Música: “Enterro das Marés”, novo EP da one men band Throe, continua equilibrando brutalidade, melodia e um pouco de luz

texto por Homero Pivotto Jr.

O guitarrista e compositor Vina é forjado na diversidade rocker que deu o tom na última década do século passado — tempo em que era preciso esforço para se ter acesso a bandas fora do mainstream, seja garimpando lojas de discos, lendo publicações especializadas (de zines a revistas) ou ficando atento aos programas menos óbvios da extinta MTV. São referência para o músico estilos que vão do metal ao indie, passando pelo punk, pelo hardcore, pelo que se convencionou chamar grunge, pelo alternativo e, por que não, até por algo mais pop. Com esse background diversificado, o paulistano consegue equilibrar brutalidade e melodia com propriedade de quem é fã tanto de Seaweed, Drive Like Jehu e Deftones quanto de Morbid Angel, Napalm Death e Kreator.

Se na banda Huey, na qual é guitarrista, Vina dividi com os parceiros uma produção musical instrumental autoclassificada como “metal tropical” (espécie de cruza entre stoner e post rock com tempero “à brasileira”), na carreira solo ele ousa variar ainda mais. Seu projeto one men band Throe carrega elementos dos subgêneros rockeiros já mencionados aqui, e ainda acrescenta referências de industrial, noise e eletrônica para criar uma experiência sonora densa, por vezes ruidosa e outras mais harmônicas.

No mais recente EP “Enterro das Marés”, Vina nos conduz por uma instigante jornada por meio da música que não se apega a rótulos. São apenas três faixas gravadas no Tori Studio, em São Paulo — onde também foi registrado o álbum “Throematism” (2021) — com produção de Marco Nunes (Chaosfear, Genocidio, Sacrifix).

Neste, que é o sexto trabalho do Throe, Vina segue a fórmula de composição dos materiais anteriores: idealiza as faixas e cria, se não todo o instrumental, ao menos a maior parte dele, incluindo programação das batidas, guitarras e sintetizadores. Já o baixo, desta vez, foi uma colaboração do produtor Marco Nunes.

Sobre a inspiração para a obra, Vina declarou no press-release oficial: “São composições que surgiram da reflexão sobre os diversos finais que precisamos viver, o vazio que isso causa e como esse vazio pode também ser entendido como um novo espaço a ser preenchido”.

‘Hope Shines in the Autumn Light’ abre o EP. Trata-se de uma viagem sonora de 14 minutos que alterna momentos de calma e tensão. Em velocidade moderada, a faixa ganha o ouvinte com batidas bem pontuadas e um ótimo trabalho das cordas (linha de guitarra com melodia cativante e graves bem marcados), lembrando algo de Jesu (projeto shoegaze/drone do veterano mestre do barulho Justin Broderick).

A sequência com ‘Bleed Alike’ é mais nervosa, remetendo às repetições e ao peso do Godflesh (banda principal do já mencionado Broderick). Soa, grosso modo, como trilha sonora para expurgar o mal que habita em cada um. Como não há vozes, sinta-se à vontade para gritar acompanhando a intensidade do instrumental.

O último tema do registro é ‘Renascente’, que traz a calmaria à tona evocando um quê de Slowdive com alguma reminiscência de composições mais lentas do The Cure. É a track mais “otimista” do álbum, encerrando o trampo de maneira reflexiva, sugestionando — ao menos para o escriba — sensação de que há luz no vale das trevas.

“Enterro das Marés” saiu pelo selo Abraxas Records nas plataformas digitais e, segundo seu autor, considera-se a possibilidade de lançamento em algum formato físico.

– Homero Pivotto Jr. é jornalista, vocalista da Diokane e responsável pelo videocast O Ben Para Todo Mal.

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