A Matador Records relançará uma série de títulos importantes do catálogo da lendária banda texana The Butthole Surfers, incluindo álbuns clássicos e EPs gravados durante a estranha, grotesca e, em última análise, incomparável primeira década da banda. E a pedido do selo, Byron Coley, crítico de música da revista Forced Exposure na década de 1980, da New York Rocker, do Boston Rock e da Take It!, relembra como era ver e ouvir The Butthole Surfers naquela época.
texto de Byron Coley
Mais de quatro décadas depois do fato, ainda me lembro de sair da minha primeira vez frente aos dos Buttholes em um estado de feliz confusão. Em 1982 já havia muitas bandas que aparentemente começaram como parte da cena hardcore americana, mas agora seguiam em outras direções. Uma dessas unidades havia sido o Big Boys, cuja mistura de skatepunk e readymades de funk era viciante e brilhante. Fomos vê-los no Grandia Room, em Los Angelesm, com baixas expectativas para a banda de abertura, The Butthole Surfers, que imaginamos ser apenas mais uma banda de thrash do Texas com um nome “para chocar”.
Os Buttholes já tinham começado o seu set quando chegamos e ficou imediatamente evidente que a sua abordagem sonora estava longe do que esperávamos. Algumas de suas músicas pareciam uma versão melhor e mais estranha dos Dead Kennedys, mas os trechos compreensíveis das letras soavam ótimos como o inferno – “There’s a time to fuck and a time to crave/ But the Shah sleeps in Lee Harvey’s grave!” E o cantor e o guitarrista pareciam estar competindo no sorteio dos malucos. Mesmo com a dificuldade de enxergar alguma coisa no Grandia Room, a banda causou um verdadeiro impacto. Perguntei a Mike Watt o que ele sabia sobre os Surfers e ele apenas disse que os caras estavam “por aí”. O que considerei um bom sinal.
Quando os discos deles começaram a chegar, eu os comprei mesmo sendo do selo Jello B (que eu geralmente boicotava). “PCPPEP” (na verdade gravado após a versão proteana de “Another Man’s Sac”) soou mais maluco do que o disco de estúdio que o precedeu, e também foi o primeiro a apresentar o poder da clássica formação de dois bateristas da banda (King Coffey e Teresa Taylor). O brutalismo percussivo sincronizado deste par (rumores falsos diziam que eles eram irmãos) forneceu a base perfeita para a explosão de guitarras e vocais então compartilhada por Gibby Haynes e Paul Leary. Não conseguimos ver os Buttholes ao vivo novamente até que eles tocaram na Costa Leste em 1984, época em que alguns baixistas já haviam entrado e saído, e a banda “evoluiu” para um modo totalmente louco.
O início dos anos 80 teve sua cota de bandas insanas – The Birthday Party, Black Flag e Minor Threat tinham o poder bruto de derreter sua mente em segundos. Swans, Einsturzende Neubauten e Big Black criaram uma pressão sonora avassaladora o suficiente para que seus sons pudessem realmente achatar o ouvinte. E o Sonic Youth exibia uma mistura tão imprevisível de arte, cultura pop e violência que às vezes você deixava seus shows babando. Os Buttholes compartilhavam elementos com todos esses grupos, mas acrescentavam um toque psicodélico selvagem e uma propensão para espetáculos bizarros.
No momento em que eles começaram a turnê para divulgar a versão renovada de “Psychic… Powerless… Another Man’s Sac”, o show ao vivo dos Buttholes era uma extravagância frenética e crescente de luzes estroboscópicas, fumaça, prendedores de roupa, dança nua, megafones, loucura e música que era tão loucamente alucinante quanto a de qualquer banda que já existiu. “Another Man’s Sac” também avançou bastante em relação aos discos anteriores. Partes do LP envolviam seu toque punk em tanta digressão que você quase não conseguia discernir, com outros segmentos se estendendo em uma forma mutante de garage blues, e outros simplesmente girando fora de controle.
Esta evolução continuou em “Rembrandt Pussyhorse”, que apresentava um conjunto de músicas para as quais a destruição da forma baseada no rock dos Buttholes era misturada com passagens experimentais e deturpadoras de fitas de várias fontes. Haynes estava lidando com todos os vocais audíveis a essa altura, e seu domínio do dinamismo pós-linguístico estava finalmente em pleno vôo. Enquanto isso, seus shows tornaram-se exemplos lendários de excesso e desordem, e sua música ficou cada vez mais alta, estranha e selvagem. Era o diametralmente oposto da cena hardcore da qual emergiu, que caminhava em direções cada vez mais codificadas e estilisticamente conservadoras.
Este primeiro lote de reedições da Matador Records certamente irá levantar o telhado para muitas pessoas que pensavam que tinham um bom controle sobre os reinos externos da cena indie-rock dos anos 1980. E embora as gravações não sejam a experiência totalmente imersiva do show dos Buttholes, você ainda pode se sentir como se tivesse caído em uma toca de coelho do tamanho do próprio Texas.
Este é o som dos Butthole Surfers antes de serem “apresentados” por Kurt Cobain e assinarem com a mega Capitol Records em um frenesi para não ficarem de fora das apostas do indie-rock. Antes de terem um verdadeiro sucesso na Billboard com “Pepper”, de seu LP de 1996, “Electric Larryland”. Antes que as pessoas os vissem como um progenitor de bandas teatrais excêntricas, como Flaming Lips e Animal Collective. As primeiras gravações dos Buttholes para gravadoras independentes e os shows que eles fizeram ao longo da década de 1980 são exemplos puros do som mais teimosamente dionisíaco já vomitado.
Yippie Yi Yo!
Cinco músicas para “entender o Butthole Surfers, por Leonardo Vinhas