CALMANTES
COM CHAMPAGNE
The Oscar Goes
To...
por
Marcelo Costa 20/03/2003
Entra
ano e sai ano e é sempre a mesma coisa: muita gente desdenha
a premiação máxima da Academia de Artes
e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos,
o tal do Oscar, mas no dia da premiação estaremos
todos, fãs de cinema, claro, em frente à TV com
nossa torcida organizada particular. È notório
que a premiação do Oscar mais erra do que acerta.
Há, inclusive, um livro sobre isso escrito em 1993, Alternate
Oscars, em que o autor, Danny Peary, questiona as escolhas
feitas pela Academia, desde a primeira entrega de prêmios,
em 1929. Só para ficar em alguns exemplos, você
sabia que o dramalhão Kramer Vs. Kramer bateu
a obra-prima de Francis Ford Coppola, Apocalipse Now
em 1979? E o que dizer da vitória de Gandhi sobre
Blade Runner em 1982? E Titanic que afundou seus
concorrentes em 1998, entre eles, o bacanaço Los Angeles,
Cidade Proibida. Tem mais. Cidadão Kane, propagado
Melhor Filme da História (eu discordo), concorreu em
1941 e só faturou o Oscar de melhor roteiro. E isso nem
é o pior. Lembrar de quem ganhou o Oscar é até
mais fácil, mas e aqueles filmes sensacionais que nem
concorrem? Exemplo: Cidade dos Sonhos de David Lynch,
que no ano passado, vencido pelo mediano Mente Brilhante,
nem esteve entre os cinco finalistas. Daria para escrever um
livro... se Peary já não o tivesse escrito...
claro. O fato é que de boas intenções o
inferno está cheio, sem dúvida. Assim, com desacertos
ou não, o Oscar é uma cerimônia interessante
que norteia bem estes anos (pós-modernos) malucos que
passam por nós, pelo menos cinematograficamente. Se o
que está na tela pode ser tomado como vida real é
outra história (bastante interessante, por sinal).
Com
tudo isso na cabeça, e tendo visto todos os concorrentes
ao prêmio, decidi sentar aqui e esboçar minhas
apostas. Claro, não só elas, mas o que elas apontam
no mundo que vivemos, afinal, se você já leu alguns
dos outros textos que já postei neste espaço vai
lembrar da tecla que não me canso de bater: toda produção
artistica e cultural está ligada totalmente ao período
em que ela foi parida, ou seja, a política, bingo, manda
no mundo. E já dizia outro, quem não gosta disso
é chefiado pelos que gostam (e acabam fazendo tudo que
querem pelo desleixo e interesse da maioria). Assim, mais do
que qualquer outra coisa, quando a Academia anúnciar
os premiados de 2003, estará, também, sinalizando
como o mundo é, ou não, manipulável. Senão,
vejamos:
Cinco
filmes brigam pela honra de entrar para a história do
cinema. Três brigam cabeça a cabeça, um
é o azarão e o último é uma bobagem.
Vamos começar pelo último, O Senhor Dos Anéis
- As Duas Torres. Bem, tudo que precisava ser dito sobre
este filme eu já disse, então, pulemos para o
azarão, As Horas, de Stephen Daldry. A adaptação
do livro de Michael Cunningham ganha em roteiro e elenco, mas
perde em direção. Daldry dirige com mão
pesada e quando o foco da história deveria ser mais a
dor das personagens, pequenos detalhes é que acabam saltando
(como vasos, festas e frases) mostrando a falta de delicadeza
do diretor. Quase todos os atores trabalham magistralmente em
As Horas, mas falta ao filme acabamento. E isso é
bastante perceptível, tanto quando o nariz de Nicole
Kidman, prejudicando a obra na briga pela estatueta.
