por Renan Guerra
25 minutos. 10 músicas. Punk, reggae, electro, psicodelia, hardcore. Num primeiro instante, a estreia do FingerFingerrr poderia até parecer aquela ideia engraçadinha de um “pop punk” que nos causava calafrios lá pelos idos do anos 2000, porém aqui o duo não deixa em nenhum momento que “MAR”, o tal álbum, caia na falácia de ser uma única piada em looping. O humor surge de forma natural dentro de um cenário quase nonsense de sons e imagens potentes que transitam de forma confortável entre o português e o inglês, entre a ira e a celebração.
O duo paulistano Flavio Juliano (baixo, guitarra e voz) e Ricardo Cifas (bateria, teclado e voz) curiosamente lança seu disco pelo selo Rosa Flamingo, da cantora Tiê, mesmo selo de Naná Rizinni e André Whoong. “MAR” conta ainda com a produção de Fernando Sanches (em parceria com o duo) e a mixagem de Mario Caldato Jr, que já trabalhou com gente como Beastie Boys, Nação Zumbi e Planet Hemp.
Com quatro anos de estrada, o FingerFingerrr já tem em seu currículo turnês pelo Brasil e pelos Estados Unidos, trazendo assim um aprendizado que só o palco propicia: aquele entendimento do timing das canções. De velocidade punk e intensidade hardcore, “MAR” consegue ter a pecha de ser um disco suntuosamente pop, que nos faz querer dançar ao ritmo apressado e raivoso de suas canções. Mesmo em seus momentos mais experimentais (como na instrumental “Kanye”), o FingerFingerrr consegue trazer esse ar de festa ao disco. “MAR” é um disco que não tem nem cheiro de brisa oceânica, nem de suor de roda punk, ele soa mais com cara de inferninho daqueles cheios de luzes neon, aonde você dança até cansar, enquanto bebe cervejas, drinks em abacaxis ou mesmo litros de vodka com energético.
O mais importante nesse panorama apresentado pelo FingerFingerrr é que há uma unidade constante, nada em “MAR” soa perdido ou aleatório, pois quando falamos em misturar inúmeros gêneros, geralmente acaba em confusão, que torna uma faixa destoante da outra, soando como uma versatilidade plastificada. Aqui a palavra versatilidade nem se encaixa, pois essa multiplicidade de referências com as quais o FingerFingerrr bombardeia o ouvinte soam extremamente naturais, como se esse misto entre punk rock de garagem, rap e qualquer coisa de verão em praias caribenhas já fosse uma parte natural deles, sem soar fake ou montada para soar suficientemente cool para as baladas da Rua Augusta ou pra shows em grandes festivais de verão.
O interessante, e que vai e volta em “MAR”, é esse humor meio de moleques, que dá um ar de fervor juvenil a tudo, porém sem cair necessariamente em clichês, inclusive em suas escolhas estéticas, como fica bem claro no primeiro single do disco, “Eu Só Ganho”, que recebeu um clipe suficientemente alucinado. No vídeo, o duo corre acompanhado de uma bela garota, os três nus, pela Bedford Avenue, em Williamsburg, região do Brooklyn, em Nova York. Entre efeitos e alucinações, a historieta do vídeo é de que “são três aliens soltos na Terra de sua nave mãe para desestabelecer a ordem capitalista predatória atual”, por isso mesmo soa natural a direção de John Threat, famoso hacker dos anos 90, inimigo federal dos Estados Unidos e atualmente produtor e diretor de documentários e videoclipes.
No final das contas, “MAR”, disponibilizado para download gratuito no site oficial do duo, acaba sendo uma estreia que coloca o FingerFingerrr numa posição distinta dentro do underground brasileiro: há aqui uma possibilidade verdadeira de comunicação com os públicos mais distintos, desde os roqueiros mais roots até o pessoal mais hypado possível. FingerFingerrr é “o ‘norvana’ que faltava para unir todas as tribos”. Ok, talvez eles não unam todas as tribos, mas certamente trarão mais diversão no cenário de eterno mais-do-mesmo do “indie brasileiro”.
– Renan Guerra é jornalista e colabora com o sites You! Me! Dancing! e Scream & Yell. A foto que abre o texto é de Daniela Ometto / Divulgação