Boteco:10 cervejas nacionais em… garrafa

por Marcelo Costa

Abrindo uma seleção de 10 cervejas em garrafa (num momento em que as latas estão se destacando no mercado) com duas da mineira Zalaz, uma das favoritas da casa. A primeira delas é a Sassafrás & Café, uma Baltic Porter que recebe chips da madeira nobre Sassafrás e o café Liga Natural, cultivado na própria Fazenda Santa Terezinha, que abriga a cervejaria. De coloração marrom escura translucida com creme bege escuro de ótima formação e boa retenção, a Zalaz Sassafrás & Café combina um delicioso toque amadeirado com o também delicioso aroma do café. Há, ainda, leve remissão a canela, toffee e a malte torrado. Na boca, amadeirado leve no primeiro toque, delicioso, seguido de café apaixonante, canela, amadeirado novamente, café, torra e amargor elegante (não deve chegar a 30 IBUs). A textura é quase cremosa e, dai pra frente, segue-se uma Baltic Porter elegante, aprofundada, deliciosa. No final, café (sem açúcar) doce, caramelo tostado sutil e madeira. No retrogosto, café e madeira, deliciosos.

A segunda da Zalaz é a Flor de Bananeira, uma Weizenbock que recebe adição de doce de banana produzida com as frutas da própria fazenda. De coloração âmbar levemente escura com creme bege de boa formação e ótima retenção, a Zalaz Flor da Bananeira apresenta um aroma frutadissimo, com muita banana, banana passa e banana caramelada. Há, ainda, percepção de condimentação (cravo) e de tosta. Na boca, doçura de caramelo tostado no primeiro toque seguida de uma pancada de doce de banana, cravo, melaço, ameixa e uva passa. Não há nenhuma percepção de amargor, muito pelo contrário – ainda que a condimentação distraia o bebedor. A textura é suave (e mesmo aqui, os 8.5% de álcool soam comportados) e, dai pra frente, a sensação é de zona de conforto, já que o doce de banana enaltece notas tradicionais do estilo, e ainda que exista leve aprofundamento no conjunto, não foge tanto do que espera de uma Weizenbock. No final, cravo e banana passa. No retrogosto, banana passa.

De Paraisópolis para Pomerode, em Santa Catarina, com a primeira de duas IPAs da Schornstein. A primeira delas é uma Session IPA que atende pelo singelo nome de All Day IPA. Não contentes em kibar o nome de uma cerveja famosa da Founders Brewing, de Chicago, os catarinenses ainda se “inspiram” em outra receita dos norte-americanos, a Founders Centennial IPA, utilizando o lúpulo Centennial nesta receita. De coloração âmbar alaranjada com creme branco de boa formação e retenção, a Schornstein All Day IPA apresenta um aroma com muita sugestão de laranja flutuando sobre um balde de doçura caramelada, que aqui fica em segundo plano. No paladar, a laranja chega antes no primeiro toque, mas na sequencia é envolvida por muito caramelo, de tal forma que mesmo o amargor de 30 IBUs parece 3. A textura é meladinha, meladinha, e, dai pra frente, surge uma Caramel IPA com bastante laranja. No final, laranja e caramelo. No retrogosto, caramelo e laranja. Dá saudade de Chicago.

Não contentes em kibar material gringo, os catarinenses apresentam nesta outra IPA uma receita que recebe adição de nibs de cacau e dry-hopping de lúpulos Citra e Mosaic. O nome? Citrus Kakao IPA, numa pegada que lembra bastante a colab feita entre os curitibanos da Bodebrown e os norte-americanos da Stone, a Cacau IPA, lançada em 2013 e até hoje no mercado (um dos grandes sucessos da cervejaria de Curitiba). Essa “versão” da turma de Pomerode apresenta coloração âmbar translucido com creme bege clarinho, quase branco, de boa formação e retenção. No nariz, “o cacau surge intenso ao lado das notas cítricas derivadas de lúpulo”, deixando perceber leve sugestão de maracujá, encoberta por bastante doçura. Na boca, a doçura do cacau é intensa desde o primeiro toque, amaciando o que poderia surgir de amargor de lúpulo, mas ainda é possível perceber notas de maracujá. Os 30 IBUs de amargor estão aqui, em algum lugar, mas a doçura do conjunto os impede de ser mais voraz. Já a textura, é meladinha, meladinha. Dai pra frente, uma boa cópia do exemplar do estado vizinho, com amargor aconchegado no final e muito cacau. No retrogosto, cacau e maracujá.

