C6 Fest SP 2023 – Dia 3: Black Country, New Road fez um dos grandes shows do festival e Comet is Coming atropelou todo mundo

textos por Bruno CapelasMarcelo Costa e Renan Guerra
fotos por Fernando Yokota

DIA 3 – 21 de maio de 2023 – Domingo
introdução por Marcelo Costa

Saiba como foi o Dia 1 e o Dia 2

Na sexta-feira, quando o C6 Fest deu início a sua primeira edição em São Paulo, a sensação era de terra arrasada. Ainda que a programação estivesse bacana e os shows tenham sido legais, a falta de público foi marcante, deixando uma incógnita tanto para os dias seguintes quanto para o futuro do festival. No fim de semana, porém, mudou totalmente o panorama: no sábado, um grande público saiu de casa para assistir a mais uma emocionante aula do Kraftwerk, e também circulou dignamente pelas demais tendas. No domingo, a coisa toda ganhou aquele típico ar celebratório, com amigos se esbarrando, emocionados, shows para públicos diversos acontecendo em vários cantos do Ibirapuera e o Village, a “pracinha” central do festival, completamente tomada, o que merece um respiro de alívio e um piscar de olhos para o futuro.

Isso tudo porque a gente escreve sobre shows, reclama de detalhes da produção, do preço dos ingressos, de equívocos estruturais que poderiam ter sido evitados, mas a gente ama festivais, a gente ama música, e a gente ama acompanhar música ao vivo. Assistir a uma programação de curadoria exemplar como a do C6, com vários nomes que estão entre o que temos de mais interessante e novidadeiro na música em geral hoje em dia, é sempre um prazer, e a gente só não deseja que festivais assim se proliferem porque se já está difícil para o povo ter que escolher entre tantos festivais vivendo com uma moeda constantemente desvalorizada, mais pode levar o público amante de música à falência. Mas mandem que a gente resolve… Ainda assim, o C6 Fest cumpriu as expectativas em seu dia de fechamento e merece continuidade apostando na visão futurista de sua escalação 2023.

É certo que é preciso se debruçar sobre as contas finais e tentar chegar a um valor que permita com que todas as pessoas consigam ver os shows que desejam – a quantidade de gente que esbarrei neste domingo que fizeram a opção por um palco em detrimento de outro foi enorme, afinal não havia dinheiro para dois tickets. E se Black Country, New Road fez um dos shows mais festejados do fim de semana na Tenda Heineken (ver Top 5 da equipe Scream & Yell no final), a apresentação solo de Tim Bernardes na plateia externa do Auditório Ibirapuera também entrou na lista tanto quanto alguns shows de jazz torto do Auditório Ibirapuera: quem esteve nos três espaços presenciou um leque vastíssimo de experiências musicais, e quanto mais pessoas tiverem acesso a isso, melhor. O saldo final, porém, é positivo: que o C6 Fest tenha vindo pra ficar. Abaixo, comentamos o último dia do evento em São Paulo (leia sobre a perna carioca aqui).

