Lou Reed em São Paulo, 2000

por Marcelo Costa
foto por Chris von Ameln

Você conhece o som de uma Fender? O verdadeiro som de uma Fender? Se disse que sim, só tenho uma constatação: você já foi num show do Lou Reed. Sim, porque só quem foi num show desse cara sabe o real som que tem uma Fender Stratocaster. Eu fui. Eu vi. Ouvi. E no capitulo do rock’n roll “já posso morrer feliz” eu digo: eu vi Lou Reed e ele tocou “Sweet Jane”.

O momento mágico aconteceu no Credicard Hall, em São Paulo, 14/11. Quem foi, não viu apenas duas Fender sendo tratadas do modo que merecem (carinho e violência na mesma batida). Viu um quarteto excelente revigorar um som batizado como rock’n’roll.

A banda é afiada por estar quatro anos acompanhando Lou. O baixista Fernando Saunders faz de seu baixo um violino, em várias passagens. O baterista Tony “Thunder” Smith é um show de carisma enquanto o guitarrista Mike Rathke é um guitarrista de rock, com todos os melhores adjetivos do termo.

A iluminação era simples. O palco trazia um simples manto preto. E Lou é Lou, ou seja, camiseta preta, calça e jaqueta de couro, e os cigarros. Apenas isso, e muito barulho, e muita poesia. O show é um antídoto perfeito para, por duas horas, nos fazer esquecer do mundo lá fora. Da violência, dos assaltos e dos corações partidos. Uma vez no mundo de Lou Reed, não tem jeito, você é pego.

Louis Allan Reed declamou para o público paulista suas letras urbanas, poéticas, proféticas, doentias, mágicas, urgentes. Declamou como um bardo que aos 58 anos ainda vê sentido em cantar que “Romeu tinha sua Julieta, e Julieta tinha seu Romeu”. Se Morrissey é o maior inglês vivo, nada mais apropriado que o cara que decidiu fazer música para unir o som de sua Fender com um texto tão forte quanto os de Shakespeare e Dostoiévski seja o maior norte-americano vivo.

O show é dividido, sintomaticamente, em duas partes. Na primeira, apenas canções do último álbum, que dá nome a tour: Ecstasy. Dez canções desse álbum formam o grosso do show. Em seu site, Lou publica um diário da turnê. E, passando em Belfast, reclamou que as pessoas só querem ouvir as canções antigas. E existe certa razão nisso. Ecstasy é um ótimo álbum. Como bem definiu um outro jornalista, se tivesse sido lançado por qualquer novato, seria incensado, mas foi lançado por Lou Reed.

A parada é dura. Na mesma “página do diário” ele diz que sempre toca as velhas canções. O diferencial é que, para ele, dois clássicos dos anos setenta e três dos anos 80 já bastam. Para nós, não.

Lou Reed poderia, na boa, fazer três shows diferentes tocando só clássicos, misturando canções do Velvet Underground com as de sua carreira solo. Poderia, mas prefere divulgar seu novo álbum, dando um show – realmente – de feeling, poesia e barulho.

A nós, resta chamá-lo de “motherfucker” e cantar com toda a força dos pulmões Turn To Me, Dirty Boulevard, Set the Twilight Reeling e, claro, Sweet Jane e Perfect Day. E sair sorrindo para casa por ter visto mais uma página do rock’n’roll sendo virada. E torcer, para que numa próxima vez ele toque Satellite Of Love, Walk on The Wild Side e, quem sabe, Run Run Run e Sister Ray …

Set List

Paranoia Key Of E
Turn To Me (New Sensations)
Modern Dance
Ecstasy
Small Town (Songs For Drella)
Future Farmers of America
Turning Time Around
Romeo and Juliette (New York)
White Prism
Rock Minuet
Mystic Child
Tatters
Set The Twilight Reeling (álbum homônimo)

Primeiro encore
Sweet Jane (Loaded com o Velvet Underground)
Dirty Boulevard (New York)

Segundo encore
Baton Rouge
Perfect Day (Transformer)

****

– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne

Leia também:
– Dois vídeos do Lou Reed em São Paulo em 2010 (aqui)
– “Eu falo por meio das minhas canções”, Lou Reed (aqui)
– Lou Reed ao vivo em Málaga, 2008, por Marcelo Costa (aqui)

2 thoughts on “Lou Reed em São Paulo, 2000

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