Entrevista: O quinto disco da banda Mopho e o balanço dos 25 anos de carreira

entrevista por Ananda Zambi

Uma das mais importantes e cultuadas bandas de rock psicodélico do Brasil do século XXI, a banda Mopho lançou no final de junho o seu quinto disco, “Que Fim Levou Meu Sorriso” (2021), no mesmo ano que o grupo completa 25 anos de carreira. O álbum, curto e contido, mas belo e elegante, é composto por seis faixas – quatro do vocalista, guitarrista e líder da banda, João Paulo (uma delas, “Merri-Go-Round”, em parceria com sua filha, Julia Guimarães), remanescentes da produção do quarto álbum da banda, “Brejo” (2017), e duas de Bocão, que deveriam ter sido gravadas no disco “Sine Diabolo Nullus Deus” (2004, que está prestes a ganhar reedição em vinil), que acabaram sendo registradas com a Casa Flutuante, banda que ele e Hélio Pisca (baterista) tiveram quando estavam fora da Mopho. Aliás, o conjunto, que já passou por várias idas e vindas em sua formação – exceto por João Paulo –, conta agora com os mesmos integrantes da produção do “Volume 3”, considerada a formação clássica da banda: João, Pisca, Bocão e Dinho Zampier nos teclados.

A banda alagoana que conquistou fãs de Norte a Sul do país após lançar seu primeiro disco, homônimo (2000), pelo selo paulistano Baratos Afins, do produtor Luiz Calanca, e ganhar elogios de nomes como Arnaldo Baptista e Rogério Duprat (que chegou a declarar na época que gostou mais da Mopho do que de Júpiter Apple), nunca escondeu a nordestinidade em suas músicas – vide, por exemplo, o vocal de sotaque carregado e timbre inigualável de João Paulo. Em “Que Fim Levou Meu Sorriso”, a relação com a música nordestina é intensificada. O EP apresenta influências de grandes cancionistas populares da região, como Fagner, Belchior e Ednardo, mas sem abandonar as camadas lisérgicas e a doce melancolia características da Mopho. O quinto trabalho do grupo, que sairá em CD e posteriormente em vinil pelo selo Psico BR, foi gravado no Estúdio Panda e no Divina Home, em Maceió, mixado por Joaquim Prado e masterizado por Brendan Duffey. “Que Fim Levou Meu Sorriso” foi viabilizado com os recursos da Lei Aldir Blanc, através edital público da Secretaria de Estado da Cultura de Alagoas (Secult).

Numa conversa sincera e descontraída, Júnior Bocão e Hélio Pisca falaram mais sobre o disco novo, sobre a volta deles à banda (e como, mesmo quando estavam fora, ainda continuaram envolvidos com a Mopho), sobre novidades futuras (incluindo feat com um grande nome do rock gaúcho), sobre música psicodélica brasileira contemporânea – indo de O Terno a Rodrigo Campos (!) e sobre o documentário “Eu Quero Tudo – O Projeto Mopho” (2019), de Carla Rosset, que você pode assistir na integra no final do texto. Os dois ainda fazem um balanço dos 25 anos de carreira da banda. Confira:

Queria saber como é que como que foi voltar à mesma formação do “Volume 3”.
Pisca: Na verdade, a gente começou essa formação pouco antes da pandemia. A formação (até então) era essa sem o Bocão, mas com o Leo (Luiz). Era eu, o Léo, o João e o Dinho, nós quatro. Só que antes da gente se encontrar mesmo, o Dinho tinha produzido o disco “Brejo” junto com João Paulo. Eu tinha saído pouco antes deles produzirem o “Brejo”. Na verdade, eu saí e voltei umas duas ou três vezes já.

