30º Festival MixBrasil: “Close” é um poderoso filme sobre amizade – e sobre como o patriarcado destrói coisas belas

texto por Renan Guerra

Léo e Rémi tem 13 anos, são amigos inseparáveis e irão começar o ensino médio em uma escola com novos colegas. Nesse novo espaço, a amizade dos dois passa a ser questionada e eles são vistos pelos colegas como namorados, suposições e a violência que isso acarreta que irão macular a amizade dos meninos com consequências drásticas. Isso talvez seja o fundamental a se saber sobre a sinopse do filme “Close” (2022), de Lukas Dhont, por isso tentaremos ao máximo evitar spoilers. Premiado em Cannes com o Grand Prix e escolhido pela Bélgica como seu representante na busca por uma vaga ao Oscar de Filme Internacional, o longa já foi exibido por aqui no Festival do Rio e seu sucesso boca a boca rendeu filas nesse Festival MixBrasil que encheram a rua Augusta na entrada do CineSesc, em São Paulo.

E isso tudo tem um motivo: “Close” é um filme lindo sobre amizade e sobre como as violências da nossa sociedade impactam em nossa vida. Lukas Dhont (diretor de “Girl”, disponível por aqui na Netflix) criou as bases de seu roteiro após ler o livro “Deep Secrets: Boys’ Friendships and the Crisis of Connection”, da psicóloga Niobe Way. A pesquisa de Niobe entrevistou um grande número de garotos e revela que a maioria dos meninos em início de adolescência têm relações muito íntima com seus amigos, de troca de segredos e de afeto mútuo, mas conforme vão se aproximando do fim da adolescência, esses laços vão rareando e essas amizades ficam menos intensas – as amizades íntimas e os sentimentos de vulnerabilidade passam a ser coisas de garotas e gays.

Lukas Dhont, que estava presente na sessão no Festival MixBrasil, explicou que o livro fez ele revisitar muitas questões de sua adolescência e entender que algumas de suas vivências não estavam necessariamente relacionadas a sua homossexualidade, mas sim a sua vivência de masculinidade em uma sociedade tão patriarcal quanto a nossa. E é a partir daí que surge o plot inicial de “Close”: essa amizade íntima e afetuosa entre Léo e Rémi. O filme de Dhont não faz suposições, não cria denominações e nem limita esses meninos: eles são jovens amigos, estão vivenciando essa experiência de crescimento de forma conjunta e é isso. Porém, o mundo que os cerca é áspero e a entrada deles na escola irá dar demonstrações de como a homofobia e as violências da sociedade patriarcal afetam a todos, inclusive os homens.

Léo (Eden Dambrine), por exemplo, responde a essas violências se afastando de Rémi (Gustav de Waele) e apostando em universos mais masculinos, como entrar numa equipe de hóquei no gelo e passar a andar mais com os meninos que discutem futebol. Todos esses movimentos e esses pequenos detalhes que constrõem “Close” só funcionam de forma tão pungente por causa da atuação dos dois meninos, que são delicados e intensos na mesma medida. Eden Dambrine, o protagonista, curiosamente foi descoberto por Lukas Dhont no trem. Dhont se encantou com sua expressividade, mas ficou com certo receio de abordar o menino no trem, de todo modo se apresentou mesmo assim. Os amigos de Dambrine jogaram o nome de Dhont no Google e viram que ele realmente era cineasta. Depois disso, a família de Dambrine teve acesso ao roteiro e aí o que temos é essa atuação primorosa de um ator em pleno desabrochar.

E é curioso como Dhont desenvolve essa história ao lado das crianças, pois “Close” é um filme de tópicos extremamente complexos: homofobia, violência, saúde mental, luto e amadurecimento. De todo modo, tudo é extremamente delicado no filme, construído com um cuidado, uma sutileza, o que leva ao envolvimento direto do espectador, tanto que há cenas em que pouco sabemos ou quase nada se diz e mesmo assim conseguimos sentir todas as emoções que aqueles personagens transpassam na tela. Falando nas atuações, além dos dois garotos, é importante destacar a presença de Émilie Dequenne (“Rosetta”), que está maravilhosa como Sophie, a mãe de Rémi.

Realista e um tanto quanto doloroso, “Close” é um olhar muito delicado sobre como o patriarcado nos afeta e destrói coisas belas pelo caminho, mesmo que às vezes a gente não se dê conta do estrago. Assista com uma caixinha de lenços ao seu lado!

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– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Faz parte do Podcast Vamos Falar Sobre Música e colabora com o Monkeybuzz e a Revista Balaclava. 

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“Close” é um poderoso filme sobre amizade – e sobre como o patriarcado destrói coisas belas

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