Dessa
forma, concorrentes mesmo são só três, sendo
que qualquer um deles pode levar a taça para casa, embora
só dois deles mereçam. Se o mundo fosse justo,
se tudo fosse perfeito, o Oscar 2003 de Melhor Filme seria de
Fale Com Ela, do espanhol Pedro Almodovar, com Cidade
de Deus levando o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Como
a perfeição não é assim tão
notável, os dois filmes nem estão concorrendo,
deixando a briga entre os excelentes Gangues de Nova York
de Martin Scorsese e O Pianista de Roman Polanski,
junto com a bobagem Chicago de Rob Marshall. Na verdade,
pouco importa qual deles seja o melhor filme. O que importa
é a guerra. Ponto.
Dos
cinco candidatos ao prêmio de Melhor Filme, Gangues
de Nova York é o melhor. Martin Scorsese baseou-se
em um livro escrito em 1928 para contar como imaginava a cidade
de Nova York pré Guerra da Secessão. O filme é
violento, denso, tenso e épico. E é anti-ufanista,
o que somente um diretor do quilate de Scorsese teria o poder
de fazer. Tudo bem que na cena final, ao subir os créditos,
o diretor preste sua declaração de amor a cidade
expondo as torres gêmeas na tela, mas ninguém sai
do cinema acreditando que o EUA são o melhor lugar do
mundo. Gangues consegue mostrar pessoas imperfeitas,
dessas que existem em todos os lugares do mundo, inclusive aqui,
no Brasil. Esse é seu maior mérito: ter personalidade.
Claro que o fato de ter uma boa história, excelentes
atuações, uma grande produção, ajudam,
mas mesmo assim é pouco provável que o filme leve
o prêmio. Não é ok para o governo norte-americano
premiar um filme em que seu povo é retratado como violento,
antipático e opressor aos imigrantes, mesmo que isso
aconteça em toda parte do mundo e seja só um fragmento
da história. Mesmo assim há o beneficio da dúvida,
ou seja, vai que a Academia tem vergonha na cara e não
cede às pressões governamentais...
Já
O Pianista tem contra si tudo e mais um pouco. Em uma pátria
livre de coerções seria o filme certo na hora
certa, embora seja um tiquinho inferior cinematograficamente
a Gangues, por retratar tão bem a Polônia
invadida, tomada, usurpada e aniquilada pelos alemães,
entre 1939 e 1945. Baseado na autobiografia de Wladyslaw Szpilman,
que já era um músico conhecido quando da invasão
das tropas alemãs, O Pianista é belo e
assustador. O tudo e mais um pouco que o filme tem contra si
na cerimônia do Oscar vem, primeiro, de seu recado: "olha
os erros que foram cometidos. Vocês vão querer
cometer tudo de novo?". Com a guerra praticamente datada para
o dia da cerimônia, não seria nada mais obrigatório
que "O Pianista" ganhasse, se estivéssemos em uma pátria
sem pressões. Como o evento é norte-americano,
a pressão contra O Pianista é enorme. Contando
ainda que o diretor Roman Polanski é persona non grata
na América, dificilmente que a principal estatueta da
noite irá para o filme.
Assim,
sobra Chicago, que vem sendo apontado nos últimos
dias como o grande favorito aos principais prêmios. Chicago
é fraco, não redime o gênero dos musicais
e tem roteiro frouxo. Com poucos méritos, e eu não
sou o melhor para falar sobre o assunto (nos post scripts teremos
links para resenhas mais esclarecedoras), Chicago é
tolo, inverossímil e banal. O governo Bush propõe
algo semelhante àquilo que aconteceu com o povo brasileiro
na conquista da Copa do Mundo de 1970: distração.
Vamos deixar o povo feliz enquanto os apunhalamos no sono. Quer
detalhe mais sintomático e alienante (e cruel) do que
festejar o glamour dos musicais enquanto, lá fora, o
mundo explode? Vamos dançar enquanto bombas caem. Não
poderia ser pior. Assim, se tudo correr como previsto, Chicago
leva a taça, sem merecer.
As
outras categorias dependem muito da principal premiação.
