Entrevista: O renascimento de Ben Kweller

entrevista por Leonardo Tissot

Após nove anos sem lançar disco, Ben Kweller está de volta. O “garoto prodígio” do rock alternativo dos anos 90 e início dos anos 2000 liberou, em pleno réveillon, “Circuit Boredom”, álbum que marca um verdadeiro recomeço em sua carreira, aos 39 anos de idade.

Ben quase perdeu a vida em um incidente doméstico ocorrido em 2013. Mesmo recuperado fisicamente, as sequelas psicológicas de passar pela experiência fizeram com que o artista ficasse totalmente desinteressado em relação à música — pelo menos, de forma profissional.

Neste papo de quase uma hora via Zoom com o Scream & Yell — entre dezenas de “like” e “you know” típicos de quem viveu muitos anos em Nova York —, um animado Ben Kweller fala sobre o novo disco, o período de reclusão, algoritmos, o desejo de trabalhar com Kanye West e a paixão por Fortaleza e Belém, cidades que conheceu em sua passagem pelo Brasil, em 2012.

E ele deixa bem claro: quer voltar ao país assim que as condições sanitárias permitirem. Confira o papo a seguir!

Então, como você está…
Estou bem!

…com a pandemia e tal. Como tem lidado com a situação?
Tá tudo uma bagunça. É triste ver que isso já durou tanto que agora virou apenas… o novo normal, saca? Como você pode ver, investi em algumas câmeras [Ben mostra diversos ângulos de câmera em seu pequeno estúdio], então esse foi o jeito que encontrei de ter meu mundo aqui. E eu tenho… Sabe, cara, na real tenho escrito muitas músicas. Uma coisa legal da COVID, se é que tem algo legal nisso, é que tenho feito muitas sessões de composição via Zoom, como essa que estamos fazendo agora, mas apenas compondo com outras pessoas, então é bem divertido. Geralmente eu pego um voo pra L.A., Nova York ou Nashville pra fazer esse tipo de coisa, mas agora tem sido bem legal e tenho tido a oportunidade de fazer isso com artistas que, normalmente, não faria. Muita gente tem se aberto a essa possibilidade, então tem sido legal.

Onde exatamente você está morando?
Estou na região de Austin, Texas. Vivo no campo, em uma pequena cidade chamada Dripping Springs. É, tipo, a “Woodstock de Austin”, nas colinas. E é muito bonito aqui, além de ter uma boa comunidade de músicos.

Fora alguns singles lançados nos últimos anos, faz algum tempo que não ouvimos falar de você. Há alguma razão específica para você não ter lançado nenhum álbum completo em nove anos? E o que te motivou a retornar agora?
Bem, é uma história triste… Lancei “Go Fly a Kite” em 2012, e estava indo tudo bem. Fiz turnês por todo o mundo e até fui indicado a um Grammy pela primeira vez. As coisas estavam realmente ótimas.

Foi nessa época que você veio ao Brasil também.
Isso, exatamente, minha primeira turnê no Brasil, que foi legal pra caralho… Então, no inverno, eu e minha família alugamos uma cabana no Novo Mexico. Foi muito divertido, até que uma noite minha esposa acordou e disse, “Ben, levante-se, tem algo errado. Estou passando mal”. Tentei me levantar e caí na mesma hora. Estávamos passando mal e não sabíamos o que era. Saímos da cabana e chamamos a emergência. A ambulância veio nos pegar e disseram, “mais 15 minutos e vocês não acordariam mais. Vocês estão envenenados com monóxido de carbono”.

Vazamento de gás?
Vazamento de gás, exatamente.

