Entrevista: Les Deuxluxes (Canadá)

por Renan Guerra
Colaboração Nycolas Ribeiro

A dupla canadense Les Deuxluxes está rodando pela primeira vez pela América Latina e traz no bolso seu disco de estreia, “Springtime Devil” (2016), trabalho que mescla rock, country e uma boa quantidade de glitter e paetê. Ainda quase desconhecidos por aqui, os dois trabalham na construção de uma identidade bem específica, numa busca direta por apresentar-se como artistas e vender esse universo quase de magia. Para isso, Etienne Barry e Anna Frances Meyer tem um olhar curioso sobre o passado: glam rock, casacos de franjas e Dolly Parton misturam-se de forma natural a referências do hip-hop, do rock alternativo e da música pop.

Nessa busca, o disco “Springtime Devil” reúne uma força e uma delicadeza capaz de levá-los longe. Com canções que falam sobre amores, juventude e qualquer outro tema clássico do rock, Les Deuxluxes conseguem trazer diversão e entusiasmo naquilo que a um primeiro momento poderia parecer mais do mesmo. E é isso que eles trarão ao Brasil: Les Deuxluxes se apresentam em São Paulo no dia 10 de dezembro, na Noite Canadense, que ocorrerá no Centro Cultural Rio Verde. Parte da Semana Internacional de Música – SIM SP, a dupla se apresentará ao lado das bandas conterrâneas Chocolat, Foreign Diplomats e Randon Recipe.

Nós conversamos com eles via e-mail, quando eles já estavam viajando pela América do Sul, e falamos sobre rock, moda, expectativas e representatividade feminina. Confira abaixo:

Duas guitarras, uma bateria e apenas dois integrantes. Essa não é uma formação clássica de uma banda de rock, em que momento vocês decidiram por esse formato? Aliás, Etienne, como você desenvolveu a coordenação motora para tocar bateria e ainda ter a guitarra sempre ali a postos?
Por que essa formação? Por que isso é tudo que precisa para fazer rock’n’roll! Tudo esta presente: a batida, a guitarra rítmica, a guitarra principal e os vocais. Esta é apenas uma versão mais compacta da clássica formação de uma banda de rock de quatro instrumentos. Tudo surgiu naturalmente com a gente tentando ser o mais eficiente musicalmente possível. Quanto à coordenação motora, é realmente como tocar bateria, mas ao invés das baquetas, eu uso a guitarra!

Vocês se utilizam tanto de referências de rock clássico como de música country. O que vocês escutam e utilizam como referência para a banda?
Nós somos verdadeiramente apaixonados por música e ouvimos quase todos os estilos. Gostamos de música Disco da mesma forma que gostamos de Gangsta Rap. O jeito que trabalhamos é alinhar algum aspecto de qualquer estilo de música que possa nos interessar (pode ser um efeito na voz, um tom de guitarra) e isso é o suficiente para nos inspirar. Atualmente estamos ouvindo muito o som das bandas de nossos amigos de Quebec, como Les Hôtesses d’Hilaire, Les Hay Babies ou Gazoline, assim como artistas clássicos, como Dolly Parton, Willie Nelson e ABBA.

A estética da banda é uma parte fundamental do conceito criado em torno da música e vocês utilizam coisas que não estão diretamente ligadas ao rock. Nesse sentido, o que inspira vocês na criação desse visual?
Somos inspirados pelo glamour old school e showmanship. Acreditamos que o visual é uma parte importante do nosso show e da nossa identidade enquanto uma banda. Liberace, Little Richard ou Tina Turner jamais subiriam no palco vestindo uma calça jeans e uma camiseta, porque o figurino também é uma grande parte da qualidade de um show. Além disso, adoramos roupas no estilo funky e estamos sempre buscando por peças especiais quando estamos em turnê. Nossa maior influencia vem do look clássico do rock, o glamour das bandas dos anos 70 e o clássico strass de cowboy. Nós amamos tudo que brilha!

