Ao vivo em Porto Alegre, Planet Hemp faz a cabeça dos fãs com hinos próprios e covers de Ultramen e Ratos de Porão

texto por Homero Pivotto Jr.
fotos de Billy Valdez

O Planet Hemp até hoje colhe os frutos do pioneirismo de falar sobre maconha e outras questões sociais com seu raprocknrollpsicodeliahardcoreragga que se espalhou como fumaça Brasil afora. Uma semente plantada desde o surgimento da banda, na primeira metade dos anos 1990, e até hoje regada à criatividade, erva e algumas polêmicas. Desde então, o conjunto que tem os vocalistas Marcelo D2 e BNegão — além do baixista Formigão —, da formação clássica, viu sua popularidade germinar.

Atualmente, o nome do grupo carioca está enraizado na cultura pop da nação. São poucos os artistas que conseguem cultivar um público tão florido (no sentido de amplo) como o que se viu dia 18 de janeiro, quinta-feira, no auditório Araújo Vianna, em Porto Alegre. Prova de que o Planet Hemp segue fazendo a cabeça de quem curte som.

O retorno dos maconheiros mais famosos do país ao estado no extremo sul (caracterizado, por alguns, pelo conservadorismo) fez parte da turnê “Jardineiros”. A alcunha da gira é a mesma do álbum mais recente e primeiro de inéditas em mais de 20 anos, lançado em outubro de 2022. Eleito disco do ano na votação do Scream & Yell, este trabalho também reforçou a relevância da proposta lírica e sonora do Planet ao abocanhar duas categorias no Grammy 2023: “Melhor Interpretação Urbana em Língua Portuguesa” e “Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa”.

A apresentação na capital (a primeira do grupo neste ano) rolou em um espaço tradicional de eventos, onde grandes artistas já tocaram. O local, rodeado pela natureza e não raro usado para queimar um mato, fica na Redenção, nome fantasia do Parque Farroupilha — aquele eternizado nos versos de ‘Amigo Punk’, da Graforréia Xilarmônica (“Pega a chinoca, monta no cavalo e desbrava essa coxilha / atravessa a Osvaldo Aranha e entra no Parque Farroupilha).

Durante aproximadamente duas horas, enquanto a fumaça subia e a neblina baixava, os cerca de 3,5 mil presentes puderam prestigiar uma safra produtiva de boas composições. O foco foi nas músicas novas, mas sem esquecer-se dos clássicos. O espetáculo começou com cerca de 40min de atraso.

Em um palco simples, mas aparentemente bem pensado — com ótimo jogo de luzes e até cadeiras de praia entre os elementos decorativos, lembrando o cenário do tradicional “MTV ao Vivo: Planet Hemp” (2001) — os músicos ficaram à vontade para uma performance à altura do esperado.

O trio de integrantes mais antigos parecia em destaque, ao centro, enquanto o baterista Pedro Garcia (bateria) tocava em um praticável elevado à direita, acima da posição onde estava o guitarrista Nobru. O produtor Daniel Ganjaman revezava-se entre teclas e seis cordas do outro lado. Abaixo dele, estava o DJ Renato Venon mandando brasa em programação e bases.

Na abertura do repertório, enquanto no telão era mostrada uma espécie de retrospectiva da trajetória do Planet, a formação foi entrando em cena. BNegão já começou fazendo bem seu papel de mestre de cerimônias, convidando a plateia para chegar mais perto do palco e agitar — mesmo em meio às cadeiras do auditório.

Depois da intro, veio ‘Distopia’, ‘Yuka’ e ‘Taca Fogo’, trinca de composições da nova fase que vive o Planet Hemp. Na sequência, uma leva de temas do passado: ‘Dig Dig Dig’, a vinheta ‘Planet Hemp’, ‘Fazendo a Cabeça’ e ‘Mary Jane’. Em seguida, ‘Puxa Fumo’ e ‘Amnésia’ precederam ‘Jardineiros’ e seu refrão que, além de funcionar bem ao vivo, dá o recado: “jardineiro não é traficante”. O set prosseguiu com o trecho inicial de ‘Não Compre Plante’ dando lugar à ‘Legalize Já’, ‘Fim do Fim’ e ‘100% Hardcore’. Aliás, chamou atenção a escolha de faixas mais aceleradas, da ala punk/hc da discografia. Tanto que o andamento do show teve releitura para ‘Crise Geral’, do Ratos de Porão. Mais adiante, rolaram outras homenagens, com ‘Dívida’ (dos gaúchos da Ultramen) e ‘Samba Makossa’ (Chico Science & Nação Zumbi).

O show teve espaço ainda para ‘Remedinho’, ‘Veias Abertas’, ‘Eles Sentem Também’, ‘Puta Disfarçada’, ‘Phunky Buddha’, ‘Raprockandrollpsicodelia’ e ‘O Ritmo e a Raiva’. Em ‘Zero Vinte Um’, o guitarrista Eduardo da Silva Vitória, conhecido como Jackson, fez uma participação especial. Ele tocou com o Planet no fim dos anos 1990, chegando a ser um dos detidos no episódio em que a banda foi presa. .

O hino ‘Quem tem Seda’ apareceu depois, seguido de ‘Onda Forte’, ‘Queimando Tudo’, ‘Stab’, ‘Nunca Tenha Medo’, ‘Contexto’ e a versão de CSNZ. No encerramento, tivemos a pesada ‘A Culpa é de Quem’ e ‘Mantenha o Respeito’.

Diferentemente da neblina adocicada que envolve a carreira do grupo e dissipa-se no ar, o Planet Hemp mostrou-se protagonista de uma entrega consistente, mantendo o respeito pelo legado que construiu e, principalmente, pelos fãs que fazem questão de prestigiar a banda ao vivo.

– Homero Pivotto Jr. é jornalista, vocalista da Diokane e responsável pelo videocast O Ben Para Todo Mal.
– Billy Valdez é pai da Kaáka, fotógrafo, videomaker, integrante do Coletivo Catarse e baixista da Diokane

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