Boteco: 10 cervejas nacionais

por Marcelo Costa

Abrindo mais um passeio por duas cervejas de cada cervejaria com a St. Patricks Beer, uma cigana interiorana que produz suas cervejas no Brew Center, em Ipeúna, e comparece desta vez com a Acid Trip, uma sour com adição de 10 frutas: cajá, caju, graviola, jabuticaba, manga, maracujá, melancia, morango, pitanga e umbu. De coloração amarelo avermelhada alaranjada e creme branco meio bege claro de média formação e retenção, a St. Patricks Acid Trip destaca na paleta aromática um perfil bem frutado, com alternância de destaques entre pitanga, cajá, caju e melancia. Há leve sugestão de acidez e azedinho. Na boca, suquinho de frutas azedinho no primeiro toque que se abre em remissões a caju, cajá, pitanga, melancia e, levemente, morango. Não há sensação de amargor, mas a acidez é moderada. Já a textura é levemente acética e com discreta adstringência. Dai pra frente, um delicioso suquinho alcoólico, com 4% de ABV e muitas frutas. No final, frutas e leve adstringência. No retrogosto, refrescancia.

A segunda da St. Patricks Beer é a Irish Car Bomb, uma Russian Imperial Stout com cacau e baunilha envelhecida em barricas antes usadas para maturar uísque escocês, receita inspirada no drink escocês de mesmo nome. De coloração marrom bastante escura e creme bege de boa formação e media alta retenção, a St. Patricks Irish Car Bomb apresenta um aroma que combina amadeirado, (12% de) álcool, uísque e chocolate meio amargo. Na boca, o primeiro toque traz o chocolate amaciado pela baunilha, o que diminui a percepção da barrica tanto quanto da potência alcoólica. O amargor é uma pancada de 70 IBUs que surge embebida em álcool. A textura é sedosa e com o álcool pinicando e dançando sobre a língua. Dai pra frente, principalmente quando aquece, o álcool dá as caras, mas é um conjunto bastante agradável, com o chocolate aumentando a presença, a baunilha amaciando, e a madeira e o uísque tacando fogo no parquinho. No final, chocolate e baunilha. No retrogosto, chocolate, álcool e uísque.

Do interior de São Paulo para Campo Bom, no Rio Grande do Sul, com outras duas Barbarellas Fruit Beer a passar por aqui (depois de framboesa e morango). A primeira delas é a versão que recebe suco de uva na receita, e exibe uma coloração vermelha roseada intensa, com creme branco avermelhado de ótima formação e alta retenção. No nariz, percepção intensa de doçura (remetendo a açúcar), sugestão de refresco de uva e, ainda, leve acidez, além das notas tradicionais da marca: Ki-Suco e doces infantis (manja Dipnlik?). Na boca, doçura marcante no primeiro toque abrindo caminho para um frutado artificial que lembra tanto uva quanto morango. Não há sensação de amargor, muito pelo contrário, a doçura é intensa, e a textura é leve (permitindo, sobre a língua, identificar com mais facilidade a receita base e o suco artificial). Dai pra frente, uma Fruit Beer que fica bonita na taça, mas que parece mais um refresco blendado com cerveja do que uma cerveja com adição de frutas. No final, uva artificial. No retrogosto, refresco de uva.

A outra Barbarella Fruit Beer recebe adição de suco de maracujá, e soa a mais interessante das quatro que passaram aqui – ainda que, como nas demais, o suco pareça excessivo e, em muitos momentos, se sobressai sobre a cerveja, com a vantagem aqui de não soar tão artificial. De coloração amarela turva, juicy como um suco, e creme branco de boa forma e retenção, a Barbarella Fruit Beer Maracujá exibe um aroma de… suco de maracujá (sabe aqueles de caixinha? Igual) com destaque para tanto a doçura da fruta (com uma dose extra de açúcar) quanto para seu azedinho. Na boca, doçura frutada no primeiro toque e, depois, doçura de suco de maracujá com leve azedinho e leve acidez. Não há amargor (é possível que o iBU seja algo em torno de -10 aqui), a textura é levemente frisante (e tal qual na anterior, é apenas sobre a língua que se percebe a presença da cerveja no conjunto) e, dai pra frente, mais um refresco alcoólico (3.7%) que favorece o suco enquanto esconde a cerveja. No final, maracujá. No retrogosto, doçura e azedinho de maracujá.

Do Sul do país para Uberaba, em Minas Gerais, casa da Cervejaria 7C (nome que homenageia as sete colinas da cidade mineira), que começou nas panelas em 2014 abastacendo growlers stations da cidade e abrindo sua própria fábrica em 2018. A primeira dos mineiros a debutar por aqui é a Summertime, uma Munich Helles de coloração dourada levemente turva e creme branco de boa formação e média alta retenção. No nariz, sugestão de doçura maltada, cereais e um herbal bastante leve. No primeiro toque, doçura maltada média seguida de sugestão de cereais, doçura maltada, leveza herbal e amargor bastante sutil. A textura é bastante leve e, dai pra frente, segue-se um conjunto simples e eficiente, que entrega o que promete, sem grandes destaques. No final, maltadinho e discreto herbal. No retrogosto, mais doçura maltada e herbal bem sutil.

A segunda da Cervejaria 7C é a Tornado, uma American IPA com três lúpulos norte-americanos no dry-hopping. De coloração âmbar meio dourada com turbidez sutil e creme bege claro, quase branco, de boa formação e média alta retenção, a 7C Tornado apresenta um aroma que combina notas herbais e cítricas sem muita profundidade de distinção, pendendo, porém, ao pinho. É possível perceber ainda leve doçura, mas não chega a ser uma Caramel IPA – ainda bem. Na boca, doçura maltada no primeiro toque seguida de uma combinação de notas cítricas e herbais pendendo, novamente, para a segunda. O amargor (apenas 45 IBUs) consegue, com sucesso, sobrepor-se a doçura, e a textura é suave, quase um mel (sem soar tão doce). Dai para frente, uma Old American IPA honesta, que entrega o que o estilo pede, sem grandes surpresas. No final, amarguinho herbal sutil. No retrogosto, herbal e mel.

