Tributo a Walter Franco: Seleção dos Convidados

Lançado em maio pelo Scream & Yell, o tributo “Um Grito Que Se Espalha“, em homenagem à Walter Franco, trazia 15 artistas debruçando-se sobre a obra mágica do compositor paulistano. Com produção de Leonardo Vinhas (também responsável pelos tributos aos Paralamas e Alceu Valença, entre outros), masterização de Otavio Bertolo, arte de capa por Daniel P. Floriano e encarte por Leo Siqueira, “Um Grito Que Se Espalha” vem angariando novos fãs para a obra quase secreta de Walter Franco. E também muita gente que já conhecia o compositor, já o admirava e encontrou nesta homenagem novas maneiras de ouvir Walter Franco. A pedido do Scream & Yell, seis convidados elencam suas faixas favoritas de “Um Grito Que Se Espalha“. E a sua, qual é?

FERNANDO ROSA é criador e organizador do festival El Mapa de Todos, e fundador e gestor do selo/portal Senhor F. Também é jornalista, DJ e pesquisador musical.

Faixa favorita: “Respire Fundo”, na versão dos Buenos Muchachos

Primeiro, esta é uma das minhas músicas preferidas do disco também preferido do Walter Franco, que ouvi muito na época. Walter era uma espécie de Frank Zappa para mim, de quem eu era e continuo sendo fã, ao contrário de muitos amigos roqueiros. Dos “marginas”, Walter Franco era o mais marginal, mais ousado e desafiador, não apenas musicalmente, mas também poeticamente. “Respire Fundo” só poderia ser regravada pelos geniais uruguaios Buenos Muchachos – a música tem a cara deles. Ainda ouço Walter Franco e sigo acompanhando Buenos Muchachos. Os dois juntos, então, é um presente. Gracias.

Outros destaques
2 – Os Gianoukas Papoulas – Quem Puxa aos Seus Não Degenera
3 – Sérgio Gonzales Aristizábal – Desprendáte
4 – Joe Silhoueta – Cena Maravilhosa / Eternamente
5 – La Carne – Feito Gente

HELENA GUERRA, artista visual, sócia-diretora da Irmãos Guerra Filmes e co-fundadora do espaço Cultural Marieta.

Faixa favorita: “Coração Tranquilo”, na versão de Dadalú

Sempre que ouço uma música pela primeira vez, incontrolavelmente minha imaginação me leva para alguma cena inesperada que me rapta por alguns minutos.

CENA – DIA ENSOLARADO – EXTERNA

Moto passeia por uma estrada de terra sinuosa, no entorno uma vegetação verde, densa, alta. Vamos nos aproximando e vemos que quem dirige essa moto é uma mulher. Ela tem por volta de 35 anos, serena, respira tranquila. Cavalgando sua moto, está em controle, contente: ela é livre.

Enquanto imagino essa mulher, consigo sentir em mim o vento que bate em seu rosto, me vem uma sensação gostosa de liberdade e tenho meu coração tranquilo.

RAFAEL LÓPEZ CHIOCCARELLO é editor da revista digital Hits Perdidos, e já lançou tributos ao Pato Fu (“O Mundo Ainda Não Está Pronto”) e Titãs (“O Pulso Ainda Pulsa”)

Faixa Favorita: “Me Deixe Mudo”, na versão de Marcelo Callado

Uma das mais legais do tributo é a versão do Marcelo Callado para “Me Deixe Mudo”. Para começar que ele encurtou ela em uns 2 minutos, aproveitou bem da letra rica e deu outra frequência. Deixando ela pop e psicodélica, ele agregou a faixa uma percussão que me lembrou o ritmo do Olodum e brincou com seus versos em sua parte final. Ficou pronta para tocar na rádio, tem uma aura pop interessante, ao mesmo tempo que esquizofrênica, feito os hits do Walter. Aliás as releituras do Callado são sempre divertidas. As soluções costumam sair do comum.

Outros destaques:
“O Dia do Criador”, Consuelo
“Revólver”, Juliano Gauche
“Feito Gente”, La Carne
“Mixturação”, Bike
“Desprendáte”, Sérgio González

ADRIANA DE BARROS é jornalista e colunista do UOL, local em que trabalha desde 2000. Passou pelas rádios Mix FM, 97Rock e pela gravadora Sony Music.