Bocão: Eu e Pisca gravamos o primeiro disco – o Pisca é um dos fundadores do Mopho, que surgiu em 1996. Nós tivemos uma saída em 2002, foi uma época que nós fomos morar em São Paulo, e a gente formou uma banda chamada Casa Flutuante na época, para tocar algumas músicas que seriam do repertório do segundo disco do Mopho. E depois nós retornarmos em 2009 e em 2011 lançamos o “Volume 3”. Um pouco depois do lançamento desse disco, já em 2012, nós saímos, eu e o Pisca, e agora nós retornamos em 2020. O Pisca tinha sido convidado para gravar o disco novo em 2019, já tinham começado as conversas e as gravações desse trabalho. Em 2020, no começo do ano passado, por algum problema de saúde, o Léo, que é também músico original do Mopho lá de trás, não pode fazer uns shows que a banda tinha agendado e fui convidado para me reintegrar a banda para esses shows. Depois que teve esse reencontro entre eu, Pisca, João Paulo e Dinho, depois de alguns anos que a gente não se encontrava no palco para tocar juntos com o Mopho, o João Paulo e o Dinho decidiram chamar a gente novamente para retornar à banda, e eu já cheguei para fazer a parte final do disco “Que Fim Levou Meu Sorriso”, que era os contrabaixos e algumas vozes, mas o resto estava quase tudo pronto, o Pisca já tinha feito todas as baterias e tal. Foi assim que aconteceu esse reencontro. Foi meio que por acaso e consequência de um reencontro mesmo de amizade e tal, e fluiu bem natural. Foi muito legal, a gente está trocando muita ideia para fazer coisas muito interessantes daqui para frente. Ficou muita música ainda do que seria esse disco. A ideia era fazer um disco maior, só que a gente acabou decidindo fazer um EP para juntar músicas que dialogassem umas com as outras melhor, por isso acabamos optando em fazer esse disco com seis músicas. Ficaram algumas pra gente trabalhar ainda ao longo desse ano, do ano que vem, e também já com ideia de criar coisas novas e partir para novas experiências sonoras com a banda.

Você falou das músicas e tem duas que eram da Casa Flutuante que vocês gravaram de novo agora. Como é que foi isso? Porque essa decisão de regravar com a Mopho?
Bocão: Essas duas músicas fazem parte de uma época, de um momento muito importante para a gente, porque quando a gente lançou o primeiro disco, a gente morou, praticamente, em São Roque, em um sítio que o Luiz Calanca, da Baratos Afins tinha, e a gente ficou hospedado lá dois meses durante o ano de 2000, mais ou menos. E lá a gente compôs muitas coisas, e essas duas músicas eu compus lá no sítio de São Roque. João Paulo gosta muito delas, e ele sempre quis, sempre falou que queria regravá-las, porque a partir daquele momento que eu e o Pisca saímos do Mopho, a gente já tinha essas músicas trabalhadas para gravar no disco do Mopho e a gente acabou colocando nesse álbum que nós intitulamos de “A Terra É A Nossa Casa Flutuante”, que foi lançado em 2003. Aí agora… Inclusive antes de eu voltar pra banda João Paulo já tinha me pedido para gravar essas músicas nesse disco. Eu já tinha cedido, autorizado. Eram músicas que já estavam nos planos da banda há 20 anos.

“Mopho” (2000) e “Sine Diabolo Nullus Deus” (2004)

Eu vi uma entrevista com o João Paulo, antiga, falando que vocês lançam discos quando têm alguma coisa para dizer. Não tem aquela coisa de lançar todo ano, né. E queria saber o que vocês querem dizer com o “Que Fim Levou Meu Sorriso”. Qual que é a ideia desse disco?
Bocão: Com relação às composições da banda, o João Paulo é uma pessoa que realmente tem essa urgência de só escrever e trabalhar músicas que realmente são coisas que ele está sentindo, assim, muito, sabe? Ele é uma pessoa muito… que escreve muito sobre a vida dele. Então esse álbum, quatro músicas são do João Paulo, e esse repertório desse disco é uma sobra de material do “Brejo”, que é o quarto álbum que foi lançado nesse hiato meu e do Pisca – a gente saiu 2012 e o João Paulo tinha tido uma separação, a vida pessoal dele estava um pouco complicada, então “Brejo” é um disco que tem uma carga emocional forte, até dramática – e algumas músicas desse álbum, “Que Fim Levou Meu Sorriso”, até pelo título, comunicam muito sobre isso, sobre essas relações de amor e desilusões, e é o que o João Paulo fala muito nas composições dele, sobre amor, sobre a dor do amor, as perdas, os desencontros das relações.

