por Richard Cruz
Há quanto tempo hein, Pin Ups? 20 anos separam o disco novo “Long Time no See” de “Bruce Lee” (de 1999), última vez que o Pin Ups soltou um conjunto de músicas inéditas na praça. A banda já contou em diversas entrevistas como o (agora mítico) “show de despedida” de 2015 foi concebido pra ser realmente seu canto do cisne. Mas a reação da plateia, surpreendentemente jovem, empolgou a banda, que resolveu fazer mais algumas apresentações. Depois, decidiu voltar a ensaiar. Chamaram Adriano Cintra (ex – CSS e Thee Butcher´s Orchestra) pra segunda guitarra. Aproveitaram pra fazer músicas novas. E uma coisa levou à outra…
O resultado disso é que a emblemática banda paulistana de rock alternativo está lançando finalmente seu sétimo álbum (é, eles tem muita história) com 11 músicas que já estão disponíveis nas plataformas de streaming. Já o cedêzinho vem pelo lendário selo midsummer madness (que tem em catálogo bandas seminais do indie nacional como Pelvs, The Cigarrettes e Second Come) e o lançamento em vinil está prometido para o segundo semestre de 2019.
O disco levou um ano pra ficar pronto (entre composições e finalização) e tudo foi feito com muita calma, o que, nas palavras da própria banda, é algo inédito. A produção foi dividida entre o guitarrista e fundador Zé Antônio e o “novato” Adriano Cintra. Para Zé, a parceria facilitou o processo por causa das experiências anteriores de Adriano. “Ele sabe como estimular uma banda a oferecer o seu melhor. Ajudou nas escolhas, indicou caminhos e realizou um trabalho espetacular na pós-produção. Sem falar que pelo fato dele ser um integrante da banda, tem um entendimento completo do que procuramos”, diz Zé Antônio.
O Scream & Yell conversou com Zé Antônio sobre o disco, que, apesar de conter algumas faixas aceleradas, com as famosas “guitarras no talo”, mostra também uma faceta mais delicada e psicodélica da banda e ainda vem repleto de participações especiais de convidados daqui (bandas SkyDown e Antiprisma), de fora (Jim Wilbur, da lenda indie Superchunk, no single abaixo) e até de Eliane, a guitarrista da trilogia “Jodie Foster” – “Lee Marvin” – “Bruce Lee”, que pra muitos fãs, é a melhor fase da banda. Confira!
20 anos separam “Long Time no See” do último lançamento de vocês, “Bruce Lee”, que é de 99. O cenário do rock independente no Brasil (bem como o próprio mundo) mudou completamente. O Pin Ups ainda tem relevância pra esse cenário?
Nós amamos música, isso faz parte das nossas vidas, e nos sentimos felizes por poder tocar, gravar e fazer shows. Mas acho que não cabe a nós dizer se somos relevantes ou não. Sempre fizemos tudo com a mais absoluta sinceridade e simplicidade. Ficamos sempre muito tocados quando alguém diz que gosta do nosso trabalho, sabemos que isso é um privilégio e esperamos poder retribuir tanto carinho.
Como aconteceu e o que representa ter a participação do Jim Wilbur do Superchunk no disco?
O Superchunk sempre foi uma grande influência para o Pin Ups. Tivemos a sorte de fazer duas turnês com eles aqui no Brasil, e acabamos nos tornando amigos. Quando compus “Mexican Tale” imaginei uma linha de guitarra ao estilo do que eles fazem, e pensei que seria incrível se o próprio Jim criasse essa linha de guitarra pra nós. Mandei uma mensagem e ele topou na hora. Alguns dias depois ele gravou a guitarra na casa do Mac (McCaughan, líder do Superchunk) e enviou pra nós. Eu sempre gostei do estilo de guitarra dele e todos nós ficamos muito felizes com essa participação.
Pra mim, o Pin Ups nunca soou tão diversificado quanto nesse novo trabalho. Há alguma banda nova nacional (ou internacional) com a qual a banda se identifica e/ou que influenciou de maneira marcante nas gravações? O Primitives continua sendo uma inspiração?