16h as 18h

Juçara Marçal e Kiko Dinucci

BRUNO CAPELAS: Com público visivelmente maior que nos outros dois dias já de partida, o terceiro dia do C6 Fest paulista começou com ares de piquenique no fim de tarde, na área externa do Auditório Ibirapuera. Parecia até que estávamos no Festival Coala, não fosse a excelente lembrança de que a grama é mais agradável que o concretão do Memorial da América Latina. Muita gente estendeu a canga (ou aquele casacão) na grama para curtir a homenagem orquestrada por Juçara Marçal e Kiko Dinucci ao ano de 1973, com participações de Jadsa, Linn da Quebrada, Giovanni Cidreira, Tulipa Ruiz e (ufa!) Arnaldo Antunes. Foi um show bacaninha, bom pra aquecer os motores e tomar a primeira Coca-Cola do dia, entre momentos baixos (Linn atropelando “Abundantemente Morte”, de Luiz Melodia) e altos (Arnaldo balançando “O Balanço”, de Tim Maia). Alguns momentos foram óbvios – como Tulipa cantando Gal ou o próprio Arnaldo com Paulinho da Viola –, mas o final foi divertido com todos subindo ao palco pra homenagear Rita Lee em “Mamãe Natureza”. Na sequência, o mesmo espírito reverente esteve presente com Tim Bernardes pagando tributo a Gal Costa. Foi um espaço onde, a despeito do risco de correr em clichês e mais clichês, Tim provou sua grande fase: sozinho com seu violão, ele percorreu hits (“Que Pena”, “Baby”), mas também passeou por canções menos óbvias (“Joia”, “Avarandado”, “Volta”) sem traçar uma rota em papel carbono – pelo contrário, Tim sabe que seu nome não é Gal e leva seus registros vocais e instrumentais para outra paragem, o que deixa a experiência honesta e verdadeira. Bonito, bem bonito.

1973

MARCELO COSTA: Após dois dias de transporte público, o domingão, com Avenida Paulista aberta para as pessoas e fechada para carros, pedia um plano b, e na correria optei por um 99, que saiu impressionantemente pagável (R$ 24 de Perdizes até a entrada do Auditório). Cheguei correndo quase sem ar para ver e ouvir Juçara Marçal e Kiko Dinucci entortarem clássicos do cancioneiro brasileiro de 1973 (você sabia que o show é inspirado em um livro? Eu não sabia…). Com Kiko e Juçara não tem erro, as versões ficam legais, mas é mais experimento, porque a seleção de músicas escolhida é “incoverizável”. Jadsa, Linn da Quebrada, Tulipa Ruiz, Giovani Cidreira e Arnaldo Antunes fizeram bonito, mas preciso dizer: o show solo de Kiko Dinucci com participação de Juçara Marçal na abertura do Festival MIMO em São Paulo, dias antes, foi quilômetros melhor em todos os quesitos. Mas nunca vou reclamar de ouvir “Comportamento Geral”, “Araça Azul”, “Abundantemente Morte”, “Roendo as Unhas” e “Mamãe Natureza” no gramado do Ibira…

Tim Bernardes

RENAN GUERRA: O terceiro dia começou com trânsito na chegada ao Parque do Ibirapuera, então acabei chegando com certo atraso para o primeiro show. Na área externa do Auditório do Ibirapuera, a turma do show “O Ano de 1973” já estava na metade de sua apresentação. Com o comando de Juçara Marçal e Kiko Dinucci, o show reuniu nomes como Linn da Quebrada, Tulipa Ruiz, Giovani Cidreira e Arnaldo Antunes. No final, ainda deu tempo de ver Tulipa Ruiz cantando uma linda versão de “Pontos de Luz” (Jards Macalé/Waly Salomão), lá do “Índia”, de Gal Costa. Falando em Gal, o show seguinte no palco externo era de Tim Bernardes cantando o repertório da cantora baiana. O repertório feito por Tim é o mesmo que ele havia gravado no programa “Versões”, do Canal Bis; esse ao vivo virou uma espécie de bootleg do artista e circula por aí em versões piratas. Apenas voz e violão, Tim Bernardes cantando as canções da Gal é algo extremamente bonito por sua simplicidade e pela forma como Tim ao mesmo tempo respeita aquelas canções e não tenta emular Gal. E não adiante, Tim tem o charme para canções tristes e belas, por isso mesmo faixas como “Volta” (Lupicínio Rodrigues), “Sua Estupidez” (Erasmo Carlos/Roberto Carlos) e “Negro Amor” (Bob Dylan em versão de Caetano Veloso e Péricles Cavalcanti) brilham demais em sua voz.

