Entrevista: Emerson Dindo fala sobre a edição 2021 do Diáspora Lab

 entrevista por João Paulo Barreto

Até o dia 13 de outubro de 2021, as inscrições para a terceira edição do Diáspora Lab estão abertas. Valorosa iniciativa da equipe liderada pelo produtor baiano Emerson Dindo que, desde 2018, quando aconteceu a primeira edição, foca no laboratório de desenvolvimento de projetos cinematográficos voltado para profissionais negros do audiovisual. As inscrições podem ser feitas pelo site da Plataforma Diáspora Conecta.

Para participar do laboratório, que será realizado de modo remoto em plataforma digital entre os dias 06 e 18 de dezembro de 2021, os candidatos precisam ser nascidos no Brasil, maiores de 18 anos, negros e negras, além de ter projeto de longa-metragem de ficção ou de documentário em fase de desenvolvimento. Até oito trabalhos serão selecionados para o programa de tutoria e assessoramento.

Na edição desse ano, os participantes do Diáspora Lab terão seus projetos avaliados por uma equipe composta por consultoras internacionais. Um dos projetos receberá do Diáspora Lab o prêmio Miradas Doc, que levará, com todas as despesas pagas, seu autor ou autora para a Espanha, onde participará do AFROLATAM LAB (Fórum de Coprodução África-América Latina), no tradicional Festival Miradasdoc, que acontece em Tenerife, nas Ilhas Canárias.

O diretor executivo da Diáspora Conecta, Emerson Dindo, pontua que, desde a edição do ano passado, a partir da necessidade de se realizar o evento de forma remota, os pontos principais de análise desse novo perfil do evento são infraestrutura e investimento. “Com a pandemia, o fator segurança sanitária também assumiu um lugar prioritário nessa cesta de desafios. Temos um grande dever de casa que está para além da execução das atividades anuais: pensar a Diáspora Conecta agora e no futuro, e em como o nosso conjunto de atividades pode colaborar para construir um mercado mais justo. Em criar espaços onde profissionais negros possam encontrar subsídios para trabalhar os seus projetos com infraestrutura e acolhimento”, explica Dindo.

Sobre a meta do projeto, o produtor traz um foco preciso de organização. “Queremos ser um bom ponto de partida para estes profissionais e suas obras, mas, para isso, precisamos pensar um modelo de plataforma sustentável do ponto de vista financeiro e logístico. Isso é um movimento que tem nos motivado há algum tempo. Os desafios são muitos, mas o desejo de fazer é maior que tudo”, salienta Emerson.

As consultoras trazem em suas trajetórias profissionais longa experiência dentro do audiovisual e, também, na área educacional e acadêmica. Paula Gomes é diretora e roteirista do tocante “Jonas e o Circo Sem Lona”, além de também ter escrito o premiado “Filho de Boi” e produzido o mais recente, “Saudade Fez Morada Aqui Dentro”, projeto em fase de finalização. Ao seu lado no Diáspora Lab está Xenia Rivery, roteirista e professora natural de Cuba, que trabalhou por 13 anos como chefa e coordenadora da Cátedra de Roteiro e do Serviço Internacional de Consultorias da Escuela Internacional de Cine y TV de San Antonio de los Baños, EICTV-Cuba.

Além delas, integra a equipe de consultoras a produtora-executiva Tanya Valette, professora no curso de Cinema da Escuela de Diseño Altos de Chavón, na República Dominicana, tendo já dirigido a conceituada Escuela Internacional de Cine y TV de San Antonio de los Baños, onde foi a primeira graduada da própria escola a ocupar o cargo. Fechando o time, a cineasta moçambicana, Lara Sousa, atualmente diretora do curso de Cinema da Escuela de Diseño y Bellas Artes de Chavón, na República Dominicana.

Ao ser perguntado sobre as obras selecionadas em edições anteriores e que melhor representam o resultado positivo do Diáspora Lab, Dindo brinca. “Não me coloque nesta situação, pois um pai nunca vai escolher um(a) preferido(a). Os projetos que passaram pelas primeiras edições do laboratório estão fazendo um caminho muito bonito e competitivo em suas mais variadas etapas de produção”, comemora Emerson, listando os principais projetos nesse papo abaixo com o Scream & Yell. Confira.

