Entrevista: Lennon Z & The Sickboys

por Leonardo Vinhas

Faz sentido, nos dias de hoje, fazer música de quase 70 anos atrás? Para Lennon Z & The Sickboys Trio, não só faz como o resultado obtido é argumento forte o suficiente para desarmar qualquer modernete que só aceite a novidade do momento.

Na verdade, a banda de Caxias do Sul (RS) se propõe a ir fundo na estética dos gêneros musicais que mais lhes agradam – e que compõem o conceito que eles definem, sucintamente, como “rock dos anos 50” – e tratá-la não com reverência, mas com paixão e apuro musical. Não há a dureza pesada do psychobilly nem o tom ingênuo e bubblegum de quem deixa a estética à frente da música, algo muito comum no gênero. Há, sim, a sensualidade e o senso de diversão indissociáveis à inspiração da banda.

Para isso, guitarras tocadas com vibrato e tremolo, como manda a tradição, mais baixo acústico, kit mínimo de bateria, vocal grave e um grande senso de urgência nas melodias são a essência do som da banda, formada por Lennon Z (voz e violão), Gus Sickboy (guitarra), Jones Ireland (baixo) e Mr. Bow Tie (bateria). “Bastard Songs for Bastard People”, o álbum de estreia, foi lançado no fim do ano passado em formatos físico e digital, e traz oito composições próprias, todas ligeiras, mas nada fugazes – na verdade, é quase irresistível recomeçar a audição quando o álbum chega ao fim. “I’m Back Home” e “Long Black Train” se sobressaem como hits imediatos, mas é desonesto com o prazer auditivo pular qualquer uma das faixas.

A turnê para divulgar o trabalho começou para valer neste ano, por ora mais restrita ao Rio Grande do Sul – onde o circuito para esse tipo de som é bastante restrito. Ainda assim, a banda procura ampliar sua presença nos palcos – tanto que Lennon Z, sucinto em suas palavras como na duração de seu álbum, concedeu essa entrevista pouco antes de um show na Estação Imigrante de Transporte Urbano, durante o Festival Brasileiro de Música de Rua em sua cidade natal. E para não negar a fidelidade ao espírito “sujo” do rock dos anos 50, a conversa com o repórter aconteceu entre os tambores de lixo (!) da estação.

Vocês são uma banda de rockabilly bem ao modo clássico do gênero…
(interrompendo) Não exatamente. O rockabilly é um dos muitos gêneros que a gente toca e que estão no nosso disco. Tem o western, tem country e também tem o rockabilly. Enfim, é o rock dos anos 50. É assim que definimos nosso som: como rock dos anos 50.

Certo. De qualquer forma, se nota a intenção de vocês de estar mais próximos da abordagem original dos estilos.
Sim. A gente tentou fazer na pureza quando foi gravar o disco, mas agora a gente tenta criar a própria personalidade da banda. Com o lançamento, a gente tá tentando se descobrir. Por isso o nome do disco é “Bastrds Songs for Bastard People”, porque tinha um pouco de tudo que a gente gostava e, na real, a gente não sabia exatamente se queria seguir mais para um lado que para outro. Então decidimos colocar um pouco de tudo que vínhamos trabalhando e ver o que nos agradaria mais.

Você citou o country como um dos estilos preferidos da banda. De uns anos para cá, a referência mais comum para bandas novas acaba sendo o alt.contry, que é algo que nem se nota no som de vocês.
O que é alt.country?

É essa mescla do gênero com rock alternativo, elementos tecnológicos, uma busca pela modernização, até pela psicodelia, em alguns casos.
Essa não é a nossa praia. A gente está tentando fazer o mais fiel possível. Gostamos do gênero como ele é e queremos ir fundo nele.

Em Caxias, não há uma cena de rockabilly – ou rock dos anos 50, como preferem. Isso funciona como uma vantagem para vocês, ou é um obstáculo?
O lance de não ter cena foi uma grande vantagem. Somos uma banda bem procurada, até porque não tem outras como a gente. Quer dizer, tem bandas surgindo, mas ainda não entraram no mercado. É um pessoal que está começando mesmo. E espero que surjam e cresçam. Queremos que tenham mais bandas do estilo, para que possamos tocar juntos, organizar um festival dentro desse estilo.

Isso é uma característica desse circuito, pelo que eu noto. Vejo que as bandas do gênero na América Latina, que é o cenário que mais percorro, procurando ajudar umas às outras.
Sim, é uma cena que se apoia muito. Não é uma cena autossustentável financeiramente, mas certamente é uma onde há muita união, onde as bandas dão apoio umas às outras. Quando uma banda vai tocar na Europa ou nos Estados Unidos, ela volta dando dicas do que as outras bandas podem fazer para tocar por lá. Não rola aquela competição, a coisa de “esconder o jogo”. Uma banda quer mais é que a outra toque em tantos locais quanto possível. Agora, admito que na América Latina não tenho contato com muitas bandas. Seria legal conhecer mais.

Você vê o som que vocês fazem como algo de nicho, como um gênero que não encontra espaço em todo lugar?
Até encontra, mas o que dificulta que toquemos em um lugar como Porto Alegre, por exemplo, é que sai caro para um bar, mesmo um que esteja relacionado com a música que tocamos, pagar uma banda de fora para ir lá. Então acaba ficando difícil sair da região.

É possível identificar afinidade com outras bandas brasileiras?
Sim. Tem a The Bop Hounds, de Natal, que já fecharam contrato com a Wild Card, gravadora dos EUA. Tem a Mystery Trio, de Curitiba; a Rockin’ Rizzo & The Locomotives, de São Paulo…

Parece ter se criado um “estilo de vida” ligado ao rockabilly cheio de externalidades que às vezes assumem o protagonismo: tatuagens, carros, cerveja artesanal. Em alguns eventos e festivais, fica a impressão de que isso é mais importante que a música. Confere?
O rockabilly é um estilo musical. Os acessórios que importam são os instrumentos. Carros e outras coisas podem vir junto, mas não são o essencial. Se alguém vai nomear um evento como “rockabilly”, tem que cuidar disso. Acho que muitas pessoas fazendo de qualquer jeito e botam coisas que não tem a ver com o evento musical, erram até no estilo – botam um grupo de heavy metal para tocar num evento que leva “rockabilly” no nome. As pessoas confundem, e não é legal que confundam dessa maneira. Mas também tem gente fazendo certo por aí.

– Leonardo Vinhas (@leovinhas) assina a seção Conexão Latina (aqui) no Scream & Yell.

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