canadenses do Arcade Fire, no mesmo patamar.

Penso comigo: R$ 30 em um CD é pra lá de abuso. Mas tem como piorar: a Warner (Bloc Party, Linkin Park, White Stripes) chega às lojas com CDs entre R$ 38 e R$ 42. A Warner deve acreditar realmente que a renda do público comprador equivale ao do mercado norte-americano. Mas em tempos de dólares abaixo dos R$ 2, comprar CD importado com frete gratuito se tornou uma vantagem para os fãs de música dispostos a ter o disquinho em casa (e os MP3 no computador): recebi nesta semana uma edição especial do álbum "At San Quentin", de Johnny Cash, contendo dois CDs (31 músicas), mais um DVD com um documentário da época (1969), pela bagatela de US$ 19,95. Pelo dólar de hoje, esse pacote bonitinho com um CD duplo mais um DVD me saiu mais barato que o novo disco do White Stripes, que será lançado pela Warner por algo em torno de R$ 40.

Apesar da falta de noção da alta cúpula da Warner, a atitude da Universal e da Sony/BMG mostra que as gravadoras estão apostando as poucas fichas que lhes restam na redução do preço do CD. E a última tenta uma cartada a partir do próximo dia 28: o CD Zero, um formato de álbum que trará cinco músicas, preço de R$ 9,99 estampado na capa, e que será uma espécie de "versão resumida" do disco (que será lançado em seu formato "cheio" ao mesmo tempo). Opinião deste colunista: o formato vai fracassar miseravelmente. Não é má vontade, juro. Tenho mais de 5 mil CDs em casa, continuo comprando CDs (apesar de começar a achar o ato muito mais vício do que necessidade) e acho essa idéia tremendamente tola e canibalizadora. Se você comprar o CD Zero, você irá se animar a desembolsar seu dinheiro suadinho para comprar um disco do qual você já tem cinco músicas? Mais: Para que pagar R$ 9,99 em um CD com cinco músicas se o CDR cheio estará sendo vendido nos camelôs por R$ 5, máximo R$ 10? Mais: os donos de loja vão mesmo vender o CD por R$ 9,99? Testes anteriores de singles com preço fixo não vingaram. Ou seja, esse CD Zero é um bebê morto no parto.

Nos planos da Sony/BMG, no entanto, depois de Vanessa da Mata, estão os CDs Zero dos novos lançamentos de Capital Inicial e Lobão, que fracassaram em suas primeiras semanas nas lojas. Lobão anda cantando aos quatro ventos que seu disco é um sucesso de crítica e público, mas seu "Acústico MTV" não comoveu as massas. Com um show agendado para Curitiba, duas semanas atrás, após ter marcado (alugado?) presença por meia hora no Domingão do Faustão, e suas músicas terem voltado misteriosamente a tocar nas rádios, Lobão fez uma apresentação para 600 pessoas em um local preparado para receber 2.500, um fiasco tão retumbante quanto as vendas pífias do novo álbum do Capital Inicial. Se no caso Lobão, o ouvinte pode argumentar que nem se lembra do velho lobo após tanto tempo fora da mídia, com o Capital Inicial a coisa é bem diferente. Uma das principais bandas dos anos 80 em atividade no País, o Capital viu seu público rejunescer, foi abraçado pela geração MTV, e a pouca procura dos CDs nas lojas é muito mais sinal de crise econômica do que de esquecimento dos fãs.

Não bastasse o fantasma das trocas de arquivos de MP3, e os camelôs descolados que diversificam cada vez mais seu leque de "ofertas" para o público, as grandes gravadoras nacionais voltam a enfrentar outro vilão: a queda do dólar. Com a moeda norte-americana batendo R$ 2, o novo disco do Wilco, "Sky Blue Sky", que a gravadora EMI está prestes a lançar no mercado nacional (por volta de R$ 30/32), pode chegar as mãos do consumidor brasileiro em uma versão importada por R$ 29 em uma loja virtual internacional isenta de frete. Se o comprador quiser pagar um pouco mais do que a edição nacional, por R$ 38 ele assegura a versão limitada com CD e DVD do mesmo produto, inédita no País. A vida é dura, meu amigo, mas poderia ser mais fácil. Se as gravadoras abrirem o olho, diminuírem a margem de lucro, e entregarem um CD em preços competitivos para as lojas, é possível que ainda exista um próximo round nesta dura batalha das gravadoras contra o avanço da tecnologia (e da pirataria). Do jeito que as coisas estão, infelizmente, o nocaute está bem próximo.

Agora, me conta caro leitor(a): você ainda compra CDs? Qual o preço que você consideraria justo pagar por um CD? Se o CD fosse mais barato, você compraria? O MP3 veio para ficar? Os comments estão a sua disposição. :o)

Rapidinhas – justiça seja feita: a ST2, que acabou de lançar o álbum da atriz e duble de roqueira Juliette Lewis com sua banda The Licks, bate na casa dos R$ 20. E independentes como a Monstro Discos e a Mondo 77 quase sempre não passam desse valor. E "Send Away The Tigers", disco do Manic Street Preachers que foi tema desta coluna algumas semanas atrás, só chegará ao Brasil como download pago (?!?).

maccosta@hotmail.com


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