por Marcelo Costa
“August: Osage County” (no Brasil, “Álbum de Família”, 2013) nasceu como peça de teatro pelas mãos do dramaturgo Tracy Lets, que ganhou o Prêmio Pulitzer na categoria Drama em 2008, e sacudiu a Broadway com a história de uma família do calorento estado de Oklahoma cujo patriarca, o poeta e professor Beverly Weston (Sam Shepard), desaparece misteriosamente, e após a descoberta de seu paradeiro, suas três filhas retornam a casa para cuidar da mãe, Violet (Meryl Streep, sempre esplendorosa), doente de câncer na boca e viciada em remédios (vários).
Terceiro texto de Tracy Lets, que também assina o roteiro, a ganhar as telas de cinema (os anteriores foram o suspense “Bug”, de 2006, e o sensacional “Killer Joe”, de 2012, ambos dirigidos por William Friedkin), “Álbum de Família” é dirigido por John Wells, um homem mais acostumado com séries de TV, mas que não compromete aqui – pelo contrário, consegue, inclusive, fugir das armadilhas teatrais do texto, que são bem desenvolvidas nos dois primeiros atos, e parecem mais nítidas no trecho final (terceiro ato) do filme.
No primeiro ato, a família se reúne para dar suporte à mãe em meio ao desaparecimento do pai, e esta, drogada e magoada, desfila um rosário de queixas e acusações que reviram o estomago do espectador. O segundo ato se desenrola após a descoberta do paradeiro do pai, e a tragédia do acontecimento amplifica o clima de dramas na casa que as três filhas cresceram. O ato final, que não consegue se livrar do arquétipo teatral do roteiro original, é um baú doloroso de segredos sendo aberto, que não irá facilitar em nada a relação entre as mulheres da casa.
Não espere alegria. Retrato de uma geração que passou maus bocados em uma nova terra absolutamente sem lei (e um mundo onde a violência familiar era tão normal que a bênção antes de dormir), “Álbum de Família” é um catálogo de feridas familiares cujos personagens retiram a casca, uma a uma e lentamente entre berros e acusações, desvelando traumas, decepções e segredos carregados por uma vida inteira, e que, de certa forma, contaminam as novas gerações.
O texto de Lets ganha ainda mais impacto com o elenco estelar encabeçado por Meryl Streep (sempre, sempre e sempre magnifica, ainda que um tiquinho exagerada – ou excessivamente teatral – aqui) e Julia Roberts (como a filha Barbara, que se descobre cada vez mais parecida com a mãe, e não gosta nada disso), simplesmente sensacional, em uma de suas melhores atuações. Circundam as duas Ewan McGregor (ótimo como o marido que não consegue domar Barbara), Chris Cooper, excelente como Charles, casado com a irmã de Violet, Mattie Fae.
Tracy Lets é fiel ao lema “tragédia pouca é bobagem”, e a impressão que “Álbum de Família” passa é de que o roteirista condensou os traumas de 10 famílias em uma para amplificar o drama dos Weston, por isso um simples almoço pode se transformar em um disparo ferrenho de acusações, que não poupam do novo namorado (Dermot Mulroney, como Steve, o canalha yuppie sem escrúpulos) da filha tolinha (Juliette Lewis, como Karen, ótima) até a neta primogénita (Abigail Breslin), que precisa lidar com bullyings familiares aos 14 anos.
Os dramas dolorosos (e excessivos) do mês de agosto em Osage County narrados por Tracy parecem referendar a ideia de que, em seu âmago, todas as famílias carregam traumas, e basta provocar para que os fantasmas saiam dançando pela sala entre poças de lágrimas. Exagerado, depressivo e, por que não, educativo, “Álbum de Família” soa como um retrato (e um recado) de uma geração que sofreu horrores com avós e pais (e um país) incapazes de lidar com a obrigação de criar uma família enquanto se criava, também, uma nação (os Estados não tão Unidos assim da América).
Será que cometeremos sempre os mesmos erros?
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
O núcleo da história, pai abandonando uma mãe louca e excessiva, e a personalidade das três filhas, me fez lembrar, vagamente, Interiores do Woody Allen.
Gostei bastante do filme.
Lembro de pensar várias vezes se assistiria ou não (com um certo preconceito pelo plot que lembrava novelão estilo Thalia e suas várias Marias). Finalmente resolvi relaxar no sofá e mergulhar naquela história. Pra minha surpresa, o novelão tinha momentos de humor realmente apropriados.
Pesa a mão no drama (como foi escrito na crítica acima). Também concordo que mesmo maravilhosa, em alguns momentos, Streep parece cair em um leve Overacting). Julia Roberts é mesmo o destaque do filme.
Gostei bastante da sequência do piano (prevejo Cumberbitches -homens e mulheres- se derretendo com aquela cena -que termina com uma ótima piada)