Entrevista: A volta do Rumbora

entrevista por Bruno Lisboa

Fruto da geração anos 90 que recolocou Brasília no mapa do rock nacional, o Rumbora foi uma das bandas mais interessantes de um período tão bem retratado por Gabriel Thomaz no livro “Magnéticos 90” (Edições Ideal). Formado em 1997 na capital federal, o Rumbora se notabilizou na união de elementos de ska e hardcore com letras bem humoradas, combinação explosiva que ganhou ainda mais impacto com os clipes, sempre bem posicionados em execução nos programas da MTv Brasil.

Do disco de estreia, “71”, lançado em 1999, surgiram os mais hits mais celebrados do grupo como “Chapirous” e “Skaô”. O videoclipe da primeira foi indicado na categoria de melhor clipe de rock no VMB (Video Music Brasil) enquanto o segundo registro em vídeo foi ainda mais longe, sendo indicado na categoria “Escolha da Audiência”, a mais importante da MTV. O grupo também foi indicado como banda-revelação no Prêmio Multishow e teve cinco indicações nos Melhores do Ano da revista Showbizz, incluindo o de disco do ano.

Com produção dividida entre Carlo Bartolini e Carlos Eduardo Miranda, o segundo álbum, “Exército Positivo Operante”, chegou ás lojas pelo selo Trama em 2000. Apesar dos hits “O Mapa da Mina”, “O Passo do Azuilson” e “Veste o Uniforme” (versão bem-humorada de “Born to Be Alive” do cantor francês Patrick Hernandez), a banda não renovou contrato com a Trama, e o terceiro disco, “Trio Elétrico”, saiu de forma independente em 2003. A banda decidiu parar as atividades em 2005 e o vocalista Alf Sá primeiramente montou o Supergalo e, depois, partiu para carreira solo.

Após mais uma década dedicada a projetos pessoais, Alf Sá (guitarra e voz) e Beto Loureiro (baixo e voz) decidiram por continuar a escrever mais algumas páginas de sua própria história. Na conversa abaixo, que celebra o retorno aos palcos do Rumbora, Alf fala sobre a era “71” (“Foram anos intensos”), sobrevivência artística (“Viver de música ou de qualquer outra forma de expressão artística nunca foi nem será fácil”), a diferença ideológica da sua geração para contemporaneidade (“O mundo de hoje passa por um momento estranhíssimo de muito retrocesso”) e planos futuros (“Não pretendemos ficar na nostalgia”). Confira!

O disco “71” comemora 20 anos de lançamento em 2019. Quais as lembranças vocês daqueles tempos?
Foram anos intensos. Muita concentração e dedicação. Quando montamos a banda ensaiávamos de segunda a segunda, manhã , tarde e noite. Muitos amigos fizeram parte dessa história desde o começo em Brasília e depois o bando foi aumentando exponencialmente Brasil afora. Chegamos a São Paulo na ponta dos cascos e caímos matando. O fã-clube viajava pelo Brasil assistindo nossos shows em tudo que era lugar. De bar na praia e inferninhos até chegar ao Rock in Rio, Porão do Rock (que tocaremos na edição 2019) e as grandes casas de shows da época. Muita gente tatuou a logo da banda e até hoje muita gente me reconhece pela que fiz no cotovelo. Outras lembranças marcantes foram a gravação na casa do Carlo Bartolini em Cotia num esquema “meio do mato” que ajudou bastante no clima do álbum e a mixagem em Los Angeles feita pelo Bill Kennedy (Nine Inch Nails, Alice in Chains) no Scream Studios, mesmo estúdio onde foram mixados “Nevermind”, do Nirvana, “Angel Dust”, do Faith No More e o primeiro do Rage Against The Machine, dentre vários discos revolucionários.

Para além do aniversário do disco de estreia, quais os motivos os levaram a retomar as atividades do Rumbora?
Todos. Saudade de tocar com os amigos, dos fãs que nunca desistiram da banda, de fazer músicas novas…

Marcelo Vourakis e Iuri Rio Branco foram recrutados para esta nova fase. O que ambos trouxeram a sonoridade da banda?
O momento agora é de cair na estrada. Tocar o repertório dos álbuns que já lançamos. Como ambos já são de casa, pareceram boas escolhas para levar o plano adiante. Infelizmente, o Marcelo teve que declinar.

Desde 2005 a banda tem ensaiado o retorno as atividades, mas só agora o mesmo aconteceu. Por que se esperou tanto tempo?
Na verdade, a banda parou em 2005. Os ensaios de retorno foram alguns anos depois. Não se esperou, apenas as coisas não encaixavam. O momento de alguém não cabia, um mudava de cidade, outro as ideias não batiam mais e os planos ficavam pelo caminho. A coisa foi se protelando até chegar uma hora de dar um basta e voltar pro trilho de uma vez por todas.

