Boteco: Cinco cervejarias nacionais, Dez cervejas

por Marcelo Costa

Abrindo uma nova sequencia de cervejas por Ribeirão Preto, casa da Colorado, que retorna ao site com a Gabiru, uma American IPA cuja receita recebe adição de gabiroba, fruta amarela popular do Cerrado brasileiro, além de dry hopping com os lúpulos Loral, Centennial, Chinook e Ella. De coloração âmbar bem alaranjada com creme bege clarinho quase branco de ótima formação e média alta retenção, a Colorado Gabiru exibe um aroma incrível, com a gabiroba simplesmente apaixonante em meio a notas cítricas, um leve herbal, caramelo e doçura de mel. Na boca, doçura cítrica da fruta no primeiro toque, deliciosa, seguida de amargor que remete à casca, trazendo leve amargor. A textura é suave e, dai pra frente, surge uma American IPA meio Fruit Beer, mas, ainda assim, cítrica e amarga. No final, leve amarração de casca de fruta e amargor. No retrogosto, terroso, resina leve, cítrico e mel. Surpreendeu!

De Ribeirão Preto para Belo Horizonte com a primeira de duas Backer, a Belohorizontina, uma Pale Lager com dry-hopping de lúpulos franceses. De coloração dourada cristalina com creme branco de boa formação e média retenção, a Backer Belohorizontina exibe um aroma interessantíssimo, com leve floral, um toque de cítrico e de anis e os tradicionais cereais e casca de pão. Na boca, doçura maltada suave e leve anis no primeiro toque com algo meio cítrico na sequencia seguido de refrescancia. O amargor é bem baixo (8.2% declara o rótulo, mais baixo que muita popular de boteco) e a textura é levíssima. Dai pra frente surge uma Pale Lager caprichada, cujo belo trabalho de lupulagem (num resultado diferente e provocante) a diferencia das demais, para melhor. No final, secura e refrescancia. No retrogosto, leve floral, palha e refrescancia. Boa surpresa!

De Belo Horizonte para Curitiba com a primeira de duas Maniacs, a premiada (no South Beer Cup 2016) Saison da casa, com centeio e trigo vermelho na receita. De coloração amarelo palha com creme branco de formação intensa, borbulhante e de alta retenção, a Maniacs Saison exibe um aroma com acidez (via levedura) perceptível, doçura, casca de pão, frutado suave, maçã, uva e leve presença de especiarias. Na boca, doçura de cereais no primeiro toque seguida de leve acidez e efervescência de levedura acrescida de leve frutado (maçã e uva verdes), vinho branco e refrescancia. Não há amargor e a textura (dominada pela levedura) é suavemente frisante, cremosa e picante. Dai pra frente segue-se um conjunto que replica com carinho o estilo Belgian Saison, juntando sugestão de vinho branco, funky de levedura e a doçura dos cereais. No final, secura e leve acidez. No retrogosto, acidez, adstringência bem discreta, maçã e uva verdes, cereais e refrescancia. Gostei!

Do Paraná para Minas Gerais, mais precisamente para a Fazenda Santa Teresinha, em Paraisópolis, casa da Zalaz, que marca presença primeiro com a Cascara, uma Sour Ale lançada em julho de 2016 que recebe adição de chá de casca de café e raspas da casca de limão cravo cultivados na fazenda (bebi a primeira vez num Slow Brew harmonizando com torresmo), receita colaborativa da Zalaz com a OneBrew. De coloração dourada cristalina com creme branco de boa formação e rápida dispersão, a Zalaz Cascara exibe um aroma de café verde bem sutil sobre uma base de limão e de malte bastante suaves, com percepção de acidez leve. Na boca, o limão e uma acidez bem leve são mais perceptíveis no primeiro toque, mas o chá de cascara está por ali, e aumenta a sua presença conforme o liquido desce a garganta. A textura é levemente frisante e acética – com bastante presença de limão. Dai pra frente segue-se um conjunto refrescante, com cítrico do limão e o chá de café bem presentes, e uma doçura maltada suave marcando o final junto a limão e café, que também marcam presença no retrogosto, refrescante.