18h as 20h

Black Country, New Road

BRUNO CAPELAS: Confesso que não esperava muito do show do Black Country, New Road – afinal, a banda anda em processo de reconstrução após a saída do vocalista e líder Isaac Wood em 2022 e decidiu não tocar mais nenhuma das músicas de seus dois ótimos primeiros discos em respeito ao ex-integrante. Mas eu e quem mais estava na tenda Raikkonen foi atropelado pelo espetáculo do (agora) sexteto inglês, que entrou no palco em grande estilo, ao som de “Crazy in Love”. Era o começo de uma paixão do público brasileiro com o grupo, altamente jovem e democrático – todo mundo tem menos de 24 anos, toca muito bem e ninguém exatamente comanda a banda, em sistema de aparente autogestão. Percorrendo uma nova estrada com repertório calcado no recém-lançado “Live at Bush’s Hall”, o grupo fez um passeio de cinquenta minutos de delírio, trafegando pela canção inglesa, pelo folk, pelo post-rock, um cadinho de improviso do jazz e algum barulho, em um espetáculo acompanhado com raro silêncio por uma plateia paulistana – se vale a rima, “é som de branco / diplomado / mas quando toca / todo mundo fica calado”. Uma porrada do começo ao fim, da aplaudidíssima “Up Song”, cantada pela baixista Tyler Hyde (e acompanhada a plenos pulmões pelos presentes), até a linda “Dancers” – e é difícil não destacar a elegia de “Turbine/Pigs”, um tour de force de quase dez minutos comandado pela tecladista May Kershaw. É apenas maio, mas já temos mais um sério candidato a show do ano nesta terra ao sul do Equador.

Black Country, New Road

MARCELO COSTA: Na companhia de amigos no Village, a “pracinha” do festival, ficamos todos de queixo caído ao observar que, pela primeira vez em todo o fim de semana, havia fila para entrar na Tenda Heineken. Minha primeira reação foi imaginar que todo aquele povaréu (umas 300 pessoas) estava aguardando pela fada Natalie Laura Mering, que faria o segundo show da noite no espaço, mas qual não foi a surpresa descobrir que todo mundo estava ali realmente pelo Black Country, New Road, numa provável junção de público da banda com fãs de Terno Rei – o saxofonista Lewis Evans até participou do show da banda brasileira na perna carioca do C6, enquanto o restante da banda assistia ao show no meio da plateia – que também abraçaram o sexteto britânico, que fez um show calcado em músicas lançadas num disco ao vivo do mês passado, e já decorado por grande parte dos presentes. Isso não foi a única coisa que impressionou: o poder do grupo ao vivo é impressionante, passeando por estilos “não indies”, mas esmurrando a bateria e pisando no pedal de distorção quando preciso (ok, menos que quando o ex-líder Isaac estava na banda). É daqueles shows para se virar fã e sair adquirindo tudo relativo à banda após a apresentação. A sensação é de que a inglesada já nasce com gene pop no sangue, agindo com frieza diante da bajulação do público e tocando como se já estivessem há 40 anos juntos. Show para ir para o topo da lista de melhores de 2023… ou ficar em segundo (desbancar Lianne Las Havas segue sendo um desafio), mas o Black Country, New Road mostrou que não é impossível… Ainda deu tempo de pegar três músicas do show de Caetano (entre elas, “Não Vou Deixar”, viva!) e correr de volta para ver Florence, ops, Weyes Blood comandar um séquito de fãs com sua varinha de condão invisível. Sério mesmo, a senhorita Welch liberou o uso de sua roupa característica?? Enquanto eu discutia questões com uma advogada de direitos autorais, “amigos” comparavam Natalie ao vivo com Aimee Mann, e… apenas não. O lance aqui é de uma Enya pop, e no quesito pop o show foi bem bom… (entendam, não quero virar sapo)…

