Cinema: Namorados Para Sempre

por Marcelo Costa

O marketing cinematográfico brasileiro costuma cometer erros grotescos, e isso infelizmente não é novidade. Exemplos existem aos montes (principalmente no que diz respeito aos títulos dos filmes), mas o caso de “Blue Valentine” (Estados Unidos, 2010), no entanto, é peculiar. Não bastou dar ao filme um título nacional fofinho (“Namorados Para Sempre”) que nada tem a ver com o drama emocional violento e espetacular da história, mas vendeu-se a película com um filme de casal perfeito para o dia dos namorados.

Porta-retratos para fixar na geladeira e corações fofos de borracha foram distribuídos na compra do ingresso aos casais  que, iludidos, deviam imaginar ter pela frente um romance água com açúcar daqueles que transformam a vida real em um conto de fadas, mas nada poderia os preparar para a tempestade emocional que cerca “Blue Valentine”, segundo longa-metragem da carreira do jovem cineasta Derek Cianfrance, que divide o roteiro com Cami Delavigne e Joey Curtis. O subtítulo nacional, no entanto, é acertado: “Uma verdadeira história de amor”.

“Blue Valentine” narra o romance dos jovens Cindy e Dean. Os personagens, no entanto, são secundários. Eles vivem uma história de amor intensa, sorriem e choram, mas a grande estrela do filme é o relacionamento entre estas duas pessoas absolutamente normais, que escolheram viver juntas por vontade própria (com uma mãozinha do destino – sempre ele), e levaram uma rasteira de Afrodite, a decantada deusa grega do amor. O que interessa em “Blue Valentine” não é Cindy e/ou Dean, mas o que ele constroem e destroem juntos.

O relacionamento tal qual o conhecemos surge na maioria das vezes ao acaso. Homens e mulheres entram em uma história de amor de olhos vendados. Ele não a conhece (embora acredite que conheça). Ela, a mesma coisa. Na verdade, eles mesmos não se conhecem, mas se entregam àquilo que acreditam ser amor (e talvez até seja), mas assim como começa, o amor (desculpem-me os românticos) também acaba. “Blue Valentine” é um filme que mostra o quão somos despreparados para o relacionamento a dois.

Focado em Cindy e Dean, a grande força de “Blue Valentine” naturalmente surge das excelentes atuações de Michelle Williams e Ryan Gosling, que não estão aqui apenas como atores, mas também como produtores executivos – o que, de certa forma, explica a entrega dos dois atores a seus personagens, entrega tal que rendeu aos dois indicações na categoria de melhor ator e atriz no Globo de Ouro, e para Michelle no Oscar (ela merecia ficar com a estatueta que foi parar nas mãos de Natalie Portman, por “Cisne Negro”).

“Blue Valentine” começa com certa leveza: a filha do casal acorda o pai para dizer que a cachorrinha da família desapareceu. Derek Cianfrance vai incluindo delicadamente os elementos da história como se estivesse esculpindo uma pérola. Tudo acontece no momento certo. Nada é gratuito.  O roteiro não glamouriza o romance. A trilha sonora do grupo Grizzly Bear é delicada e eficiente. A montagem simples e exemplar intercala começo e fim. Cenas do romance se esfarelando são exibidas lado a lado com os sorrisos de um início de relacionamento propondo a questão: como aquela felicidade se transformou nessa dor? Você deve saber.

Então voltamos à questão inicial sobre o marketing brasileiro em torno do filme: ao vender “Blue Valentine” como um conto de fadas, a produtora cometeu um grande erro que no fim das contas deu certo. Pois quem realmente precisa(va) ver esse filme são os casais felizes do dia dos namorados que nunca pararam para pensar nos dois lados de uma história de amor. Nunca pararam para pensar a própria história. Amam por inércia. Porém, a inércia uma hora acaba e o amor também. Não precisa nem ver o filme para saber isso (mas vá!): basta prestar atenção ao seu redor. Não que seja impossível ser feliz, mas é bom saber ser feliz de verdade. Ou alguém aqui (além de Kate Middleton) acredita em conto de fadas?

4 thoughts on “Cinema: Namorados Para Sempre

  1. Esse filme é incrível. Fui ver por causa dos dois, que adoro, mas não sabia nada do roteiro. Sai do filme meio sem rumo.
    Não concordo muito com a parte que você fala da montagem. Não acho ela simples, acho refinadíssima (não que você tenha dito o contrário). A montagem é uma das melhores coisas do filme. Muito bem feita.
    Você leu a crítica do Roger Ebert? Na minha opinião ele (quase) sempre acerta. Vale a pena.
    Comprei o filme na Amazon, já que não achei aqui ainda.

  2. Marcelo teu texto ficou melhor q o filme e apesar da excelente atuação do casal de atores, o filme me deixou constrangido, incomodado e achei uma excelente porcaria mas o texto tá ótimo e tem muito mais sobre amor q do próprio filme.

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