Entrevista: Rod Krieger fala sobre o projeto TRIPLX

entrevista por Bruno Lisboa

A banda TRIPLX nasceu nos bastidores das manifestações dos secundaristas, no final de 2015, quando (o hoje ex-BBB) Lucas Koka Penteado (vocais) e Rod Krieger (baixista, ex-Cachorro Grande) se conheceram na Escola Estadual Caetano de Campos, em São Paulo. Na sequência, chegaram Duda Machado, que ainda atuava como baterista da Pitty na época, e Martin Mendonça (que divide com Pitty o projeto Agridoce e toca na banda da cantora desde 2004, gravando todos os discos de “Anacrônico” pra frente). No ano seguinte, o grupo gravou o álbum de estreia que seria engavetado, devido a inúmeros compromissos assumidos pelos integrantes, como, por exemplo, o fato de que Lucas passaria o ano realizando a gravação de uma novela (“Malhação”).

Passados cinco anos, eis que o quarteto decide retomar o projeto aproveitando a exposição midiática alcançada por Lucas Penteado na última edição do Big Brother Brasil. Previamente, eles lançaram dois singles, “Era Uma Vez?” e “Se Liga Lóki” – muito elogiados nas redes sociais – e agora disponibilizam o álbum “Salve Família” (2021) – que deve ganhar edição em vinil. Composto por oito faixas, o disco, produzido pela própria banda, une estéticas sonoras ligados ao rap, ao rock e ao funk metal, fruto de influências que vão de Cream a Jane’s Addiction, Stone Roses e Rage Against The Machine.

As letras abordam de maneira afrontosa o cotidiano, sob um olhar periférico. “Dá até pra dizer que ‘Jorge’ tem a ver com o governo atual”, diz Lucas Penteado. “Afinal, que palhaçada é essa, não é mesmo? Mas enfim, na época, quando fizemos a música, eu me referia ao dia a dia da quebrada, situações que fazem parte da realidade de muita gente”, completa sobre a faixa que abre “Salve Família”. Já “Se Liga Lóki”, o segundo single, é “sobre os preconceitos que um jovem periférico vive. Sobre como os estereótipos da sociedade, esses padrões, não encaixam em ninguém e ninguém se encaixa neles. Mas, ao mesmo tempo, as pessoas ficam nessa busca eterna de tentarem ser aceitas e acabam num mundo vazio, percebem que é impossível se encaixar nesses padrões ao ver que a vida se passou”, explica Lucas.

Diretamente de Portugal, Rod Krieger fala sobre as dificuldades de seguir na ativa em tempos de pandemia, a decisão de retomar o projeto TRIPLX, o contexto político / social das letras, influências sonoras, relembra seu primeiro encontro com Lucas Penteado numa ocupação escolar (“Quando estava indo embora me deparei com o Lucas fazendo uma rima para um grupo de pessoas e isso me chamou muito a atenção. Em poucos segundos fiquei encantado com o talento e o carisma dele”), e também fala de sua carreira solo (ano passado ele lançou seu disco de estreia: “A Elasticidade do Tempo”), as semelhanças e diferenças dos públicos brasileiro e português, o futuro das apresentações ao vivo, planos futuros e muito mais.

Primeiramente eu gostaria de saber: como tem sido esse período pandêmico para você? O que você tem feito para superar esse momento em que a cultura tem sofrido um dos mais duros golpes?
Acredito que esse período tem sido uma merda para todo mundo, não consigo pensar em alguém que esteja se beneficiando com essa porra toda, aliás, consigo. É só olhar para Brasília, né? Mas, enfim, isso é uma outra história. Quando me liguei que essa parada da pandemia ia durar um bom tempo e que não era apenas uma gripezinha, eu e minha esposa saímos do centro da capital (Lisboa) e viemos para um pequeno vilarejo no interior, onde temos muito contato com a natureza. Aqui tenho o meu cantinho onde funciona o estúdio Magic Beans e passo a maior parte do tempo compondo, produzindo, enquanto aguardo essa loucura toda passar. Além disso, mudei muito meus hábitos, não só físicos e alimentares, como a maneira de olhar para o mercado da música de uma forma geral e isso tem me feito não surtar e entender que certas coisas tem o seu processo e que o tempo é elástico.

