Faixa a faixa: “Arte Bruta”, Bike

introdução por Renan Guerra
Faixa a faixa por Bike

Arte Bruta” é o quinto disco da prolífica banda Bike e que chega aos ouvintes após uma pausa ocasionada pela pandemia. Depois de seu bem recebido disco “Quarto Templo”, de 2019, o grupo nascido em São José dos Campos, no Vale do Paraíba, tinha uma série de planos, incluindo turnê internacional e outros projetos, que acabaram sendo descontinuados em função do distanciamento social. Ao invés de se lançar nas lives e no mar das redes sociais, o que o Bike decidiu fazer foi mergulhar na produção de seu próximo disco e para isso se uniu ao produtor Guilherme Held.

Guitarrista virtuoso, Held já tocou com uma série de nomes importantes da cena nacional e inclusive lançou em 2020 um excelente disco solo chamado “Corpo Nós”. Dessa troca com Held, “Arte Bruta” nasce como um disco que pode ser lido até como mais “abrasileirado” em suas sujas sonoridades. Rock psicodélico, krautrock e outras transcendências se mesclam nas 13 canções de “Arte Bruta” e apresentam uma banda que agora flerta de forma mais firme com sonoridades de origem afro-brasileira e toda a psicodelia que aqui abundou nos anos 60 e 70. Esse barulho todo já ecoa por outras bandas, tanto que recentemente a banda participou de uma live session nos estúdios da KEXP (assista no final do texto), e essa é uma ótima opção para entender a força do grupo ao vivo.

Formado por Julito Cavalcante na voz e na guitarra, Diego Xavier também na voz e na guitarra, João Felipe Gouvea no baixo e Daniel Fumega na bateria, a Bike consegue em “Arte Bruta” levar o ouvinte em uma viagem múltipla e de sonoridade diversa. Com um processo lento e minucioso de produção, o disco inclusive seria dividido em duas grandes faixas que acabaram desmembradas para a estrutura que conhecemos hoje. E nesse desmembramento de canções, trazemos aqui um faixa a faixa do disco – destaque do Scream & Yell para a Aliança Faro em maio – em que a Bike conta mais detalhes desse processo de produção e como as faixas de “Arte Bruta” ganharam forma. Confira abaixo:

01) Arcoverde – O riff que introduz o disco veio do Gui Held e os arranjos foram desenvolvidos com a banda em estúdio, o nome é de uma cidade no sertão de Pernambuco, e segue a brisa de colocarmos nomes de cidades em músicas.

02) Além-Ambiente – A primeira música feita para o “Arte Bruta”, a letra fala sobre a sensação de estar fora do corpo, mas ainda muito vivo e podendo explorar o que está além do que nós vemos. Era pra ser uma música longa, mas acabamos dividindo em três partes, as outras duas são “O Torto Santo” e “Traço e Risco”. No final dá pra sacar um pouco da mistura que fizemos viajando entre o noise e o Krishnanda de Pedro Santos.

03) O Torto Santo – Originalmente era parte de “Além-Ambiente”, mas decidimos mudar o tom e dividir a música. A letra segue pela viagem e sensação de estar fora do corpo físico. O nome é uma analogia ao cipó mariri, que é todo torto e também santo. Na parte final das músicas entraram várias mudanças de tom e um pedaço da música “Yaripo” que fecha o disco.

04) Cedro – A primeira parceria do disco com o Gui Held, ele veio com o riff e nós desenvolvemos os arranjos juntos, a música mais percussiva do álbum, mais uma vez indo de encontro ao Krishnanda, passando por Dorival Caymmi, o marcante solo do Gui e um coco psicodélico no final. A ideia era que fosse uma pequena viagem entre as músicas.

05) Traço e Risco – A continuação de “Além-Ambiente” e “O Torto Santo”, os riffs, letra e estrutura deixam claro que as 3 músicas são na verdade uma só, dessa vez o arranjo contou com synth bass.

06) Filha do Vento – A música mais direta do álbum, a letra brinca com o tempo e o vento em repetições e leves trocas nas ordens das frases. O riff de guitarra é cru e dá espaço para o baixo e a bateria pulsantes que acompanham toda a música, no final todos os instrumentos se encontram e dão a abertura necessária para continuar na faixa seguinte.

07) Clara-Luz – Originalmente era a parte final de “Filha do Vento”, mas também resolvemos dividir essa música em duas partes, a música segue pulsante e com todos os elementos se completando e cruzando como em uma corrida. A letra é simples e ao mesmo tempo diz muito sobre o corre que fazemos, essa eterna viagem de um lado ao outro para a nossa música chegar em todos os lugares possíveis.

08) Além-Céu – Como sempre pensamos em lançar os álbuns em vinil, sendo assim “Além-Céu” é a introdução do lado B, mais uma vez o Gui Held chegou com o riff e nós fizemos os arranjos no estúdio, a letra é uma introdução a música que fecha o álbum, tem muita percussão, cítara, tablas, samples, ruídos e tudo que uma grande introdução merece.

09) Que Vai da Terra ao Céu – O Lado B era uma grande música de quase 15 minutos que foi dividida em quatro partes, “Que vai da Terra ao Céu” é a primeira, e apesar de instrumental o nome dá essa sensação do que encontrar durante a música e o que esperar das partes seguintes, nela usamos a garabiroba, um instrumento artesanal feito por um artesão de Ubatuba com pedaços de árvore e que foi tocado com arco de violino para fazer muitos ruídos que se somam com as guitarras e dão o clima para o que segue na faixa seguinte.

10) O Encontro do Céu com a Terra – O encontro acontece numa mistura de Velvet Underground com a floresta e tudo que nela existe, a música vai crescendo e dando o tom da viagem, uma valsa psicodélica que vai acelerando e ficando caótica a cada compasso e culmina na parte tr~es, quando a cabeça já está no céu e os pés fora da Terra.

11) Santa Cabeça – Já totalmente fora do chão, a música cresce a partir do motorik da bateria e segue com guitarras e baixo dando toda a sensação de estar fora do chão, flutuando em algum lugar. A letra é um mantra que vai se dissolvendo a cada momento que é entoada. No final a música cresce, a letra é repetida e acaba numa queda livre.

12) A Queda do Céu – A queda acontece num loop do riff que introduz a música “Que vai da Terra ao Céu”, o retorno do “Além-ambiente”.

13) Yaripo – A música é outra parceria com o Gui, o riff que já tinha aparecido no final de “O Torto Santo” cresce e é acompanhado por um instrumental que embala o poema entoado no alto da montanha.

– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Faz parte do Podcast Vamos Falar Sobre Música e colabora com o Monkeybuzz e a Revista Balaclava. A foto que abre o texto é de Bel Gandolfo

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