Entrevista: Thales Silva

por Bruno Lisboa

Natural de Belo Horizonte, Thales Silva faz parte da nova e efervescente cena mineira composta por bandas como Transmissor, Dead Lovers Twisted Heart e Graveola, entre tantas outras. Sua carreira divide-se entre uma recém-lançada carreira solo e o trabalho com o grupo A Fase Rosa, com quem já lançou dois EPs (“O Arquiteto e o Carnaval”, de 2011, e “EP2”, 2012) e um álbum, “Homens Lentos” (2013), todos disponíveis no Bandcamp da banda.

Do lado solo, Thales disponibilizou gratuitamente na web em maio seu debute, “Minimalista”, um álbum que prima por ser “muito enxuto, muito simples, que fosse até simplório por vezes”, segundo ele próprio conta em entrevista por e-mail ao Scream & Yell. “Eu tinha muitas canções que se acumularam ao longo dos anos. Dessas, selecionei as que eu sentia que faziam sentido em conjunto e parti pra ideia de um disco”, explica.

“Minimalista” foi produzido de forma independente por Thales com o apoio de Thiago Corrêa e Henrique Matheus (ambos do Transmissor) e promove o encontro da brasilidade do compositor com o formato rock. Thales conta abaixo sobre suas influências, comenta sobre a cena independente brasileira e aprofunda o lado crítico social de suas composições: “Sou totalmente a favor das manifestações”, avisa. Com vocês, Thales Silva.

Em que “Minimalista” difere do processo criativo impresso em “Homens Lentos”, primeiro disco da A Fase Rosa?
O “Homens Lentos” é, antes de qualquer outra diferenciação, um disco de banda e o “Minimalista” é um trabalho solo. Para além dessa diferenciação de uma cabeça pensando tudo no “Minimalista” e quatro outras trabalhando quando fazemos um disco do A Fase Rosa, existe uma diferença essencial de conceito também. No Minimalista eu procurei algo muito enxuto, muito simples, que fosse até simplório por vezes. É um disco onde o foco principal é a canção, depois a voz, para contar e cantar a canção. Os instrumentos foram pensados com cuidado e muito valorizados, mas com papel coadjuvante. Pela A Fase Rosa é natural que a parte instrumental divida um pouco mais o espaço com a canção e com a voz.

Como foi o processo de produção de seu trabalho solo?
Eu tinha muitas canções que se acumularam ao longo dos anos. Dessas selecionei as que eu sentia que faziam sentido em conjunto e parti pra ideia de um disco. Em principio eu gravaria um disco voz e violão, só pra registro. Mas com a possibilidade de gravar nas mãos, decidi que seria melhor que eu empenhasse um tempo de produção em cima das canções e que gravasse com banda. Confiei que mesmo sozinho e sem recursos, eu conseguiria encontrar um resultado no mínimo coeso. Até pelo aprendizado constante que tenho tido pela A Fase Rosa.

Como se deu a parceria com Thiago Correa e Henrique Matheus, ambos do Transmissor?
Estava à procura de um bom estúdio que tivesse soltado sons característicos, cuidadosos e conectados com a atualidade. Conheci os meninos e eles compraram a ideia também. Foram ótimos, talentosos e carinhosos com o som.

Seu trabalho estabelece diálogo entre a velha e na nova guarda da MPB. Quais seriam suas influências musicais?
Gosto de figuras super importantes como Gil, Caetano, Chico, Tom Zé e João Gilberto. Não tenho vontade de desmontar esses ícones. Acho eles geniais e acima de qualquer suspeita (risos). Mas tenho curiosidade pelos lados obscuros da música popular também. Tem algumas coisas do brega que acho muito interessantes, gosto de alguns discos dos anos 90 do Paralamas e alguma coisa da Nação Zumbi. Até mesmo o Rappa. Mas acho que a partir dos anos 2000, com a organização da música independente como um mercado, começaram a chegar até à mim muitas das melhores bandas da música popular brasileira, segundo o meu gosto, claro. Acho que depois dos gênios que citei, artistas como a Céu, Lucas Santanna, Constantina, Dibigode, Berlinda, Karina Buhr (essa muito especial), enfim, vários outros, vieram ocupar um lugar muito especial na música brasileira. Acho que depois das vanguardas tão importantes nos anos 70 e 80, esse pessoal dos 2000 tratou de dar uma nova cara para a MPB.