Uau…
Ficamos no hospital por alguns dias, no oxigênio, e nossos cérebros fritaram… Voltamos a Austin após alguns dias, e tive que cancelar tudo. Eu tinha virado um zumbi. Algumas semanas se passaram, depois alguns meses… Eu não queria sair em turnê, não queria tocar ao vivo, estava super deprimido. Não sabia o que fazer. Antes que eu pudesse perceber, anos haviam se passado. O lado bom disso foi que continuei compondo, mas eu apenas sentava na minha cama e escrevia algumas canções. Não queria ir para lugar nenhum nem fazer coisa alguma. Não queria gravar. Então, há uns dois anos, um amigo meu, Dwight Baker, me ligou e disse: ‘Cara, sei que você está realmente deprimido, mas estava pensando, quem sabe você aparece aqui. Vamos gravar uma música apenas por diversão e brincar no estúdio, porque talvez fazer isso com um amigo faça com que você se sinta melhor. Então gravamos “Heart Attack Kid”, e esse foi o começo de tudo. Quer dizer, nem acredito que nove anos se passaram. É tão triste, porque eu amo música. Quer dizer, é a coisa que mais amo. Nunca fiquei deprimido antes, então tive que dar atenção à minha saúde mental, fazer terapia e tal. Me livrei do monóxido de carbono, mas o incidente afetou uma série de coisas, tanto fisicamente quanto a minha memória, entre outras coisas. Meio que afeta todo o organismo, então é por isso… [que levou tanto tempo para lançar um novo álbum]. E agora estou querendo correr atrás do tempo perdido, para compensar.

É ótimo tê-lo de volta.
Feliz de estar de volta, cara!

Pode me contar um pouco sobre as gravações de “Circuit Boredom”? O disco foi gravado em casa ou no estúdio? Ele foi coproduzido por você com o Dwight Baker, certo?
Isso aí.

Mas o álbum foi feito durante a pandemia?
Bem, é engraçado. Terminamos pouco antes da pandemia começar. Eu ia lançar o disco em março, mas aí veio a pandemia. Ficamos, tipo: “Que merda! O que é que a gente faz?”. E aí, finalmente… Isso já está rolando há tanto tempo que eu apenas disse, “vou lançar no Ano-Novo”, só para fazer algo divertido. Porque geralmente ninguém lança um disco no Ano-Novo, a indústria da música está totalmente fechada nesse período. Mas pensei que meus fãs iam estar com seus celulares e receberiam uma notificação sobre o lançamento. O processo de gravação foi bem simples, basicamente eu e meu amigo John David Kent, que é um ótimo baterista — ele era da minha banda, Radish, quando éramos adolescentes. E ele tocou na maior parte dos meus discos solo. Então éramos eu, John e Dwight na mesa de mixagem, e meu amigo Daniel tocando teclados e sintetizadores. Mas fizemos overdubs nas partes dele. Na real, durante a gravação éramos eu na guitarra e cantando, mais um baterista. Isso para as bases. E aí adicionamos teclados, sintetizadores e o baixo. Teve só um dia que eu trouxe um grupo de amigos para fazer um coral. Eles cantaram uns “ohs” e “uhs”.

Considerando tudo pelo que você passou, você é um compositor que trabalha constantemente em novas músicas ou o seu foco criativo só aparece quando tem um projeto específico em mente, como um álbum ou single?
Eu escrevo o tempo todo — não necessariamente todos os dias —, mas é algo que faço ao longo do ano. O que tento fazer, pelo menos uma vez por semana, é escrever uma canção para outros artistas. Compor é o que mais gosto de fazer, então me reúno com amigos pelo Zoom, e combinamos: “beleza, vamos fazer uma música country hoje”, ou “vamos compor algo pop, que a gente possa mandar para a Ariana Grande”. É legal fazer esse exercício.

Então, às vezes você manda essas canções para os artistas de fato.
Sim, a gente tenta. Enviamos para os empresários e representantes de cada um. Estou meio que montando uma pasta de tudo que escrevi durante a pandemia. Então, vamos colocar essas canções no mundo, vai ser legal. É empolgante.

Você diria que o novo álbum tem um tema, um conceito ou algo mais específico…
Sim.

