Por Marcelo Costa
Berlim, 08 de agosto de 2008. Três dias antes, o Radiohead havia tocado na terceira noite do Rock Werchter, na Bélgica, um festival que ainda contou com R.E.M., Neil Young, Lenny Kravitz e Beck (entre muitos outros). O público ficou dividido. Muita gente achou o show frio e o repertório pouco convidativo. Em um dos raríssimos momentos em que Thom Yorke se dirigiu à platéia, o vocalista falou: “É uma honra pisar no mesmo palco em que Neil Young tocou”. Só. Foram vinte e duas músicas, apenas um bis e nada de “Creep”. Muita gente deixou o local preferindo a apresentação do Sigur Rós (que tocou antes) ao Radiohead.
Corte para o trem em Berlim. Minutos após deixar a estação que atende ao aeroporto de Schönefeld, um homem grisalho aparentando uns 45 anos sentado no último banco do vagão, de jaqueta de couro e com uma garrafa de cerveja na mão (e são só 9h), interpela três garotos de quase vinte anos, primeiro em alemão, depois em inglês. “De onde vocês são?”. Um dos rapazes responde: “De Manchester, na Inglaterra. Viemos ver o Radiohead”, entrega dizendo mais do que lhe foi perguntado. O homem se interessa: “O Radiohead vai tocar aqui? Em Berlim? Putz, sabe a turnê do “The Bends”? Eu vi sete shows!”…
Berlim foi a vigésima oitava parada da turnê “In Rainbows”. Os shows no Brasil – primeiros da banda em mais de 15 anos – vão ser os de número 51 e 52 da tour, e a banda continua fiel ao seu lado difícil. Em 50 shows, hits de primeira hora como “Anyone Can Play Guitar” do álbum “Pablo Honey”, e “Black Star” do disco “The Bends” (aquele que o alemão é fã) não foram tocados sequer uma vez. Mas “Creep”, inédita até então na turnê, apareceu no segundo show do México, o que pode prometer surpresas para o repertório brasileiro. Em compensação, canções novas como “Weird Fishes/Arpeggi”, “Bodysnatchers”, “All I Need”, “Reckoner”, “Nude”, “Videotape” e “15 Step” foram tocadas todas as noites. E apenas duas canções por show são de “Ok Computer”.
Na capital alemã, o show acontece no meio do grande parque Wuhlheide, na periferia da cidade, mesmo local em que a banda tocara no dia 11 de setembro de 2001, no mesmo horário em que aviões colidiam com torres nos Estados Unidos. Parece especial para Thom Yorke tocar ali. Quanto mais se entra na mata, mais ela se fecha. Em certo momento, abre-se uma clareira, e o que surge carrega semelhanças com um antigo teatro romano. O palco está montado no fundo, arquibancadas de metal e madeira cercam quase todo o lugar, e gente de todo o mundo conversa numa confusão de línguas. Dezenas de barracas de bebidas, comidas e souvenirs lotam as redondezas e uma dupla de DJs faz algo que, provavelmente, só os alemães entendem até o finzinho da tarde.
A rotina segue: o jogo de luzes (barras de tungstênio penduradas no teto) toma sua posição, fileira por fileira, até cobrir toda a extensão do palco. Uma melodia minimalista começa a tocar enquanto os ajustes finais são dados e a banda toma seu lugar. O telão (no fundo e nas laterais), na verdade, são diversas telinhas que focam cada integrante (tal qual o clipe de “Jigsaw Falling Into Place”). “Weird Fishes/Arpeggi” abriu o show do Werchter, mas em Berlim eles preferem começar com “15 Step”, que serviu como abertura em mais de metade das apresentações da turnê. Em seguida é hora de testar os batimentos cardíacos dos fãs com uma faixa de “Ok Computer” (“Airbag”, “Lucky”, “Karma Police”, “Climbing Up The Walls” ou “Exit Music (for a film)”).
Junto com diversas possíveis faixas de “In Rainbows”, uma de “Kid A” (a sensacional “National Anthem”) e duas de “Hail To The Thief” marcam presença (quase certa) na primeira parte do show: a excelente “There There” e a sonolenta “The Gloaming”. No decorrer o grupo não facilita e da-lhe b-sides como “Bangers and Mash” e “Talk Show Host”. As canções de “The Bends” começam a dar às caras no miolo do set list: na Bélgica foi “Just”, e em Berlim, um presente especial: “Nós tocamos aqui em 11 de setembro de 2001. Espero que vocês lembrem essa canção. É para vocês”. O riff marcante de “My Iron Lung” preenche o ambiente. “Fake Plastic Trees” também pode rolar.
