Ao vivo: Em um Morumbi lotado, Coldplay faz um primeiro tempo matador, mas quase deixa a vitória escapar no finalzinho

texto por Marcelo Costa
fotos por Fernando Yokota

Se lá em 2000/2001, quando “Yellow” escalou as paradas apresentando o Coldplay para as massas, alguém dissesse que 20 anos depois eles seriam uma das maiores bandas do mundo, pouca gente acreditaria. Eles eram uma banda calminha, quase fofolk, e cá estamos nós presentes diante de um feito surpreendente: uma banda inglesa praticamente morando no Brasil durante um mês, alugando o estádio de um grande time por uma semana na capital paulista e esgotando mais de 430 mil ingressos para seis shows em São Paulo, cerca de 70 mil por apresentação. Sorriam, detratores, o Coldplay chegou lá.

Engana-se, porém, quem acredite que foi uma caminhada a esmo rumo ao sucesso. A calmaria dos primeiros discos foi cedendo espaço para um pop musculoso e grandiloquente com Chris Martin estudando todos os detalhes da postura de Bono e das turnês revolucionárias do U2 nos anos 90, e aplicando tudo numa versão mais pop, dançante e visual do seu grupo (quando não convocando até Brian Eno para dar umas dicas). Chris é o mestre de cerimônias e, assim como Bono, poderia ter saído em carreira solo e se dado muito bem, mas a confiança depositada pelos outros três membros mantém as duas bandas unidas até a eternidade.

A grande diferença entre U2 e Coldplay é que os irlandeses revolucionaram a música pop ao menos duas vezes (com “Joshua Tree” e “Acthung Baby”, 1987/1991) lançando hits e bons álbuns enquanto os ingleses fizeram bem a passagem do pop rock romântico dos primeiros quatro discos para o pop dançante pós “Mylo Xyloto” (2011), mas não conseguiram manter o mesmo pique com “Music of the Spheres”, o terrível disco lançado em 2021 que é a cruz e a espada dessa nova tour: quando a banda engata dois ou três sucessos de discos anteriores juntos o show incendeia, mas basta tocar duas canções novas pra tudo quase desabar (serão sete na noite)…

Diante de um Morumbi lotado, na abertura da turnê brasileira, Chris Martin e companhia fizeram um primeiro tempo primoroso, o suco do mais puro futebol pop arte, com projeções, canhões de serpentina, lasers, pulseiras coloridas, fogos de artificio, transmissão nítida via telões e som cristalino e impecável saindo pelas caixas – obrigado novamente U2 pelos ensinamentos deixados pelo caminho. A pop progressiva “Higher Power”, que abre “Music of the Spheres”, abriu o show de forma intensa conectada a “Adventure of a Lifetime” (single de “A Head Full of Dreams”, de 2015) com boa resposta do público – o set foi praticamente idêntico aos dos demais shows na América Latina, com as diferenças marcadas pelas participações locais.

O primeiro grande momento de histeria veio com “Paradise” (de “Mylo Xyloto”, de 2011), que também mostrou o domínio que Chris tem da audiência, conseguindo silenciar 70 mil pessoas enquanto modulava as vozes de cada lado do estádio. Bonito e impressionante. O coro aumentou em “The Scientist”, hit de “A Rush of Blood to the Head” (2002), bom disco que um Coldplay, em dúvida, chega a soar em alguns momentos como um Echo and The Bunnymen antes de trilhar o caminho U2. Chris se comunica em bom português, expediente que ele irá repetir várias vezes na noite: “A gente está muito feliz de estar aqui com vocês. Obrigado pelo esforço de estar aqui hoje mesmo com a chuva, o transito e todos os outros problemas”…

