Três comédias românticas de 2023: “Amor à Primeira Vista”, “Felicidade para Principiantes” e “Amor ao Primeiro Beijo”

textos por Marcelo Costa

“Amor à Primeira Vista”, de Vanessa Caswill (2023)
Uma garota perde um voo para um casamento em Londres que ela não pode perder. Encaixada no voo seguinte, ela precisa matar tempo no aeroporto, momento em que seu olhar se cruza com o de um garoto que também está indo para Londres… e eles vão se apaixonar, adianta a narradora. Daí em diante, Jameela Jamil (perfeita como narradora… e coadjuvante) irá elencar uma porção de coisas que, talvez, você reconhecerá como sendo do livro “Ensaios de Amor” (1993), de Alain de Botton, o que surpreenderá o espectador, porque “Love at First Sight” (título original), comédia romântica disponível na Netflix com roteiro de Katie Lovejoy, é inspirada em “The Statistical Probability of Love at First Sight” (2011), romance de Jennifer E. Smith, e passada a surpresa e o susto inicial das similaridades entre as obras, a sensação que ficará é de que a análise de Botton sobre o processo de como as pessoas se apaixonam e depois se desiludem poderia render um filme muito mais… interessante, mas… foco em “Amor à Primeira Vista”: a garota é Hadley (Haley Lu Richardson, que quebrou a cara num romance na segunda temporada de “White Lotus”) e o garoto é Ben (Oliver Jones, o Roger Taylor de “Bohemian Rhapsody”) e eles flertaram sobre o Oceano Atlântico (desculpe, Alain, mas você gastou muito tempo filosofando as possibilidades de duas pessoas sentarem próximas num voo: nas comédias românticas isso se resolve de maneira bem mais simples), esqueceram de trocar contatos (quem nunca?), mas, entre um casamento e um funeral (estamos em tempo de vacas magras, Andie MacDowell), terão várias oportunidades para testar a força do amor à primeira vista numa comédia romântica fofinha, um pouco brega (te colocam em cada uma, William Shakespeare) e um tantinho óbvia, mas que poderá arrancar lágrimas de jovens sonhadores(as), se essa categoria de público existir em 2023. Para assistir sem compromisso… e depois ir atrás de Charles Dickens (e Alain de Botton).

Nota: 6

“Felicidade para Principiantes”, de Vicky Wight (2023)
Helen Carpenter (Ellie Kemper), uma (amarga) mulher de 40 anos, acabou de se divorciar do marido (mala) e quer recuperar o tempo perdido (e o bom humor) fazendo coisas que nunca fez na vida… como, por exemplo, percorrer a famosa Trilha dos Apalaches. O percurso inteiro tem cerca de 3.500 quilômetros, mas Helen se inscreveu num grupo de trecking que percorrerá, durante alguns dias, aproximadamente 80 quilômetros, dormindo na relva e aprendendo coisas sobre primeiros socorros. Assim que ela encontra o pequeno grupo descobre: 1) Que ela é a pessoa mais velha da turma; 2) Que, talvez, ela poderia ser mãe do jovem e destemido instrutor do grupo, Beckett (Benjamin Cook); 3) Que Jake (Luke Grimes), o melhor amigo de seu irmão mais novo, também se inscreveu para percorrer a trilha; Ops, a gente não tinha falado do amigo do irmão, né. Bem, o cara é apaixonado por ela – isso fica claro em uma passagem rápida anterior – e, como você já deve imaginar, a trilha irá aproximar os pombinhos e… felizes para sempre. Certo? Mais ou menos. Inspirado no livro de mesmo nome lançado em 2015 por Katherine Center, “Happiness for Beginners” carece de paixão, simpatia, carisma, alma e inventividade. Ok, todos sabemos que uma das características das comédias românticas é sua obviedade (você olha o poster ou vê noventa segundos do filme e já sabe que fulana vai ficar com sicrano), mas “Felicidade para Principiantes” abusa do artificio sem se aproveitar de um de seus maiores trunfos: a fotografia de Daniel Vecchione não valoriza o potencial de beleza da trilha, e o resultado é um daqueles filmes para se ver correndo na esteira, passando roupa ou lavando louça, pois talvez a concentração em outra tarefa faça com que a mente passe ilesa pelos deslizes de um filme que não traz felicidade.

Nota: 4

“Amor ao Primeiro Beijo”, de Alauda Ruíz de Azúa (2023)
Não se assuste com o título brega nacional: “Eres Tú” (no original), segundo filme da diretora espanhola Alauda Ruíz de Azúa, é uma surpresa bastante agradável, mérito também do roteiro assinado por Cristóbal Garrido e Adolfo Valor e do bom trabalho do elenco. Na trama, Javier (Álvaro Cervantes), um editor de livros prestes a falir está no balcão de um bar pronto para terminar um relacionamento quando uma ex faz o serviço para ele, revelando um método que ele segue à risca: levar a moça para o mesmo bar lotado, não tocar nas nozes, pagar a conta adiantado e terminar dizendo que sabe que a história deles não iria dar certo. Isso acontece porque Javier descobriu, aos 16 anos, que conseguia ver o futuro de seu relacionamento logo no primeiro beijo. É simples: as bocas se tocam, um filmezinho passa pela cabeça de Javier, ele vê como o futuro será desastroso e o namoro está condenado para todo o sempre. Esse “dom” faz com que nosso pobre amigo não consiga manter nenhum relacionamento na vida adulta, mas o destino, sempre ele, aplica-lhe uma peça: em uma balada com a mulher de seu melhor amigo, Lucia (Silvia Alonso), e uma amiga que ela estava tentando “arranjar” para ele, Javier beija Lucia (numa cena muito bem construída) e descobre que ela, a mulher de seu melhor amigo, é a mulher de sua vida. Já está prevendo a confusão? Sim, preveja, mas saiba que se outras comédias românticas esbanjam obviedade, sobra inteligência em “Amor ao Primeiro Beijo”. Não que Cristóbal e Adolfo, a dupla de roteiristas, estejam inventando a roda, mas, ao menos, eles sabem brincar com a imaginação do público, deixando a história fluir de maneira agradável e esperta lançando fumaça pelo caminho para, depois, surpreender o espectador com algo que estava debaixo do nariz dele. Para ver, se deliciar e testar: quantos relacionamentos você teria terminado antecipadamente se, no primeiro beijo, soubesse que tudo daria errado no futuro? Quantos?

Nota: 7.5

– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.

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