O disco está pronto desde 2016, mas só ganhou o mercado em 2021. O que motivou vocês deixarem a obra de lado de forma temporária naquela época?
O Lucas foi convidado para participar de uma novela na época em que estávamos finalizando o disco. Decidimos que era melhor segurar o lançamento do álbum, e, enquanto ele gravava no Rio de Janeiro, a gente finalizaria o disco, mas isso nunca aconteceu. As coisas foram tomando outro rumo e todos fomos nos envolvendo em outros projetos e do nada cinco anos se passaram.

Você e o Lucas tem uma história que precede o disco e a formação da banda em si. Como se deu a aproximação de vocês? Quais as afinidades fizeram com que vocês vislumbrassem o potencial de se unirem artisticamente?
Na época em que o conheci, eu ia fazer um show com a Cachorro Grande em uma ocupação escolar no centro de São Paulo. Recordo que fui um dia antes no local do evento para levar alguns alimentos e assistir algumas atrações culturais que estavam acontecendo. Quando estava indo embora me deparei com o Lucas fazendo uma rima para um grupo de pessoas e isso me chamou muito a atenção. Em poucos segundos fiquei encantado com o talento e o carisma dele, e assim que foi ele aplaudido por todos e encerrou a sua rápida apresentação, trocamos contato e não paramos mais de nos falar. Sentimos que era a hora de nos juntarmos para fazer algo musical, sabíamos que se nossas diferentes culturas, e vivências se juntassem poderiam contar uma bela história. E foi o que acabou originando o funk metal da TRIPLX.

O disco é composto por letras que abordam o cotidiano, sob um olhar periférico, unindo ideais de luta e engajamento. Em tempos em que muitos artistas optam pela omissão política, qual a importância de se posicionar, levantando bandeiras sociais que tão pontuais?
O clima já estava estranho no Brasil quando formamos a banda e, consequentemente, isso acabou refletindo não só na musicalidade, como nas letras. O estúdio onde o disco foi gravado e as canções foram escritas, ficava perto da Avenida Paulista, em São Paulo, e as manifestações ao redor das sessões eram constantes. As músicas foram todas criadas dentro do estúdio, chegávamos lá sem saber o que aconteceria, apenas ligávamos os equipamentos e saíamos tocando qualquer coisa, quando aparecia algo interessante começávamos a elaborar o instrumental, enquanto o Lucas escrevia as letras. Não tinha outro tema que combinasse mais com aquele som do que o que estava acontecendo, e essa foi a nossa maneira de protestar. Sobre os artistas que não se posicionam, eu penso que eles já tem a posição deles, e isso é muito triste, mas se você pegar a história da música sempre teve a turma que ficou omissa. Não compactuo com isso.

Musicalmente as oito faixas são raivosas, consistentes, que promovem a união entre o rock e o rap. Quais foram as referências que cada um trouxe para que vocês chegassem ao som da TRIPLX?
Eu já conhecia o Duda e o Martin antes de fazer parte da Cachorro Grande. Existe uma amizade muito grande entre nós três. Desde 2005, a gente faz jam sessions intermináveis naquele estúdio e tínhamos noção que uma hora outra iria sair algo dali. As referências são infinitas no grupo, se juntar as coleções de disco de todos os integrantes da TRIPLX vai de Abba a Zappa passando por todos os gêneros musicais possíveis. Mas acredito que pelo fato de sermos um power trio, a gente acabou caindo muito naquela coisa do Cream e do Jimi Hendrix Experience. Porém é engraçado, pois nunca paramos para fazer uma coisa tipo isso, ou tipo aquilo, apenas fomos fazendo e deu no que deu. Agora, se tiver que citar algumas referências da minha parte, eu posso te dizer que os Stone Roses, o Jane’s Addiction foram muito importantes no desenvolvimento das linhas de baixo.