Por exemplo: Se Chicago ganhar, possivelmente Scorsese
leva a sua merecida (e tardia) primeira estatueta de Melhor
Diretor. Se Gangues ganhar, Polanski corre o risco de
ser redimido. Eu torço, pessoalmente, por Pedro Almodovar,
o azarão. Mas Scorsese é o nome. A briga por Melhor
Ator é uma das mais equilibradas. Se O Pianista
não levar nenhuma das categorias acima, o prêmio
para a bela atuação de Adrian Brody cairia como
uma luva para o filme. Como Gangues deve levar ou filme,
ou direção, Daniel Day-Lewis acaba sendo prejudicado
na corrida. Mas, ao que parece, é entre as mãos
de Nicolas Cage (do sensacional Adaptação)
e as de Jack Nicholson (do bonitinho Confissões de
Schmidt) que esse Oscar deve cair. E só a indicação
de Michael Caine já valoriza o mediano O Americano
Tranquilo. Pelo filme, eu fico com Nicolas Cage, mas acho
que quem leva é Jack Nicholson.
Para
atriz, parece que finalmente chegou a hora de Nicole Kidman,
grande perdedora do ano passado com Moulin Rouge (era
favoritíssima, mas perdeu para Halle Berry, merecidamente).
Em As Horas, Kidman consegue passar toda angústia
de uma Virginia Wolf atormentada por seu próprio eu.
Das outras quatro concorrentes, apenas Juliane Moore merece
destaque (por Longe do Paraíso), embora a mediana
Rénee Zellweger esteja correndo por fora com sua interpretação
mediana em Chicago. Aposto as fichas que eu não
tenho em Nicole. E acho que vai dar ela, mesmo.
Ator
Coadjuvante é outro território sem dono. Christopher
Walken pode redimir o bom Prenda-me Se For Capaz de Spilberg.
Alias, sua atuação é uma das melhores coisas
do filme. Mas o páreo é duro contra Chris Cooper
(excelente em Adaptação) e Ed Harris (assustador
em As Horas). Essa coluna fica com Walken, mas acha que
quem leva é Ed Harris. Para finalizar as apostas, Juliane
Moore é a preferida desde colunista para atriz coadjuvante,
com sua atuação em As Horas (sim, ela concorre
a atriz também, mas por Longe do Paraíso).
A concorrência é forte com Kathy Bates muito bem
em As Confissões de Schmidt e Meryl Streep em
Adaptação. Catherine-Zeta Jones é
o azarão e tem muita chance de levar. Quer coisa mais
comovente que ver uma grávida receber um prêmio
da Academia???? O problema é que ela não merece...
Mas
mais do que falar dos filmes que podem ser premiados, o legal
é falar dos que ficaram de fora. Se eu fosse o todo-poderoso
e a mim fosse concedida a graça de apontar os cinco melhores
filmes de 2002, a lista seria a seguinte, sem ordem de preferência:
Fale
Com Ela
Cidade De Deus
Adaptação
Minority Report
Sinais (ou Insônia ou Prenda-Me Se For Capaz)
E
eu não saberia indicar qual dos três primeiros
seria o MELHOR FILME...
A
cerimônia de premiação acontece no dia 23
de março e vai ter transmissão ao vivo no canal
do seu Silvio. Faça suas apostas, depois a gente conversa,
ok.
Ps1.
- No site Bscene, os filmes Chicago,
O
Pianista e Adaptação
estão melhores traduzidos/explicados/resenhados. A resenha
do Adaptação, inclusive, é escrita
por este que vos escreve. Confira o site todo, alias (as editoras
agradecem!)
Ps2.
- O Homem Sem Passado, concorrente finlândes ao
Oscar de Melhor Filme Estrangeiro é uma deliciosa...
bobagenzinha. Esqueça a premiação em Cannes.
O filme é cheio de boas intenções... e
defeitos. Mas vale uma conferida, ao menos, para que você
conheça a melhor atuação canina de 2002,
dele, o temível cão Hannibal. Confira, mas cuidado.
Ps3.