Dos anos 2000 pra cá, o jornalismo musical não pode ver uma dupla homem + mulher que já quer fazer comparações com o The White Stripes ou mesmo com o The Kills. Vocês acham incômodo esse tipo de comparação? E esses artistas são influências para vocês?
É comum surgir essa comparação com o White Stripes e The Kills, mas não nos incomoda muito porque historicamente não existem muitas bandas de duas pessoas formadas por um homem e uma mulher. Essa ainda é a formação menos explorada no rock. Entretanto, a comparação não é muito coerente, porque apesar de gostarmos do The Kills e White Stripes, nós não baseamos nossa música no que eles fazem. Gostamos de pensar que nosso som vem das mesmas referencias deles. Nós provavelmente ouvimos muito as mesmas músicas.

As discussões sobre as representações do corpo feminino são bastante acaloradas atualmente, porém fica bem claro que a Anna não tem nenhum problema com suas curvas, então essa pergunta é para ela: você já teve problemas em lidar com o seu corpo? Como você acha que a música, e o rock principalmente, são importantes para desmistificar esses padrões?
[Anna] Eu tive sorte de crescer em um lar que meu deu apoio. Meus pais nunca me colocaram deliberadamente em ambientes que fossem prejudiciais à minha autoestima. Meu tamanho nunca foi um ponto que gerava stress ou infelicidade. Eu costumava ser bem mais magra, mas fazer turnê não nos permite fazer refeições saudáveis com frequência ou exercícios físicos, uma vez que estamos sempre nos preparando para o próximo destino, e meu corpo obviamente mudou com essa rotina. Em um mundo que parece estar mais e mais rígido, polido e de cabelos escovados, é importante desafiar as percepções das pessoas às colocando frente à diversidade. Para mulheres jovens como eu, é especialmente importante verem pessoas de diferentes tamanhos se orgulhando de tudo que têm e se exibindo publicamente. Tudo! As pessoas estão muito preocupadas com o espaço que as mulheres estão ocupando, seja sobre o que elas estão vestindo ou como elas estão se vestindo, ou se são grandes ou pequenas ou se são barulhentas. Eu amo a Beyoncé, mas não tenho nada em comum com ela. As “mulheres fortes” famosas que admiramos na música têm muito dinheiro para investir nelas mesmas, e elas têm lindos squads, personal trainers e cirurgias. Esse não é um padrão de beleza que é muito acessível à maioria das pessoas, e ainda assim nós devemos nos sentir belos e aceitar como nós somos mesmo que não tenhamos tudo isso. Acredito que o rock pode ser um poderoso canal para trazer essas mudanças, porque é simplesmente sobre se divertir e não se preocupar com o que as pessoas pensam sobre você, em ser forte e reforçar sua presença. Também acredito que as pessoas têm muito mais a oferecer do que apenas seus corpos. Eu quero que a minha música seja tão confiante quanto como eu me apresento. Quero ser a mudança positiva que eu gostaria de ver: se eu sendo eu mesma no palco e aproveitando tudo é algo que fará a diferença para outras mulheres, então é isso que farei!

Essa é a primeira vez que vocês estão fazendo uma turnê pela América Latina? Como tem sido essa viagem?
Essa é a PRIMEIRA vez que estamos fazendo uma turnê fora da América do Norte! Até agora estamos amando aqui. Todo mundo tem sido muito gentil e parceiro. As pessoas parecem gostar do que nós fazemos. Nós adoraríamos voltar aqui quando pudermos!

A pergunta clichê: vocês escutam música brasileira? Há algum artista que vocês são fãs e gostariam de encontrar por aqui?
[Etienne] Eu sou fã d’Os Mutantes desde que eu era adolescente e a Anna Frances gosta muito de Vanessa da Mata e Seu Jorge, mas com exceção da bossa nova dos anos 60 e músicas de samba que são bem famosas na América do Norte, temos que admitir que nosso conhecimento da música brasileira é bem limitado. Entretanto, estamos aqui para conhecer mais! Todas as sugestões são bem-vindas!

Renan Guerra é jornalista e colabora com o sites You! Me! Dancing! e Scream & Yell. A foto que abre o texto é de Frank Lam Photography / Divulgação

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