Hahaha, definitivamente não! O Primitives era algo que ouvíamos há muito tempo. Em nenhum momento das gravações pensamos em soar como qualquer outra banda. Obviamente isso deve ter acontecido de forma inconsciente, afinal somos uma mistura de tudo o que a gente gosta e assimila, mas não tivemos essa preocupação com referências.
Apesar de não ser muito ativa em redes sociais, a Alê tem posições políticas e feministas contundentes. As opiniões são partilhadas pelo resto da banda? Por que não há amostras dessas posições no disco? São assuntos que o Pin Ups não quer tratar?
O Pin Ups nunca foi uma banda com letras politizadas, e mesmo entendendo a distopia em que vivemos atualmente, mudar o tema das letras não seria natural. Felizmente todos nós temos posições políticas muito parecidas, e sempre fomos radicalmente contra qualquer tipo de preconceito, censura, violência, misoginia, cerceamento da liberdade e dos direitos de cada um. Essa postura faz parte das nossas vidas, é algo que praticamos em nosso cotidiano.
Em várias entrevistas depois da volta, você disse que o público dos shows de vocês rejuvenesceu. Ao que você atribui essa identificação com o som da banda?
Sinceramente não sei te explicar porque isso acontece, mas é algo que nos deixa muito felizes, e na verdade nós é que nos sentimos rejuvenescidos.
Em anos recentes, livros e documentários (como “Time Will Burn“, de 2016) começaram a retratar a cena indie brasileira dos anos 90 e o Pin Ups sempre é destacado nesses trabalhos. Esse reconhecimento tardio envaidece ou enraivece?
Tanto a vaidade quanto a raiva são grandes armadilhas (rsrsrs). Mas o fato de tanta gente se referir a essa cena mostra que houve alguma relevância. O reconhecimento sempre leva tempo. Uma certa distância é necessária para que tudo seja avaliado com imparcialidade e com a verdadeira dimensão do que realmente significou. Fico feliz que isso esteja acontecendo, e não falo isso apenas em causa própria. Fico feliz que muitas bandas boas como o Killing Chainsaw, Second Come e Brincando de Deus possam ser lembradas e celebradas.
O disco é dedicado ao Kid Vinil. Você pode falar um pouco sobre essa homenagem?
Eu costumo dizer que qualquer pessoa que goste de música tem uma dívida com o Kid Vinil. Muito da nossa formação musical foi determinada pelo o que ouvíamos em seus programas de rádio, ou pelo que assistíamos nos programas de TV em que ele sempre abria espaço para a cena independente, para a música nova. Mas além de tudo isso, o Kid era uma pessoa extremamente generosa. Ele sempre nos ajudou, sempre foi gentil e se tornou um amigo querido. Quem o conheceu sabe o quanto ele era incrível, e o amor que ele tinha pela música. Foi um exemplo pra nós e uma pessoa que sempre teve a nossa admiração. Dedicar esse disco a ele é uma pequena homenagem. Pouco diante do que ele merece.
LONG TIME NO SEE, Pin Ups
Faixa a Faixa por Richard Cruz
01. You Can Have Anything You Want – Ecos de stoner rock. Um pianinho marcante, teclados que emulam o som de um theremin, uma levada reta de bateria e um riff circular de guitarra trazem o Pin Ups pro século XXI. A mão (detalhista) de Adriano Cintra na produção já mostra a que veio, nesta que é um excelente cartão de visitas do disco novo. A faixa encerra com quase 30 segundos de pura microfonia. Os fãs da banda (e a letra) perguntam: “Tell me now is this a dream?”
02. Portraits of Lust – Este é com certeza o disco mais variado que a banda já gravou até hoje. Mas isso não quer dizer que a velocidade foi deixada de lado e essa segunda faixa é um belo exemplo. A linha de baixo vigorosa e a melodia vocal simples, ao estilo Kathleen Hanna (expoente do punk feminista nos anos 90), conduzem a música que promete ser um dos destaques nas apresentações ao vivo do material novo.
