Cinema: Keanu Reeves cumpre (novamente) a promessa de entregar ação e frenesi em “John Wick IV – Baba Yaga”

texto por João Paulo Barreto

Nos três textos apresentados por este escriba nos últimos quatro anos e que tinham algum dos trabalhos de Keanu Reeves como pauta, foi citada a maneira como o ator traz uma energia palpável e oriunda de seu próprio entusiasmo para seus projetos focados em espetáculos visuais de ação. Sejam projetos cinematográficos ou aqueles voltados para quadrinhos com potencial de se tornarem filmes, a paixão do astro em tornar aquela simples leitura, ou as mais de duas horas de pancadaria, violência gráfica e ação frenética em um exercício de estilo visual calcado no regozijo de sua audiência, é sempre um esforço crível existente na construção dos filmes e/ou graphic novels que trazem seu nome no topo. Foi o caso de “John Wick: Parabellum”, produção lançada em maio de 2019; do excelente retorno à Matrix com sua quarta parte, o subestimado “Ressurections”, lançado em 2021; e de “BRZRKR”, revista em quadrinhos co-escrita pelo ator e lançada no ano passado, dois destes trabalhos analisados aqui no Scream & Yell.

Assim, voltar a visitar e a falar de seu segundo personagem mais marcante (Neo, na quadrilogia das irmãs Wachowski, ainda ocupa o trono), é um exercício revigorante de análise desse cinema estiloso de ação que representa a franquia “John Wick” e do modo ímpar de entrega de seu ator principal. Aqui, a trajetória errática do atormentado matador e sua busca por vingança contra aqueles que, em uma atitude de consequências em bola de neve, mataram seu cachorro, tentaram matá-lo e o trouxeram de volta a um mundo do qual ele queria distância, alcança, nessa quarta parte, um patamar de frenesi que, apesar de ficar abaixo do que vimos em “Parabellum” (o melhor dos quatro filmes da franquia), dá ao público cativo desse tipo de sessão a recompensa diante do investimento de quase três horas dentro da sala escura observando membros decepados, pancadaria e, claro, muitos, mas muitos tiros.

Já conhecendo mais profundamente as engrenagens da Alta Cúpula, organização criminosa que tem, em Nova York, o Hotel Continental como sede, além das regras rígidas e seculares da mesma, bem como os tentáculos do grupo que se alastram em âmbito mundial, o novo filme da franquia, batizado de “Baba Yaga” (uma referência ao termo que designa o bicho-papão na cultura eslava), apresenta outros elementos deste universo. Dentre eles, a figura de um mediador para tempos de guerra (Clancy Brown), juntamente à estrutura hierárquica daquele universo que, no seu topo, encontra na figura de Bill Skarsgård a exata descrição do burocrata frouxo a se vender de brabo, mas que fica atrás da mesa com algo a mais na mão.

Assim, mesmo com todos esses novos elementos, a quarta parte da saga foca, claro, nos embates que o anti-herói (que não usa capa, mas um terno à prova de balas) tem que travar para seguir em frente na sua busca pela blindagem dentro da Alta Cúpula. É inevitável perceber, no entanto, que o filme cria uma série de obstáculos para seu protagonista avançar nesse caminho violento, construindo uma estrutura de vídeo-game na qual, a cada sequência de tiros e pancadaria, Wick parece seguir mais forte para a “próxima fase”, sendo que, cada uma delas, representa um desafio mais árduo dentro daquela rota suicida.

Funcionando como um exercício de estilo referencial ao cinema oriental, principalmente de Senjun Suzuki e John Woo, “Baba Yaga” traz, claro, uma sequência que homenageia à altura tais cineastas ao colocar Hiroyuki Sanada e Donnie Yen, dois dos rostos orientais mais familiares do cinema atual, em um confronto em plena Tóquio moderna. Além disso, ao seguir para o além mar, deixando Nova York como destaque apenas para a fabulosa parte três, “Capítulo 4” ambienta suas sequências dentro de aspectos de cada país por onde John Wick passa de maneira a marcar cada uma de modo único.

Deste modo, quando vemos o anti-herói lutar contra um chefão brutamontes do crime russo dentro de uma casa noturna em Moscou onde, em meio às luzes frenéticas e música às alturas, na melhor representação do estilo visual daquele cinema, seus frequentadores não notam todo caos que os cerca; ou mesmo quando as ruas que levam ao Arco do Triunfo na avenida Champa Elysées servem como cenário de guerra entre Wick e um exército contratado para matá-lo, e o trânsito mal parece se abalar diante daquele show de horrores e chumbo, bom, são construções de cenas assim que definem a proposta absurdamente cativante da franquia.

Em seu encerramento, quando a famosa escadaria com mais de duzentos degraus que levam à Basílica parisiense de Sacré-Cœur serve como a final (e literal) escalada insana de violência do vingativo e atormentado homem, percebemos como a meta de alcançar e ultrapassar níveis absurdos de brutalidade foi batida com esmero.

– João Paulo Barreto é jornalista, crítico de cinema e curador do Festival Panorama Internacional Coisa de Cinema. Membro da Abraccine, colabora para o Jornal A Tarde e assina o blog Película Virtual

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