Entrevista: Giraffe Tongue Orchestra

por Daniel Tavares

Em 2016, mais um supergrupo nasceu. William DuVall, atual vocalista do Alice in Chains, e os guitarristas Brent Hinds (Mastodon) e Ben Weinman (Dillinger Escape Plan) conseguiram concretizar os planos de transformar a Giraffe Tongue Orchestra em uma banda real, complementada por Thomas Pridgen (The Mars Volta) e Pete Griffin (Dethklok, Zappa Plays Zappa).

O debute do quinteto, “Broken Lines”, foi lançado em setembro de 2016 pela Cooking Vinyl e agora está disponível no Brasil via Hellion Records. Falando num inglês calmo e pausado, o vocalista William DuVall conversou conosco sobre a Giraffe Tongue Orchestra, sobre “Broken Lines” e como o trabalho de cada um em sua própria banda funciona em relação ao novo grupo.

DuVall ainda contou como vê o grunge hoje (“Gosto de algumas bandas… Soundgarden, Pearl Jam) e se algum dia se imaginou no posto outrora ocupado pelo falecido Layne Staley. Ele também discorreu sobre o que acompanha no cinema e na TV listando várias séries, falou sobre religião e música brasileira. Surpresas: ele ouvia Hermeto Pascoal, Gil e Tom Zé. Confira!

Como a banda foi formada e de onde veio esse nome?
Bem, a Giraffe Tongue Orchestra se tornou uma ideia pela primeira vez cerca de seis ou sete anos atrás. Brent Hinds e Ben Weinman queriam trabalhar juntos, talvez formar uma banda com ambos tocando guitarra e, naquela época, fui o primeiro vocalista que apareceu pra trabalhar com eles, mas por muitas razões não deu certo. Nós estávamos todos muito ocupados com outras bandas. Eu particularmente estava muito ocupado com o Alice in Chains e muitas outras coisas que estavam acontecendo na minha vida naquele momento. Então eles tentaram uma longa série de baixistas, bateristas e cantores, mas não conseguiram encontrar a combinação certa de pessoas. Então nós acabamos tendo um tempo de sobra em 2015. Encontrei o Brent Hinds numa mercearia em Atlanta, e ele falou: “Cara, eu ainda adoraria que você participasse do Giraffe Tongue Orchestra”. E então, naquela época, o Brent e o Ben tinham algumas gravações de músicas, faixas instrumentais com Thomas Pridgen na bateria e Pete Griffin no baixo. E soavam muito bem, mas não tinham um vocalista. Eles tinham tentado um, mas não tinha dado certo. Eu telefonei para o Ben Weinman na primavera de 2015 e disse: “Como as coisas estão indo?”. Ben e eu conversamos um pouco sobre como queríamos que essa banda fosse, se fôssemos fazer isso. E o que nós não queríamos que a banda fosse. Queríamos que ela fosse algo completamente único, algo em que pudéssemos realmente acreditar. Não queríamos que fosse apenas algum tipo de supergrupo, em que os caras rapidamente chegam na banda e soltam um álbum. Queríamos alguma coisa que fosse muito arriscada, que se expusesse a riscos e que pudesse existir completamente em seu próprio espaço, fora de qualquer coisa que nós tivéssemos feito no passado ou qualquer coisa que nós fizéssemos com quem quer que fosse no futuro. E uma vez que chegamos a esse desejo comum, foi aí que a coisa ficou real, porque as duas primeiras canções que escrevi, “Adapt or Die” e “Crucifixion”, mandei pro Ben e pro Brent. Eles dois piraram e vimos que ia funcionar. Então escrevi o resto das canções e, de repente, a gente tinha um álbum inteiro, “Broken Lines”, o qual nós ainda ficamos felizes demais. Ficamos felizes demais com essa música e estamos felizes de termos lançado agora.

E o nome?
Oh, e o nome, o nome, você perguntou sobre o nome. O nome veio do Brent Hinds visitando o zoológico em Sidney, na Austrália. A história é que ele tinha um cacho de bananas e foi até uma girafa e a girafa caminhou até ele e pegou as bananas direto da sua mão. E usando apenas a sua língua a girafa descascou e comeu as bananas bem na frente do Brent. E o Brent ficou tão impressionado com isso, com a girafa usando sua língua de uma forma tão diferente, que ele pulou e disse. “Oh, eu achei o nome pra uma banda, eu achei o nome para uma banda. Giraffe Tongue” [N.T. Língua de Girafa]. E o resto do pessoal apenas disse, “ah, meu Deus”. Porém alguém comentou: “Por que não colocar Orchestra no final, fazendo com que soe mais musical e importante?”. E então também teríamos o acrônimo GTO e todo mundo vai poder pensar em carros velozes, e tudo mais. Então foi assim que o nome aconteceu. Nós todos dissemos, ok, tanto faz. E ficou assim.