Pisca: São quatro músicas do João Paulo, e duas do Bocão. Geralmente eles escrevem, então acaba sendo uma mensagem muito pessoal. Tem muito a ver com as experiências deles, inclusive. Eu entro com a minha parte mais musical, mais em arranjo. A letra, os caras sempre chegam com ela já pronta. Letra, harmonia, de certa forma, melodias. Então eu e o Dinho, a gente basicamente entra mais nas partes de arranjos, nesses momentos. Não opino muito nas letras não. Raramente falei alguma coisa sobre as mensagens. O que a gente tenta fazer é deixar a mensagem mais clara junto com a música. Tipo, ouvindo o que eles escreveram, eu, pelo menos, tento captar o máximo aquela mensagem ali e tentar passar isso para a música na hora de pensar no arranjo. Esse disco, inclusive, tem uma coisa meio melancólica, sabe, meio… eu acho que casou com o momento, por mais que a gente tenha produzido antes de tudo que estava rolando, meio que bateu. Foi uma feliz coincidência pra gente.

Bocão: Você fala em relação ao momento pandêmico que a gente está vivendo, né, as pessoas isoladas, solidão, rupturas, muita coisa que aconteceu nesse momento também…

Pisca: Sim. Porque estava ouvindo aqui o disco depois de pronto, e tem esse clima. Eu senti essa coisa bem triste, melancólica, meio que reflexiva também.

E apesar de também ter esse lado melancólico que a gente pode associar à pandemia, mas a produção do disco começou antes da pandemia, em 2019…
Pisca: Sim, sim. Na verdade, começou em 2018, a gente já estava gravando umas coisas. A gente não queria só seis músicas. Acho que tinha mais três, né, Bocão? Ou quatro, não lembro.

Bocão: Mais quatro músicas.

Pisca: Só que são músicas que destoam dessas aí. Tem outra pegada. São músicas mais pesadas. Acho que o João não tinha colocado letra ainda.

Bocão: Tem uma que tem letra que tem uma participação do Diego Medina, de Porto Alegre.

Que legal! Que era do Vídeo Hits, né.
Bocão: Isso. Ele é um amigão nosso, a gente se conhece desde 2000, um brodaço da gente. É uma música que ficou nessa sobra que a gente vai trabalhar ainda. mas ele já gravou a parte dele de voz.

Legal.
Um rock’n’roll no estilo do Diego, né. O Diego tem umas coisas bem viscerais de trabalhos dele, e ele botou muito disso, dessa carga dele nessa música. Logo logo a gente vai trabalhar ela!

Agora queria saber como é que foi fazer o feat com a Júlia Guimarães, filha do João Paulo… e foi o primeiro feat da banda, né?
Bocão: Na verdade cometi um equívoco quando falei sobre ser o primeiro feat, porque o Wado participa de uma faixa do “Volume 3”. Mas como não é um trecho que ele canta uma frase longa, acabou que meio que passou despercebido, mas o Wado participou de uma faixa. A Júlia participou cantando realmente a música inteira junto com o João. Ela é uma menina que nasceu quando a banda nasceu, praticamente. A Júlia tem a idade do Mopho. E o João Paulo já vem trabalhando com ela, ela tem uma banda, e ele já vem trabalhando na produção do disco dela já há alguns anos, que não está finalizado, e aí eles tão trocando figurinhas e compondo juntos, ela compôs uma música com João no disco, que é a “Merri-Go-Round” e ela canta a primeira faixa do disco, que é a “Mundo Sem Fim”. O João fala muito emocionado sobre esse fato, porque para ele é uma coisa muito especial, cantar com a filha dele, compor com a filha dele, apresentar a filha dele para o mundo musical… Eu não tenho filhos nem o Pisca tem, deve ser uma experiência incrível.