…e qual a origem do título?
Tem um tema, sim. Ele se chama “Circuit Boredom” porque, bem, há um trocadilho com circuito impresso [“circuit board”, em inglês], e estar entediado [“bored”, em inglês]… Porque vivemos nesta era da tecnologia na qual temos todas as respostas na ponta dos dedos. Você pode procurar qualquer coisa no Google, pode encontrar e fazer qualquer coisa… Há muita informação. E mesmo com tudo isso, estamos entediados o tempo todo. As pessoas estão simplesmente entediadas e não sabem o que fazer, então é uma situação engraçada, na qual… Parece que você tem tanto, mas sente como se não tivesse nada. Então é isso que “Circuit Boredom” significa para mim. Gravei 15 músicas, mas coloquei apenas oito no disco, porque… ninguém mais tem tempo para nada, então pensei, “oito canções provavelmente são o suficiente”. Se colocasse 15 seria muita coisa para as pessoas hoje em dia. E notei que muitos rappers têm feito isso, como o Kanye. Muitos discos dele têm oito canções. Então também estou entrando na onda. Acredito que menos realmente é mais. Antes do álbum lancei diversos singles, e eu nunca faria isso, mas é por causa da tecnologia. É quase como se a tecnologia estivesse desempenhando um papel na forma como a arte é feita agora, o que é bem esquisito. Mas o Spotify basicamente transformou nossa indústria num mercado de singles novamente. Não sei se você sabe disso, mas quando você sobe uma música para o Spotify, você só pode enviar uma canção para os editores, para tentar incluir numa playlist. Então, quanto você manda todo o disco, apenas uma faixa pode ser enviada para tentar emplacar numa playlist. E é por isso que tantos artistas, de uns dois anos pra cá, simplesmente começaram a lançar singles. É tipo, “por que eu vou te dar todo meu conteúdo se você só vai ouvir uma música?”. Então eu te dou uma música, depois outra, depois outra, e cada uma delas têm chance de entrar numa playlist. Acho que 10 anos atrás eu teria reclamado, tipo “foda-se isso! Eu faço álbuns!”, e ficaria na defensiva, protegendo a minha arte. Mas agora estou pensando que é interessante reagir ao que nos é imposto. É divertido trabalhar dentro de um sistema e ver o que consigo fazer nele.

Mas ao mesmo tempo, os primeiros discos do Black Sabbath, por exemplo, também tinham cerca de oito faixas cada.
Sim.

Então isso já era feito 50 anos atrás.
Sim, total. E muitos desses discos mais curtos se tornaram um pouco mais clássicos também por causa disso, porque você pode ouvi-los de uma sentada só. Mas já estou pronto para fazer outro.

O que você pretende fazer com essas sete canções extras? Vai lançá-las como singles ou vai reuni-las em um álbum?
Vou fazer outro álbum e essas músicas devem aparecer por aí. Às vezes dou uma segurada em canções porque pode surgir algum projeto divertido, tipo um filme, e aí eles precisam de uma canção original e inédita minha. As melhores, é claro, vou lançar no próximo disco. Sabe, é engraçado, porque normalmente eu estaria na estrada agora. Estaríamos falando no telefone, eu estaria num quarto de hotel ou em uma casa de show em algum lugar… É tão estranho ter um novo álbum lançado, mas estar em casa. Acho que vou fazer outro disco, não tenho mais nada para fazer, então vou apenas continuar fazendo música.

