Download: Ouça e/ou baixe um tributo a Walter Franco

por Leonardo Vinhas

“Foi meu mestre quem te ensinou / foi teu mestre quem me ensinou”… Esses versos de “Partir do Alto”, uma das mais suingadas composições de Walter Franco, propõem que o aprendizado acontece nas vias mais transversais e imprevisíveis. E como sugere a condução rítmica da canção, esse aprendizado vem em um movimento constante, dinâmico a ponto de não deixar espaço para o estabelecimento de verdades universais ou mestres absolutos. Como nenhum outro compositor antes ou depois, Walter Franco consegue captar essa dinâmica, essa eterna mutabilidade da existência, e usá-la como matéria-prima de canções.

Sua poesia quase sempre mântrica e suas harmonias ricas são pequenas peças que nos ajudam a afinar nossos próprios instrumentos “de dentro pra fora e de fora pra dentro”, como diz sua criação preferida, “Serra do Luar”. Sim, mesmo que não sejamos músicos, a obra de Franco permite encontrar nosso lado mais musical, e já que a música precede a fala, não é exagero dizer que ela permite encontrar nosso eu mais verdadeiro.

Nascido em São Paulo em janeiro de 1945, Walter Franco não integrou nenhum dos movimentos badalados da música brasileira. Sim, Walter Franco não foi Bossa Nova, não foi Tropicália, não foi nem Maldito como muitos de seus pares setentistas. E foi Vanguarda Paulistana, sozinho, muito antes do termo ser cunhado nos anos 80. Seus dois primeiros discos, “Ou Não” (1973) e “Revolver” (1975), são obras clássicas cravadas a ferro e fogo na epiderme da música brasileira, o que não quer dizer que “Respire Fundo” (1978), “Vela Aberta” (1979), “Walter Franco” (1982) e “Tutano” (2001) sejam menores, muito pelo contrário: um álbum de Walter Franco, qualquer um, é um evento cultural por si só. Quem ousar mergulhar não voltará o mesmo.

Organizar um tributo a uma obra desse porte, revisitando-a sob outras óticas, é um risco e um atrevimento. Quase uma sandice. Por outro lado, o criador dessa obra nunca foi reverente às formas musicais estabelecidas. Aliás, essa é uma de suas mais valiosas lições: se perguntar “o que é que tem nessa cabeça, irmão?”, e procurar constantemente a resposta. 15 artistas toparam o desafio de se perguntar isso, e responder em forma de uma versão para uma composição de Walter Franco. Não tratando-o como “mestre absoluto”, porque como foi dito dois parágrafos atrás, isso não existe. Mas como o criador de transgressões, de beleza, de coisas que nos impulsionam a ir além. Como o arquiteto de sons e gritos que ele é.

“Um Grito que se Espalha” é um tributo a essa criação, a essa força que não se detém, ao imprevisível que não se conforma, e ao silêncio que diz mais que a soma das palavras.

Obrigado, Walter Franco, por nos lembrar que nada é mais danoso que a apatia e o conformismo. E vida longa à inquietação que só a melhor música provoca!

DOWNLOAD GRATUITObaixe “UM GRITO QUE SE ESPALHA” em MP3 320 via Mediafire aqui
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Ouça em streaming no Spotify – Deezer – Google Play – iTunes

As faixas “Mixturação” (BIKE) e “Desprendáte” (Sérgio González) são exclusivas para streaming (nos portais acima) e no álbum completo disponível para download gratuito (também acima)

Créditos do álbum
Produção executiva, curadoria e realização: Leonardo Vinhas
Masterização: Otavio Bertolo nos estúdios Jamute (www.jamute.com.br)
Arte de Capa: Daniel P. Floriano
Encarte: Leo Siqueira
Distribuição digital: Tratore