Faixa Favorita: “Vela Aberta”, por Pão de Hamburguer

“Desde o momento que me foi pedido para escrever sobre esse tributo belíssimo me veio à memória minha mãe cantando as músicas do Walter Franco enquanto estendia suas roupas no varal. Eu bem menina, lembro-me claramente dela cantando “Vela Aberta” e me falando de uma tal psicodelia, que eu mal entendia. É uma canção que me emociona, assim como toda obra do artista, que mais tarde tive oportunidade de conhecer e entender seu brilhantismo. Enquanto ouvia a releitura do Pão de Hamburguer estava descendo a serra do mar do litoral de São Paulo. As viagens não poderiam ser mais completas: a memória, o mar e o som lúdico da banda. Por 4 minutos e 22 segundos, a delicadeza da voz do Gabriel e do arranjo me fizeram esquecer que eu estava dentro de um carro. Com algumas lágrimas no rosto pude responder em pensamento para minha mãe que hoje entendo o que ela dizia. Tks, Pão de Hamburguer. Tks, Walter Franco. Tks, Marcelo. Foi uma linda viagem!”

ALEJANDRO MERCADO é jornalista e publicitário, com pós-graduações em Comunicação e Sociedade e Multimeios. É um dos responsáveis pelo portal de cultura A Escotilha

Faixa favorita: “Desprendáte”, na versão de Sérgio González

Sérgio González teve a “audácia” de captar a essência tão plural e icônica da música feita por Walter Franco. Decifrar a alma e a mente de Franco nunca foi tarefa simples, porém González parece ter encontrado um caminho que unisse todo o vanguardismo da MPB com a energia do rock experimental que emergem da trajetória do músico paulistano – sem nunca esquecer o minimalismo, o pop, ou a busca pelo que não se vê na superfície.

O colombiano, à sua maneira, se vez valer daquele emaranhado artístico em que Walter Franco sempre procurou valorizar a palavra e suas combinações, trazendo da poesia concreta sua forte inspiração, uma busca incessante pela melodia e pelo lirismo, em uma via de mão dupla inigualável.

A escolha por González, que carrega na bagagem uma doce união do experimentalismo da Andrés Gualdrón y los Animales Blancos com o folk dos Surcos, foi certeira, pois encontrou nessa forma pouco convencional de prestar tributo uma maneira de ecoar um artista tão pouco convencional como Walter Franco.

Outros destaques:
– “O Dia do Criador”, Consuelo
– “Feito Gente”, La Carne
– “Respire Fundo”, Buenos Muchachos

MARCUS VINICIUS LOSANOFF é jornalista, DJ, pesquisador musical e podcaster. Eventualmente, comanda o programa Camb¡o, dedicado ao rock ibero-americano, na Rádio Graviola.

Faixa favorita: “Respire Fundo”, na versão dos Buenos Muchachos

Uma boa versão de um clássico, na minha visão, é sempre aquela onde o artista ou banda consegue entender e transportar o espírito do tema original para a sua interpretação, sem deixar de incluir a identidade ou marca registrada de quem se propõe ao desafio, sempre renovando a experiência de se ouvir uma velha, consagrada e – por vezes, até – “caducada” canção. Isto acontece diversas vezes neste compilado e, no caso específico de “Respire fundo”, vejo a banda uruguaia Buenos Muchachos como bastante exitosa no intento de soar com a voz de Walter Franco na sua boca (no caso, a de Pedro Dalton, vocalista do grupo). O tom seco, rasgado de Franco e os coros grandiosos, celestiais dão lugar a um acento cálido, intimista, enfatizado pelo característico timbre de voz cavernoso de Dalton, aqui sussurrado, tingindo com novas cores (sóbrias e sombrias) os versos “abra os braços, respire fundo e corte os laços todos deste mundo”. O que soava em 1978 como um quase brado juvenil, um slogan rebelde, imperativo e até ingênuo, converte-se quarenta anos depois – utilizando-se das mesmas palavras – em um conselho sereno de um velho amigo (ou pai), mais experiente, e que já vivenciou inúmeras batalhas (e, sobretudo, derrotas) em sua longa jornada até aqui. E mesmo quando a versão uruguaia “cresce”, do meio para o fim, é como se estivesse apenas “subindo o tom” do mesmo conselho, agora de forma apaixonada, sim, à la Walter (pero no mucho), após uma negativa ou indiferença de seu provável interlocutor para a fala “muito mansa” do início. Talvez seja este inclusive um certo interlocutor mais jovem, rebelde… e até ingênuo. Ou apenas um antigo (e olvidado) espelho, enfim revisitado e agora refletindo – “com a sua imagem e semelhança, nos mesmos traços de uma criança” – uma nova mirada sobre si mesmo.

