Três livros: “Ordem Vermelha”, “Praia de Manhattan”, “Ideias Para Adiar o Fim do Mundo”

Resenhas por Adriano Mello Costa

“Ordem Vermelha: Filhos da Degradação (Vol. 1)”, de Felipe Castilho (Intrínseca)
Um sistema opressor que massacra a população de todas as formas possíveis e imagináveis incluindo uma violenta repressão que descamba para a tortura pura e simples quase que sempre. No apoio a esse regime, além de um forte braço militar, estão a religião, a ciência e a manipulação de fatos e verdades com informações que favoreçam aos que estão no poder e espalham o medo. Essa é a realidade de Unthreak, a última região habitada do mundo apresentada em “Ordem Vermelha: Filhos da Degradação (Vol. 1)”, do escritor paulista Felipe Castilho. A obra foi lançada na CCXP em dezembro de 2017 com participação direta da empresa e teve publicação pela editora Intrínseca com 448 páginas. Fantasia onde transitam seres fantásticos e criaturas assombrosas, “Ordem Vermelha: Filhos da Degradação (Vol. 1)” tem como grande inspiração “O Senhor dos Anéis” e outras obras correlatas, contudo exibe brilho próprio não somente pelo universo que cuidadosamente cria em termos de ambientação e dinâmica visual, mas particularmente pelo teor do texto que insere uma sólida pegada política ainda que mascarada e encoberta por várias camadas. Os indivíduos que se atrevem a derrubar e desmascarar o governo corrosivo da deusa Una precisam lidar com táticas e nuances que quando tiramos as espadas, bestas, escudos e bichos grotescos não são tão diferentes das que hoje vemos por aí tanto no Brasil quanto em alguns outros países do mundo. Dosando aventura, tensão e humor com essa dose camuflada de crítica política e social, o primeiro volume de “Ordem Vermelha” é um trabalho que exibe vários bons atributos.

Nota: 7 (site oficial)

“Praia de Manhattan”, Jennifer Egan (Intrínseca)
Se atualmente as mulheres ainda se deparam com os mais diversos tipos de preconceito e ouvem absurdos mil, imagine como era na década de 40! É onde Anna Kerrigan, a protagonista de “Praia de Manhattan” (“Manhattan Beach’, no original), da escritora Jennifer Egan, se encontra e lida diariamente para conseguir o que deseja enquanto sustenta o crescimento pessoal junto com os erros, dúvidas e afirmações decorrentes. Publicado nos EUA em 2017, a obra recebeu edição nacional em 2018 pela editora Intrínseca com 448 páginas e tradução de Sergio Flaksman. A vencedora do Pulitzer de 2011 com o magistral “A Visita Cruel do Tempo” (e também autora de “O Torreão” e “O Circo Invisível“), Egan aqui navega por uma narrativa mais convencional (mas não menos elegante), que utiliza a ficção histórica como condutora. Desenvolvido sobretudo na Nova York da época em que a segunda guerra mundial se desenrolava, mas também tendo uma relevante parte nos anos 30, no cenário pós-crise financeira de 1929, o trabalho versa sobre escolhas, consolidação, luta, inquietação, risos e lágrimas, sejam no mar ou em terra. Entramos de cabeça na vida da personagem principal que trabalha no Arsenal da Marinha e anseia por ser mergulhadora quando mulheres eram proibidas disso. Vivendo sozinha com a mãe e com a irmã que carrega sérios problemas de saúde, Anna Kerrigan fica sempre a um pé de desmoronar enquanto toma uma decisão difícil ou quando se entrega aos prazeres da vida. Com ambientação histórica que beira a perfeição, Jennifer Egan mostra de novo suas habilidades e o que é capaz de construir.

Nota: 8 (leia um trecho)

“Ideias Para Adiar o Fim do Mundo”, de Ailton Krenak (Cia das Letras)
Ailton Alves Lacerda Krenak nasceu na década de 1950 na região do Vale do Rio Doce, em Minas Gerais, no território do povo que carrega no nome e onde a mineração continua de modo incisivo até hoje. Ativista, escritor, pensador e um dos líderes mais renomados dos povos indígenas no Brasil, tem esse ano pela Companhia das Letras outro livro publicado, chamado “Ideias Para Adiar o Fim do Mundo”. Em formato pequeno (pocket) e com apenas 88 páginas, o trabalho se destaca pela força inversamente proporcional ao tamanho. Emprestando o nome do título de uma palestra proferida em uma universidade portuguesa em março de 2019, a obra se baseia ainda em outra palestra e uma entrevista, ambas efetuadas em Lisboa no ano de 2017. Naquilo que apresenta e se propõe a discutir, Krenak cumpre o objetivo de fazer o leitor pensar, se indagar e questionar não somente os caminhos do mundo, mas os próprios passos. Em determinado momento pergunta no texto: “Somos mesmo uma humanidade?” E aí? Será que somos mesmo? Difícil acreditar nisso depois de passar um dia lendo as notícias atuais. Conversando sobre passado, presente e futuro, “Ideais Para Adiar o Fim do Mundo” é uma obra que ganha ainda mais força depois dos absurdos e posicionamentos cometidos pelos atuais mandatários da nossa nação e se torna um convite para que possamos contar mais uma história, sermos mais conscientes, nos posicionar a favor da natureza e adiar assim a cada dia – um pouco mais que seja – o fim.

Nota: 8,5

– Adriano Mello Costa assina o blog de cultura Coisa Pop ( http://coisapop.blogspot.com.br ) e colabora com o Scream & Yell desde 2009!

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