Faixa a Faixa por Leonardo Vinhas

01) “Pátio dos Loucos”, Dado. Poucos se lembram da quarta faixa do álbum “Ou Não” (1973). Dado Oliveira, da banda fluminense Pessoal da Nasa, não só se lembrou como fez dela a oportunidade para apresentar sua carreira solo. A versão, registrada na Toca do Bandido (RJ) com um time forte do underground carioca, é conduzida para um terreno totalmente insuspeito – ou, nas palavras do próprio Dado: “é ‘O Pátio dos Loucos’ na pista de dança”.
02) “Canalha”, André Prando. “Eu não queria perder o riff original, mas também não queria fazer algo que soasse ‘cover’”, disse o artista capixaba durante o processo de elaboração da sua versão. O caminho encontrado para isso foi um “um novo significado pra dor canalha, uma coisa mais malandra”, segundo Prando, que trouxe um tom entre o samba e o sombrio para o registro.
03 ) “O Dia do Criador”, Consuelo. Claudia Dalbert, vocalista da banda brasiliense Consuelo, sempre foi fascinada para a versão que Elba Ramalho gravou para essa composição de Walter Franco. Aqui, Claudia e sua trupe combinam a releitura de Elba com a latinidade sombria que caracteriza as incursões musicais da Consuelo. O resultado foi aplaudido pelo próprio autor na primeira audição deste disco.
04) “Mixturação”, BIKE (exclusiva em streaming e download). O quarteto de São Paulo sempre admitiu a influência de Walter Franco em sua música, tanto que essa versão foi gravada para uma Popload Session durante o primeiro ano de existência da banda. A gravação foi remasterizada exclusivamente para esse disco, acentuando o mais o lado stoner que o psicodélico.
05) “Cena Maravilhosa/ Eternamente”, Joe Silhueta. O numeroso combo brasiliense liderado por Guilherme Cobelo encontrou conexão entre essas duas faixas de “Revolver” (1975), revestindo-as de um manto psicodélico que recobre o terreno árido de seu folk do cerrado. O resultado não só é dos mais belos como antecipa a nova fase da banda, cada vez menos presa ao formato folk.
06) “Serra do Luar”, Tamy. Brasileira radicada no Uruguai, Tamy se dedica a fazer pontes entre a música do seu país de residência e a brasileira. Não é diferente com essa recriação dessa que se tornou o maior sucesso de Leila Pinheiro: aqui, um piano de forte inspiração uruguaia ganha texturas eletrônicas e o canto decididamente brasileiro de Tamy. Ao fim, uma citação de “Coração Tranquilo” vertida para o espanhol completa o diálogo transnacional.
07) “Revolver”, Juliano Gauche. Enquanto a original é grandiosa, a versão de Juliano Gauche, também capixaba, prefere o minimalismo. Assim, o mantra torna-se mais contemplativo que a expansiva faixa-título do clássico álbum “Revolver”.
08) “Lindo Blue”, Seamus. Há cerca de 15 anos, apresentei a Fernando Lalli, vocalista e guitarrista do Seamus, o álbum “Revolver”. Ele não só ficou encantado como me devolveu a gentileza, me apresentando pouco tempo depois o disco “Respire Fundo”. O “cartão de visitas” que ele usou foi justamente a canção “Lindo Blue”, aqui tratada pelos power chords, ruídos de guitarra e harmonias vocais que são a cara do Seamus, além da poderosa vocalização de Fernando.