Para além da TRIPLX você é multi-instrumentista, atua em formato solo, é produtor e dirige um estúdio de gravação. De que maneira a adoção do caráter múltiplo de funções contribui para o seu fazer artístico?
Nem eu sei te responder essa pergunta direito, durante um único dia eu sou isso tudo e mais um pouco, na verdade cada hora eu tô fazendo uma coisa que não dá muito tempo de pensar o que sou ou quem eu sou, apenas vou indo e seguindo da maneira que dá. Tenho muita sorte de todos os meus trabalhos e afazeres paralelos serem relacionados a área musical e estou amando a vida de produtor, posso te dizer que a mesa de som virou meu instrumento musical oficial nos últimos tempos. E essa diversidade de funções só me faz melhorar como profissional nas outras coisas que faço, por exemplo, uma coisa que você faz de um lado te dá conhecimento do outro e assim eu vou aprendendo mais e conseguindo colocar na música, que ainda é o que mais importa para mim!

Atualmente você reside em Portugal, país que tem servido de refúgio / exílio para diversos artistas brasileiros nos últimos anos. Nesse sentido como tem sido a experiência de seguir em frente num outro país? Quais as diferenças e semelhanças em relação ao público brasileiro e o português?
Diversas vezes na minha trajetória eu pensei que se eu pudesse fazer tudo de novo eu faria diferente ou, se eu tivesse certas experiências não teria cometido certos erros, e é isso que tá rolando, mas ao mesmo tempo, já dá vontade de fazer tudo de novo novamente. A “Elasticidade do Tempo” foi lançado uma semana antes da pandemia e acabou que os shows foram cancelados e todos os meus planos de conquistar o velho mundo tiveram que ser alterados, mas tá sendo incrível a receptividade dos portugueses, eles amam a música brasileira e já conheciam o meu trabalho, então, facilitou muitas coisas por aqui, como a exposição midiática do lançamento do álbum. Eu fiquei fascinado com a maneira como eles consomem música, Portugal é um país mágico com centenas de festivais e Lisboa é uma cidade que respira música, lá acontecem shows de segunda a segunda, e além dos portugueses, circulam pessoas do mundo inteiro querendo prestigiar a arte. Isso é muito benéfico para todos nós. Sobre as semelhanças e diferenças acho que não são muito diferentes, afinal fãs de rock são seres únicos e universais, mas uma coisa que eu estou amando são os horários dos shows, que são bem mais cedo que no Brasil.

Apresentações artísticas somente agora, um ano e meio depois, começaram a ser retomadas em alguns países de forma tímida e receosa. Num exercício de futurologia, você acredita que, num futuro próximo, teremos as apresentações musicais tal como em outrora?
Duas semanas atrás fiz um show em Lisboa ao lado da Surma, uma das cantoras mais interessantes da cena portuguesa e foi estranho ver todas as pessoas sentadas de máscara. Confesso que durante a apresentação minhas emoções eram mistas, mas fiquei muito esperançoso de que dias melhores virão. Penso que passamos por um período muito delicado, no começo da pandemia poucas pessoas imaginavam que isso ia durar tanto tempo, confesso que eu também achei que ia passar rápido, mas a coisa foi se estendendo e aqui estamos. Eu espero muito que o mercado volte a funcionar, mas ainda temos uma caminhada pela frente.

Por fim, por mais que seja difícil falar em planos futuros, ainda mais numa pandemia, gostaria de saber o que vocês tem em mente para a TRIPLX.
É muito difícil saber o que vai acontecer, em algum momento iremos nos apresentar, espero que não demore cinco anos como demorou o disco, mas o fato é que cada um mora em um lugar do planeta e as agendas estão super cheias, por isso optamos por viver um dia de cada vez e deixar as coisas acontecerem sem ansiedade. A ideia é que façamos pelo menos os shows de lançamento nas principais capitais do país e provavelmente a gente participe de alguns festivais.

– Bruno Lisboa  é redator/colunista do O Poder do Resumão. Escreve no Scream & Yell desde 2014.

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