De Minas Gerais voltamos para Curitiba, no Paraná, com um garrafão de 750 ml da Bodebrown com a Brut IPA Sparkling Hop Single Hop Galaxy, uma cerveja de coloração dourada, sparkling, mas com creme branco que sobe rapidamente e desaparece tão rapidamente quanto. A rigor, esse novíssimo estilo surgido em São Francisco traz como estrela a enzima Amilase, usada com frequência para aliviar o corpo de stouts e porters sem diminuir o álcool. Mas o que aconteceria se ela fosse usada em uma receita mais leve? Bem, nasce as Brut IPA, cerveja que valoriza o lúpulo e diminui a presença de açucares de malte na receita. O aroma, no caso deste exemplar curitibano da Bodebrown, é intensamente cítrico (maracujá) com leve floral e, ainda, um distante herbal. Na boca, cítrico (mais maracujá) no primeiro toque com forte secura e leve mineral na sequencia. A textura é seca e picante e, dai pra frente, segue-se um conjunto bastante cítrico, seco e refrescante. No final, secura e cítrico. No retrogosto, mineral, cítrico, secura e refrescancia. Interessante.

De volta a Ribeirão Preto para fechar a dupla da Colorado com mais uma novidade no catálogo da casa: Öktö, uma Session Festbier, estilo alemão que abriga cervejas Marzen produzidas para a Oktoberfest, que nesta releitura brasileira recebe adição de castanha de caju. De coloração âmbar e creme branco de ótima formação e média alta retenção, a Colorado Öktö apresenta um aroma com predomínio de malte, sugerindo casca de pão doce e biscoito, além de leve percepção da castanha e leve doçura caramelada. Na boca, biscoito e pão doce no primeiro toque seguidos de doçura caramelada suave, castanha e cereais. O amargor (18 IBUs) quase não aparece enquanto a textura é leve, bem leve. Dai pra frente surge uma cerveja interessante, que equilibra muito bem a doçura tradicional do estilo com a castanha adicionada, que dá um leve colorido ao conjunto (altamente tradicional), sem descaracteriza-lo. No final, leve terroso e amêndoa. No retrogosto, doçura, toffee bem baixo, castanha e biscoito.

A segunda Backer desta série é a Fargo 46, uma cerveja de um estilo escocês conhecido como Wee Heavy ou Strong Scotch Ale. O nome homenageia a paixão dos fundadores da Bakcer por carros antigos. De coloração âmbar escura com creme bege espesso de ótima formação e longa retenção, a Backer Fargo 46 apresenta um aroma com caramelo tostado destacado, ameixa, figo, toffee, açúcar mascavo e discreta sugestão de defumado. Na boca, doçura (bastante) caramelada no primeiro toque seguida de frutado (figo e ameixa) e mais doçura (açúcar mascavo e caramelo). Como você pode imaginar, amargor não tem vez aqui, mas a boa surpresa é que os 8.5% de álcool estão muito bem escondidos. A textura é melada e levemente picante (de álcool). Dai pra frente, uma Wee Heavy doce demais, mas saborosa e boa para ser compartilhada a dois (ainda mais numa garrafa de 600 ml). No final, caramelo e picância. No retrogosto, banana assada, herbal, sugestão de madeira e caramelo.

A próxima é a segunda da curitibana Maniacs, uma variação da primeira, só que com malte tostado e levemente torrado. De coloração marrom escura translucida com creme bege claro de boa formação e retenção. No nariz, funky suave predomina em meio a um caramelado puxado para torra mais do que tosta na base, bem leve, bem suave, mas perceptível. Há, ainda, leve frutado (maçã e uva verde). Na boca, caramelo e leve funky chegam juntos no primeiro toque seguidos de doçura caramelada um pouco mais intensa, azedinho discreto, funky, maçã verde e absolutamente nada de amargor. A textura é mais suave do que picante e, dai pra frente, segue-se um conjunto que remete bastante a receita anterior, mas com o malte tostado / torrado acrescentando sutilezas que não favorecem tanto ao estilo (sai a rusticidade, entra a doçura), mas podem conquistar adeptos. No final, azedinho e caramelo. No retrogosto, mais azedinho (bem suave), funky e caramelo.

A segunda da Zalaz é um lançamento recente, de agosto de 2018, uma Brazilian Wild Ale que leva o nome de Passiflora e integra a linha Amantik da casa, com leveduras selvagens. A receita recebe adição de maracujá colhido na Fazenda Santa Teresinha, onde está instalada a cervejaria. Que coloração amarela levemente dourada com creme branco de boa formação e média retenção, a Zalaz Passiflora exibe um aroma frutado cítrico com percepção fácil do maracujá adicionado além de um funky bastante sutil, ainda que aparentemente nada “wild”. Na boca, azedinho cítrico no primeiro toque que se abre para maracujá na sequencia acompanhado de um leve funky campestre e de doçura agradável. A textura é levemente picante (mas bem leve mesmo), e dai pra frente surge um conjunto refrescante e saboroso, um suco de maracujá alcoólico com um leve traço funky. No final, azedinho bem leve. No retrogosto, funky, maracujá, doçura e azedinho.