Eu sei que vocês em breve vão lançar em CD o “Que Fim Levou Meu Sorriso”, queria saber se tem alguma novidade sobre isso.
Bocão: O disco já está definido, inclusive está indo para fábrica em alguns dias, deve sair daqui a uns 30, 40 dias. Vai ser uma tiragem limitada, de 500 cópias, pela Psico BR, de Campinas, que é um selo muito legal que abrange o rock nacional, psicodelia principalmente, e a gente tem plano sim de fazer o disco em vinil um pouco mais adiante. Na verdade, esse trabalho a gente tinha feito idealizando realmente lançar ele em vinil. Inclusive o projeto visual do disco é todo para um vinil. A gente botou o disco no edital da Lei Aldir Blanc aqui pela Secretaria de Cultura do Estado, Secult, e conseguimos ser aprovados, e a gente decidiu lançar primeiro nas mídias digitais e depois pintou essa parceria com a Psico, que já é uma extensão de uma parceria que a gente já findou com eles para o relançamento do “Sine Diabolo”, que vai sair esse ano ainda em LP, uma edição de luxo, com remixagem do Pisca e masterização do Arthur Joly. A gente deu uma pausa no projeto de lançar esse disco novo em vinil porque as fábricas estão com os prazos muito longos para entregar, e como já vai sair o disco do “Sine Diabolo”, para não chocar esses lançamentos, a gente acabou optando fazer isso agora, mas está no plano lançar também esse (novo) álbum e ir lançando os outros álbuns em LP, que acredito ser um formato que tem mais a ver com o som da banda, até com os fãs que a gente tem.

“Volume 3” (2011) e “Brejo” (2017)

Queria saber o que vocês acham da cena de rock psicodélico no Brasil hoje.
Pisca: Tenho acompanhado bem pouco especificamente uma cena, sabe. Pra ser sincero, poucas bandas eu vi que eu não sei nem se eu classificaria como psicodélico. Tipo, tem uma banda aqui em São Paulo que quando eu trabalhava num estúdio eles ensaiavam muito lá, e a primeira vez que eles tocaram, quando eles começaram o ensaio, me chamou a atenção para caramba, inclusive porque a música que eles tocaram eu lembrei do Mopho, e achei bem legal. Era O Terno. Eles ensaiavam lá no estúdio em que eu trabalhava, até troquei ideia com um dos caras. Batera muito bom, sabe. Mas ouvi poucas vezes O Terno. Depois disso eles gravaram, apareceram em alguns lugares, eu achei massa, é uma banda que eu acho bem legal. Tenho ouvido um cara chamado Rodrigo Campos. Adoro o som do Rodrigo. Uma maravilha. Ele faz uma música bem brasileira, bem genuína. ele eu conheci mesmo pessoalmente lá no estúdio, a gente trocava ideia de vez em quando, até falei para ele que lembrava um pouco Paulinho da Viola. Ele tem uns sambas bem bonitos, sabe. Mas ele tem um disco, que eu acho que é o terceiro disco da carreira dele, que é o “Conversas com Toshiro” (2015), se eu não me engano, que beira à psicodelia. São até meio surreais umas coisas que ele escreve. Muito bom o disco, adoro. Agora vejo que surgem algumas bandas de vez em quando que vão despontando na cena rock, nacional, meio psicodélicas, mas ainda acho que é uma coisa bem misturada, sabe. Tem um cara que conheci que acho muito legal, o Jonnata Doll, não sei se vocês conhecem.

Eu gosto.
Pisca: Eu dividia casa com o baterista da banda dele, e eles ensaiavam lá (no estúdio). Eu curtia bastante, eu ficava ouvindo os ensaios deles, fui ver shows também. O Jonnata é muito massa, mais para punk, né, um som mais punk do que psicodélico.

Bocão: É muito difícil definir esse gênero do psicodélico brasileiro porque existem muitas coisas que as pessoas pegam e classificam como psicodélico. Algumas fases dos Mutantes, Ronnie Von, coisas até de Zé Ramalho, Lula Côrtes e algumas coisas do Nordeste como psicodélico e tal. Quando o Mopho surgiu, não tinha ninguém fazendo um som assim como a gente fazia. E esse termo de neo-psicodelia brasileira é uma coisa que já aconteceu um pouco depois da gente. Eu percebo hoje em dia que as pessoas que nos conhecem há mais tempo nos colocam como aqueles caras que abriram as portas para uma neo-psicodelia brasileira, mas não acredito muito nisso. Acho que a gente surgiu numa época que tinham alguns artistas que tinham um Q psicodélico – uns partiam mais para o pop, outros uma coisa mais garagem. Particularmente gosto muito de bandas como Os Skywalkers, que não estão mais em atividade – inclusive eu fiz parte dessa banda – e que misturava muito bem a coisa da música… O Pedro Bizelli, que era o compositor, metia um frevo no meio de uma coisa meio garagem, meio psicodélica… A Vídeo Hits mesmo, que partia um pouco pro pop, também tinha umas coisas meio psicodélicas… Me lembro de uma banda de Porto Alegre muito legal, a Laranja Freak, que era mais Jovem Guarda psicodélica. Tinha Os Haxixins, que é uma banda da zona leste de São Paulo, que é uma coisa mais garageira psicodélica… e partindo pro Nordeste, tem a The Baggios, que é uma banda de rock’n’roll que você pode também colocar com uma banda psicodélica, a próprio Necro, aqui de Maceió, que é uma banda que a galera coloca como stoner – a galera inventou um monte de gênero, né: stoner, psicodélico, progressivo, prog-rock e tal. E tem uma banda daqui de Maceió que é do primo do Pisca, o Alex, que cansou de ver a gente ensaiar na casa do Pisca, e que se chama Jude, que é uma banda que tem uma coisa bem psicodélica. É interessante ver que esse movimento de uma música livre, sem se preocupar em fazer sucesso radiofônico, acabou que meio que ficando um pouco popular dentro dessa cena que não é mainstream…