Todos vocês tem suas próprias bandas. Você acha que essas músicas não se encaixariam em nenhuma delas? Não encaixariam no estilo do Alice in Chains ou do Mastodon?
Eu acho que o GTO é o GTO e ninguém mais. Essa era a ideia desde o início, que a música do GTO seria única para o GTO. Isso tem tudo a ver com a combinação única de músicos que fazem parte da banda. E todos nós trazendo a totalidade das nossas influências dentro do GTO e é assim que ela soa do jeito que soa. Essa música não poderia existir com nenhuma das nossas outras bandas ou com a banda de mais ninguém. É nossa e é o que é. É isso que a faz ser boa.

Você considera que se a GTO alcançar um sucesso estrondoso vocês deixariam suas bandas originais para se dedicar exclusivamente à GTO?
Acho que hoje, em 2016, é importante mais do que nunca que os artistas, de todos os tipos, diversificarem suas carreiras e fazer coisas diferentes que possam todas coexistir juntas. Então a GTO, por mais maravilhosa que seja para todos nós, não significa que eu vá deixar o Alice in Chains, ou que o Brent Hinds vá deixar o Mastodon ou algo assim. Nós temos essas bandas e temos o GTO. E talvez outras coisas que nós fazemos, porque hoje em dia, particularmente da forma como a indústria da música está indo, acho que é bom ter múltiplas avenidas para alcançar as pessoas. Minha esperança é que o GTO possa coexistir com tudo o mais que nós fazemos de uma forma realmente harmoniosa.

E você tem planos de uma turnê mundial? Alguma chance de ter shows no Brasil?
Nós amaríamos isso, porque, como tenho dito em muitas entrevistas, o Brasil tem verdadeiramente uma das melhores plateias no mundo. Eu espero que aconteça. O maior desafio para a GTO é o agendamento porque nós temos as outras bandas. Mas, sim, esta é minha esperança. Eu gostaria de poder te dizer quando, mas nós definitivamente queremos ir.

Você é formado em filosofia, com especialização em religião. Vai ser difícil, mas, você conseguiria resumir em poucas palavras suas visões religiosas hoje e sua posição a respeito do cristianismo, do islamismo e de outras religiões.
Eu diria que sou muito mais humanista e com uma espiritualidade interessante do que uma pessoa religiosa que está ligada a qualquer religião. Sinto como se todas as religiões do mundo tenham tentado responder a mesma questão fundamental da humanidade, de novo e de novo e de novo outra vez. Eles continuam tentando explicar o mundo extraordinário e o universo ao redor de nós tanto quanto codificar nosso próprio comportamento, nossas falhas morais e todos esses problemas realmente profundos e pesados que enfrentamos como seres humanos. Todas as religiões do mundo tem coisas bonitas para dizer, respostas bonitas para algumas dessas questões e, claro, todas as religiões do mundo, ou a maioria das religiões do mundo, tem também criado muito mais questões do que tem respondido. E temos visto casos em que muitos problemas grandes foram criados para a humanidade, por todo o mundo, em nome da religião e coisas assim, mas, no geral, minhas visões queriam apenas encontrar o senso comum que existe entre todas essas linhas de pensamento, e, mesmo além disso, abraçar todo o progresso maravilhoso que tem sido feito na ciência e física, na medicina, todas as disciplinas científicas que podem responder à maioria destas questões e por todas essas coisas juntas para formar o que, em minha visão, é uma visão mais abrangente da nossa realidade, mesmo se essa realidade for uma ilusão. Algumas das coisas mais fascinantes que estou lendo neste momento é como os físicos estão desafiando até mesmo a noção da nossa percepção e da nossa realidade, que pode impactar o conceito de relatividade e ilusão – talvez, o tempo mesmo pode ser uma ilusão. Todas essas coisas me fascinam muito além do que o cristianismo diz ou outras religiões dizem. Acho tudo isso fascinante. Foi uma questão difícil. [risos]

Nós temos assistido à série The Walking Dead recentemente. Existe uma grande conexão da série com Atlanta, sua cidade. Você gosta da série? E o que você normalmente vê na TV?
Não assisti “The Walking Dead” ainda! Tenho tido vontade de ver porque o Norman Reedus [ator que interpreta o personagem Daryl Dixon] é um amigo do Brent Hind. O Norman também tem sido muito gentil apoiando o GTO em suas redes sociais e me falam que ele é um cara legal. Sei que eles fazem muitas filmagens da série em Atlanta, mas muitas coisas são filmadas em Atlanta esses dias, cara. Muitos filmes… Jogos Vorazes”, “Passageiros”, com a Jennifer Lawrence, que vai sair em breve. Existem muitas coisas sendo filmadas aqui. Eu gostaria muito de assistir Walking Dead. Um dia vou sentar e assistir uma maratona com todas as temporadas [risos], mas até agora simplesmente não tive tempo. Neste momento estou curtindo realmente séries como “Westworld”, “Insecure”e “Shameless”. Tem outra chamada “The Affair” que estou achando interessante.

