por Carmine D’Amico
Texto publicado originalmente no site italiano Kalporz, parceiro de conteúdo do Scream & Yell
O primeiro rascunho deste texto data de muitas semanas atrás. Aqueles eram dias da turnê norte-americana do Måneskin (banda de hard rock italiana formada em Roma em 2016 que também fará shows no Brasil no segundo semestre) iniciada em outubro, novembro e dezembro de 2021, com um salto para abril de 2022 culminando na apresentação no Coachella, e pensei que seria divertido relembrar outra banda italiana que também desbravou o exterior – curiosamente, eles também foram a primeira banda de new wave ocidental a tocar na União Soviética.
Talvez não fosse preciso especificar porque essa abertura soa menos divertida no momento, mas o interesse em falar sobre essa banda italiana formada na metade dos anos 70 se manteve. E ainda há um componente curioso por não se tratar de uma banda underground repleta de maquiagem, mas sim de uma das bandas de maior sucesso na história da música italiana: Matia Bazar.
De acordo com o livro “Back in the USSR: The True Story of Rock in Russia“, foi Gosconcert (a agência estatal de reservas da União Soviética) quem os convidou para uma turnê de verão em 1984. Um autêntico cavalo de tróia sintético do cenário de Sanremo causou uma epifania nos russos culminando em ingressos esgotados em Moscou e seu entorno.
Origens à parte, o som de Matia Bazar foi abertamente inspirado em bandas como Ultravox, enquanto o figurino e a voz de Antonella Ruggiero certamente remetiam a Siouxsie – Ruggiero também se transfiguraria em uma espécie de Sheila Chandra em sua estreia solo, “Libera” (1996), um bizarro disco de pop étnico gravado entre Madras e Los Angeles.
Matia Bazar certamente foi uma figura muito estranha dentro da música italiana, talvez o primeiro (pelo menos entre os artistas pop que figuravam nas paradas de sucesso) a misturar uma melodia tão eletrônica quanto cantada. Todo o imaginário da banda, a começar pelo penteado e roupas de Matia, lembrava um imaginário dos anos 40, em total contradição com o som absolutamente em sintonia com os tempos, quiça até futurista. Era como se “Blade Runner” tivesse sido filmado com a estética de “Casablanca”, puro pós-modernismo.
A sublimação desta fórmula é certamente “Vacanze Romane”, uma obra-prima e uma grande música pop tornada lendária pela soprano robótica e melodramática de Ruggiero que se eleva em batidas e sintetizadores que não deveriam ter cidadania no arranjo de Carlo Marrale. Foi o 14º single da Matia Bazar, lançado em 1983 e presente no álbum “Tango” (do mesmo ano).
Poucos grupos foram capazes de aquarelar paisagens sonoras tão ambíguas, a meio caminho entre um videogame antigo e uma visão dos sonhos de David Lynch. Se existisse uma banda italiana assim hoje, principalmente se estivesse no topo das paradas do Spotify, com certeza seria comentada em todos os lugares. Dos “terraços do Corso” (citação da letra de “Vacanze Romane”) a webzines como este.
Nota do editor: ainda que o último disco de estúdio, “Conseguenza Logica” tenha saído em 2011, a Matia Bazar segue na ativa até hoje, sem nenhum membro original. Dois dos músicos que fundaram a banda em 1975, Giancarlo Golzi e Piero Cassano, deixaram o grupo em 2015 e 2017, respectivamente. Antonella Ruggiero permaneceu na banda entre 1975 e 1989, e após sete anos afastada da Matia Bazar lançou seu primeiro disco solo, “Libera”, de 1996. De lá pra cá foram mais de 20 álbuns, com a cantora enveredando para a música clássica nos discos mais recentes.
Oi. Legal a matéria acerca desta ótima banda Italiana.
O período anterior a essa fase “eletrônica” que inicia-se com o álbum Tango, de 1984, é igualmente excelente e que desde o início a banda se propôs a experimentação. a Marca MATIA BAZAR é uma referencia quando se trata de readaptação a cada tempo de sua existência. Há várias formações sempre com uma excelente cantora a frente mas com um som quase que democrático e de competentes arranjos e execução. Só escutando para sentir. A minha recomendação são os três primeiros álbuns.