Samuel Úria no Teatro Tivoli BBVA

Texto por Pedro Salgado, especial de Lisboa
Fotos por Luís Miguel Andrade (confira galeria)

Perante um Teatro Tivoli BBVA lotado e recebido com grande entusiasmo, Samuel Úria entrou no palco tranquilamente, acompanhado apenas por uma guitarra elétrica e assinou um momento de intimismo, interpretando o tema “Ao Tom Dela”. O show visava apresentar as canções de “Carga de Ombro” (2016) e celebrar a amizade e as parcerias que Úria estabeleceu com vários músicos portugueses. Após a entrada da banda, onde se incluíam Silas Ferreira (teclas), Jónatas Pires (guitarra), Tiago Ramos (bateria) e um coro, entre outros, o conjunto tocou o hit “Dou-me Corda” com pujança, delineando uma alternância entre temas calmos e abordagens ao pop e rock que caracterizariam grande parte da atuação.

A interpretação de “É Preciso Que Eu Diminua”, um dos melhores momentos do espetáculo, seria antecedida por um pequeno discurso, revelador do senso de humor de Samuel: “Algumas semanas antes do show mandaram-me imensas mensagens pedindo para que eu tocasse esse tema. Vamos já tocá-lo e depois podem ir embora”. A faixa foi apresentada com um balanço pop percussivo sem beliscar a sua sensibilidade lírica e garantiu a primeira grande ovação da noite. O agradecimento à assistência comprovou a simplicidade e o caráter genuíno da personalidade de Úria.

As primeiras convidadas do show, a dupla feminina folk Golden Slumbers, foram apresentadas pelo músico como sendo as suas “filhas adotivas”. Com Samuel na guitarra acústica, as irmãs Catarina e Margarida Falcão interpretaram uma versão portuguesa de “Something”, dos Beatles e posteriormente “Para Perto” (o tema escrito por Úria para a dupla), que recebeu imensos aplausos. Em contraponto, a roqueira “Repressão” permitiu a Samuel Úria e à sua banda cavalgar numa sonoridade mais direta, acrescentando-lhe um charme pop por via da paleta sonora do tecladista Miguel Ferreira (produtor de “Carga de Ombro”), mas conservando a urgência do tema através de um excelente solo de guitarra de Jónatas Pires.

A convidada seguinte, a vocalista do Clã, Manuela Azevedo, destacou “o prazer de poder cantar com Samuel Úria” e assinou uma versão hipnótica de “Canção De Água Doce” (escrita pelo músico para a banda portuense), acompanhada por Samuel no cavaquinho. A melhor tradução entre a expressividade de Manuela e a serenidade de Úria veio, no entanto, através do dueto emotivo de “Carga de Ombro”, no qual a sintonia vocal dos dois artistas foi acompanhada por um pop delicado que gerou a adesão total do público à estrofe: “Põe o meu nome junto ao teu, carga de ombro é legal”.

Descrita como uma versão da versão dos Vaselines, “Os Lábios da Amália” simbolizou o momento de fúria punk do concerto. O regresso de Úria aos tempos mais estridentes do selo FlorCaveira foi acompanhado por saltos e o músico empolgou-se de uma forma generalizada, refreando o ímpeto junto do bumbo do baterista Tiago Ramos. “Para Ninguém”, só com Úria na guitarra acústica, comoveu e Ana Moura selou a sua participação interpretando uma excelente versão tango fado de “Não Arrastes O Meu Caixão”, seguida de “Cantiga de Abrigo” (escrita por Samuel para o álbum “Moura” da fadista) onde evidenciou o seu timbre poderoso.

O pop de “Tapete” comprovou que Samuel conserva um entusiasmo quase juvenil relativamente à sua música, denotando confiança na forma como canta abertamente as suas emoções e a participação de Manel Cruz no espetáculo rendeu um ótimo dueto no tema “Lenço Enxuto” (apresentado pelo vocalista dos Ornatos Violeta como “uma das canções mais bonitas do nosso espólio musical”). Para gáudio da assistência, Manel interpretou também o clássico dos Ornatos, “Capitão Romance”, cantado em coro pelo público. Seguiu-se um lote de temas do álbum “Samuel Úria em Bruto” (2008), iniciado com “Barbarella e Barba Rala” (com guitarra lap steel, coros e voz), “Segreguei-te Ao Ouvido” e uma versão celebratória de “Teimoso”, na qual Úria prolongou habilmente o tema e ensaiou uma saída de cena com a sua banda.

Samuel voltou ao palco debaixo de fortes aplausos e no primeiro encore acompanhou as Golden Slumbers na revisitação do tema “É Preciso Que Eu Diminua”. Pouco depois, dividiu os vocais com Márcia na emblemática “Eu Seguro”. Saudando os que “vieram ao show e saíram de casa num sábado à noite”, interpretou o gospel “Império” sugerindo um final grandioso e representativo da sua mensagem. No último encore, Úria chamou Manuela Azevedo para uma reprise de “Carga de Ombro”, cantada pelo público e pelos restantes convidados do show que entretanto regressavam ao palco. Juntos, despediram-se da assistência com um abraço coletivo, simbolizando a amizade entre os vários artistas que participaram no espetáculo, consagrando o talento de Samuel Úria e confirmando o bom momento da música portuguesa.


– Pedro Salgado (siga @woorman) é jornalista, reside em Lisboa e colabora com o Scream & Yell contando novidades da música de Portugal. Veja outras entrevistas de Pedro Salgado aqui.
– As fotos de Luís Miguel Andrade foram feitas especialmente para o site Deus Me Livro e liberadas para publicação no Scream & Yell por Pedro Miguel Silva. Confira a galeria completa de fotos aqui.

Leia também:
– Download: Projeto Visto -> Reaproximando Brasil e Portugal com música (aqui)
– Samuel Úria (2016): “O caminho ideal passa por criar muitos universos” (aqui)
– Samuel Úria (2013): “O maior favor que faço à minha música é não premeditá-la demasiado” (aqui)
– Um dos grandes discos de 2013, “O Grande Medo do Pequeno Mundo”, de Samuel Úria (aqui)
– Ouça: 15 canções do pop português (aqui) e uma playlist chamada Tugas (aqui)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.