Leandro (baterista na época do disco “Trio Elétrico”) participará da apresentação SESC 24 de Maio, em São Paulo dia 18 de abril. Bacalhau, Biu e Fabrício também foram convidados para participar desta nova tour?
Conversamos com todos. Nossa amizade e proximidade com o Biu e o Fabrício sempre se mantiveram intactas mesmo quando eles saíram da banda. Mas é uma inviabilidade geográfica. Biu mora em Los Angeles e Fabrício mora em Berlim. Quando vierem pra CÁ, certamente participarão. Já a distância com o Bacalhau (que desde 2002 é o baterista do Ultraje a Rigor) é de afinidade de ideias. Desde que ele saiu da banda lá em 2001 fomos ficando cada vez mais distantes. É uma pena, mas vida que segue. O Rumbora é maior que todos nós.

Quando “71” foi lançado, o mercado musical ainda vivia sob as rédeas da indústria fonográfica, mas com uma ascendente cena alternativa e a internet num formato ainda primitivo. Passados 20 anos são perceptíveis diversas mudanças quando o assunto é a sobrevivência musical. Para você que viveu as duas esferas, quais são as mudanças mais significativas de lá para cá?
Viver de música ou de qualquer outra forma de expressão artística nunca foi nem será fácil. A diferença é que naquela época a dificuldade maior era o custo de produção. Gravações, vídeos, etc. Hoje se consegue resultados satisfatórios com pouco investimento. Eu mesmo gravei meus singles solo no meu quarto, mandei masterizar fora, coloquei nos serviços de streaming e foi. O desafio atualmente está em chegar a um número expressivo de pessoas. Conseguir relevância num mundo regido à uma produção frenética de conteúdo onde o número de curtidas e seguidores é determinante pra que um produtor se interesse em contratar um show, por exemplo. Todo mundo quer resultados imediatos e a maturação essencial a tantos que fizeram história foi pro ralo. É claro que existem artistas incríveis acontecendo pelo Brasil e pelo mundo, mas muitos estão soterrados embaixo dessa pilha onde tudo fica cada vez mais rápido e descartável. Os 15 minutos de fama que o Andy Warhol falava viraram 15 segundos.

Qual seria a melhor alternativa para criar um mercado independente sustentável?
Menos nichos, mais troca.

Li recentemente “Magnéticos 90” do Gabriel Thomaz e ele comenta o quão efervescente era a cena de Brasília na época. Qual foi o legado deixado pela sua geração?
Foi um tempo incrível, de muitas descobertas. Soaria pretensioso da minha parte falar em legado de algo que faço parte. Prefiro que esse tipo de comentário venha de quem foi impactado por isso. Já fico feliz de saber que muitas bandas se inspiraram no que construímos e de saber que alguma música que fizemos salvou um dia ruim na vida de alguém.

O que o Rumbora do século XXI difere do de outrora?
O mundo de hoje passa por um momento estranhíssimo de muito retrocesso. É impressionante como a tecnologia avança tanto e a humanidade continua ainda tão primitiva e desigual. Por outro lado dá ânimo ver que um número significante de pessoas se pronuncia contra essa maré. O Rumbora se inclui nesse grupo. Somos uma banda em constante evolução. Que acompanha o mundo. Fomos largando as letras mais descompromissadas, característica de muitas bandas da época, e nosso som foi ficando mais maduro e a mensagem cada vez mais afiada. Esse é o caminho a ser seguido nessa retomada. Além de sempre nos renovarmos musicalmente sem perder o DNA da banda.

Para além dos shows comemorativos há algum disco novo na pauta?
Os shows comemorativos são um ótimo motivo pra celebrar e reconectar com as pessoas que tem carinho pela banda, mas não pretendemos ficar na nostalgia. Várias músicas novas estão a caminho. É questão de tempo.

– Bruno Lisboa (@brunorplisboa) é redator/colunista do O Poder do Resumão. Escreve no Scream & Yell desde 2014.

3 thoughts on “Entrevista: A volta do Rumbora

  1. Ahhhh Rumbora de volta!!!
    Que tuuuudo!
    Melhor fase da minha vida…. melhor banda de Rock….
    Me orgulho tannnto de ter feito um baita sacrifício e assistir o show do Rumbora no Rock in Rio/2001….
    Bons tempos….

    BoraRumbora!!!!

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