09) “Quem Puxa aos Seus Não Degenera”, Os Gianoukas Papoulas. Pai (Olavo Rocha, vocalista) e filho (Pedro Canales, baixista) convivem na formação do quinteto paulistano Os Gianoukas Papoulas. Não só isso, Pedro foi essencial nos aspectos mais técnicos dessa gravação, o que aprofunda o tom emocional da linda versão indie pop feita pela banda.
10) “Vela Aberta”, Pão de Hamburguer. Quando convidado para tomar parte no disco, Gabriel Farsto, vocalista e guitarrista da Pão de Hamburguer, mandou de primeira: “Tô dentro se for para fazer ‘Vela Aberta’”. A obra de Franco chegou a Fausto por meio de seu pai, e essa canção é um poema de Cid Franco, pai de Walter, musicado pelo filho. Assim, a relação “filial” com a obra se repete, com direito à participação do pai de Fausto na gravação, dando o que seu filho chamou de “pitacos filosóficos”.
11) “Coração Tranquilo”, Dadalú. A chilena Dadalú adora a sonoridade da língua portuguesa, mas, fiel às suas origens no rap, sentiu a dificuldade de adaptar-se ao minimalismo mântrico da poesia de Walter Franco. “Mas essa é uma música muito bonita e eu tinha que encontrar meu jeito de cantá-la”, disse. O resultado é essa divertidíssima versão “one woman band”.
12) “Me Deixe Mudo”, Marcelo Callado. Essa canção foi gravada duas vezes pelo próprio Walter Franco (em 1973 e 1979) em arranjos bem diferentes. O músico carioca – conhecido por ser baterista de Do Amor, banda Cê e outros – nutre igual paixão pela poesia de Walter e pelo pouco lembrado álbum “Meu Nome É Gileno” (1976), do cantor Leno. E foi na interpretação de Leno para “Me Deixe Mudo” que Callado encontrou o ponto de partida para levar a composição para seu universo sonoro, trazendo ainda elementos vocais do primeiro registro feito por Walter no álbum “Ou Não”.
13) “Feito Gente”, La Carne. “O ‘seo’ Walter Franco usava muitos recursos de gravação, então fomos na dele”, explica Carlos Remontti, baixista do La Carne. A versão dessa porrada que abre o álbum “Revolver” (1975) manteve a agressividade da original e acrescentou várias citações a episódios que envolvem a participação de Franco nos festivais da canção – principalmente o de 1972, quando “Cabeça” foi vaiada pelo público, declarada vencedora pelo júri… e logo desqualificada por um time de “especialistas”. Assim, o veterano quarteto de Osasco (SP) entrega uma canção que dialoga com a fama de “maldito” que persegue a eles e ao autor da canção.
14) “Respire Fundo”, Buenos Muchachos. Os violões da canção original são refeitos pelas três guitarras dos Buenos Muchachos, segundo a épica roqueira dos veteranos uruguaios. Também é a primeira gravação na qual o vocalista Pedro Dalton canta inteiramente em português.
15) Bônus: “Desprendáte”, Sérgio González (exclusiva em streaming e download). O colombiano Sérgio González fez parte dos cultuados Animales Blancos e também integra a banda folk Surcos. Além disso, desenvolve um trabalho solo mais inspirado na canção popular colombiana. A partir dessa base, ele se inspirou livremente em ideias pinçadas em “Respire Fundo” e “Serra do Luar” para criar uma canção nova, e que não tivesse referências diretas às originais. A ideia aqui era prestar tributo não com uma regravação, mas com uma canção nova, produzida por Felipe Ortega (Ságan) e com o violoncelo de Mintcho Badev.

