Três perguntas: Juçara Marçal fala sobre o som urbano (e os remixes) de “Delta Estácio Blues”

entrevista de Bruno Moraes
foto de Ivana Cassuli

A cantora, compositora, instrumentista e professora Juçara Marçal já possui uma carreira sólida junto a projetos musicais como Metá Metá, Vésper, Sambas do Absurdo e A Barca, aos quais se somam discos-solo com grande potência criativa e exploração de sonoridades que aliam o avant-garde, o eletrônico e uma forte presença de uma estirpe desconstruída de samba.

Em sua terceira vez no Psicodália (a primeira solo – as duas anteriores haviam sido com o Metá Metá), Juçara levou ao festival 2024 um show de igual potência e carisma, celebrando seu mais recente álbum de inéditas, “Delta Estácio Blues” — em uma época em que, devido à pandemia de COVID-19, não era possível executar o disco ao vivo (o álbum foi eleito Melhor Disco Nacional de 2021 aqui no Scream & Yell e também para a APCA).

Após o show, que adiantou algumas das versões remix presentes no então inédito (mas agora recém-lançado – ouça abaixo) “DEB RMX” (2024), a equipe de cobertura do Scream & Yell fez uma rápida entrevista com Juçara — devido ao avançado da hora – da qual destacamos as três respostas abaixo.

Vocês apresentaram os remixes inéditos neste show e eu queria que você conversasse um pouquinho com a gente sobre… Primeiro contar um pouco do que você achou de estar no Psicodália. E depois, se você puder falar um pouquinho mais do disco também, né? Desse conceito de traçar esse paralelo criativo entre o Robert Johnson e o trio dos Bambas do Estácio.
É a terceira vez que eu venho (ao Psicodália). E quando me convidaram eu fiquei muito animada. Porque sei que show aqui é sempre um astral muito impressionante. Muita energia que vem pra gente. E aí o show se torna uma coisa sempre inesquecível. Eu já vim duas vezes com o Metá Metá e agora eu trouxe o “Delta Estácio Blues”. E sobre o “Delta Estácio Blues”, na verdade… A gente se deu conta, um pouco a partir da música que a gente fez com parceria do Rodrigo Campos, quando ele criou esse microconto do Robert Johnson se encontrando com os Bambas do Estácio… A gente se deu conta de que, na verdade, essa era a síntese do disco, essa coisa de juntar todas as referências que a gente tem da música estadunidense, do rap, de várias coisas que vêm de lá… Do blues, inclusive, com as coisas de África, as coisas do Brasil, o samba. Tem até um crítico que chegou a falar que, na verdade, “Crash” [canção do disco composta em parceria com o rapper Ogi] é um samba! (risos) E eu achei o máximo, porque no fundo é isso.

É música diaspórica, né?
É. No fundo é essa relação com a música negra feita hoje. De vários pontos do mundo. E isso é um pouco o que sintetiza o “Delta Estácio Blues”. Esse grande Delta.

O disco também traz várias outras temáticas. Por exemplo, ele fala muito de situações cotidianas, tem uma urbanidade muito grande, que acho muito linda, e que traz um pouco dessa coisa de a gente viver num país periférico. Fala da força feminina, a sexualidade feminina. Religiosidade afro[brasileira] claro… E esses temas costuram a sua música desde bastante tempo, né?
É. Eu acho que tem a ver um pouco com viver em São Paulo. Viver em São Paulo dá a você essa experiência de lidar com muitas realidades diferentes. E a gente gosta de revelar isso na música de alguma maneira. Que podia ser… Você pode viver em São Paulo ou em qualquer capital e fazer uma música abstrata. Mas a gente gosta de que apareça na música essa incongruência, essas sensações estranhas que a gente sente na urbanidade toda que tem lá. Então eu acho que isso aparece um pouco no som um pouco por conta disso.

– Bruno de Sousa Moraes migrou das ciências biológicas para a comunicação depois de um curso de jornalismo científico. Desde então, publica matérias sobre ecologia e conservação da biodiversidade, e está se arriscando pelo jornalismo musical.

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