Fechando o rolê, a quarta versão da Bodebrown Atomga a passar por aqui: depois da versão base e das Atomga Cherrie e Cacau agora é a vez da Atomga Pão de Mel, uma Russian Imperial Stout de 11.5% de graduação alcoólica cuja receita recebe adição de especiarias. De coloração marrom bastante escura com creme bege espesso de excelente formação e média alta retenção. No nariz, a aproximação com pão de mel é a primeira coisa que se percebe seguida de baunilha, chocolate, canela, anis, cravo, biscoito e café além do álcool, também facilmente perceptível. Na boca, baunilha, canela e cravo no primeiro toque com leve presença de café, chocolate e álcool na sequencia, num conjunto que, ok, se aproxima do pão de mel (o aroma é 8/10, o paladar fica no 6/10). A textura é sedosa e vai se tornando licorosa com picância intensa de álcool e especiarias (até parece que tem pimenta aqui também… será?). Dai para frente, uma Russian Imperial Stout interessante, ainda que um pouco enjoativa para uma garrafa de 750 ml (que deve ser compartilhada, por favor). No final, canela, pimenta e chocolate. No retrogosto, chocolate, canela, anis, baunilha e calor alcoólico. Bem boa!

Balanço
Primeira da fila, a Colorado Gabiru foi uma deliciosa surpresa: o aroma está incrível, o paladar, ainda que um pouco abaixo por uma amarração que parece derivada da casca da fruta, mantém o conjunto em alta, e o resultado é uma belíssima cerveja, mais pra Fruit Beer do que para American IPA. Mas muito boa! Também muito boa é a Backer Belorizontina, uma Pale Lager com lúpulos franceses meio doidinhas, mas bem interessante. Premiada, a Maniacs Saison replica com respeito o estilo belga. E vale a pena! Praticamente uma Kettle Sour, com boa parte da acidez derivada da fruta, a Zalaz Cascara é uma cerveja refrescante e saborosa, com limão e chá da casca do café bem presentes. Fechando a primeira volta com a primeira Brut IPA a passar por aqui (a minha quarta no Untappd), a Sparkling Hop Single Hop Galaxy da Bodebrown me pareceu interessante, mas nada sensacional. Uma boa cerveja com secura extrema, muita presença de lúpulo e refrescancia. Boa, mas nada surpreendente. O mesmo pode ser dito da Colorado Öktö, uma Marzen redondinha, mas bem básica. Já a Backer Fargo 46 é uma Wee Heavy doce demais, mas saborosa e boa para ser compartilhada a dois (ainda mais numa garrafa de 600 ml). A Maniacs Dark Saison não mantém o brilho da Saison tradicional, mas causa interesse pelo choque do estilo com o malte torrado. Já segunda da Zalaz, a Passiflora, é uma Keetle Sour gostosinha e refrescante. Fechando com a A Bodebrown Atomga Pão de Mel, com muitos condimentos que replicam belamente pão de mel no aroma, principalmente, e no sabor. Bem interessante.

Colorado Gabiru
– Produto: American IPA
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5.6%
– Nota: 3,60/5

Backer Belorizontina
– Produto: Pale Lager
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4.6%
– Nota: 3,37/5

Maniacs Saison
– Produto: Belgian Saison
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 6%
– Nota: 3,40/5

Zalaz Cascara
– Produto: Sour Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4.4%
– Nota: 3,41/5

Bodebrown Sparkling Hop Single Hop Galaxy
– Produto: Brut IPA
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 6.5%
– Nota: 3,49/5

Colorado Öktö
– Produto: Session Festbier
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 3,21/5

Backer Fargo 46
– Produto: Wee Heavy
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 8.5%
– Nota: 3,17/5

Maniacs Dark Saison
– Produto: Belgian Saison
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 7.5%
– Nota: 3,12/5

Zalaz Passiflora
– Produto: Sour Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 3,30/5

Bodebrown Atomga Pão de Mel
– Produto: Russian Imperial Stout
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 11.5%
– Nota: 3,91/5

Leia também
– Top 2001 Cervejas, por Marcelo Costa (aqui)
– Leia sobre outras cervejas (aqui)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.