Pisca: Você falou do Baggios, realmente lembrei até de alguma coisa agora…

Bocão: Boogarins.

Pisca: Isso. Em Sergipe está rolando uma uma cena bem legal. O Luno lançou um disco (nota do editor: destacado aqui no Scream & Yell)…

Bocão: Super psicodélico, muito lindo o disco dele.

Pisca: E tem o batera, que eu acho que tocava… Não sei se no Plástico Lunar… Tem um batera lá muito bom que também lançou um disco muito bom… Eu na verdade ouvi duas músicas, não posso falar muito do disco todo, mas ouvi duas músicas que eu achei muito boas. Eu tinha visto um clipe, só que não lembro o nome dele agora, eu vi rapidamente. Estava ouvindo o disco do Luno, inclusive. Aracaju tem uma cena muito massa. Às vezes eu tenho a impressão que é uma cena mais organizada que Maceió, sabia?

Bocão: Você está conectado mais com as pessoas de lá. Aqui em Maceió, hoje, tem uma coisa muito ampla, cara.

Pisca: Sim.

Bocão: Muitas bandas de muitos gêneros e muitos nichos… Eu tive um programa na Mutante Rádio, né. Toquei durante quatro meses.

Sério? Eu também tive.
Bocão: É muita coisa. Então você sabe do universo de música independente. E eu fiquei impressionado porque eu tive o programa de 2019 pra 2020, eu pesquisei bastante e eu fiquei impressionado com a quantidade de produção e de qualidade. Desde música punk, reggae, hip-hop, funk metal e todo tipo de gênero de música. Tem muito artista legal em Alagoas. É impressionante.

“Que Fim Levou Meu Sorriso” (2021)

Para encerrar, eu queria saber como vocês avaliam esses 25 anos de carreira. Vocês estão fazendo 25 anos esse ano, né?
Pisca: Eu não participei durante os 25 anos ativamente, né. Inclusive há uma janela grande de quando eu saí em… 2003? Eu nem lembro mais… 2003, mesmo. De 2003 a 2008, pelo menos cinco anos aí que eu não trabalhei nada com o Mopho. Eu caí no limbo (risos).

Bocão: Mas estar dentro e estar fora também faz parte da história.

Então eu queria saber da impressão de vocês enquanto vocês estavam e estão dentro da banda.
Pisca: Quando a gente saiu em 2003, a gente saiu meio que brigado, eu fiquei sem falar com João Paulo durante cinco anos. E quando a gente se encontrou, a gente trocou uma ideia sobre o que aconteceu e tudo e, enfim, colocamos as coisas nos lugares, sabe. E aí o Bocão, acho que você tinha conseguido um show em São Paulo, né? Ele morava aqui. E a gente se encontrou e a gente não ensaiou! A gente se encontrou no lugar do show, no dia, e foi lá e tocou e o show foi uma maravilha!

Bocão: Foi no Berlim. Esse show foi muito louco.