Terceira edição do Diáspora Conecta Lab juntamente com mais um Diáspora Lab. Nestas três edições, desde a primeira em 2018, quais os principais desafios que você como diretor e produtor do evento enfrentou para realizá-lo?
Essa é uma pergunta que eu sempre levo um tempo para responder, embora tenha na ponta da língua os fatores que estão sempre pairando as nossas produções: infraestrutura e investimento. Com a pandemia, obviamente, o fator segurança sanitária também assumiu um lugar prioritário nessa cesta de desafios. Temos um grande dever de casa, que está para além da execução das atividades anuais, que é pensar a Diáspora Conecta agora e no futuro, em como o nosso conjunto de atividades pode colaborar para construir um mercado mais justo, criar espaços onde profissionais negros possam encontrar subsídios para trabalhar os seus projetos com infraestrutura e acolhimento. Queremos ser um bom ponto de partida para estes profissionais e suas obras, mas para isso precisamos pensar um modelo de plataforma sustentável, do ponto de vista financeiro e logístico, e isso é um movimento que tem nos motivado há algum tempo. Os desafios são muitos, mas o desejo de fazer é maior que tudo.

Neste período, quais projetos selecionados em edições anteriores que você pode citar como produções que vieram ou que caminham para uma concretização?
Não me coloque nesta situação, pois um pai nunca vai escolher um(a) preferido(a). Os projetos que passaram pelas primeiras edições do laboratório estão fazendo um caminho muito bonito e competitivo em suas mais variadas etapas de produção. Começo falando de “Açucena” (BA), filme dirigido por Isaac Nonato, com produção de Marília Cunha, e que esteve conosco na primeira edição do Diáspora Lab em 2018. Ele já foi finalizado e teve uma boa estreia na Mostra Tiradentes deste ano, levando o Prêmio do Júri. Também chamo à atenção para ”Solina” (GO), da roteirista e diretora Larissa Fernandes, o projeto é uma história de realismo fantástico e este ano foi selecionado para dois importantes eventos de coprodução internacional: o Cine Mundi BH e o CoPro do BrLab; vale também destacar o projeto “Minha Avó é Nagô” (BA|SE|PE), dirigido por Naymare Azevedo, premiado no Nordeste Lab e que participou do Festival Internacional de Cine de Cartagena de Indias, Colômbia. Na última edição, o Diáspora Lab (2020) cresceu e recebeu um número maior de projetos de todo o Brasil, daí a quantidade de destaque também amplia. Começo falando de Tais Amordivino e o seu projeto “Miraildes Mota, a lendária Formiga” (BA), que conta a trajetória da espetacular e histórica jogadora da seleção brasileira de futebol feminino, Formiga. O documentário, que tem produção de Gabriel Amaral Pires e Cláudia Lima, vai virar uma produção da HBO Brasil. Do outro lado do Atlântico, de Cabo Verde, já em fase de produção, temos o “Nós, povo das Ilhas”, de Elson Santos, o projeto recebeu importantes prêmios como, Blue Ice Docs do Hot Docs Canadian Internacional Documentary Festival e foi selecionado para o Spotlighted Projects do Marché du Film – Festival de Cannes. A lista é grande, mas vou ser um pouco mais sucinto: “A Cor da Margem” (RJ), de Mariana Luiza, foi o projeto selecionado pelo Prêmio Miradas Doc (ESP) do ano passado, voltando de lá com o prêmio do Good Picth Brasil, um programa imersivo para projetos de impacto social; “Um pouco de mim morreu quando você nasceu” (RJ), de Quézia Lopes, levou os prêmios Chavón e Diáspora, que lhes proporcionaram uma imersão na Universidade Chavón, na República Dominicana e o valor de R$ 10 mil Fechando a nossa lista de destaques, cito a linda animação “Ana, en passant” (MG), dirigida por Fernanda Salgado, em estágio avançado de desenvolvimento; “Levante” (BA|MG|SP), de David Aynan, produzido por Jacson Dias, que recebeu o Prêmio Jorge Portugal e foi finalista do edital de desenvolvimento da SPCine e; ”Antes do último voo” (SP), produzido por Marcela Coelho, que foi selecionado para o Afrolatam Lab, do Festival Miradas Doc (ESP).

