Crítica: “Sit Down For Dinner”, do Blonde Redhead, é delicadamente comovente

texto por Paolo Bardelli

“Passei muito tempo e o tempo está ficando mais curto / Já não ando por aí à procura de oportunidades”: esta linha de letra de Massimo Volume, grupo de rock italiano formado em Bolonha em 1992, poderia se adequar facilmente ao novo álbum da amada (desculpem esta confissão tão pessoal) Blonde Redhead, um trio que já dura três décadas (sim, 30 anos!) de uma maneira específica e única.

Kazu Makino e os gêmeos Amedeo Pace e Simone Pace passaram um bom tempo fora de sintonia, por vários motivos, e “Sit Down For Dinner” (2023) – que chega nove anos depois de “Barragán”, o registro anterior – quase não viu a luz do dia: já em 2017 o trio falava de gravar um disco em Berlim, mas a história morreu e nada mais se ouviu falar disso; em 2019 Kazu lançou seu primeiro álbum solo (“Adult Baby”), algo que, geralmente, pode não ser uma boa indicação da saúde de um coletivo.

Ah, sim, existem inúmeros grupos que sobrevivem aos projetos solo de seus integrantes, mas isso só é dito mais tarde, quando se constata que a trajetória solitária não afetou a coesão da equipe. Finalmente, outro obstáculo surgiu no caminho do Blonde Redhead: neste verão Amedeo ficou gravemente doente tendo sido hospitalizado com a doença de Lyme e uma infecção chamada babesiose, semelhante à malária

Tudo foi superado, ou quase, e o Blonde Redhead surge emulando uma família que, parafraseando o título deste álbum, se encontra jantando reunida, o que os permite trazer à tona o que os une e não o que divide. Há algum tempo, um dos seus comunicados de imprensa sublinhava que “quando estão em turnê ou ensaiando, eles partilham sempre uma refeição, aconteça o que acontecer”.

Na realidade, porém, a imagem pacificadora do jantar não deve ser interpretada ao pé da letra, visto que Kazu esclareceu: “O jantar é secundário à morte. O título do álbum foi retirado de ‘The Year of Magical Thinking’ de Joan Didion: ‘A vida muda rapidamente. A vida muda instantaneamente. Você se senta para jantar e a vida como você a conhece acaba’. Dessa forma, ‘Sit Down For Dinner’ é, na verdade, sobre como qualquer pessoa pode deixar de existir a qualquer hora, em qualquer lugar, incluindo, mas não se limitando, à mesa de jantar. “Em vez de comer, você pode morrer.”

Então chegamos ao ponto: “Sit Down For Dinner” não é um álbum de maturidade, está além disso. Ele destaca a consciência de que a vida é frágil, um pensamento que é naturalmente internalizado (felizmente) apenas mais tarde na vida. E você pode sentir isso. O trio há muito abandonou distorções e cacofonias e – flertando com o pop (“23”) e a eletrônica (“Penny Sparkle”) – passou a tocar músicas evocativas, nostálgicas e delicadas. Um pouco como PJ Harvey fez recentemente, o trio reduziu os arranjos ao esqueleto da canção para chegar ao cerne das coisas, ao significado delas.

Na bela “Not for Me”, por exemplo, Amedeo canta “Achei que você queria luz / Agora quero saber que você está bem” e contrasta as aspirações mais elevadas (luz) com a realidade (sentir-se pelo menos bem). As expectativas diminuem com o passar dos anos. Mas esse sentimento de consciência e aceitação da mudança dos tempos não cura inteiramente alguns arrependimentos (“Se ao menos as mudanças / Nos tivessem feito crescer”, é um arrependimento contido em “I Thought You Should Know”) e não supera certas dúvidas compreensíveis ( “Se eu te contar agora o que fiz no passado / Você ainda me amará como antes?”, em “Before ”).

O tom é modesto, desapegado, delicadamente comovente como os arpejos finais de “Before” ou como as notas iniciais do piano de “Via Savona”. O Blonde Redhead parece estar encenando a trilha sonora de um filme que é, na verdade, o filme de uma vida juntos. Não mais violento, mas sim reconciliado.

Texto publicado originalmente no site italiano Kalporz, parceiro de conteúdo do Scream & Yell. 

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