Quatro discos psicodélicos de 2023: Death and Vanilla, Trees Speak, Witch e Gnoomes

textos por Paolo Bardelli

“Fliker”, Death and Vanilla (Fire Records, 2023)
O trio Death and Vanilla colocou todo o seu cuidado e imaginação psicodélica neste “Fliker” depois de mais de uma década de discos (este deve ser o sexto, se não nos enganamos na matemática, mas, de qualquer forma, há mais um punhado de ep’s no Bandcamp da banda). São delicadas digressões psíquicas temperadas com um distinto e elegante pop em que a cerebralidade e a dimensão dos sonhos (como na bela “Baby Snakes”, uma moderna “Riders on The Storm”) é temperada em algumas passagens por um fisicalidade mais seca (“Find Another Illusion”) que a banda remete, como sugestão, ao Cure da primeira fase. O trio vem de Malmoè, na Suécia, e é formado por Marleen Nilsson, Anders Hansson e Magnus Bodin, que tocam com instrumentação vintage “para emular as texturas e sons mágicos de trilhas sonoras de bibliotecas, krautorock alemão e yèyè pop francês dos anos 60 e 70”. Um disco fantástico.


“Mind Maze”, Trees Speak (Soul Jazz Records, 2023)
Trees Speak é uma dupla de Tucson, no Arizona, que combina um gosto instrumental muito forte repleto de influências com um prazer básico absoluto. A imprensa exagera um pouco, mas começa a dar as coordenadas: “Trees Speak é a música como uma tradução cosmológica, tomando emprestado do Can e da fase ‘Bitches Brew’, de Miles Davis, a prática de utilizar o estúdio como ferramenta de composição, em que longas improvisações se fundem em voos indeléveis de fantasia com edições de fita assistidas por lâmina de barbear. Eles operam entre o subconsciente e o inconsciente, o radiante e o eclipse, o micro e o macro”. Uma coisa é certa: o krautrock alemão tem algo a ver com isso, assim como a dupla se inspira nas trilhas sonoras dos anos 1960 e em um certo rock psicodélico livre e sem restrições com o cosmos como destino e o deserto do Arizona como um universo para pousar. Duas canções se destacam: “Syndrome” causa a mesma angústia do Massive Attack enquanto em “Sospetto”, com uma queda pelo Air de “The Virgin Suicides”, a influência das trilhas sonoras italianas dos anos 1970 é evidente desde o título. Outro álbum incrível.


“Zango”, Witch (Desert Daze Sound, 2023)
Uma história à la Rodriguez: entre 1972 e 1977, The Witch, uma banda da Zâmbia, fez cinco álbuns que só foram lançados em sua terra natal. Em 2010 surgiram reedições na Europa e nos Estados Unidos e o mix rock-fuzz africano do Witch agradou tanto que os fãs decidiram apoiar a turnê de uma nova banda que Jagari Chanda – o único sobrevivente, agora com 71 anos – montou há seis anos, composta principalmente por jovens músicos europeus. Em junho foi lançado o primeiro álbum do Witch depois de quatro décadas e o grande um músico holandês Jacco Gardner toca e produz: o resultado é fantástico. A marca africana do grupo explode em um rock baseado em fuzz que é, para dizer o mínimo, ultra-viciante. O líder Jagari Chanda foi acompanhado pelos novos companheiros de viagem Patrick Mwondela, Nico Mauskoviç, Jacco Gardner, Charlie Garmendia, JJ Whitefield e Stefan Lilov. Uma história e um disco que merecem reconhecimento.


“Ax Ox”, Gnoomes (Rocket Recordings, 2023)
Quem tem medo de psicodelia russa? A guerra levantou barricadas que a música transpõe, por isso estamos aqui para recomendar este quarto álbum de uma banda que vem de Perm e que, após três discos marcados por uma exclamação (“MU!” de 2019, ” Tschak!” de 2017 e “Ngan!” de 2015), retira o sinal do título como que para normalizar uma proposta que não é normal. Antes de tudo, pela primeira vez o quarteto canta em sua língua nativa, o russo, e – desde o início do conflito com a Ucrânia – dois dos integrantes fugiram da Rússia, o que nos faz entender a postura política da banda além de uma escolha, o de usar o russo desta vez, o que parece bastante nacionalista. Musicalmente, “Axe Ox” parte em direção a um kraut elevado às vezes por batidas techno (“Loops”) ou intuições garage-dark (“The Neighbor”), ou diminuída em sensações que remetem ao Boards Of Canada (“Mirrors”). Abaixo do nível dos três álbuns acima, mas ainda assim fora das coordenadas habituais.

Texto publicado originalmente no site italiano Kalporz, parceiro de conteúdo do Scream & Yell. 

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