A próxima pergunta é sobre algo que você já falou um pouco na entrevista. Li no seu site algo que você escreveu sobre estar “de saco cheio dos algoritmos”. Você pode falar mais a respeito e também dizer o que pensa sobre o Spotify e outros serviços de streaming? Há muitos artistas reclamando sobre não receberem pagamentos justos por seu trabalho.
Quando escrevi isso, estava falando especificamente sobre redes sociais. Estava falando mais sobre o Google, Facebook, Instagram. Antigamente, você tinha milhares de seguidores, mandava uma mensagem e todos a recebiam. Mas aí inventaram o Facebook Ads e viram que poderiam faturar vendendo anúncios. Uma das coisas que eles podem monetizar é criadores se comunicando com sua audiência. Então, agora, se eu tenho 70 mil pessoas na minha página no Facebook e eu mando uma mensagem, só uns 7 mil a visualizam. Se eu quiser atingir mais gente, preciso pagar uns 500 paus só pra fazer a mensagem chegar. Então é algo bastante triste, porque às vezes só quero dizer “oi, amo vocês, como estão, o que está rolando?”. E nenhum músico pode se dar ao luxo de gastar centenas de dólares só para dar um “oi”. Isso começou a me irritar, aí fiz algo meio antiquado e procurei minha lista de e-mails. Encontrei até minha lista de antes dos tempos do e-mail, com os endereços das casas das pessoas. Costumávamos enviar um fanzine no começo dos anos 2000, então eu tenho alguns endereços. Quer dizer, provavelmente são inválidos agora, mas organizei minha lista de e-mails e fui para as redes sociais dizendo: “ei, assinem minha lista, para que eu possa te enviar um e-mail diretamente. Venha para benkweller.com!”. Tenho controle sobre o meu site e ele não está vinculado a nenhuma corporação que quer faturar em cima de meus fãs e de meus amigos. É desse algoritmo que eu falava. Em relação ao Spotify, há toneladas de algoritmos ali também. Toda aquela questão das playlists é um dos problemas. Eu adoraria subir um álbum e fazer com que o Spotify colocasse as músicas nas playlists. Quer dizer, é estranho que essa coisa das playlists tenha ficado tão grande. É o novo rádio, de certa forma. E o rádio nos Estados Unidos sempre foi meio corrupto. Há algumas estações que tocam sua música porque gostam dela, mas se você quer uma rotação contínua, precisa pagar depois de um tempo. Isso é uma merda, cara. E é por isso que você ouve sempre os mesmos 10 artistas.

Isso também acontece no Brasil há bastante tempo. E é curioso que hoje em dia ninguém pede uma recomendação de disco. É só “me manda tua playlist”.
É isso, é o lance de uma canção por vez. Então toda canção precisa ser boa, sabe? Ai de você se não compor uma música boa.

Vamos torcer para que as pessoas não resolvam ir para shows para ouvir apenas uma música e voltarem pra casa.
Pois é! Pois é! Isso costumava acontecer com o rádio e os one hit wonders. Eu me lembro do Beck, quando ele lançou “Loser”. Fui assisti-lo, acho que ele estava abrindo para o That Dog ou algo do tipo. Ele nem era famoso ainda, mas “Loser” estava começando a se tornar popular. Daí ele subiu ao palco com a guitarra e disse: “beleza, vou tocar essa canção, ‘Loser’, e aí vocês todos podem ir pra casa”. Daí ele tocou a música e as pessoas foram embora, só ficaram os fãs de verdade para ver o restante do show. [risos]

Muita coisa tem rolado no mundo, especialmente nos Estados Unidos, com todas as questões políticas, o Black Lives Matter, e as casas de show tentando sobreviver. Os roadies, equipes técnicas, todos que ajudam a movimentar essa roda estão sendo afetados. O que você pensa sobre o futuro do mercado da música e como acredita que os artistas possam ajudar a minimizar o impacto da pandemia para esses trabalhadores?
[Pensativo] Cara, é…