Pisca: Acho que se a gente tivesse ensaiado não teria ficado tão bom. Uma palavra para resumir o que me vem à cabeça agora é sintonia, sabe. Eu acho que sempre que a gente se encontrou e começou a falar de música a gente conseguiu uma sintonia. Inclusive quando a gente passou cinco anos sem tocar junto e que se encontrou, teve a sintonia de novo. A gente não tem a pretensão, talvez, de achar que “Ah, vamos lançar um disco que agora vai mudar a história da banda”. A gente às vezes fala isso brincando. Porque assim, a história da banda a gente constrói com a vontade mesmo da gente. Tanto é que a gente não lança um disco por ano. A gente se junta, tem umas canções que curte, “legal, vamos trabalhar? vamos. Pô, curti isso, curti aquilo, vamos fazer isso”, de uma forma assim, “vamos fazendo”, sabe. Não é nada programado. Sintonia resume bem. A gente consegue ficar sintonizado um com o outro na hora de fazer música.

Bocão: Faço um balanço um pouco diferente do Pisca. Acho que esses 25 anos serviram para definir uma importância muito interessante do Mopho na própria cena musical brasileira pós-2000. Falo respaldado por fãs que nos acompanham há mais de 20 anos, por pessoas importantes, músicos e pessoas que realmente amam o trabalho dessa banda, e apesar desses hiatos e da banda estar sempre como um elástico que estica e parece que faz estourar e volta, e de repente dá uma sumida… Então é isso, o Mopho tem 25 anos de estrada, já são cinco trabalhos – fora as duas demos que foram lançadas lá antes de 2000 –, e assim, é uma banda que não tem uma audiência muito grande, mas que tem fãs que realmente seguem a banda ao longo de todos esses anos. Mesmo com altos e baixos a gente, quando se reúne, como o Pisca falou, rola uma sintonia que é sentida pelas pessoas. Foi muito legal a gente ter tido um documento importante, que foi o lançamento do filme, o documentário “Eu Quero Tudo – O Projeto Mopho”, foi lançado em 2019, né, Pisca?

Pisca: Sim.

Bocão: Foi um momento muito importante para a gente, que a gente reencontrou o (Luiz) Calanca, ele veio pra Maceió, nós tocamos juntos depois de muitos anos ali, eu não tinha voltado pra banda nem o Pisca, mas a gente estava no palco celebrando. A gente está, nesse momento de 25 anos, tentando retomar um trabalho de mais encontros, mais músicas, mais composição, e a gente vai continuar trabalhando, que é o que nos motiva desde sempre. O Mopho surgiu para moldar o que seria o destino de cada um de nós, porque hoje eu trabalho com música, o Pisca trabalha com música, João Paulo trabalha com música… O estopim disso ter se traduzido nas nossas vidas é o trabalho dessa banda. Então, mesmo a gente estando fora, todos os momentos que estive fora eu me senti muito dentro, porque como o Pisca falou, “ah, o Bocão fechou um show, mesmo estando fora”, o Pisca fechou um contrato de um disco, mesmo estando fora… Então a gente está sempre no radar. O João Paulo passou alguns momentos lá sem eu e o Pisca, ele e o Léo, mas a gente esteve sempre em volta, sempre foi muito importante para a gente o Mopho, a gente é sempre reconhecido também pelo Mopho – não tem como a gente não reconhecer isso. Eu tenho vários trabalhos fora do Mopho, mas sou sempre lembrado como alguém do Mopho. O balanço que faço é muito positivo, apesar da gente não ter tido a oportunidade de ter vivido do Mopho – a gente mais investiu tempo e dinheiro do que recebeu da banda, vamos dizer assim. Mas a gente sempre foi uma banda de status de reconhecimento do fã, lá em cima, e sempre uma banda que nunca teve uma valorização no que se refere a um contrato, a fazer shows grandes, a circular realmente no país. Independente disso, acho que foram 25 anos de muita coisa legal que aconteceu, e ainda tem muita coisa por vir. Eu acredito.

– Ananda Zambi (@anandazambi) é jornalista e editora do Nonada – jornalismo travessia. Nas horas vagas, também brinca de fazer música.” A foto que abre o texto é de Rodrigo Brasil. 

 

One thought on “Entrevista: O quinto disco da banda Mopho e o balanço dos 25 anos de carreira

  1. Muito boa a entrevista. Amo demais a banda. Pude registrar muitos shows da fase do Brejo, quando o Pisca e o Bocão estavam fora, porém alguns shows tiveram a participação do Bocão. Registrei esse show no lançamento do documentário. Estou ansioso pra shows voltarem e poder filmar os novos shows desse disco.
    Essa formação é ótima, e espero que dure muitos anos, mas a formação clássica foi a do primeiro disco.

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