Mantendo-se no Sul do país, mas saindo de Santa Catarina para Campo Bom, no Rio Grande do Sul, casa da Cervejaria Imigração, que retorna ao site com duas cervejas acidas. A primeira delas é uma cerveja que tenta replicar uma Belgian Lambic (de maneira impossível, porque necessitaria replicar o bioma belga, não apenas a levedura bretta) adaptando o estilo ao Brasil com a utilização de madeira nacional na maturação. Ou seja, é uma Brazilian Sour que apresenta coloração âmbar e creme branco de ótima formação e rápida dispersão. No nariz, abacaxi, pêssego, laranja madura, couro e doçura maltada. Na boca, doçura rápida no primeiro toque atropelada por uma acidez intensa, levemente avinagrada, com frutado, couro e nada de amargor (são 3 IBUs apenas). A textura é meladinha e picante, levemente acética. Dai pra frente, uma Brazilian Sour potente, que deve amaciar (principalmente o amadeirado) com o tempo, e que finaliza trazendo pêssego e abacaxi maduro. No retrogosto, madeira e couro.

A segunda da linha Sour da 1824 Imigração é uma Brazilian Sour maturada e envelhecida ao longo de dois anos em barris de carvalho americano que anteriormente abrigaram Whisky, e que conta com adição de açúcar de cana e semente de coentro. De coloração âmbar e creme branco de ótima formação e média retenção, a 1824 Imigração Barrel Whisky Lambic apresenta um aroma que combina notas ariscas que remetem a feno e couro com bastante doçura caramelada. É possível ainda perceber avinagrado (vinagre de maçã) e um off flavour que remete a esmalte / acetona. Na boca, acidez e azedume intensamente agressivos no primeiro toque, com sugestão de madeira colando no céu da boca e trazendo consigo remissão a esmalte e acetona. Nada de coco, nem uísque, muito menos madeira. De um lado temos uma acidez e azedume exagerados e, de outro, doçura, com traços discretos de geleia de abacaxi. A textura é esmaltada, acetonada, e melada. Dai pra frente, um erro, um grande equivoco que não honra o estilo Sour, o Barrel Aged, muito menos o Lambic. No final, abacaxi passado e acetona. No retrogosto, abacaxi esmaltado.

Do Rio Grande do Sul para Piracicaba, no interior paulista, para encontrar mais dois rótulos da série Catharina (Fruit) Sour, da Dama Bier, que já passou por aqui com a versão Maracujá e Tamara e agora retorna, primeiramente, com a versão que recebe adição de polpa de jabuticaba e chás de melissa e poejo, também conhecido no Brasil como hortelãzinho, uma das espécies mais conhecidas do género Mentha. De coloração âmbar clara com creme branco de média formação e baixa retenção, a Dama Catharina Sour Jabuticaba, Melissa e Poejo apresenta um aroma frutado (jabuticaba), floral, adocicado (caramelo) e levemente herbal. Na boca, doçura rápida no primeiro toque já com leve presença de chá de melissa, que aumenta sua presença na sequencia enquanto recebe discretas notas de jabuticaba, bergamota, poejo e caramelo. Não há sensação de amargor (a casa antecipa 8 IBUs) e a textura é leve, com discreta picância. Dai pra frente até pinta um azedinho, que se prolonga, sem impressionar. No final, melissa e poejo. No retrogosto, refrescancia.

A segunda Catharina Sour da piracicabana Dama Bier recebe adição de suco de tangerina e gengibre. De coloração amarelo alaranjado com creme branco de boa formação e baixa retenção, a Dama Catharina Sour Tangerina e Gengibre apresenta um aroma com muita, mas muita tangerina mesmo, um pouco de gengibre e quase nada que adiante notas de um perfil sour. A sensação se replica no paladar, que mais parece o de um suco de tangerina (absoluto no primeiro toque) com leve acréscimo de gengibre e nada, nadica mesmo de sour. Poxa, chama logo de Fruit Beer e corre pro abraço, né. O amargor não existe (8 IBUs de toda a linha que é nada, mas não se esperava outra coisa), a acidez é do suco da fruta e a textura é leve e delicadamente frisante – com muita tangerina. Dai pra frente, um sucão alcóolico (4%) que é bem gostosinho, mas não tem absolutamente nada de sour. No fim, tangerina e gengibre (esse bem leve). No retrogosto, tangerina.