Eu sei que é uma pergunta difícil.
Essa é das grandes! Bem, sabe, eu acho que as pessoas que escolhem a música como profissão são criativas por natureza, então elas acabam encontrando uma saída. Em primeiro lugar, muitas pessoas estão desempregadas, o que é horrível. Muitas casas excelentes estão falindo. Haverá perdas, nem todas as empresas e negócios vão conseguir sobreviver, e isso é horrível. E até mesmo alguns artistas não terão condições de continuar, mas ao mesmo tempo, acredito que as pessoas nesse mercado são resilientes e surgirão novas ideias e novas formas de promover a música. Acredito que as turnês voltarão. Espero que essa vacina funcione e as coisas possam voltar, de alguma forma, a algo parecido com o que tínhamos antes. Não sei, cara… O cenário político é assustador e há tanta coisa envolvida que eu simplesmente não sei. Acho que estamos todos segurando a respiração, imaginando o que vem pela frente. Estou preparado para uma transição de poder pacífica [a entrevista ocorreu cerca de uma semana antes da data prevista para a posse de Joe Biden como presidente dos EUA]. Espero que Biden faça um ótimo trabalho. Precisamos nos unir, e me preocupo que ambos os lados continuem gritando um com o outro e não consigam. Mas precisamos. O país está super dividido agora, e é muito difícil para mim, porque sou um comunicador. Minha essência é unir as pessoas. É por isso que a música é uma grande forma de arte também. É uma das formas de arte que pode te levar de volta para uma determinada época e lugar da sua vida, e trazer memórias, aromas e sentimentos. As canções podem fazer isso, não importa a cor de sua pele, sua religião ou suas crenças. A música é realmente especial e acredito que meu trabalho no mundo seja continuar fazendo música, e se ela traz esperança às pessoas, isso é tudo o que posso fazer.

Muitos artistas estão em dificuldades. Até mesmo grandes nomes como Bob Dylan e Neil Young recentemente venderam boa parte de seus catálogos. Qual você considera a melhor maneira de os fãs apoiarem seus artistas favoritos em tempos como os atuais?
Uma coisa que achei legal, e fiquei orgulhoso do Spotify por isso, é que eles criaram um sistema para doações diretas aos artistas. Não sei se isso foi lançado em todo o mundo. Sempre digo isso: se você ama um artista, tente encontrar uma linha direta de comunicação. Para a maior parte das pessoas, as redes sociais são a solução, mas sempre há uma grande corporação entre você e o artista. Então, tento ir direto para os websites. Comprar mídias físicas é sempre bom, se você puder adquirir discos em vinil ou produtos licenciados diretamente do artista. E se tiver que comprar de uma dessas grandes plataformas, o iTunes continua sendo a melhor, considerando o percentual que o artista recebe. Eu criei o meu próprio fã clube no meu site. Acho que tenho umas 160 pessoas lá agora. É uma das coisas que mais gosto, porque temos uma linha direta de comunicação, faço Zooms com eles e tal.

Muitas bandas que começaram nos anos 90, como você, têm relançado seus álbuns clássicos com material extra, lados B, gravações ao vivo etc. Você tem a intenção de fazer algo parecido com seu material? Por exemplo, “Sha Sha” vai completar 20 anos em 2022…
[Empolgado] Sim, “Sha Sha”!

Você tem planos a respeito?
Você acertou na mosca, mano! 2022, sim! Meu selo, o Noise Company, comprou os direitos dos meus primeiros álbuns. Então, em 2022 vamos lançar uma edição comemorativa de “Sha Sha”. Tenho demos, voice memos, tudo daquela época. É bem legal, vai ser divertido.

Você também planeja fazer algo semelhante com o material do Radish?
Sim, gostaria de fazer. O estranho do material do Radish é que não conseguimos mais encontrar as fitas originais. É tão velho, e a gravadora com quem assinamos na época foi comprada por outra, então algumas coisas… Temos os direitos para fazer isso se quisermos, mas talvez a gente só consiga remasterizar os discos. Nem eu sei. Talvez tenhamos fitas DAT, com certeza temos os CDs, mas ter as fitas master seria incrível. Então é mais complicado. O meu material solo foi todo arquivado, por sorte. A ATO Records, com quem assinei na época, fez um ótimo trabalho e deixou tudo organizado. Mas na época do Radish era tudo mais louco.

