Ao vivo: Brant Bjork Trio entrega conhecimento de causa, experiência e improvisação num showzaço em São Paulo

texto por Leonardo Vinhas
fotos por Fernando Yokota

Brant Bjork é tanto uma das maiores referências para o que se chama de stoner rock que a plateia do seu show em São Paulo continha diversos integrantes de bandas brasileiras do estilo. Você pode argumentar que isso acontece em shows de outros gêneros, mas considerando o quanto estamos falando de algo nichado, a coisa impressiona. Era um show da cena e para a cena, por assim dizer.

A pista da pequena Casa Áurea, no Bixiga, era dominada por um público majoritariamente masculino (mulheres não passavam de 5% dos presentes) e que saiu de casa – em muitos casos, de cidades distantes – para ver um músico absolutamente desconhecido por quem não tem relação com esse estilo musical, mas que é um dos maiores nomes do gênero para os entusiastas. A atitude quase contemplativa da plateia (de 350 pagantes, segundo a produção do evento), que não desgrudava os olhos do palco e evitava até sair pra comprar bebidas, era uma prova do quanto aquele momento era singular para aquele grupo de pessoas.

E Bjork e seus companheiros – o baterista Ryan Gut e o baixista Mario Lalli – não defraudaram o séquito. O setlist focou nos discos que o homem assinou solo, combinando as preferidas do fundamental “Jalamanta” (“Lazy Bones”, “Too Many Chiefs… Not Enough Indians”, “Low Desert Punk”), outras favoritas de diferentes períodos, e músicas inéditas do álbum que ele lançará no segundo semestre desse ano (e sobre o qual ele falou aqui no Scream & Yell), com espaço para jams que soavam como novas composições dentro das canções, e não exibição de virtuosismo.

Até nas jams ficava claro o quanto as composições de Bjork primam por boas melodias e riffs concisos. Não é à toa que, na entrevista ao nosso site, o homem citou o Cream como uma de suas maiores influências. Na verdade, o power trio inglês é apenas uma das hastes em um tripé que é composto também por Jimi Hendrix e jazz. Assim, é a psicodelia de discos como “Disraeli Gears” e “Axis: Bold as Love” que garantem o lado mais “stoned” (chapado) de seu stoner rock. E assim como faziam Eric Clapton, Jack Bruce, Ginger Baker e Hendrix, Bjork faz do jazz uma estrada para sua nave roqueira passear com maior velocidade e fluidez.

E se ele já faz isso suficientemente bem por conta própria, a coisa toma outra proporção quando acompanhado por Mario Lalli. O ex-Yawning Man é um dos músicos que melhor definiu a sonoridade do “desert rock”, e no palco ele faz por merecer sua fama: tirando timbres pesados e altamente personalizados de seu Jazzbass e se valendo até de power chords, Lalli preenche espaços que talvez demandassem um segundo guitarrista caso ele não estivesse na banda. Sua presença musical é tão marcante que não teria sido descabido anunciar o show como “Brant Bjork & Mario Lalli”.

Sustentar dois músicos de naipe tão alto poderia servir de pretexto para que o baterista se retraísse – ou pior, que tentasse se sobressair tocando por cima das cordas. Ryan Gut não faz uma coisa nem outra: sua bateria não cria espaços novos, é verdade, mas mantém a sonoridade arejada, entregando peso apenas quando necessário. É como se ele entendesse que a guitarra e o baixo já aportam toda a densidade que cada canção precisa, e ele usa a bateria para deixar as coisas mais fluidas em vez de mais pesadas.

Esse trio entregou um show que não previa momentos de pico: a intensidade se manteve igual, fossem as canções mais lentas ou mais rápidas, menos ou mais conhecidas. A alquimia musical vinha de doses iguais de conhecimento de causa, experiência e improvisação. Era música solta, feita por quem gosta (era notável o quanto os músicos estavam à vontade) e para quem gosta. E que funcionou ainda melhor graças à excelente acústica da Casa Áurea, que ali recebia seu primeiro show.

Em tempos de música sendo vendida como trilha sonora para agendas pessoais, ativações de marketing e “experiências”, é surpreendente e revigorante ver um público tão compenetrado e atento à própria banda. Também é muito bom estar em um show que te lembra que o rock pode, sim, ser música de nicho, e que o chororô sobre o gênero ter “perdido espaço” tem mais a ver com gente mais velha tendo nostalgia da adolescência do que com qualquer questão musical. Brant Bjork, Mario Lalli e Ryan Gut estavam entre os seus ali, e isso bastou para uma grande noite.

– Leonardo Vinhas (@leovinhas) é produtor e assina a seção Conexão Latina (aqui) no Scream & Yell.
– Fernando Yokota é fotógrafo de shows e de rua. Conheça seu trabalho: http://fernandoyokota.com.br

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.