OUTROS DESTAQUES:
“Serra do Luar” – Tamy
“Pa?tio dos Loucos” – Dado
“O Dia do Criador” – Consuelo
“Me Deixe Mudo” – Marcelo Callado
“Quem Puxa aos Seus Na?o Degenera” – Os Gianoukas Papoulas

Faixa a Faixa por Leonardo Vinhas

01) “Pátio dos Loucos”, Dado. Poucos se lembram da quarta faixa do álbum “Ou Não” (1973). Dado Oliveira, da banda fluminense Pessoal da Nasa, não só se lembrou como fez dela a oportunidade para apresentar sua carreira solo. A versão, registrada na Toca do Bandido (RJ) com um time forte do underground carioca, é conduzida para um terreno totalmente insuspeito – ou, nas palavras do próprio Dado: “é ‘O Pátio dos Loucos’ na pista de dança”.
02) “Canalha”, André Prando. “Eu não queria perder o riff original, mas também não queria fazer algo que soasse ‘cover’”, disse o artista capixaba durante o processo de elaboração da sua versão. O caminho encontrado para isso foi um “um novo significado pra dor canalha, uma coisa mais malandra”, segundo Prando, que trouxe um tom entre o samba e o sombrio para o registro.
03 ) “O Dia do Criador”, Consuelo. Claudia Dalbert, vocalista da banda brasiliense Consuelo, sempre foi fascinada para a versão que Elba Ramalho gravou para essa composição de Walter Franco. Aqui, Claudia e sua trupe combinam a releitura de Elba com a latinidade sombria que caracteriza as incursões musicais da Consuelo. O resultado foi aplaudido pelo próprio autor na primeira audição deste disco.
04) “Mixturação”, BIKE (exclusiva em streaming e download). O quarteto de São Paulo sempre admitiu a influência de Walter Franco em sua música, tanto que essa versão foi gravada para uma Popload Session durante o primeiro ano de existência da banda. A gravação foi remasterizada exclusivamente para esse disco, acentuando o mais o lado stoner que o psicodélico.
05) “Cena Maravilhosa/ Eternamente”, Joe Silhueta. O numeroso combo brasiliense liderado por Guilherme Cobelo encontrou conexão entre essas duas faixas de “Revolver” (1975), revestindo-as de um manto psicodélico que recobre o terreno árido de seu folk do cerrado. O resultado não só é dos mais belos como antecipa a nova fase da banda, cada vez menos presa ao formato folk.
06) “Serra do Luar”, Tamy. Brasileira radicada no Uruguai, Tamy se dedica a fazer pontes entre a música do seu país de residência e a brasileira. Não é diferente com essa recriação dessa que se tornou o maior sucesso de Leila Pinheiro: aqui, um piano de forte inspiração uruguaia ganha texturas eletrônicas e o canto decididamente brasileiro de Tamy. Ao fim, uma citação de “Coração Tranquilo” vertida para o espanhol completa o diálogo transnacional.
07) “Revolver”, Juliano Gauche. Enquanto a original é grandiosa, a versão de Juliano Gauche, também capixaba, prefere o minimalismo. Assim, o mantra torna-se mais contemplativo que a expansiva faixa-título do clássico álbum “Revolver”.
08) “Lindo Blue”, Seamus. Há cerca de 15 anos, apresentei a Fernando Lalli, vocalista e guitarrista do Seamus, o álbum “Revolver”. Ele não só ficou encantado como me devolveu a gentileza, me apresentando pouco tempo depois o disco “Respire Fundo”. O “cartão de visitas” que ele usou foi justamente a canção “Lindo Blue”, aqui tratada pelos power chords, ruídos de guitarra e harmonias vocais que são a cara do Seamus, além da poderosa vocalização de Fernando.
09) “Quem Puxa aos Seus Não Degenera”, Os Gianoukas Papoulas. Pai (Olavo Rocha, vocalista) e filho (Pedro Canales, baixista) convivem na formação do quinteto paulistano Os Gianoukas Papoulas. Não só isso, Pedro foi essencial nos aspectos mais técnicos dessa gravação, o que aprofunda o tom emocional da linda versão indie pop feita pela banda.