Weyes Blood

RENAN GUERRA: Quando o sol se pôs, foi a vez de Caetano Veloso subir ao palco externo do Auditório Ibirapuera. Para uma plateia lotada, Caetano apresentou o show da turnê “Meu Coco”, que mistura clássicos de seu repertório com as canções de seu mais recente disco. Os números mais novos, como “Anjos Tronchos”, por exemplo, soa grandiosos, já “Não Vou Deixar” se prova ainda melhor do que no disco, com sua força para ser cantada em coro. Além disso, claro que Caetano sempre solta as mesmas coisas que o público parece esperar, aí dá-lhe “Sozinho”, “Leãozinho”, “Sampa”, aquilo tudo que sempre ouvimos e que ninguém aguenta mais. Nessa primeira parte do show, Caetano também cantou “You Don’t Know Me”, do clássico “Transa”, disco que logo ganhará turnê comemorativa de Caetano. No meio do show foi hora de me movimentar rumo à Tenda para conferir a norte-americana Weyes Blood. Com a turnê de seu mais recente disco “And In The Darkness, Hearts Aglow” (2022), Weyes fez um show belíssimo e quase etéreo. Com um lindíssimo vestido branco, a cantora passou por faixas do mais novo álbum, como “Grapevine” e “God Turn Me Into a Flower”, e também resgatou canções de seu disco anterior, “Titanic Rising” (2019), como “A Lot’s Gonna Change” e “Andromeda”. Para fechar o show, ela tocou a tristíssima “Movies” e é surpreendente como a voz dela é bonita ao vivo, é algo que nos envolve e emociona de uma forma única. Seria lindo demais que ela pudesse voltar para o Brasil em algum show em um teatro, vamos torcer para que isso role no futuro.

20h as 22h

Caetano Veloso

BRUNO CAPELAS: Enquanto o Black Country New Road fazia o melhor show do C6 Fest lá na tenda, do lado de fora do Auditório Ibirapuera tinha muita gente pronta pra ver Caetano Veloso – que fez o que se espera dele nesse tipo de ocasião e deu ao público um caminhão de hits, nem sempre em alta velocidade. Na tenda, Weyes Blood teve a difícil tarefa de suceder o sexteto inglês com seu som que trafega entre o pop oitentista e o soft rock, redondinho pra tocar nas rádios nostalgia da madrugada paulistana. Portando um vestido branco esvoaçante, para dar o toque de cantora-fada-mística que muito jovem adora, Weyes cativou o público, mas fez um espetáculo no máximo morno, quadradinho. A figura geométrica de quatro ângulos retos com lado iguais é também a forma correta para descrever o The War On Drugs, aplaudidíssimo pelos indies a despeito de fazer um som bem reto, convencional até – é classic rock na medula, com doses cavalares de Bruce Springsteen, Tom Petty, Dire Straits e até um bocadinho de U2. Mas é esquisito: é rock de arena que não tem refrão, uma proposta que até poderia ser interessante se soubesse brincar com um jogo de intenção e recusa, mas que aqui soa apenas… plano demais. No entanto, é preciso conceder um prêmio a Adam Granduciel e seus companheiros: o de ser a única banda capaz de gerar uma roda de pogo no festival. Roda de pogo é legal demais.

The War on Drugs

MARCELO COSTA: Desde a sexta-feira, ao ser questionado sobre a minha expectativa sobre o show do The War on Drugs, e ante a surpresa da resposta desajeitada – “não gosto tanto assim da banda” – que sou bombardeado com questões semelhantes a “como assim, você não gosta? Eles são a ponte perfeita entre Wilco e Bruce Springsteen, dois artistas que você ama…”. Bem, é “inexplicável”, mas o som da turma do Adam não me comove – do mesmo jeito que o de outra banda irmã de estilo, My Morning Jackett. Investigar os porquês diz muito mais sobre mim do que, necessariamente, sobre as bandas, e como estamos aqui nesse boteco virtual falando de um festival, assumo que o show deles foi bem legal. (Ou)Vi sentado fora da tenda – a produção teve a bela sacada de abrir toda a frente do espaço para que pessoas que compraram os demais palcos pudessem ver o show do War on Drugs, e não fosse isso seria um show para 200 gatos pingados pogadores – e o som que saia do ambiente era bastante agradável, não a ponto de entrar num Top… 10 do festival, mas com certeza não me incomodou (como o show da Nomade Orquestra com Russo Passapusso e B Negão) nem me fez ter vontade de acender um incenso (como Weyes Blood). E nada como ver os (vários) amigos felizes!