Já que estamos falando sobre a atual cena independente, recentemente você fez o show de lançamento de “Minimalista” via crowdfunding em parceria com a Váriavel 5, projeto que mobiliza apoiadores de iniciativas culturais com quem você já havia trabalhado anteriormente promovendo um show do A Fase Rosa . Você acredita que esta forma é a “salvação” para artistas independentes?
Entendo como parte das várias ferramentas disponíveis. Acho que a luta empreendedora do artista é primeiro ser um empreendedor, algo que, por bem ou por mal, mexe com o artista. Outra coisa é a necessidade de corrigir distorções próprias do próprio mercado. Acho que o crowdfunding é umas das principais ferramentas para o artista conseguir catalisar as energias no inicio de projetos. Depois de certo estabelecimento eu partiria pra outros caminhos.

Como você enxerga a atual cena musical mineira?
Vejo muito músico bom, bandas excelentes. Vejo também que é o momento de mudanças. Nascimento de novos projetos e cenas, além da consolidação de excelentes projetos ainda regionais. Entendo que a cena musical aqui não é uma e sim são vários nichos diferentes. Como só um se profissionalizou e conseguiu ficar perto de quem faz acontecer, os outros movimentos se enfraqueceram. Sinto que seja hora de todo mundo se organizar e entender a amplidão do meio musical. Talvez fosse até necessário uma grande banda se consolidar nacionalmente pra trazer o olhar de vez pra cá e assim mexer com a coragem e autoestima de quem vem surgindo e crescendo.

Recentemente entrevistei a Jennifer Souza, do Transmissor, e ela também vê com bons olhos a cena mineira. Atualmente iniciativas como o Musiqueria, projeto recém idealizado pelo CCCP (pub mineiro), e o já tradicional Festival Conexão tem colaborado, em termos de exposição, com artistas independentes mineiros, mas isto não tem sido suficiente para fazer com músicos daqui consigam tocar em outras praças. A que se deve esta “resistência”?
Sinto que parte do problema é estético. Os sons daqui parecem bastar aqui dentro. Não temos tradição de música pop dentro do cenário independente de Minas e as tentativas em geral são falhas ou criticadas. Acho que nesse sentido faltam bons produtores. Pessoas que consigam sintetizar e construir estéticas mais vanguardistas e mais conectadas. De outro lado é o natural bairrismo. Existe aqui em BH e vai existir fora. Jornalistas e curadores abraçam seus amigos. Isso aqui em BH e isso lá em SP.

Suas letras tem em essência certo ar crítico social. Como você observa as manifestações populares ocorridas nos últimos tempos no Brasil?
Pra mim é um símbolo fortíssimo de mudança no comportamento nacional. É natural que os partidos, em especial os de Direita, tentassem e conseguissem manipular e enfraquecer o que surgiu. Mas não é possível apagar. Sou totalmente a favor das manifestações e acho que todos os comportamentos ali dentro explicáveis. Falo de alguns tipos de violência e quebra-quebra, dos quais nem sempre consigo justificar. Mas entendo que o limite e o radicalismo talvez sejam essenciais nas mudanças dos processos de quebra do conservadorismo e totalitarismo. Acho absurdo que o governo trate isso como terrorismo quando é muito claro que a intenção ali nada tem a ver com lesar o povo. Mas o embrião está aí. O PT, gostem ou não, deu comida e deu casa. Agora muita gente quer mais. Que tem mais, pois a diferença ainda existe. Os ricos se assustam e protestam seu medo, xenofobia e etc. E surgem também as respostas que também não enxergam mudança e querem mais a qualquer custo. No meio dessa polaridade ficam várias pequenas vitórias do pensamento democrático dessa Esquerda crítica. São ocupações que pipocam e resistem, são movimentos sociais que voltaram a ganhar corpo, movimentos grevistas que resistem mais e mais na luta pelos seus direitos. Enfim, é apenas um embrião e já dá pra ficar satisfeito ao ver as elites mais conservadoras do status tão incomodadas. Que pelo menos os pese a preocupação sobre a cabeça nos travesseiros.

Por fim, a quantas anda o novo disco da A fase Rosa?
O disco sai esse ano. Estamos finalizando a pré gravação. Vamos avaliar algumas coisas e gravar oficialmente em seguida. Sai lá pra outubro.

– Bruno Lisboa (@brunorplisboa) é redator e colunista do pignes.com

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