O telão, então, traz imagens filmadas antes e manipuladas por edição. Quando o corte é feito, a banda já aparece no palquinho b, no final da área vip, sob garoa. Os quatro integrantes se olham, riem e partem para um set arrasador que abre com a festejadíssima “Viva La Vida” e soma “Hymn for the Weekend” e “Let Somebody Go”, que Chris toca sozinho ao piano ao lado de uma fã debaixo da garoa: “Eu amo a chuva”, ele repete algumas vezes. De volta ao palco principal, “In My Place” testa a garganta dos fãs, e quem aguentou cantar até o fim tem mais um teste pela frente: “Yellow”, o primeiro hit, surge para delírio geral com Chris ao violão e Jonny Buckland arrasando no riff, mas a segunda parte da canção, sustentada apenas pelo baixo de Guy Berryman, já destaca certo cansaço da voz de Chris, e uma falta de pique instrumental que irá contaminar o restante da noite.

“Human Heart” (cantada em dueto com uma boneca com direito a Chris fechando os olhinhos emocionado de uma maneira tão piegas) e “People of the Pride”, duas do disco novo, são aquele momento de ir para o bar, o banheiro ou de ficar olhando os fogos, as explosões de confete ou os lasers, já que as canções são fracas e esquecíveis, mas calma, porque piora. Antes, felizmente, vem “Clocks”, que reacende a audiência… por pouco tempo. “Infinity Sign”, “Something Just Like This” e “Midnight” são testes de paciência, com os integrantes vestindo grandes capacetes com cabeças de extraterrestres num momento psicodélico. Zzzzz. “My Universe”, a colaboração com o BTS, é ovacionada assim que começa, mas logo a audiência entra no marasmo da canção.

Deixando a apatia de lado, Chris pede para que os fãs esqueçam os celulares “por apenas quatro minutos”, e consegue cerca de 90% de adesão do público, que vibra, dança, pula e canta “A Sky Full of Stars” (com serpentinas em formato de estrela cobrindo a audiência). No palco C, montado na pista tradicional do estádio, ou seja, fora da área vip (uma bela sacada), o quarteto recebe dois artistas brasileiros: Cris Botarelli, do Far From Alaska, sola sua steel guitar em “Sparks”, do primeiro disco, “Parachutes”. E, para surpresa de todos, Seu Jorge chega com uma flauta e canta “A Amiga da Minha Mulher” ao lado de um Coldplay sambista. Na semana passada teve Evan Dando, do Lemonheads, cantando “Romaria”. O que as próximas semanas nos reservam, gente?

De volta ao palco principal, o quarteto parte para o final do show com “Humankind”, aquela outra canção que é melhor que “Yesterday” num mundo sem Beatles (bela piada desse filme) e mais uma faixa terrível de “Music of the Spheres”, “Biutyful”, que coloca ponto final na noite. Após um primeiro tempo primoroso, em que o quarteto mostrou entrosamento e que sabe jogar boa música pop quando quer, a sensação é de que o time começou a fazer muitas firulas na volta do vestiário e, por muito pouco, mas muito pouco mesmo, não perdeu o jogo no final. Pode se alegar a tensão do primeiro show, mas, pelo jeito, os próximos jogos serão um repeteco desse, com poucas jogadas diferentes.

Agora sério (não que não fosse antes): é extremamente valorosa a defesa de material novo frente aos hits de sempre, mas também é preciso reconhecer quando as músicas são fracas só funcionando ao vivo porque estão conectadas a uma parafernália tecnológica que acaba se sobrepondo ao som… e cansando. É preciso vender camisetas, canecas e tudo mais, mas, no caso da “Music of the Spheres World Tour”, sete músicas de um álbum mediano (sendo bondoso) talvez seja demais para um mesmo show – quatro já mudaria a espinha dorsal da apresentação, deixando espaço para que três faixas encorpassem mais a noite (escolho “God Put a Smile Upon Your Face” e deixo as outras duas para vocês, ok). Não vai mudar nada, claro, é só mais um exercício de “se”…

O que nos leva de volta ao segundo parágrafo: se Chris estudou direitinho os passos de Bono rumo ao estrelato, faltou alguém que mostrasse a ele as aulas de Paul McCartney, principalmente aquela sobre montar um set list, que, segundo o velho Macca, precisa sempre ter o formato de um W: começa lá em cima, acalma, volta lá em cima no meio, acalma, e termina mandando todo mundo pra casa lá em cima, no maior astral. A “Music of the Spheres World Tour” é visualmente impecável (crianças de 4 anos aprendendo sobre planetas iriam pirar nesse show), mas a música, aquela maldita coisa que deveria mover tudo, parece tropeçar diante de uma multidão. Nada que desanime os 350 mil fãs que esperam ansiosamente pelas próximas cinco apresentações no Morumbi. Mas que poderia ser muito melhor, poderia.

– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.
Fernando Yokota é fotógrafo de shows e de rua. Conheça seu trabalho: instagram.com/fernandoyokota/

36 thoughts on “Ao vivo: Em um Morumbi lotado, Coldplay faz um primeiro tempo matador, mas quase deixa a vitória escapar no finalzinho

  1. Depois do último álbum/turnê isso já era previsto. Impossível manter o nível de um dos melhores shows já vistos “A head full of dreams”.

    Setlist sem A head full of dreams e Every teadrop is a waterfall é bem decepcionante mesmo…

    Quando vi que essas não tocaram e teve Seo Jorge tocando, fiquei feliz em não ter ido.

    Prefiro ficar com a memória daquele 7/10/17 no Allianz Parque onde fui no melhor show da vida.

  2. Desnecessária as críticas sobre escolha das canções e comparações. A banda é a melhor do mundo nesse momento. Respeite e deixe o show por conta deles, deixe seu show e críticas para você que é tão entendido em músicas e bandas.

    1. Vc não entende nada
      Eles estão sem criatividade para fazer música boa
      O público só se inflama com as músicas antigas
      Economizei 800 cruzeiros

      1. Público bradileiros “casa lotada” Cris é banda,ainda mostram respeito é simpática,mas mundialmente as música se tornaram um …tudo igual,onde k pop,tomou lugar,estar caindo também.Mas foi show,show.

    2. Dado que ele é fotógrafo de bandas, não entendi a autoridade para toda essa dissertação a respeito do show, musicalmente falando. Cada um na sua área né!?

      1. Tô lendo os comentários e rindo da falta de dissernimento de alguns de vocês! Está lá em cima, logo no começo, “texto por Marcelo Costa”. Por que é que vocês estão malhando o fotógrafo? Quer responder, aprende a ler e responder certo! Assim você não passa nenhuma credibilidade e dá a entender que todo fã do Coldplay é idiota. Fica a dica!

    3. Concordo! O show foi perfeito do começo ao fim! Eu parei de ler na hora que ele escreveu um “zzzz”. Bem desnecessário.

    1. Cara você não entende nada de Coldplay, se entendesse o motivo pelo qual a Vanda faz tanto sucesso não viria aqui questionar só porque eles não tocaram sua música favorita então cai fora

    2. Todas as colocações são desnecessárias e ridículas! Assisti o Show de sábado, foi literalmente ESPETÁCULO! O Brasileiro precisa aprender muito ainda…. principalmente p que significa HUMILDADE!

  3. Quem escreveu é tão sagaz! Poderia me dar uma dica, por gentileza?
    Comprei um ingresso por R$840,00 (cad. sup.)para o Allianz que trocaram por arquibancada de R$250,00 no Morumbi . Será que posso exigir: ‘quero ficar num lugar compatível com o valor que paguei!’ Gostaria muito de ficar mais perto da banda. . . Não custa ‘brigar’ um pouco por isso ✨✨

  4. Que show abençoado
    Foi muito emocionante tocou profundamente meu coração ❤️
    Uma sensação indescritível
    Que Deus os abençoe sempre com muita saúde para que eles possam levar a emoção para o mundo e fazer um mundo melhor com muito amor

    1. Fernando, obviamente vc não gosta da banda, até aí tudo bem, mas sua crítica medíocre chega nem perto diminuir o que realmente foi.