Legal, espero que possamos ouvir novidades em breve. Falando no Radish, vocês tiveram algumas formações diferentes. Você ainda se dá bem com os membros da banda? Já receberam alguma oferta para voltar a fazer shows ou algo do tipo?
Ah, na verdade não. Às vezes alguém manda um e-mail perguntando se podemos fazer uma reunião… Ainda sou amigo do John, baterista. Já pensamos que seria divertido fazer uma reunião, mas pra ser sincero, nem sei por onde anda o baixista. Brian, nosso baixista que ficou mais tempo, não está nas redes sociais, não temos o e-mail ou o telefone dele. Então nem sei, ele sumiu do mapa.

Puxa…
A gente precisaria encontrá-lo. Talvez algum dia isso aconteça e a gente faça um show, sei lá.

Vamos torcer para acontecer. Você também participou do The Bens há alguns anos, com o Ben Folds e o Ben Lee. Queria saber se há outros artistas — não precisa ser ninguém chamado Ben — com quem você gostaria de desenvolver algum projeto.
Meu amigo Conor Oberst, do Bright Eyes, é alguém com quem sempre gostei de estar. Fizemos muitas turnês juntos e sempre foi bem legal. Adoraria colaborar com artistas de hip-hop. Tem um cara, o Trippie Redd, de quem gosto muito. Tem alguns produtores. Um projeto dos sonhos pra mim seria trabalhar com o Max Martin, um compositor e produtor muito famoso por canções da Britney Spears, Backstreet Boys, Taylor Swift e tal. Acho ele um cientista incrível, saca? A forma como ele aborda as faixas. Apenas estar em um estúdio com ele seria bem divertido, só para ver como é o processo de trabalho dele. Deixa eu dar uma olhada no meu celular… Tem um artista country que admiro muito, Alan Jackson. Acho que ele só é famoso nos EUA, mas seria uma colaboração dos sonhos pra mim. Meu amigo, Jason Schwartzman… Conhece a banda dele, Coconut Records? Dá uma conferida, é muito boa. Quem mais? Adoraria fazer algo com o Sonic Youth, seria incrível. Lil Uzi Vert… Tenho ouvido muito rap. Adoraria acrescentar uma guitarra grunge/indie nesse tipo de som. Mano, adoraria trabalhar com o Kanye, apesar de ele ser doido. Ele é claramente louco, mas eu o acho um gênio, musicalmente falando. Talvez ele vá para o Brasil, leia essa entrevista e role algo. [risos]

Como esse tipo de colaboração acontece? Quer dizer, você precisa ter o mesmo empresário ou o quê?
Acho que isso ajuda. O mercado da música é bem pequeno, e você geralmente tem acesso a alguém que admira. É provável que haja apenas uma ou duas pessoas entre você e o outro artista. Às vezes, é questão de descobrir o e-mail e entrar em contato. A melhor maneira, obviamente, é conhecer a pessoa e se divertir, sair com ela. Daí surge o papo: “bora fazer uma música juntos”. Essa é a melhor parte. Estar em turnê é muito divertido também. Lembro de, anos atrás, quando eu saía em turnê com os Strokes. O Julian vinha dormir no meu ônibus por alguns dias, depois eu ia para o ônibus deles. Vivíamos meio como ciganos. Era muito divertido. Isso obviamente não tem acontecido há alguns anos. Mas, repito, dá para fazer algo parecido pelo Zoom. Ainda assim, pode ser meio complicado. Imagina eu e o Kanye West reunidos no Zoom, ele pode ficar puto com alguma coisa e me deixar sozinho lá.

É, mas daí você pode lançar o vídeo no YouTube e ele pode viralizar.
Exato! [risos]

Você ainda é muito jovem, mas construiu um legado musical ao longo dos anos. Em uma entrevista que fizemos com Matthew Caws, do Nada Surf, ele disse que acreditava ser parte da “velha guarda”, no que diz respeito ao rock alternativo. Você se sente assim também e percebe sua influência em novas bandas? Tem alguma que você goste e que se diga inspirada por você?
Eu não diria que sou “velha guarda” ainda. O pessoal do Nada Surf é uns cinco ou 10 anos mais velho que eu. Lembro de ser adolescente quando eles surgiram com “Popular”, um grande hit na época. Era na fase que eu ainda ouvia Weezer e Nirvana. Quando me mudei para Nova York, fiz vários shows com o Nada Surf. Acho o Matthew uma puta lenda, saca? Mas ainda me acho jovem para isso.