Do interior de São Paulo para Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, com duas (de uma série de três) English Barley Wines produzidas pela cervejaria Mistura Clássica. A primeira delas é base, que matura por um ano. É uma cerveja âmbar escura acobreada com creme bege de boa formação e retenção. No aroma, calda de ameixa em destaque ao lado de melado, mas também é possível perceber doçura e álcool (ainda que a graduação fique na casa dos 6.4%). Na boca, sugestão de ameixa dominando o primeiro toque e sobrando na sequencia, que ainda traz sugestão de melado, baunilha e absolutamente nada de amargor (a casa adianta 40 IBUs, mas isso aqui deve ser -10 de tanta doçura). A textura é suave e delicadamente picante (de álcool). Dai pra frente, uma English Barley Wine com baixa graduação alcoólica, mas muita percepção de álcool, que ainda surpreende pelo custo beneficio. No final, calda de ameixa e doçura intensa. No retrogosto, calda de ameixa e doçura intensa.

A segunda Barley Wine da Mistura Clássica recebe infusão de baunilha de Madagascar. De coloração âmbar escura com creme bege de ótima formação e boa retenção, a Mistura Clássica Barley Wine com Baunilha apresenta um aroma que não destoa tanto da versão base, com calda de ameixa em destaque novamente ao lado de melado, mas também deixando perceber doçura de baunilha e percepção de álcool (ainda que a graduação fique na casa dos 6.4%). %). Na boca, a percepção se mantém com sugestão de ameixa dominando o primeiro toque e sobrando na sequencia, que ainda traz melado, baunilha e absolutamente nada de amargor (a casa adianta 40 IBUs, mas isso aqui deve ser -10 de tanta doçura). A textura é suave e delicadamente picante (de álcool). Dai pra frente, uma English Barley Wine com baixa graduação alcoólica, mas muita percepção de álcool, que ainda surpreende pelo custo beneficio. No final, calda de ameixa e doçura intensa. No retrogosto, calda de ameixa e doçura intensa.

Zalaz Sassafrás & Café
– Produto: Baltic Porter
– Nacionalidade: Paraisópolis, MG
– Graduação alcoólica: 7.5%
– Nota: 3.84 /5

Zalaz Flor da Bananeira
– Produto: Weizenbock
– Nacionalidade: Paraisópolis, MG
– Graduação alcoólica: 8.5%
– Nota: 3.33 /5

Schornstein All Day IPA
– Produto: Session IPA
– Nacionalidade: Pomerode, SC
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 2.98/5

Schornstein Citrus Kakao IPA
– Produto: American IPA
– Nacionalidade: Pomerode, SC
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 3.12/5

Imigração 1824 Belgian Lambic
– Produto: Belgian Lambic
– Nacionalidade: Campo Bom, RS
– Graduação alcoólica: 5.5%
– Nota: 3.30/5

Imigração 1824 Barrel Whisky Lambic
– Produto: Belgian Lambic
– Nacionalidade: Campo Bom, RS
– Graduação alcoólica: 8.5%
– Nota: —-/5

Dama Bier Catharina Sour Jabuticaba, Melissa e Poejo
– Produto: Catharina Sour
– Nacionalidade: Piracicaba, São Paulo
– Graduação alcoólica: 4%
– Nota: 3.09/5

Dama Bier Catharina Sour Tangerina e Gengibre
– Produto: Catharina Sour
– Nacionalidade: Piracicaba, São Paulo
– Graduação alcoólica: 4%
– Nota: 3.00/5

Mistura Clássica Barley Wine
– Produto: Barley Wine
– Nacionalidade: Angra dos Reis, Rio de Janeiro
– Graduação alcoólica: 6.4%
– Nota: 3.39/5

Mistura Clássica Barley Wine com Baunilha
– Produto: Barley Wine
– Nacionalidade: Angra dos Reis, Rio de Janeiro
– Graduação alcoólica: 6.4%
– Nota: 3.39/5

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