A parte final da noite traz faixas de “Kid A”, “Amnesiac” e “Hail To The Thief” como “Optimistic”, “Where I End and You Begin”, “Dollars & Cents”, “How To Disappear Completely”, “Pyramid Song” e um dos grandes momentos do Radiohead (e de Thom Yorke) no palco: “Idioteque”. Chegamos ao bis e “Everything In It’s Right Place”, em versão house, ou abre ou fecha. “You And Whose Army?” também costuma aparecer – e jogar um balde de água fria na audiência. Sem problema, pois “Paranoid Android” aparece para reerguer o ânimo em uma versão irretocável. “Planet Telex”, “The Bends”, a inédita “Supercollider” e “2+2=5” costumam aparecer também.
A rigor, o set list do Radiohead é fechado em 22 canções incluindo um bis. Nas duas datas do México, por exemplo, foram 25 canções em dois bis – se a banda e o público estiverem animados podem rolar até três bis. O repertório é dividido assim: de oito a dez canções de “In Rainbows”, uma de “The Bends” (pode até serem duas) três de “Ok Computer” (nunca quatro, mas quem sabe) e mais um ou dois b-sides. E todo o resto da tríade “Kid A”, “Amnesiac” e “Hail To The Thief”. O show tem momentos mágicos, mas pode muito bem trazer bocejos a quem não é muito familiar ao som do quinteto – e cansa um pouco até aqueles que conhecem as faixas mais obscuras. É uma apresentação que costuma demorar a engatar, mas nada como uma “No Surprises” para derreter corações de gelo.
As atitudes emblemáticas do Radiohead no showbusiness são levadas aos extremos no palco. Eles não tocam os hits fáceis porque não querem tocar. Ponto. Misturam faixas eletrônicas que poucos conseguem entender com cavalos de batalha de seu repertório num constante bate e assopra que procura reafirmar os dois lados distintos do grupo e que ali, naquele espaço, são eles quem mandam. Todos que admiram a banda podem se deliciar com o senso de dificuldade que o grupo de Thom Yorke parece criar em torno de si mesmo, cujo resultado mais simplista seria: eles poderiam optar por um repertório que facilmente faria de suas apresentações um momento mágico na Terra, mas preferem mostrar que o pessimismo (tema tão presente nas letras do grupo) também faz parte deste mundo.
Os fãs que amam o Radiohead cegamente vão adorar o show. Na verdade, eles já saem de casa adorando (em 99% dos casos com qualquer artista). Já aqueles que admiram a banda por suas particularidades talvez torçam o nariz, mas devem perceber que o show do Radiohead é mais teórico que prático. Diz mais sobre o show o que não acontece. E afinal de contas, quem vai ver o Radiohead ao vivo quer mesmo sair feliz após o show? Como sorrir após cantar “Wolf At The Door”, “No Surprises” e/ou “Nude” (que diz: “Não tenha grandes idéias / Elas não vão acontecer”)? Thom Yorke cria um paradoxo interessante para os tempos modernos. Ele entrega sua tristeza e seu pessimismo para a felicidade de uma multidão, mas quer deixar claro que não faz disso um ato heróico: se você quiser, vai ser do jeito dele, e não do seu. Poucos artistas – poucos, muito poucos – no mundo conseguem isso.
Para os shows do Brasil, muita expectativa sobre como a banda irá se portar frente ao público brasileiro pela primeira vez. A chance do grupo ceder e tocar mais canções “fáceis” que o normal é mínima, embora o repertório das datas no México abram um precedente, o que quer dizer que as apresentações de sexta, no Rio de Janeiro, e do domingo, em São Paulo, possam ter surpresas. O roteiro dos 50 shows anteriores desta turnê deve ser seguido à risca, mas e se a banda estiver mais à vontade, se o clima estiver bom, se o público colaborar, se o tempo ajudar, se Jorge Ben aparecer, o que pode acontecer com o Radiohead aqui? Lembre-se: é um jejum de mais de 15 anos que será quebrado – para a banda e para o público. Alguém assopra o ouvido dizendo que vão ser duas noites especiais. Será? O que você espera do show, caro leitor?
Veja quais foram as 56 canções tocadas pelo Radiohead nas 50 datas da “In Rainbows Tour 2008/2009”. Entre parênteses, o número de vezes que eles tocaram cada música.