Música, música, música!!!! Você,
minha irmã, o garoto da esquina, o Lúcio Ribeiro,
todo mundo já ouviu o novo álbum do Blur, certo.
Certo. Mas para quem já leu a coluna até aqui
e quer saber o que este pobre colunista, desesperançado
com a música pop, acha de Think Tank, lá
vai: bacanaço. A primeira audição foi tediosa,
na segunda melhorou, na terceira eu já estava viciado
no álbum e na quarta não queria largar mais. Tem
popices, bobices e coolzices (vixi, exagerei) em um disco feito
para se ouvir a dois, seja com um par romântico nos braços,
seja com um baseado nos lábios. Se fosse para dar uma
nota, neste momento (é um disco que melhora a cada audição)
seria nota 7 ou 7,5. E olha que eu nunca gostei muito de Blur
(sempre preferi Oasis). E olha que eu não fumo um baseado
já há uns cinco anos...
Ps4.
Outras apostas - Bowling For Columbine para Melhor Documentário
(fez um sucesso danado na Mostra SP 2002), Lilo & Stitch
para Melhor Filme de Animação (Rei Elvis vive!!!!!)
, O Pianista para Melhor Fotografia e Edição
e Charlie Kaufman e Donald Kaufman (hehehe) por roteiro adaptado
em Adaptação (embora o filme não
seja uma adaptação)....
Ps5.
O Alexandre Matias mantém o Trabalho Sujo sei lá
há quanto tempo. Eu só sei que se você quer
realmente ler textos de alta qualidade, você devia largar
isso aqui e conhecer o trabalho (sujo?) do cara. Siga o link:
http://www.geocities.com/trabalhosujo/
Ps6.
História: Quando eu ainda editava o Scream & Yell,
no braço, diariamente, tive a sacada de convidar dois
colaboradores apaixonados para me ajudar na edição
do site. Assim, mais do que empregados (catzo, o que é
isso, meu deus???) sem ganhar porra nenhuma, Leonardo Vinhas
e Diego Fernandes se dedicaram tudo quanto puderam ao S&Y,
como se aquilo fizesse (e fazia mesmo) parte deles. A decisão
de parar foi meio que um choque para os dois, que já
sabiam das minhas idéias sinistras há tempos,
mas ambos foram discretos ao máximo para entender a minha
opção. E, agora, ambos anunciam que estão
tocando novos projetos. Leonardo Vinhas se juntou ao cacúla
André Raposo para lançar o LADO 1 - (http://www.lado1.cjb.net/).
Quase toda galera que batia ponto no S&Y está ali:
A querida Angélica Bito, os geniais Juliano Costa e Martin
Fernandez e a dupla infalível do sul, Leandro Miguel
de Souza e Diego Fernandes. Este último está tocando
o GORDURAMA (http://www.gordurama.tk/)
com paixão rock and roll em alto e bom som e cinema e
entrevistas e tudo mais. A única coisa que posso dizer,
além do imenso orgulho que ambos me dispensaram em editoriais
e emails particulares é: O S&Y vive nestes dois sites.
Tudo aquilo que eu acredito ser certo em jornalismo rock and
roll pode ser conferido tanto no Lado 1 quanto no Gordurma.
Vida longa aos dois. E boa sorte, amigos.
Ps7.
Quase 23h, um puta calor, muito trabalho ainda por fazer e...
sono. Qualquer coisa me acorda no maccosta@hotmail.com
Liga não se eu demorar para responder, eu
sou meio lesado mesmo... abraços.
Leia
as colunas anteriores
#1
- Entrevista
#2 - O Futuro
da Internet
#3 - Álvaro
Pereira Júnior
#4 - Coldplay,
Travis, Starsailor
#5 - Um cd
e sete ps
#6 - Ano novo,
vida nova. Exato?
#7 - Teoria da
Conspiração
#8 - Bob Dylan,
Martin Scorcese e a História Universal
#9 - Eu quero
ser Spike Jonze
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