Bacana. Agora, falando sobre o Brasil. Existe algum artista brasileiro que você goste ou que escute em sua casa, ou mesmo que tenha tido alguma influência na sua música?
Deus, muitos anos atrás eu tinha uma banda chamada No Walls, um trio com o baterista de jazz Matthew Cowley e cujo baixista, Hank Schroy (Orixás], vivia no Rio. E juntos nós ouvíamos todo tipo de música. É por isso que a banda se chamava No Walls, porque queríamos quebrar todo tipo de barreira e fazer alguma coisa eventualmente. E nós tocávamos uma combinação de Jazz, Rock e improvisação livre. O Hank me mostrou um monte de músicos brasileiros. Ouvíamos Hermeto Pascoal, muito Gilberto Gil, Tom Zé, que a gente gostava muito. Amávamos esses músicos e alguns mais. O Brasil tem alguns dos músicos mais surpreendentes de qualquer lugar do mundo. A gama de influências que chegou ao Brasil e encontrou seu caminho através da música brasileira é fascinante para mim. Eu amo a música brasileira.

Agora algumas questões sobre o Alice in Chains. Já faz três anos desde o lançamento do último álbum, “The Devil Put The Dinossaurs Here”. Quais são os planos do Alice in Chains para o próximo ano?
Vamos ter que ver. Nós realmente não fizemos nenhum plano para 2017 ainda. [risos] Talvez nos juntemos e vejamos que ideias musicais todo mundo tem, mas eu não sei.

E como você vê o Grunge hoje.
Oh, Deus. Eu realmente não penso sobre o grunge. Sabe, gosto de algumas bandas que são chamadas grunge. Soundgarden, Pearl Jam, gosto desses grupos e sempre fico feliz em ver que as bandas ainda estão juntas, trabalhando.

Na época do Layne Staley, você já pensou que um dia poderia ser o vocalista do Alice in Chains?
Absolutamente não. Nunca. Nunca. [risos] Nunca passou pela minha cabeça. Eu sempre fui obviamente um grande fã do Layne Staley, mas não, nunca desejei isso. Eu fazia minha própria música. Foi uma grande virada do tempo ter tudo isso acontecido, sabe?

Ok. Agora, a última questão. Por que os fãs devem conhecer o seu trabalho com o GTO?
Bem, acho que se você quiser me conhecer melhor como artista, esta é uma grande oportunidade para fazê-lo. O GTO é, bem facilmente, um dos melhores trabalhos que já fiz, algumas das melhores letras que já escrevi. Foi uma experiência realmente maravilhosa e completamente imersiva escrever e gravar este álbum e ele reflete muito mais da totalidade das minhas influências, que me fazem ser quem eu sou, então se existe alguém aí que nos apoie e queira nos conhecer melhor, este é um bom lugar para começar e, esperançosamente, isso vai inspirá-lo a voltar e conhecer um pouco do meu trabalho anterior, que vem com o Comes With the Fall, com o No Walls e coisas de muitos anos atrás. Sim, eu o encorajo você a fazer isso.

– Daniel Tavares (Facebook) é jornalista e mora em Fortaleza.

4 thoughts on “Entrevista: Giraffe Tongue Orchestra

  1. Parabéns pela pauta da entrevista, achei interessantíssimo abranger a área de formação acadêmica dele e questioná-lo sobre a temas além do feijão com arroz. O Duvall tem muito mais a falar do que as pessoas imaginam e sabendo instigar isso nele é sempre garantia de uma boa matéria (uma pequena correção apenas, a data de lançamento do “Broken Lines” foi 23 de setembro e não junho de 2016).

  2. Legal a entrevista! Só uma correção: Na última pergunta ele responde “…que vem com o THE FALL”, acredito que o texto foi traduzido e a frase é “… comes with the fall”. A ex banda dele se chama COMES WITH THE FALL (que aliás é uma puta banda), e não só “The Fall”. Abraços!

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