03. Little Magic – Como o ouvinte já percebeu até aqui, a duração das faixas (nenhuma musica dura mais que três minutos e meio) nem de longe significa descuido com os detalhes. “Little Magic” conta com teclados, letra e vocais delicados. A faixa mostra como Alê soa mais segura e confortável quando canta em tom mais grave. Tem ainda participação da ex-integrante Eliane (que atualmente mora em Londres) reforçando as guitarras cortantes características do som do Pin Ups.
04. Separate Ways – Essa já vinha sendo tocada ao vivo em shows durante 2018 (como na abertura para o L7 em São Paulo). Baixo no talo. Hardcore. Riot grrls. Curtíssima. “Scrabby?”
05. Spinning – O amálgama perfeito entre a americana Belly (de Tanya Donelly) e a inglesa Ash (fase Charlotte Hatherley). Primeiro single e clip, é uma das musicas mais bem resolvidas do álbum. Seria hit no Gás Total da MTV com certeza. A letra diz (acertadamente) “Você vai sentir a emoção de ser jovem de novo”. O solo de guitarra acústica no meio da música é matador.
06. Ballad for Samuel and Tobias – Balada 60s, bem diferente da sonoridade habitual do Pin Ups. Um teclado Farfisa com som de órgão estilo vintage dá o tom na música inteira. Os backings vocals do duo indie Antiprisma (que abriu o show de lançamento do disco) também se destacam e ajudam a ressaltar o clima Beatles-fase psicodélica.
07. Mexican Tale – Durante a intro da música, o ouvinte desatento pode achar que deu play no último disco completo de inéditas da banda, “Lee Marvin”, de 98. Mas esse não é o único elemento 90s da faixa, que reforça a sonoridade característica daquela época como a participação de Jim Wilbur, do ícone indie americano Superchunk, nas guitarras. Essa é uma rara incursão do Pin Ups por temas políticos nas letras, ainda que não diga respeito a uma realidade próxima e apenas cite de leve a (louca) ideia do presidente americano Trump de construir um muro na fronteira com o vizinho México.
08. Damn Right – Influências de rock n roll mais clássico até então inéditas na carreira da banda aparecem nessa faixa, que é recheada de teclados bluesy e conduzida pelo baixo pulsante de Alê e um pandeirinho maroto. A melodia é chiclete e periga te perseguir pelo resto do dia. “All the voices in your head. All the books are in the shelves. After all, you´re so damn right”, repete o refrão até o final da música, emoldurado pela linha de baixo e um wha wha de guitarra só perceptível aos fones de ouvido.
09. Gone Tomorrow – Aqui a banda faz uma declaração de amor aos Beatles. Ou ao Oasis, dependendo da sua idade. Alê mais uma vez se sai bem com os vocais em tom mais grave, em outra balada acompanhada pelos backings certeiros do duo Antiprisma. No refrão, sons de cordas garantem: “All those lonely days, will be gone tomorrow”.
10. Crazy – Pitadas de psicodelia, dedilhados de guitarra e muitos efeitos sonoros habitam nessa faixa quase instrumental. Soa como se o Blur tomasse um ácido e fizesse uma versão de Harmony (faixa que encerra o melhor disco dos Happy Mondays, “Pills n Thrills and Bellyaches”).
11. Long Time no See – Violões e uma guitarra shoegaze encerram o sétimo disco dos Pin Ups, fazendo a cama pra um dueto entre Alê e alguém não creditado no encarte do disco, mas que eu arrisco dizer ser Adriano Cintra. O clima etéreo da letra acompanha a sonoridade e reza: “after all those years, you still got here…”
Leia também: Discografia comentada: Pin Ups (aqui)
Spinning me lembra a “pós-emo” ou (“emo-grunge”?) Lazy Eye” do Silversun Pickups.
Verdade, cara. Mas acho que isso tudo é influência de Sonic e Smashing. Não tem como fugir.