Texto, fotos e vídeo por Nelson Oliveira
Poucas bandas oriundas de outros estados brasileiros se adaptam tão bem ao gosto do público de Salvador quando a Francisco, El Hombre. A capital baiana tem o caldo político necessário para que as letras de cunho social dos paulistas encontrem eco, mas não só: também já produziu grupos que chegaram ao sucesso (como Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta, Maglore e até mesmo BaianaSystem) ao alimentar sua sonoridade com influências de fontes similares às do coletivo formado em Campinas.
Não era surpresa, portanto, que o rock dançante e repleto de influências latino-americanas feito pela Francisco, El Hombre fosse tão aguardado na capital baiana. Na última sexta, 24 de janeiro, a banda levou para o Largo Quincas Berro d’Água, no Pelourinho, o show da turnê do álbum “Rasgacabeza”, lançado no primeiro semestre de 2019. Foi a primeira apresentação do grupo na Bahia desde que Sebastián Piracés-Ugarte (bateria e vocal) passou a morar na cidade.
Antes de a Francisco, El Hombre entrar em cena, o início da noite ficou por conta da orquestra de cumbia Sonora Amaralina, que existe desde 2018 e, mais recentemente, tem trabalhado com a divulgação do dançante ritmo colombiano em um projeto semanal em Salvador. A big band, que conta com alguns músicos experientes, como Felipe Guedes, privilegia a performance instrumental, mas também apresenta clássicos cantados, como “Yo Me Llamo Cumbia”, “Prende La Vela” e “Cariñito”.
Mas mesmo Sandra Regina, vocalista da Sonora Amaralina, sabia que o público estava ali para ver Francisco, El Hombre. E ela até arriscou alguns versos de “Triste, Louca ou Má”, a cappella, no fim da apresentação da orquestra. Após alguns minutos de intervalo, os paulistas subiram ao palco com sua energia característica e fizeram um show bastante animado, cuja vivacidade manteve a plateia aquecida mesmo com o chuvisco constante que caía.
A aposta do grupo numa espécie de “rock voodoohop” em “Rasgacabeza” gerou algumas críticas, mas, por outro lado, cai como uma luva nas apresentações ao vivo. O combo de carisma com eletricidade de Mateo Piracés-Ugarte (vocal e violão) e a voz rasgada de Juliana Strassacapa embalaram canções dançantes do novo disco, como “CHAMA ADRENALINA :: gasolina”, “ENCALDEIRANDO :: aqui dentro tá quente” e “CHÃO TETO PAREDE :: pegando fogo”. Nesta última, houve até coreografia puxada pela banda, formada ainda pelo guitarrista Andrei Martínez Kozyreff e pelo baixista Rafael Gomes.
O carnaval politizado da Francisco, El Hombre teve alguns intervalos para o público respirar (e chorar) com “Triste, Louca ou Má” e “O TEMPO É SUA MORADA :: celebrar”, mas eles não duraram tanto. Logo os paulistas retomavam a farra com hits de “Soltasbruxa” (2016), como “Bolso Nada” e “Calor da Rua” e a irônica marchinha “Tá com Dólar, Tá com Deus”.
Também houve espaço para canções que têm trechos cujas sonoridades evocam a produção do BaianaSystem, como “MANDA BALA FOGO :: não preciso de você” e “SE HOJE TÁ ASSIM :: imagina o amanhã”, além de “Liquidificador”, gravada junto com a carioca Braza, em EP do projeto Francisca, La Braza. Para finalizar, foi a vez do “punk timbalada” de “MATILHA :: coleira ou cólera”, canção lançada nos primeiros dias de janeiro.
Entre o punk e a influência de ritmos latino-americanos, a Francisco, El Hombre parece cada vez mais interessada em se abastecer com a riqueza percussiva da Bahia. Enquanto esperamos por um efeito mais expressivo da estadia de Sebastián Piracés-Ugarte em Salvador, ao menos podemos atestar que a banda está preparada para pular o carnaval baiano. Ou, quem sabe, até mesmo puxar o seu próprio trio elétrico.
– Nelson Oliveira é graduado pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia, atua como jornalista e fotógrafo, sobretudo nas áreas de esporte, cultura e comportamento. É diretor e editor-chefe da Calciopédia, site especializado em futebol italiano. Foi correspondente de Esportes para o Terra em Salvador e já frilou para Trivela e VICE.