  5. Eu adoro este album novo, a música Biutyful é linda, a mensagem que passa é maravilhosa com a Moon. Something just like this é uma das minhas preferidas, fico encantada com a versão do coral das crianças Ucranianas cantando.

  6. Show maravilhoso! Indescritível a performance do Chris e banda. Agora a troca de ingressos Allianz x Morumbi foi abusiva e a maior enganação que vivenciei em Shows. Deu overbooking, comprei cadeira e fiquei numa arquibancada em pé. Com muita discussão para garantir um espaço, pois não havia assentos suficientes para a multidão de pessoas e quem estava sentado, não queria ninguém à sua frente, um show do horror. De fato, não entendi o que fizeram…

  7. Amo esta banda! Mas misturar rock com .samba não rola. Odeio samba não tem nada haver seu Jorge no palco .mas amo Coldplay.

  8. Realmente nada a ver essa comparação com o U2. O Cris é definitivamente sensacional. A banda arrasa. Pena que não pude comparecer. Enfim, tenho uma opinião um pouco diferente do te a presença de Seu Jorge no palco. Independente de ser samba ou não, ele é um excelente cantor e foi um tapa na cara do povo que fez aquela maldade com ele ano passado por puro preconceito de cor, raça. Gente o sangue negro corre nas veias de 90% do brasileiros. Me senti honrada por ele. Cris Martin é literalmente uma das pessoas mais antenadas e inteligentes que já vi neste meio artístico. Então fica a dica, se não gosta, não vai, não menospreza, apenas concentre naquilo que deve lhe interessar e deixa prá quem realmente gosta falar, pensar e curtir.

  9. Cai fora fotógrafo, “quem não tem a manhas não se mete não “.
    Vai cuidar das suas fotos….

    1. Comentei pra um e vou comentar pro outro: Tô lendo os comentários e rindo da falta de dissernimento de alguns de vocês! Está lá em cima, logo no começo, “texto por Marcelo Costa”. Por que é que vocês estão malhando o fotógrafo? Coitado! Quer responder, aprende a ler e responde certo! Assim você não passa nenhuma credibilidade e dá a entender que todo fã do Coldplay é idiota. Fica a dica!

  10. Acho estranho os Fãs de uma Banda que parece Pregar tanto amor ficarem odiando tanto o dono do Texto só por causa de não ter escrito o que eles queriam ler. Ele não pode ter a opinião dele? Estranho tanto “Amor”.

  11. Preguiça de ler essa crítica…..o show foi maravilhoso se pudesse iria todos os dias…experiência maravilhosa.
    Com certeza estarei presente em outra oportunidade.
    Marcelo Costa…não seja despeitado.

  12. De quem mesmo esse cara está falando gente, acho que ele errou de show e de artista , não é possível

  13. Fã de qualquer artista é uma coisa engraçada porque eles defendem cegamente o que eles amam. O cara elogiou o show no texto e só disse que poderia ser melhor e o povo tá todo se descabelando aqui. rsrs

  14. Verdade seja dita, o ultimo disco que presta lançado pelo Coldplay é o “A rush of blood the head” nos longínquos 2002..

  15. Senhor Marcelo Costa, crítico ou pessoa que só quer criticar? Acho que é isso, só viu defeitos…..
    Fui ao show 14/03 e confesso que além dos muitos sucessos da banda, fiquei feliz e aliás,todos que lá estavam, com as novas canções da banda, mesmo não conhecendo me agradaram muito!!
    Logo as cantarola-ei também, tenho certeza.
    E todos curtiram e aplaudiram também.
    Um show maravilhoso, posso dizer impecável, vivemos alí muita emoção, um clima de festa e alegria.
    Se você não viu nem sentiu nada disso, posso lhe dizer: o azar foi seu!!!

  16. Qual é a parada com o fotógrafo? O Marcelo Costa é o cara, manja muito de música, sou fã incondicional!
    Concordo 200% com o texto. E mais, tem gente que vem fazer comentários ofensivos, e mal sabe interpretar texto!

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