Com certeza, inclusive temos a mesma idade [risos]. Estou perguntando justamente pelo fato de você ter começado muito jovem.
Exato, estávamos no Ensino Médio quando o Radish começou. Conheço artistas que são bem mais jovens que eu e dizem, “meu deus, você me inspirou”, esse tipo de coisa. Tem uma banda de Nashville bem legal, The Cadillac Three. Não sei se você já ouviu falar deles, mas sempre dizem que fui uma inspiração. Tem também o Alvvays, que eu curto. Kevin Morby é meu amigo e também me procurou dizendo, “cara, eu te ouvia o tempo todo”. Então, é bacana. Agora eu falo para ele, “beleza, quando as turnês recomeçarem, deixa eu abrir uns shows pra você”. [risos]

Quais suas memórias de quando você veio ao Brasil em 2012 [e deu outra entrevista para o Scream & Yell]?
Bem, lembro que amei Fortaleza. Adorei as cidades grandes, claro [ele também tocou no Rio e em São Paulo]. Acho que foi no show de São Paulo que eu fiz um crowdsurfing. Eu estava tocando violão sozinho, mas levei meu pedal de distorção e consegui fazer bastante barulho. Mas eu não conseguia acreditar, rolou até uns mosh pits em algumas apresentações. E eram shows acústicos! E amei Belém, lá no Norte, perto da floresta tropical.

Sim, minha esposa é de lá.
Legal! Eu amei a cidade, cara! Fui num restaurante no qual você está sentado e, ao olhar pela janela, tudo o que você vê é a selva. Me disseram que era a floresta tropical mesmo, você pode entrar lá e nunca mais voltar [ele provavelmente se referia ao restaurante do Parque Mangal das Garças, que conta com árvores nativas e sintetiza o ambiente amazônico no meio da capital paraense]. E nunca vou esquecer dos cafés da manhã, com todas aquelas frutas.

Eles têm frutas incríveis lá.
[Muito empolgado] Frutas incríveis, cara! Pode crer!

Também sou fã! Então, para a gente finalizar, quais suas expectativas para esse ano? Já está planejando shows, caso a vacina seja bem-sucedida e se torne seguro retornar com essas atividades? Ou planeja fazer algumas lives para promover o disco?
Sim, fiz uma live em agosto, mas tive que ir até Austin. A transmissão foi feita de uma casa que está fechada, o Continental Club, uma das minhas favoritas na cidade. Então quis fazer lá, para que eles pudessem cobrar por ingressos. Foi bem divertido. Usamos umas quatro câmeras, foi bem profissional, não era só eu sentado no meu sofá tocando. O meu problema é que aqui onde moro a internet é bem ruim. Agora mesmo está funcionando bem, mas em alguns dias ela oscila muito. Estou tentando conseguir internet de fibra ótica aqui, o que vai sair bem caro, mas espero conseguir fazer mais umas lives. É uma dessas coisas sobre ser um músico hoje em dia — você precisa ter internet rápida para poder se manter. Então estou investindo nisso. Estou pensando também em abrir uma conta no Twitch. Assim eu poderia entrar ao vivo enquanto escrevo músicas e trabalho aqui no estúdio e tal. Dessa forma, os fãs poderiam fazer parte da jornada do próximo álbum, enquanto eu trabalho nele.

Legal! Muito obrigado pela entrevista. É ótimo ver que você está melhor e espero que possamos nos livrar dessa situação assim que possível para que você possa voltar ao Brasil.
Sim, total. Eu penso muito no Brasil, foi uma turnê muito legal!

– Leonardo Tissot (www.leonardotissot.com) é jornalista e produtor de conteúdo

2 thoughts on “Entrevista: O renascimento de Ben Kweller

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