» All I Need (50)
» Bodysnatchers (50)
» Reckoner (50)
» Nude (50)
» Weird Fishes/Arpeggi (50)
» Videotape (50)
» 15 Step (50)
» There There (49)
» Everything In Its Right Place (49)
» Idioteque (48)
» Faust Arp (45)
» Jigsaw Falling Into Place (45)
» The Gloaming (44)
» National Anthem (41)
» House of Cards (36)
» Paranoid Android (34)
» Optimistic (33)
» Pyramid Song (31)
» Bangers and Mash (27)
» You And Whose Army? (27)
» Lucky (26)
» Airbag (23)
» Just (23)
» Exit Music (for a film) (22)
» How To Disappear Completely (19)
» Street Spirit (fade out) (19)
» Karma Police (18)
» Climbing Up The Walls (18)
» Dollars & Cents (16)
» Where I End and You Begin (15)
» Planet Telex (15)
» No Surprises (15)
» Morning Bell (14)
» Fake Plastic Trees (14)
» Talk Show Host (13)
» The Bends (12)
» My Iron Lung (11)
» Myxomatosis (10)
» 2+2=5 (10)
» Wolf at the Door (9)
» Cymbal Rush (9)
» Go Slowly (8)
» Like Spinning Plates (8)
» Kid A (4)
» Supercollider (4)
» Hunting Bears (4)
» The Tourist (3)
» Knives Out (2)
» Bullet Proof.. I Wish I Was (1)
» Sail To The Moon (1)
» I Might Be Wrong (1)
» In Limbo (1)
» Tell Me Why (1)
» True Love Waits (1)
» Creep (1)
» Fog (1)
Fotos: Marcelo Costa / Scream & Yell – http://www.flickr.com/maccosta/
Leia também: Retrospectiva Radiohead
– “Pablo Honey”, por Eduardo Palandi (aqui)
– “The Bends”, por Renata Honorato (aqui)
– “Ok Computer”, por Tiago Agostini (aqui)
– “Kid A”, por Luís Henrique Pellanda (aqui)
– “Amnesiac”, por Marco Tomazzoni (aqui)
– “Hail To The Thief”, por Marcelo Costa (aqui)
– “In Rainbows”, por Alexandre Matias (aqui)
Espero um show lendário. Conheço toda a obra e nenhuma música passa despercebida por mim. Mas claro, há aqueles que esperam apenas por Creep ou Fake Plastic, por mim tocavam Pull Revolving Door e in Limbo, Subterranean Alien, Mixomatosis rsrs mas oq rolar será mágico.
Eu nao faco questao de ouvir Creep, mas umas musicas que voce falou eu nao ouco nem em casa (rsss). Acho que vai sera um show de altos e baixos, e estou ansiosa pelos altos
Essa é só minha postura como um do fãs, tipo, curto todos os albuns da banda (todas as fases), estou acostumado ouvir os albuns inteiros e não apenas algumas músicas, entao de You à Videotape, oq tocarem eu estarei nas alturas…=]
acho que me enquandro no que o Mac escreveu “Os fãs que amam o Radiohead cegamente vão adorar o show. Na verdade, eles já saem de casa adorando”
Tipo, vou sair do Interior do Pará, ir pra sampa pra assistir a banda da minha vida.
Cara, oq rolar (pelo menos pra quem conhece a obra) será inesquecível;; Claro, se rolasse Knives Out, Scartebrain ou Black Star, hahahha
Tive um arrepio quando comecei a ler. Outro quando cheguei a metade. Não consegui terminar de ler e vim aqui, escrever. Acho que teria um ataque se estivesse no show – choraria, ficaria muda, boba, olhando pro Thom e cantando junto. Sinceramente, eu acho que eles tem é que tocar as músicas do In Rainbows, afinal é turnê desse CD. Mas enfim, gostaria de ouvir Idioteque ao vivo (morreria lá no show). Mas como não vou, vou chorar em casa 🙁
Mac…o repertorio do Mexico ja estaria soberbo….eheehehe
cara, queria muito ouvir ‘a wolf at the door’
já valeria o show pra mim, mas tô indo na mesma da maioria (acho), o que tocar tô feliz! é jogo ganho rpa mim rs
deus, vai ser foda!
Bem que eles podiam trazer metais para cá e tocar Life In a Glasshouse pela primeira vez na turnê.
É claro que eu já vou sair de casa feliz, mas nesses 10 anos que eu acompanho a banda eu nunca ouvi o adjetivo “sonolento”. O que geralmente se lê é “inesquecível”, “show da minha vida”, etc.
Lauria, altos e baixos é uma ótima definição;
Leno, e você está certíssimo, o clima é esse mesmo!
