Música: “After”, disco de remixes de Pabllo Vittar, é um compêndio interessantíssimo sobre a atual música eletrônica brasileira

texto por Renan Guerra

A drag superstar Pabllo Vittar lançou em fevereiro o disco “Noitada” (2023), porém esse foi um lançamento bem divisivo. Com exatos 21 minutos e 55 segundos, o disco foi uma espécie de esquenta para a noitada, pois a curta duração das canções dava uma sensação de falta de algo, como um desejo de quero mais. Esse lançamento foi seguido de uma série de questionamentos em torno da carreira de Pabllo, especialmente relacionado ao seu show – uma parcela do público questionou a estrutura mínima de palco da artista e o porquê ela não investia em uma banda de acompanhamento para determinadas apresentações. Polêmicas à parte, Vittar lança agora “After” (2023), o disco de remixes de “Noitada”. Com mais de 30 minutos, esse parece ser o lançamento que se esperava: intenso, forte e divertido, o álbum é um compêndio interessantíssimo sobre a atual música eletrônica brasileira.

Os discos de remixes de Pabllo sempre foram de alto nível, é só relembrar o excelente “NPN Remixes” (2019) e os nomes que participaram do também ótimo “111 Deluxe” (2020). Pabllo é uma pessoa da noite e está sempre atenta ao que tem de interessante na cena atual, ela sabe mirar em nomes realmente interessantes e criativos e isso é visto novamente em “After”. Nomes diversos como Jup do Bairro, Irmãs de Pau, DJ Ramemes e MC Naninha se misturam em um disco que caminha por diferentes cenários da música eletrônica, indo do funk ao tribal em um trabalho que ainda surpreende por uma interessante coesão – algo que é difícil de se conseguir em um disco de remixes, até porque é natural que cada artista tenha sua própria abordagem.

O disco abre com “AMEIANOITE”, um dos melhores singles do “Noitada”, que reúne Vittar com Gloria Groove. Nesse novo lançamento a faixa ganha o remix de Clementaum com participação da cantora e compositora Siamese. Natural de São José dos Pinhais, no Paraná, Clementaum é uma DJ e produtora que mistura com muito bom humor gêneros e possibilidades rítmicas, o que é um acerto e tanto nessa faixa de abertura. Na sequência temos “Descontrolada”, faixa com participação de MC Carol, e que era um dos maiores sucessos do disco original. Remixar uma faixa que já é naturalmente ótima é, às vezes, um risco, mas nas mãos da dupla Cyberkills esse desafio é contornado com uma versão que expande ainda mais a força dessa canção. Cyberkills já são parceiros antigos de Pabllo e para essa versão eles chamam Jup do Bairro, que mistura uma série de referências em seus versos, conversando com o funk proibidão e trazendo outro tom para “Descontrolada”, transformado esse no remix mais tesudo do disco – é, não achamos outra palavra melhor para definir essa canção.

“Calma Amiga”, parceria com Anitta, ganha remix de Ramemes e DJ Tonias, e é um exemplo interessante de uma faixa que era um interlúdio pequeninho no disco original e que cresce e muito nas mãos dos dois artistas. Ramemes, aliás, é o dono de um dos discos mais interessantes do ano, “Sem Limites”, lançado em maio pelo selo QTV. “Balinha de Coração”, também com Anitta, é o caso de uma faixa originalmente mediana que cresce nas mãos de PZZS e que ganha os versos de MC Naninha, divertido nome do funk putaria que é sucesso nas redes sociais. Já “Cadeado” virou “Kaosdeado” nas mãos de Mílian Dolla, artista multimídia, DJ e produtora que já acompanhou Pabllo Vittar em suas turnês. Esse rework de Mílian é um exemplo muito interessante do mix de ritmos e possibilidades exploradas dentro do disco, algo de diálogo entre o funk e o jungle, mas como se tudo tivesse sido batido no liquidificador.

“Derretida” ganhou a presença mais que especial de Irmãs de Pau (falamos delas aqui) e Brunoso. A dupla de funkeiras reedita o seu refrão-bordão do single “Shambaralai” para “Irmãs de Pau / Chegou Irmãs de Pau / Elas têm pau / E a Pabllo também tem pau” – 10/10 essa alteração. Para além disso, é muito interessante que a faixa é um diálogo do universo de Pabllo com as duas funkeiras, que dão o nome com um flow poderoso em seus versos. “Penetra”, parceria com O Kanalha, ganhou um remix de Pedro Sampaio, e não tem nada de muito interessante, é só um arremedo do trabalho sempre repetitivo de Pedro, o que segue se destacando na canção é o encontro de Pabllo com O Kanalha, nome interessantíssimo do pagodão baiano. A faixa foi escolhida como single e ganhou um clipe muito bonito que conta inclusive com algumas locações no Zig Duplex, espaço importante da comunidade LGBTQIA+ em SP, como já contamos por aqui.

“Apetitosa”, faixa com MC Tchelinho (Heavy Baile) ganhou remix de S4TAN, com participação da drag queen Frimes. E o melhor dessa versão é que Frimes mostra que é muito mais do que um belo par de seios de plástico: ela também tem um flow excelente. Brincadeiras à parte, Frimes é uma artista de múltiplos talentos e que é conhecida pelo seu humor afiado; ela participou recentemente do reality show “Caravana das Drags”, do Prime Video, e vale ficar no seu radar. Já a faixa “Culpa do Cupido” nos leva para os lados mais darks desse after, com remix de EPX e Delcu, naquela que é a versão mais barulhenta e acelerada do disco, isto é, uma barulheira perfeita! Para fechar o disco, “After” ganha remix tribal de Filipe Guerra, nome que ficou conhecido pelo seu trabalho em parceria com Lorena Simpson. É um fechamento extremamente gay para o disco, deixando claro que Pabllo está atenta a todos os seus seguidores: tem fritação para todos!

“After” é um passeio por diferentes ritmos eletrônicos e funciona como mais um cartão de visitas para uma série de artistas interessantes envolvidos no projeto. É mais um acerto dentro da carreira da Pabllo Vittar, mostrando que a artista sabe como entender o novo e sabe como mirar o que é realmente vibrante e instigante na nossa música brasileira.

– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Faz parte do Podcast Vamos Falar Sobre Música e colabora com o Monkeybuzz e a Revista Balaclava

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