O formato on-line, que precisou ser utilizado ano passado em decorrência da pandemia, ajudou na realização?
O encontro e tudo que ele pode proporcionar é muito importante para o Diáspora Lab, pois acreditamos que a presença reúne um conjunto de elementos que a virtualidade ainda não contempla. No entanto, não podemos ser alheios ao que nos circunda e a força que o digital deu para o nosso trabalho. Com a edição digital ampliamos o nosso alcance e possibilitamos que pessoas dos mais variados lugares tivessem acesso às atividades do laboratório, diminuindo assim as distâncias, custos e garantindo o acesso que em outro formato talvez não fosse possível. Estamos desenhando os próximos passos da plataforma Diáspora Conecta, mas o ambiente digital certamente nos acompanhará, nos levando para um formato híbrido de existência.

Poderia falar um pouco acerca da parceria com o Miradas Doc, que se repete esse ano? Quais principais atrativos para a/o produtor(a) que participará in loco na Espanha?
Miradas Doc é a forma abreviada e afetiva para se referir ao Festival e Mercado de Cinema Internacional de Documentário Miradas Doc, que acontece anualmente em Tenerife, na Espanha e está na sua 15a edição. Ainda no mundo pré-pandemia, estive no Miradas Doc em 2020, sendo recepcionado nas Ilhas Canárias por Carlos, motorista venezuelano responsável pelo traslado entre o aeroporto e o hotel, que tentava me explicar um pouco sobre o perfil do lugar: as Canárias fica geograficamente na África, politicamente pertence à Europa e culturalmente é mais próximo da América Latina. Levei um tempo pensando sobre isso e como seria a minha experiência por lá e lembrei das falas de Haroldo Borges (Plano 03 Filmes) e de André Araújo (Nordeste Lab) sobre as suas passagens pelas terras vulcânicas: o Miradas Doc tem um festival e um mercado acolhedores, a cidade é pequena, tudo é perto e as pessoas conversam e negociam de uma forma mais horizontal. Em alguma medida, isso fala um pouco da nossa felicidade com a renovação da parceria com o Miradas Doc, através dos seus programas Afrolatam Lab, DocSur, Anidocs e Miradas Afro. Acreditamos que é preciso muito cuidado, competência e generosidade para trabalhar com os projetos que selecionamos e que o intercâmbio entre as pessoas, os territórios e os projetos tem um grande força transformadora. Ao longo de 2020 estivemos com o Miradas Doc algumas vezes e conhecemos um conjunto de projetos incríveis dos mais variados países da América Latina, África e Europa. Tenho muito respeito pelo trabalho desenvolvido pelo David Baute, pela Lara Sousa e toda a equipe do festival e mercado, pois percebo um esforço para que os projetos tenham boas oportunidades e para que os “decisionmaker” encontrem histórias potentes e transformadoras. Este ano teremos conosco dois projetos resultantes nas nossas participações no Afrolatam e DocSur e no Miradas Afro: Baba (Panamá), dirigido por Harry Oglive e produção de Said Isaac e Leite de Tribunal (Cabo Verde), dirigido por Celeste Fortes. No ano passado o Diáspora Lab selecionou o projeto “Nós, povo das ilhas” (Cabo Verde), dirigido por Elson Santos e o Miradas Doc seleciou os projetos “A Cor da Margem” (RJ), dirigido por Mariana Luiza, através do Prêmio Miradas Doc, e “Antes do Último Voo” (SP), produzido por Marcela Coelho, através da chamada aberta. Quem for ao Miradas Doc vai encontrar um evento muito organizado, players de todo os continentes, uma cidade acolhedora, um ventinho frio e boas oportunidades de negociação dos seus projetos.

– João Paulo Barreto é jornalista, crítico de cinema e curador do Festival Panorama Internacional Coisa de Cinema. Membro da Abraccine, colabora para o Jornal A Tarde e assina o blog Película Virtual.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.