Faixa a faixa: “Coronal Heating Problem”, de Wolf Gadelha

introdução por Diego Albuquerque
Faixa a faixa por Thiago Gadelha e Alberto Monteiro

Thiago Gadelha é músico de Olinda, Pernambuco. Pela alcunha de Wolf Gadelha e em parceria com Alberto Monteiro (O Rasta), ele está lançando “Coronal Heating Problem” (2024), seu novo álbum com 7 faixas de pura psicodelia. “Coronal Heating Problem”, ou “Problema da Coroa Solar”, é como é chamado o mistério que é o motivo pelo qual a coroa solar revela temperaturas muito mais altas do que a própria superfície do Sol.

O álbum quente foi produzido e gravado nos últimos 7 anos, que remete ao período em que Thiago tinha uma banda com amigos chamada Casillero, com quem lançou o álbum “Dark Swing” em 2016. “E assim que lançamos comecei a escrever algumas ideias para o que seria a continuação do ‘Dark Swing’”, conta o artista. Nesse meio tempo, a banda acabou. Como Thiago já tinha alguns esboços, não quis abandonar a ideia. “Eu já conhecia o Rasta e sabia que era um músico muito talentoso, então arrisquei fazer o convite para mostrar esses esboços, o ano era ainda 2016 e pelo motivo que talvez apenas ele saiba, ele se juntou a mim para fazer este disco”, explica Thiago.

Começou então aquele processo a quatro mãos e vários instrumentos, com trocas de sugestões e ideias entre ambos. “Eu escrevia, mandava para ele, ele ensaiava, escrevia e gravava ideias de bateria, execuções, e mandava para mim; eu ouvia, dava também minhas opiniões e sugestões, e assim foi até que o repertório estivesse pronto”, comenta o músico. Em 2019, o Rasta gravou as baterias no Estúdio Pólvora, no Recife. No meio do processo da gravação dos outros instrumentos, aconteceu a pandemia, que pausou o projeto.

O disco “Coronal Heating Problem” só foi concluído em dezembro de 2023 e conta com a participação do músico olindense Gilú Amaral nas percussões de “Gigantic Sun”. A capa é do artista recifense Athayde e a diagramação foi da designer olindense Luana Allycia. Ao longo das 7 faixas, o álbum apresenta elementos de funk, rock progressivo, psicodelia e afrolatinidades em faixas bem pensadas e maturadas para aquecer o coração e as mentes dos ouvintes. Abaixo, pos dois contam um pouco sobre cada uma das canções do disco (que está disponível nos principais streamings).

01) Sweet on U:
Thiago Gadelha: Essa música fala basicamente sobre expectativa, frustração e ansiedade. Alain Goraguer (especialmente a trilha para o filme “Planeta Fantástico”, de 1973, e os arranjos/climas que ele escreveu para o Serge Gainsbourg) e faixas como “Concept Nothing” e “Dark Light” do primeiro disco do rapper canadense Night Lovell são inspirações para a criação desses arranjos. As notas do chimbal na segunda metade da música, as disposições das pausas denunciam um pouco isso. A forma como o nome da faixa é escrita é por conta da faixa “Damn U”, do Prince.

Alberto Monteiro: O arranjo proposto tinha uma linha mais rock misturada com traços do rap e trap modernos representados em algumas pontuações de hihat, principalmente na segunda parte da música. Tomei o cuidado de manter fiel esses aspectos, mas colocando uma identidade de execução mais fluida, tomando a liberdade de inserir notas de hihat e viradas que estavam fora do script inicial.

02) Gigantic Sun:
Thiago Gadelha: Essa faixa conta com a participação mais do que especial do meu amigo Gilú Amaral, grande percussionista e figura muito importante da música da minha cidade, Olinda. Além de contar com colagens do improviso de flauta de outro amigo meu, Dmitri Ramus. Fico muito feliz em tê-los no disco. “After a certain distance the sun starts to burn more those who are close than those who are closer”.

Alberto Monteiro: Particularmente, gosto muito dessa faixa pela versão final mais fluida que ela tomou com as participações do Gilú nas peles e do Dimitri na flauta. O arranjo dela sempre me pareceu mais sólido e ofereceu uma liberdade maior de imprimir detalhes na forma de executar a linearidade dela, bem como nas viradas, elementos significantes da canção.

03) An Overkill, But Not a Lie:
Thiago Gadelha: Talvez a que mais se aproxima da gênese da ideia “Dark Swing”, primeiro álbum da Casillera, banda que tinha na época que comecei a compor esse som, pensando em lançar com eles. Esse disco nasceu como uma continuação do trabalho que tive com minha banda. O final é funkeado com muitas vozes.

Alberto Monteiro: O melhor groove do disco está aqui! Essa junção do rock “dark swing” com o funk em uma música cheia de ambientes e partes que trazem sensações distintas, encerrando num funk simples, mas cheio de balanço, com muitos vocais, ressalta a importância dessa faixa.

04) Amazing Maze:
Thiago Gadelha: Música curta, quebrando a sequência de várias músicas com mais de 5 minutos. O clima da primeira parte me lembra alguma coisa por volta de Scott Walker, e a segunda parte, acho, aponta para o que será a partir daqui, o conceito do “Dark Swing” decantado, maturado, e curado. E o disco se prepara para a etapa final da mensagem.

Alberto Monteiro: Mais uma vez, referência total do “Dark Swing”, álbum da Casillera. O hihat nessa música toma uma proporção importante na condução do ritmo e na acentuação de alguns ambientes.

05) Umconfortable at Home:
Thiago Gadelha: Quinta música composta para o disco, a ordem do repertório revela a ordem em que as músicas foram escritas. Feita no piano, intervalos curtinhos; tempo composto de 9/4. A bateria dessa música é muito especial, excelente entrega do Rasta.

Alberto Monteiro: A faixa mais desafiadora pela complexidade dos tempos em que os ambientes da música se comunicam entre si. Música em tempo composto sempre é desafiadora, mas não pelo compasso proposto e sim pela forma como essas bases temporais dialogam entre si, sem contar com a liberdade de propor vários detalhes nela, como algumas células de hihat (por muita influência do rap) e o final. Como gosto de um bom desafio, talvez seja a minha faixa preferida!

06) Tidal Disruption:
Thiago Gadelha: A música mais pop do álbum, e também a música que deixa mais escapar (junto com a faixa anterior) a influência exercida no disco por artistas como Warren G, Dr Dre, Mobb Deep, entre outros, mesmo sem conter um rap sequer entre as sete canções.

Alberto Monteiro: A faixa mais direta, objetiva! Alguns dizem que é a que mais se aproxima do conceito “pop”. Os arranjos com muitos vocais me trazem muito da Casillero como referência. Esse final é especialmente inspirado nas big bands, a exemplo do Brian Frasier, atual baterista da The Tennesseee Kids com o Justin Timberlake

07) Very Few Things Matter:
Thiago Gadelha: A minha faixa favorita do álbum desde o momento em que ela foi escrita. A letra é curta e suficiente. Última faixa, finalizando com um solo de bateria do Rasta em um momento cabal do disco.

Alberto Monteiro: Faixa curta com muita coisa sendo mostrada! Importantíssima para o álbum pela complexidade dos tempos entre os ambientes. Faixa que tive uma liberdade maior de interpretação na bateria durante a música toda, mas o final é o período que rouba a cena junto aos sons das teclas e cordas. Meu Top 1 do disco.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.