RENAN GUERRA: O final do dia foi se aproximando e o meu corpo foi dando os sinais de exaustão depois de três dias para lá e para cá no festival. O segundo dia foi full clubber, então me desgastei bastante, o bom desse domingo foi que os shows eram mais tranquilos e deu até pra ficar assistindo sentadinho no gramado. De todo modo, na hora do show do The War On Drugs eu já estava cansado demais e não aguentei muito, deixei o show de lado e fui para o Pacubra, onde o pessoal da Festa Selvagem tocava. Sentadinho ali entre os bancos e os puffs, ainda aguentei um pouco mais e consegui até ver um pedaço do set do duo Deekapz, porém não fui muito longe e logo foi hora de ir embora, mas com um saldo muito positivo desse domingo, com bons shows e encontro entre amigos.

22h as 0h

Domi & JD Beck

BRUNO CAPELAS: O corpo já estava cansado, a cabeça talvez já não processasse muita coisa e o joelho pedia arrego. Ir para casa era sempre uma opção, mas a gula, senhores, a gula de mais um show me fez ficar no Parque do Ibirapuera e adentrar o Auditório para mais uma noite de jazz – se tudo desse errado, pelo menos as pernas estariam descansadas nas poltronas confortáveis. Não deu tempo de ver Samara Joy, que cantou de Thelonious Monk a Djavan, mas foi suficiente para chegar na hora de ver a dupla Domi & JD Beck, que me fizeram pensar nos poucos cabelos brancos que começam a nascer na cabeça. Com menos de 25 anos, a tecladista francesa e o baterista americano arrastam um caminhão sonoro no palco, seja em composições próprias ou “assassinando músicas dos outros”, como eles mesmos dizem – aliás, os discursos de Domi e JD entre as peças são quase tão divertido quanto o show, uma espécie de Beavis and Butt-head do jazz. Dúvida? Que tal uma música chamada “SNiFF”, apresentada por JD como “you can sniff my butt” (você pode cheirar minha bunda, em português literal)? Fusion de primeira linha, com direito a releituras de Wayne Shorter (“Endangered Species”) e Weather Report (“Havona”). Em algum lugar, Chick Corea deve sorrir (ou não).

MARCELO COSTA: Desde quando saíram os horários do festival que eu prometia a mim mesmo que iria aguentar e suportar até quase a chegada da meia noite para ver Comet is Coming no Auditório, mas eu não tinha prestado atenção aos nomes da dupla enxaqueca Domi & JD Beck no line, conhecendo algo sobre eles apenas após ler a cobertura do Marco Barbosa na edição carioca do festival, um dias antes, aqui mesmo nesse site. Na hora pensei: vou gostar disso, e ignorei a curiosidade de ouvir o som para descobri-lo na hora do show – confissão: fiz o mesmo com o disco ao vivo do Black Country, New Road, ou seja, só ouvi música que eu nunca tinha escutado antes, e algumas delas me arrepiaram. No caso do jovem duo, fiquei pensando nas questões matemáticas que Domi resolve na cabeça para tocar com as duas mãos, os pés e cantar assim como o dom de JD de conduzir a bagunça toda de maneira tão especial. Foi um show torto e delicioso. Uma das boas surpresas do meu C6 Fest!