CATÁLOGO COMPLETO DO SELO SCREAM & YELL

SY00 – “Canção para OAEOZ“, OAEOZ (2007) com De Inverno Records
SY01 – “O Tempo Vai Me Perdoar”, Terminal Guadalupe (2009)
SY02 – “AoVivo@Asteroid”, Walverdes (2011)
SY03 – “Ao vivo”, André Takeda (2011)
SY04 – “Projeto Visto: Brasil + Portugal” (2013)
SY05 – “EP Record Store Day”, Giancarlo Rufatto (2013)
SY06 – “Ensaio Sobre a Lealdade”, Rosablanca (2013)
SY07 – “Ainda Somos os Mesmos”, um tributo à Belchior (2014)
SY08 – “De Lá Não Ando Só”, Transmissor (2014)
SY09 – “Espelho Retrovisor”, um tributo aos Engenheiros do Hawaii (2014)
SY10 – “Projeto Visto 2: Brasil + Portugal” (2014)
SY11 – “Somos Todos Latinos” (2015)
SY12 – “Mil Tom”, um tributo a Milton Nascimento (2015)
SY13 – “Caleidoscópio”, um tributo aos Paralamas do Sucesso (2015)
SY14 – “Temperança” (2016)
SY15 – “Ainda Há Coração”, um tributo à Alceu Valença
SY16 – “Brasil También Es Latino” (2016)
SY17 – “Faixa Seis” (2017)
SY18 – “Sem Palavras I” (2017)
SY19 – “Dois Lados”, um tributo ao Skank (2017)
SY20 – “As Lembranças São Escolhas”, canções de Dary Jr. (2017)
SY21 – “O Velho Arsenal dos Lacraus”, Os Lacraus (2018)
SY22 – “Um Grito que se Espalha”, um tributo à Walter Franco (2018)
SY23 – “A Comida”, Os Cleggs (2018)
SY24 – “Conexão Latina” (2018)
SY25 – “Omnia”, Borealis (2019)
SY26 – “Sem Palavras II” (2019)
SY27 – “¡Estamos! – Canções da Quarentena” (2020)
SY28 – “Emerge el Zombie – En Vivo”, El Zombie (2020)
SY29 – “Canções de Inverno – Um songbook de Ivan Santos & Martinuci” (2020)
SY30 – “SIEMENSDREAM”, Borealis (2020)
SY31 – “Autoramas & The Tormentos EP”, Autoramas & The Tormentos (2020)
SY32 – “O Ponto Firme”, M.Takara (2021)
SY33 – “Sob a Influencia”, tributo a Tom Bloch (2021)
SY34 – “Pra Toda Superquadra Ouvir”, Beto Só (2021)
SY35 – “Bajo Un Cielo Uruguayo” (2021) com  Little Butterfly Records
SY36 – “REWIND” (2021), Borealis
SY37 – “Pomar” (2021), Vivian Benford
SY38 – “Vizinhos” (2021), Catalina Ávila
SY39 – “Conexão Latina II” (2021), Vários artistas
SY40 – “Unan Todo” (2022), Vários artistas
SY41 – “Morphé” (2023), Rodrigo Stradiotto
SY42 – “Paranoar” (2023), YPU (com Monstro Discos)
SY43 – “NO GOD UP HERE” (2023), Borealis
SY44 – “Extras de “Vou Tirar Você Desse Lugar”, Cidadão Instigado & Plástico Lunar (2024) – Com Allegro Discos
SY45 – “Smoko” (2024), Smoko
SY46 – “Trilhas Sonoras para Corações Solitários” (2024), Hotel Avenida

Discos liberados para download gratuito no Scream & Yell:
01 – “Natália Matos”, Natália Matos (2014)
02 –  “Gito”, Antônio Novaes (2015)
03 – “Curvas, Lados, Linhas Tortas, Sujas e Discretas”, de Leonardo Marques (2015)
04 – “Inverno”, de Marcelo Perdido (2015)
05 – “Primavera Punk”, de Gustavo Kaly e os Hóspedes do Chelsea feat. Frank Jorge (2016)
06 – “Consertos em Geral”, de Manoel Magalhães (2018)
07 – “Toda Forma de Adeus”, Jotadablio (2023)

13 thoughts on “Download: Ouça e/ou baixe um tributo a Walter Franco

    1. Abdalah, está tudo correto. Um amigo também teve dificuldade na descompactação, e o descompactador dele era exatamente um Win-Rar. Dai ele trocou por um 7-zip e deu certo (segundo ele, o Win-Rar dele deveria estar desatualizado). Fiz alguns testes com amigos antes de ir ao ar e todo mundo conseguiu baixar e descompactar.

  1. Muito bom. Sempre aguardo ansioso pelos lançamentos exclusivos que vocês fazem por aqui. Ainda no aguardo de um tributo ao Zé Ramalho.

  2. não consigo descompactar… não tenho como instalar 7-zip nem mesmo winrar no meu mac… uso o unarchiver e alguns rar ele dá problema e outros não… será que vcs poderiam subir o arquivo em formato zip? o zip nunca deu problema… se puderem ia ficar agradecido… abs.

  3. Só eu que fiquei decepcionado com o tributo ao Walter Franco não ter a música “cabeça”? Como assim ficou de fora um dos maiores sucessos do tributo?

  4. Parabéns pela coragem iniciativa de reverenciar um dos músicos mais foda do mundo! Até hoje a sua música é atual e está sempre a frente! Nunca datado, sempre hoje! Walter Franco é pop, é rock, é poesia, é experimental, é paralelo, é diferente, é estilo próprio, é muito tudo! Sempre fui fã!

    Outro que merece um tributo assim é o Zé Ramalho, e é lógico, não poderá faltar Kryptonia! 😉

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