De Minas Gerais para Curitiba, com uma das várias linhas produzidas pelo Clube do Malte na Cervejaria Curitiba, a Dia de Los Muertos, aqui representada primeiramente pela El Guapo Muerto, tentativa de uma Belgian Saison que resulta em uma Belgian Blond Ale de coloração dourada levemente âmbar com creme branco de boa formação e média alta retenção. No nariz, nada do arisco das Farmhouses, mas sim o conforto das Blond com notas derivadas da levedura belga, sugestão frutada e de panificação além de um discreto floral. Na boca, doçura acentuada no primeiro toque seguida de floral e de sugestão de frutado e de frutas cristalizadas além, claro, das notas tradicionais de panificação. O amargor é bem baixo, 25 IBUs que mais parecem 5. A textura, por sua vez, é suave e picante. Dai pra frente, uma cerveja frutada e bem refrescante, ainda que a doçura pareça um tiquinha exagerada. No final, picância da levedura. No retrogosto, frutas cristalizadas.

A segunda Dia de Los Muertos é a La Calavera Borracha, uma Irish Red Ale produzida com um blend de cinco maltes que apresenta uma coloração âmbar avermelhada com creme bege bem clarinho de ótima formação e média alta retenção. No nariz, sugestão intensa de caramelo tostado com uma discreta remissão a toffee e suave toque de café. No paladar, toffee intenso no primeiro toque, caramelo tostado e café na sequencia, acompanhados de amargor, bastante presente – são apenas 24 IBUs, mas parece um pouquinho mais. A textura é suave e, dai pra frente, a Dia de Los Muertos La Calavera Borracha segue reforçando o domínio dos maltes, que continuam apostando no toffee, no caramelo tostado e no café sutil. No retrogosto, caramelo tostado e toffee.

Do Paraná para o interior de Minas Gerais, mais precisamente a Fazenda Santa Teresinha, casa da Zalaz em Paraisópolis, que retorna ao site primeiro com a Saison #1 da linha Spontaneus, uma cerveja com 100% da sua fermentação primária feita em barricas de madeira e com a microflora local da Serra da Mantiqueira onde a cervejaria está instalada mais adição de raspas de casca de laranja lima. De coloração amarela, juicy como um suco de laranja, e creme branco espesso de boa formação, ótima retenção, e rendas ao redor da taça, a Zalaz Saison #1 apresenta um aroma deliciosamente rústico, com notas cítricas convidativas (laranja e limão), leve azedinho, as notas de fazenda tradicionais (celeiro e feno) mais madeira e, levemente, álcool e herbal. Na boca, azedume e cítrico de casca de laranja no primeiro toque seguido de leve herbal mais madeira e celeiro. O amargor é marcante, deve estar na casa dos 40 IBUs. A textura é leve querendo ser suave e levemente arisca. Dai pra frente, sugestão de casca de laranja (trazendo consigo algo de limão) e carvalho dominam esse belo exemplar de Saison. No final, azedume leve. No retrogosto, carvalho, limão, laranja e azedinho.

A segunda da mineira Zalaz é mais uma da linha Ybyrá, série experimental da cervejaria que conta com receitas maturadas em barricas, a Ybyrá Airumã, uma Sour com base em Farmhouse Ale nascida do blend de dois barris que estavam maturando por 1 ano agregados com pitaya branca da fazenda da cervejaria. De coloração âmbar alaranjada turva com creme bege claro de boa formação e retenção, a Zalaz Ybyrá Airumã apresenta um aroma deliciosamente rustico com bastante presença de madeira, leve cítrico, doçura sutil remetendo a mel e leve toque de cachaça. Na boca, a rusticidade bate ponto no primeiro toque, com funky e azedume sutis e deliciosos abrindo caminho para um perfil que traz doçura leve da fruta, amadeirado intenso, sugestão de cachaça (e são só 5.7% de álcool) e leve mel. Não há nada de amargor, mas sim de azedume e funky. A textura é suave e picante. Dai pra frente segue-se um conjunto apaixonante, com a madeira em destaque seguida de perto pelo funky e com a fruta dando apenas um leve coloridinho. No final, azedumizinho e doçura. No retrogosto, mais madeira, mais azedume, mais mel e pitaya.

Balanço

St. Patricks Acid Trip
– Produto: Fruit Sour
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 3.33/5

St. Patricks Irish Car Bomb
– Produto: Russian Imperial Stout
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 12%
– Nota: 3.69/5

Barbarella Uva
– Produto: Fruit Beer
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 3.7%
– Nota: 2.11/5

Barbarella Maracujá
– Produto: Fruit Beer
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 3.7%
– Nota: 2.77/5

7C Summertime
– Produto: Munich Helles
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4.7%
– Nota: 2.89/5

7C Tornado
– Produto: India Pale Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 6.5%
– Nota: 3.01/5

Dia de Los Muertos El Guapo Muerto
– Produto: Belgian Saison
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 6.4%
– Nota: 2.99/5

Dia de Los Muertos La Calavera Borracha
– Produto: Belgian Saison
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 2.99/5

Zalaz Spontaneus Saison #1
– Produto: Farmhouse Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 6%
– Nota: 3.50/5

Zalaz Ybyrá Airumã
– Produto: Sour Barrel Aged
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5.7%
– Nota: 4.04/5

Leia também
– Top 2001 Cervejas, por Marcelo Costa (aqui)
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