Boteco: Mais cinco cervejas da Dádiva (SP)

por Marcelo Costa

Abrindo uma nova sequencia de cervejas da Dádiva, de Várzea Paulista, interior de São Paulo, com a Dádiva 3, receita comemorativa dos três anos da cervejaria, um blend da Dádiva Duo (Belgian Strong Golden Ale com levedura de Chardonnay feita para festejar o segundo aniversário) com uma Imperial Saison maturada por três meses em barricas de carvalho francês. De coloração dourada e turva com creme bege claro de bolhas que estouram rapidamente, mas mantém boa formação, a Dádiva 3 exibe um aroma rústico incrível trazendo notas funky e também doces numa junção de casca de laranja, mel, tangerina, toranja com celeiro, roça, feno e vinho branco. Na boca, funky, frutado e doçura leve no primeiro toque seguido de rusticidade (celeiro) e picância alcoólica (9.2% que se “perdem” em meio a complexidade do conjunto). A textura é funky, mas não tão picante quanto se espera. E, dai pra frente, surge um conjunto fabuloso, com o álcool mostrando um pouco mais do que deve quando o calor chega, mas nada que atrapalhe uma cerveja belíssima. No final, picância, funky, azedinho e curral. No retrogosto, um tiquinho de álcool, doçura, frutado e funky. Delicia.

A segunda Dádiva da série é outra Saison, a Lullaby, produzida em colaboração com o clube de cervejas Clubeer, e na metade de 2017. A singularidade da Dádiva CluBeer Lullaby é a adição de extrato de lavanda, que se junta na receita ao malte de cevada e de centeio além dos flocos de trigo e aveia. De coloração dourada levemente turva com creme que repete a anterior: bege clarinho de bolhas que estouram rapidamente, mas mantém uma boa formação. No nariz, a Dádiva CluBeer Lullaby exibe no aroma a potência da lavanda, que soa excessiva, atropelando tudo que vê pela frente. Com paciência é possível perceber condimentação (algo que remete a cardamomo e pode ser derivado da lavanda) e acidez pinicando o nariz. Na boca, replay do que o aroma adianta: acidez e um balde de lavanda no primeiro toque, que se amplia fortemente na sequencia – com aquele tracinho de cardamomo. A textura é frisante e cremosa com presença discreta dos 5.9% de álcool. Dai pra frente, domínio de lavanda, acidez e carbonatação alta. Não se acerta todas. Se a anterior é incrível, essa é terrível, mas pode soar interessante para quem gosta de lavanda (e só para eles). No final, condimentação e acidez leve. No retrogosto, lavanda, doçura e condimentação leve.

A terceira da Dádiva é a versão 2016 da sazonal Saison Printemps da casa, que nesta edição recebeu adição de damasco e condimentos na receita. De coloração dourada levemente turva e creme branco de boa formação e retenção, a Dádiva Saison Printemps 2016 exibe um aroma que traz doçura frutada, damasco e frutas amarelas além de condimentação e percepção de acidez (característica do estilo). Na boca, uma característica bacana das receitas da Dádiva, replay do que o aroma anuncia, com doçura frutada remetendo a geleia e damasco chegando junto no primeiro toque, e leve condimentação na sequencia. A acidez é bem leve, sugerindo amaciamento pela fruta, que marca bastante presença. A textura sobre a língua é levemente efervescente e picante (como o estilo manda) e, dai pra frente, segue-se um conjunto bacana, não tão rustico, e mais aconchegado, ainda que Saison. No final, azedinho e damasco. No retrogosto, um pouco de damasco, doçura e azedume. Tá inteirinha ainda!

Já a Dádiva Saison Printemps 2017, que nesta edição recebeu adição de pêssego e condimentos na receita além de passar por uma refermentação na garrafa com levedura Brettanomyces, soou bem mais tímida que a versão anterior. De coloração dourada e creme branco de boa formação e retenção, a Dádiva Saison Printemps 2017 exibe um aroma menos vistoso que a anterior, com leve funk derivado da levedura, doçura maltada também leve, assim como o frutado – a condimentação não dá as caras num primeiro momento. Na boca, um leve funky com sugestão de vinho branco no primeiro toque, que ainda traz condimentação suave, um discreto amadeirado e o rustico (ainda que sutil) do estilo. A textura sobre a língua é levemente frisante e picante (como o estilo manda, parte 2). Dai pra frente, uma cerveja que traz características de uma Saison e também de uma Blond belga, não aprofundando o primeiro estilo, sua característica principal, ainda que ela até traga mais características do que a versão 2016, mas está tudo tão mais sútil que a rusticidade do conjunto da 2016 se sobressai. No final, roça, pêssego e Bretta. No retrogosto mais roça, um pouco de Bretta, de pêssego e até sugestão de madeira. Boa, mas a 2016 soou melhor.

Fechando o quinteto da Dádiva com a versão 2016 da Odonata, a belíssima Russian Imperial Stout da casa, que aqui surge num blend das três especialíssimas versões lançadas em 2016 (relembrando: a #3, a #4 e a #5) com café, frutas vermelhas e baunilha. De coloração marrom bem escura, praticamente preta, com creme bege escuro de média formação e retenção, a Dádiva Odonata 2016 exibe um aroma com notas frutadas que rementem a jabuticaba, ameixa e frutas vermelhas. Ainda é possível perceber rum, alcaçuz e baunilha mais sútil. Na boca, jabuticaba, baunilha sutil e rum no primeiro toque. Logo depois, um calorzinho alcoólico ( 12%) delicioso, doçura baixa e frutas vermelhas – nada de amargor. A textura sobre a língua começa sedosa e vai ficando pegajosa, licorosa, mas o álcool surpreende e surge marcante, mas não de maneira a incomodar. Dai em diante, um conjunto que parece não chegar ao brilho do trio separado, mas, ainda assim, é incrível. O café só aparece no final, junto com jabuticaba. No retrogosto, baunilha, alcaçuz, jabuticaba, rum e café. Delicia.

Balanço
Abrindo uma série de uma das minhas cervejarias favoritas na atualidade com uma cerveja excepcional: Dádiva 3, que equilibra funky, roça, doçura e frutado (mais álcool muito bem escondido). Quero mais! Por sua vez, a Dádiva Lullaby me soou o contrário da 3: se a anterior é incrível, essa é terrível, mas pode soar interessante para quem gosta de lavanda (e só para eles). Agora duas safradas: a primeira Dádiva Saison Printemps é a 2016, com damasco, e permanece inteirinha e saborosa, ainda que mais comportada. Porém, a 2017 soou ainda mais estranhamente comportada. Na “briga” das duas, venceu a 2016. Fechando o quinteto, a Dádiva Odonata 2016 perde para as três cervejas que, blendadas, a resulta, mas ainda assim é uma cerveja especialíssima. Da-lhe jabuticaba. <3

Dádiva 3
– Produto: Belgian Strong Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 9,2%
– Nota: 4,25/5

Dádiva CluBeer Lullaby Saison com Lavanda
– Produto: Farmhouse Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5,9%
– Nota: 2,56/5

Dádiva Saison Printemps 2016
– Produto: Farmhouse Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5,9%
– Nota: 3,42/5

Dádiva Saison Printemps 2017
– Produto: Farmhouse Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5,9%
– Nota: 3,25/5

Dádiva Odonata 2016
– Produto: Russian Imperial Stout
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 12%
– Nota: 4,19/5

Leia também
– Top 2001 Cervejas, por Marcelo Costa (aqui)
– Leia sobre outras cervejas (aqui)

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