Cristal, imagine que você os verá na Europa, ano que vem ou o outro.
Adriano, curti o repertório, viu.
Ricardo, a wolf at the door é… fooooda. Adoraria ouvir também, mas talvez em um lugar menor. Tem muita coisa do Radiohead – de warp até delicadeza – que não funciona em um palco aberto para 30 mil pessoas.
Gilvas, hehe
Jonas, outra para se anotar, mas com metais e tudo.
Elvis, sempre há uma primeira vez. Pra tudo. Porém, acho que esses dois shows do Brasil tendem a ser históricos. Por vários motivos. Os que eu vi na Europa não.
É Leno, vc é o melhor fã do mundo. Muito melhor do que todos nós…
Só me faça um favor: Não fique do meu lado no show…
Claro que o show em si já será histórico. Adorei os repertórios do México. Alteraram umas 10 músicas de um dia pro outro. Estou vendo que não fiz errado em comprar RJ e SP. Assistirei a dois shows bem diferentes.
Just ou The Bends?
Exit Music ou Karma Police?
Kid A ou Street Spirit?
Difícil hein…Que toquem todas!!!! E que venha Creep também, qual o problema com ela?
Pena que Black Star, Knives Out, Let Down e Blow out não fazem parte também.
Eu sou muito a favor que toquem Creep, mas se rolasse Black Star iria ser demais.
Me lembro do Drustore tocando Black Star no programa Lado B, na época do Fábio Massari….
Também ficou divina. Com a percussão sendo feita com uma caixa de papelão e arranjos de violino…e a interpretação bem emocionada da Isabel Monteiro…
Toquei muito Let Down quando fazia apresentações acústicas. As pessoas ficavam olhando e sempre perguntavam depois de quem era essa música…espero que algumas delas tenham virado fãs de Radiohead…seria o máximo! Acontecia a mesma coisa com Manic Street Preachers, com If you tolerate this…
Samuel, deixa de ser leso meu filho, eu disse q eu era o melhor fã do mundo?
Quando tu acordar com o teu cú sujo, lembre-se em não descontar em ninguém.
fakdik
=]
Falow Mac, essa foi minha ultima postagem antes do show, to indo pra sampa nessa noite, se deus quiser tudo dará certo
Inesquecivel show pra nós!
mac, você é meio noob, em se tratando de radiohead, permitida a vulgaridade do termo.
primeiro que climbing up the walls é loooonge de ser lado-b. tá no ok computer, pô.
e outra, acho completamente incorreta a afirmação de que é um show irregular; isso é pra fãs de coldplay, que só conhecem bem os singles. não é necessário ser fã hardcore pra o show inteiro ser perfeito.
Daniel, vulgaridade permitida (hehe), mas eu vi o show. É irregular. Não é achismo, pois eu já estive na platéia em dois shows da banda. Ali, na hora em que você está em pé, cantando as canções, o show sobe e desce. Quero ver alguém dizer que “The Gloaming” ou “You And Whose Army?” não baixaram o clima. Elas não são canções para arenas, mas para lugares menores, intimistas. Mas, de repente, eles fazem um show de hits. Quem sabe, né.
Baixou o nível Leno? Até se o Thom Yorke peidar no microfone vc dará gritinhos de satisfação e gozo…
Seu lambe saco…EU conheço toda a obra, DE MIM, nada da banda passa despercebida, qualquer coisa será maravilhosa…EU entendo a obra do Radiohead, quem não gosta de alguma música é pq não entendeu.
Bom show pra vc. Vê se não desmaia. Parece até uma menininha da época dos menudos…rsrsrsrs…ai ai, o Thom Yorke é lindo! E tão sensível! Só eu o entendo….
pô mac, eu danço com the gloaming até vendo pelo youtube. é muito groove! e You and whose army vale, além de pela beleza da canção, pelo momento intimista yorke-na-câmera.
Samuel, ta com ciume do Thom menino??
Conheço mesmo, saco a banda de ponta a ponta, isso me faz mais fã? LOGICO q nao!
deixa de ser nagativista de alma pobre e tola, cresce rapaz!
falow!
Daniel, sempre tem alguém que dança. Em Berlim, algumas pessoas devem ter dançado, mas nessa hora as barracas de cerveja lotaram, e eu quase tive que ouvir Videotape inteirinha no bar. Mas deu tempo de voltar pro meu lugar com cerveja pros amigos pegando ela na metade e, ainda, ouvir No Surprises na sequencia. Nessa, ninguém arredou o pé do lugar.