por Pedro Salgado, especial de Lisboa
Fotos de Alexandre Marques
Um recinto lotado, composto maioritariamente por jovens fãs, trintões, quarentões e alguns senhores respeitáveis dava corpo a um ambiente de saudável convivência lisboeta que logo se transformou num momento de euforia com a entrada em palco dos membros do Capitão Fausto, pouco depois das 22 horas, para darem início à sua atuação, integrada na turnê portuguesa de apresentação do álbum “A Invenção do Dia Claro” (2019).
Arrancando com uma sequência claramente certeira (“Boa Memória” e “Faço As Vontades”), o quinteto cedo mostrou a sua confiança interpretativa e uma dinâmica superior a outras fases, resultado de muitos espetáculos e um ‘savoir faire’ que lhes permite dar um travo reggae à sua música perante a adesão total da plateia. As canções do aclamado novo álbum dominam o show e a animação global, mas quando soam os primeiros acordes de “Santa Ana”, do álbum “Gazela” (2011), os pulos multiplicam-se na assistência e a pegada dançante alastra na multidão.
O vocalista e guitarrista Tomás Wallenstein é um mestre de cerimônias animado (vestindo um terno axadrezado), que ocasionalmente joga charme no público, Domingos Coimbra toca o baixo com o seu ar cool, Salvador Seabra na bateria revela uma energia inesgotável, Manuel Palha (tecladista e guitarrista) aparenta alguma discrição, mas é fundamental na engrenagem da banda e Francisco Ferreira (tecladista) alterna momentos de aparente distanciamento com etapas de empolgação, mas revela ser sempre eficaz.
Depois de “Amanhã Tou Melhor” (cantada em uníssono), o grupo interpretou “Sempre Bem” e os coros da canção assinados por Domingos Coimbra e Francisco Ferreira tiveram ressonância geral. O baixista retribuiu a graça dizendo: “Ontem na Casa da Música (Porto) aconteceu o mesmo, todo o mundo dizia Uh! Uh!” e aproveitou igualmente para agradecer a vinda das pessoas ao concerto. Com Tomás ao piano veio o primeiro grande momento da noite: “Amor, A Nossa Vida”, gerando um clima de forte sintonia entre os presentes e o conjunto lisboeta.
A jornada prosseguiu revisitando quatro temas do disco “Capitão Fausto Têm Os Dias Contados” (2016), para satisfação da audiência, que confirmou a solidez instrumental do quinteto. A forma como souberam botar um colorido especial em faixas como “Semana Em Semana” e “Tem de Ser” evidenciou um sentido estético mais apurado. Esta tendência foi acompanhada pela afinação coletiva, que não saiu comprometida por um ocasional solo de bateria ou guitarra elétrica.
Um par de canções de “Pesar O Sol” (2014), formado por “Maneiras Más” e “Célebre Batalha de Formariz”, manteve o público grudado e emerso em detalhes elaborados, que comprovam a versatilidade do Capitão Fausto na abordagem ao psicodelismo e a latitudes distantes, mas não menos interessantes para os seus seguidores. Na parte final do espetáculo, onde não faltaram agradecimentos à Red Bull pela oportunidade de gravar no Brasil, às famílias, amigos e namoradas do grupo, entre outros, o Capitão Fausto recordou “Febre” (numa versão funky e irresistível), “Morro Na Praia”, “Verdade” (mantendo o seu encanto original) e concluiu a sua atuação repetindo “Boa Memória”.
Perante a insistência generalizada, o grupo voltou ao palco para o bis. No encore, de novo com Tomás ao piano, a balada “Alvalade Chama Por Mim” comoveu a multidão, representando uma espécie de regresso espiritual a casa. O show terminou com “Final” (a última canção do álbum “A Invenção do Dia Claro”), que valeu um solo de guitarra de Tomás Wallenstein, enraizado no rock dos anos 70, abrindo caminho para o abraço e vénia coletiva do quinteto. É certo que o acolhimento do público foi fantástico e o show aconteceu na sua cidade natal, Lisboa, mas a comunhão verificada no Cineteatro Capitólio anuncia que o Capitão Fausto vai florescer ainda mais e uma geração interessada irá crescer com a banda.
– Pedro Salgado (siga @woorman) é jornalista, reside em Lisboa e colabora com o Scream & Yell contando novidades da música de Portugal. Veja outras entrevistas de Pedro Salgado aqui.
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