10) “Vela Aberta”, Pão de Hamburguer. Quando convidado para tomar parte no disco, Gabriel Farsto, vocalista e guitarrista da Pão de Hamburguer, mandou de primeira: “Tô dentro se for para fazer ‘Vela Aberta’”. A obra de Franco chegou a Fausto por meio de seu pai, e essa canção é um poema de Cid Franco, pai de Walter, musicado pelo filho. Assim, a relação “filial” com a obra se repete, com direito à participação do pai de Fausto na gravação, dando o que seu filho chamou de “pitacos filosóficos”.
11) “Coração Tranquilo”, Dadalú. A chilena Dadalú adora a sonoridade da língua portuguesa, mas, fiel às suas origens no rap, sentiu a dificuldade de adaptar-se ao minimalismo mântrico da poesia de Walter Franco. “Mas essa é uma música muito bonita e eu tinha que encontrar meu jeito de cantá-la”, disse. O resultado é essa divertidíssima versão “one woman band”.
12) “Me Deixe Mudo”, Marcelo Callado. Essa canção foi gravada duas vezes pelo próprio Walter Franco (em 1973 e 1979) em arranjos bem diferentes. O músico carioca – conhecido por ser baterista de Do Amor, banda Cê e outros – nutre igual paixão pela poesia de Walter e pelo pouco lembrado álbum “Meu Nome É Gileno” (1976), do cantor Leno. E foi na interpretação de Leno para “Me Deixe Mudo” que Callado encontrou o ponto de partida para levar a composição para seu universo sonoro, trazendo ainda elementos vocais do primeiro registro feito por Walter no álbum “Ou Não”.
13) “Feito Gente”, La Carne. “O ‘seo’ Walter Franco usava muitos recursos de gravação, então fomos na dele”, explica Carlos Remontti, baixista do La Carne. A versão dessa porrada que abre o álbum “Revolver” (1975) manteve a agressividade da original e acrescentou várias citações a episódios que envolvem a participação de Franco nos festivais da canção – principalmente o de 1972, quando “Cabeça” foi vaiada pelo público, declarada vencedora pelo júri… e logo desqualificada por um time de “especialistas”. Assim, o veterano quarteto de Osasco (SP) entrega uma canção que dialoga com a fama de “maldito” que persegue a eles e ao autor da canção.
14) “Respire Fundo”, Buenos Muchachos. Os violões da canção original são refeitos pelas três guitarras dos Buenos Muchachos, segundo a épica roqueira dos veteranos uruguaios. Também é a primeira gravação na qual o vocalista Pedro Dalton canta inteiramente em português.
15) Bônus: “Desprendáte”, Sérgio González (exclusiva em streaming e download). O colombiano Sérgio González fez parte dos cultuados Animales Blancos e também integra a banda folk Surcos. Além disso, desenvolve um trabalho solo mais inspirado na canção popular colombiana. A partir dessa base, ele se inspirou livremente em ideias pinçadas em “Respire Fundo” e “Serra do Luar” para criar uma canção nova, e que não tivesse referências diretas às originais. A ideia aqui era prestar tributo não com uma regravação, mas com uma canção nova, produzida por Felipe Ortega (Ságan) e com o violoncelo de Mintcho Badev.

DOWNLOAD GRATUITObaixe “UM GRITO QUE SE ESPALHA” em MP3 320 via Mediafire aqui
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Ouça em streaming no Spotify – Deezer – Google Play

As faixas “Mixturação” (BIKE) e “Desprendáte” (Sérgio González) são exclusivas para streaming (nos portais acima) e no álbum completo disponível para download gratuito (também acima)

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