entrevista por Guilherme Lage
Brant Bjork dispensa apresentações no terreno desértico conhecido como stoner rock. Sua história na música é uma fábula quase simbiótica junto ao estilo que ajuda a efervescer desde 1987 quando ele, junto de John Garcia e Josh Homme, decidiram que os tabuleiros de Dungeons & Dragons já não mais condiziam com a angústia e a criatividade púbere que lhes levaram a trilhar os caminhos da música na pequena Palm Desert, na Califórnia.
Multi-instrumentista e compositor, Brant Bjork foi um dos cabeças do Kyuss, uma das bandas mais importantes daquela geração, que rendeu filhos bastardos como o Vista Chino, Slo Burn e o Queens of The Stone Age. Assim que o grupo se separou, em 1994, ele foi produzir o Fu Manchu e assumiu a bateria da banda nos cinco discos seguintes (até 2001) até se envolver com o Mondo Generator, de Nick Oliveri, onde ficou na bateria até 2004.
Paralelamente a tudo isso, Brant mergulhou na carreira solo em 1999, quando lançou “Jalamanta”, gravando todos os instrumentos. De lá para cá vieram mais 10 álbuns, o mais recente, “Jacoozi”, apesar de ter sido lançado em 2019, foi composto em 2010, e é um retrato de um Bjork atento às suas raízes fincadas no solo árido do deserto, mas sem repetir as fórmulas saudosistas a que alguns preferem se apegar.
Brant pisa no Brasil pela primeira vez no próximo dia 17 de outubro, em evento produzido pela Abraxas, promovendo seu disco mais recente “Jacoozi”, com show no Fabrique Club, em São Paulo, uma produção Abraxas / Powerline. Antes de baforar os riffs e grooves esfumaçados de peiote em meio a poluída noite paulistana, Brant falou um pouco sobre a composição do álbum e sobre o que pretende mostrar aos fãs em sua primeira passagem pelo Brasil.
Antes de mais nada, por que você demorou tanto pra vir pro Brasil?
Já tem muitos anos que eu queria muito ir ao Brasil. Agora, porque demorou tanto eu realmente não sei, acho que foi só o momento certo de ir mesmo.
Ouvindo o “Jacoozi” faz parecer que o processo de composição e gravação do disco foi bem tranquilo e espontâneo. Pode falar um pouco sobre isso?
O “Jacoozi” foi um disco muito espontâneo. Naquela altura da minha vida, eu realmente precisava me expressar musicalmente sem nenhum tipo de ideia pré-concebida ou qualquer tipo de direcionamento. Foi um processo muito catártico em todos sentidos. Foi realmente como entrar em uma jaccuzi e relaxar.
Como você compara o “Jacoozi” com seus outros álbuns?
Todos os meus discos, seja musicalmente, seja na pegada sônica que eu queira dar ou nas letras, são autobiográficos. Eles refletem em que momento eu estou na minha vida quando os gravei. Quando você ouve meus discos, está ouvindo uma pessoa crescendo e evoluindo e não só de uma forma linear. “Jacoozi” reflete muito bem como eu estava em 2010. Naturalmente, é bastante diferente do, vamos dizer, “Saved By Magic”, que eu gravei em 2005. Isso não é necessariamente melhor ou pior. Opiniões e preferências sempre vão existir, mas os contrastes nessas comparações são sempre óbvios. As coisas mudam conforme os anos passam.
Você se vê compondo outro disco como esse?
Se me vejo compondo outro disco como o “Jacoozi”? Claro que sempre vai existir apenas um “Jacoozi”, mas com certeza, eu gostaria muito de fazer outro disco tão espontâneo e que tenha uma expressão tão catártica quanto nesse.
Podemos esperar alguma música do disco novo nesse show?
Acho que podemos fazer uma versão ao vivo de “Guerrilla Funk” nesse show.
Você é tipo um padrinho do stoner rock e, certamente, um dos músicos mais influentes do gênero. Aqui no Brasil temos uma cena stoner bem forte e bastante influenciada pelo seu trabalho. Alguma banda que você conhece? Qual a sensação de influenciar tanta gente no mundo inteiro?
Sabe, uma das coisas que eu estou mais empolgado de ir para o Brasil é experimentar a “cena” e ser diretamente exposto a todas as bandas e pessoas e coisas que as pessoas acham que eu deveria ser exposto. É um sentimento maravilhoso saber que a minha música toca tantas pessoas a perseguirem sua própria criatividade e sua própria forma de criar. Minha música é totalmente uma extensão do meu estilo de vida e é sempre um prazer me conectar com pessoas que compartilham um estilo de vida similar ao meu, especialmente ao redor do mundo. Celebrar nossas similaridades independente das diferenças culturais ou dos países. Na minha experiência, as pessoas em qualquer lugar querem as mesmas coisas: Amar e serem amadas, comer e beber, serem felizes e rock n’ roll!
Do seu ponto de vista como multi-instrumentista, como você sabe como combinar a instrumentação nos seus álbuns? É algo orgânico? Quando você está escrevendo a música, já sabe em qual parte cada instrumento será tocado?
O elemento que mais define o meu processo criativo e a música que resulta dele é o fato de eu ser um autodidata e nunca, na minha vida, tive qualquer tipo de treinamento ou educação em música. Toda a minha carreira musical, todos os discos que eu fiz ou estive envolvido e todas as performances ao redor do mundo durante esses anos, são o resultado de um moleque que sentiu música dentro dele e simplesmente pegou instrumentos e descobriu um jeito de liberar tudo isso que sentia. Eu diria que sou como um ‘blues artist’, mas não no sentido tradicional. Meu processo, se realmente é alguma coisa, é totalmente orgânico. Tudo começa com um groove. O que você decide fazer com aquele groove é que vai determinar o direcionamento e a produção. A única regra é que não existem regras. Eu diria que sou um progressivo tradicionalista, o que basicamente significa que meus discos favoritos dos Beatles são os que eles fizeram quando começaram a fumar maconha.
– Guilherme Lage (www.facebook.com/breadandkat) é jornalista e mora em Vila Velha, ES.