0h-2h

The Comet is Coming

BRUNO CAPELAS: A parte boa de ir a um festival no domingo é evitar a Síndrome do Fantástico – aquela deprê de ver a semana recomeçando e ter que pensar no trabalho tudo de novo. A parte ruim bate lá pela meia-noite, quando ainda tem mais um concerto pra ver, o estômago pensa numa pizza do pós-show e o trabalho continuará existindo na segunda-feira. Não é todo artista que compensa, mas felizmente o trio inglês The Comet is Coming fez o que pode para retribuir aos presentes que fincaram pés (e bundas) no Auditório Ibirapuera. No palco, o trio King Shabaka (saxofone), Danalogue (synths e teclado) e Betamax (bateria) começou exatamente onde Domi & JD Beck pararam: no fusion. Ao longo da noite, porém, o grupo foi avançando por sonoridades cada vez mais arriscadas, transformando o teatro em uma pequena grande rave – e não foi pouca gente que foi para a beira do palco para dançar como se não houvesse amanhã. Mas na verdade, havia sim, contrariando o poeta: a 1h20 da manhã, depois de solos incríveis e, vá lá, alguma fritação, tudo que o corpo pedia era casa. Pelo menos não foi difícil pegar um Uber a essa hora. Falou, valeu?

The Comet is Coming

MARCELO COSTA: Estou ouvindo Comet is Coming desde que publicamos um texto aqui no site em 2019, mas show ao vivo, bem, show ao vivo traz, quase sempre, um componente muito particular: pessoas. E se alguém dissesse para o pequeno Marcelo que cresceu em Taubaté, no século passado, que tanto andava com os metaleiros da cidade quanto exercia vez em quando a função de roadie de uma banda thrash da cidade (saudades, Justice), que em 2023 eu estaria num auditório chique numa madrugada de segunda-feira vendo um monte de cabeludo bater cabeça numa rave dos infernos, eu provavelmente diria que era zoação. O show começou depois da meia noite num tom levemente esquizofrênico dançante com “Code” e “Technicolour”, acelerou com ” Summon The Fire”, mas bastou Betamax ficar de pé e começar a esmurrar seu kit de forma sincopada em “Blood of the Past” para que grande parte do público descesse até à frente do palco e começasse a bater cabeça. A sensação era de ser atropelado por um tanque de guerra… e continuar dançando. Com o passar do tempo, a violência foi dando espaço para a viagem (“Final Eclipse”, “Atomic Wave Dance”), com as luzes caprichando na cegueira geral. Quando a apresentação acabou, quase as duas da madruga, estávamos todos purificados. Que experiência, senhores e senhoras, que experiência. Que ano que vem o C6 ajuste alguns detalhes, mas mantenha a proposta. Foi um fim de semana especialíssimo!

Saiba como foi o Dia 1 e o Dia 2

The Comet is Coming

TOP 5 – OS MELHORES SHOWS DO C6 FEST

BRUNO CAPELAS
1) Black Country, New Road
2) Kraftwerk
3) Nubya Garcia
4) The Comet is Coming
5) Dry Cleaning

FERNANDO YOKOTA
1) Comet is Coming
2) Dry Cleaning
3) Weyes Blood
4) Mdou Moctar
5) DOMi & JD Beck

MARCELO COSTA
1) Black Country, New Road
2) DOMi & JD Beck
3) Dry Cleaning
4) Mdou Moctar
5) The Comet is Coming

RENAN GUERRA
1) Dry Cleaning
2) Weyes Blood
3) Kraftwerk
4) Underworld
5) Tim Bernardes

Bruno Capelas (@noacapelas) é jornalista. Apresenta o Programa de Indie, na Eldorado FM, e escreve a newsletter Meus Discos, Meus Drinks e Nada Mais. Colabora com o Scream & Yell desde 2010.
– Fernando Yokota é fotógrafo de shows e de rua. Conheça seu trabalho: http://fernandoyokota.com.br/
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.
– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Faz parte do Podcast Vamos Falar Sobre Música e colabora com o Monkeybuzz e a Revista Balaclava. 

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