por Leonardo Vinhas
“Matters of The Heart”, Eric Lindell
Eric Lindell é um nome desconhecido por aqui, mas o cidadão possui oito álbuns e cinco EPS lançados ao longo de 20 anos de carreira. Sua pegada de soul com groove de New Orleans, country e rock acaipirado não tinha muito espaço na sua Califórnia natal, por isso ele se mudou para a Louisiana e aí as coisas começaram a acontecer na sua carreira, tanto em termos práticos quanto artísticos. “Matters of The Heart (2016) parece unir esses dois mundos, trazendo o vigor e sofisticação da sua terra adotiva misturado com o lado mais comercial, ensolarado e algo insosso do lugar que lhe deu origem. Quando a vontade de ser pop domina temos faixas simpatiquinhas, mas sem maiores atrativos, como “The Good Times”, “Since June” e “Couldn’t Leave”, que soam como um Donovan Frankenreiter menos afetado. Já em temas como “Indian Summer”, “She Thinks I Still Care”, “Here In Frisco” e “Bayou Country”, o galã-wannabe entrega mais personalidade e pede para ser ouvido com mais atenção. Na pior das hipóteses, funciona como um bom disco para um dia de sol, desde que você ignore as letras clichês.
Nota: 6
“Call It What Is Is”, Ben Harper & The Innocent Criminals
Os álbuns de estúdio que Ben Harper gravou com o sexteto The Innocent Criminals – “Burn to Shine” (1999) e “Lifeline” (2007) – são os mais variados musicalmente (para não usar a desgastada palavra “eclético”) e com mais pendor pop. Então não é nenhuma novidade que essas características reapareçam neste “Call It What Is Is”. Entre os acertos, há espaço para gospel (“Dance like Fire”), reggae (“Finding Our Way”), blues sensual (“Bones”) e até uma balada rock com vocal à Tom Petty (“Deeper and Deeper”). Também está presente a maior marca pessoal de Harper, sua slide guitar, que aparece em na sutil “All that Has Grown” e na funkeada “Pink Ballon”, mas se destaca acima de tudo na poderosa faixa-título, um blues lento e pesado sobre os recentes assassinatos de negros pela polícia dos EUA (“Chame do que realmente é /assassinato”, canta o californiano no refrão). O rock de arena “When Sex Was Dirty” e o pop soul “Shine” (primeiro single do disco) são momentos mais óbvios e não tão inspirados, mas estão longe de baixarem a qualidade do álbum, que marca, sim, o retorno de Ben Harper a uma sonoridade mais comercial que esteve praticamente ausente de seus três últimos álbuns, mas que mantém o alto padrão que o homem estabeleceu com seus 24 anos de carreira.
Nota: 8
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“A Sailor’s Guide to Earth”, Sturgill Simpson
É curioso saber que este novo álbum de Sturgill Simpson chegou ao primeiro posto da parada country da Billboard – afinal, apesar de ter um background no gênero, Simpson bebe muito mais do soul e do blues que do country. Na verdade, há uma porção considerável do estilo típico de Nashville no disco – vide a climática “Brace for Impact (Live a Little)” e a acelerada “Call to Arms”, não por acaso os momentos onde a guitarra fala mais alto. Porém, há uma influência onipresente de Van Morrison, seja nos vocais de Simpson, seja nos arranjos que puxam para o lado mais vigoroso do soul – aquele da Stax, tá ligado? Imaginado como uma narrativa a ser contada a seu filho recém-nascido, “A Sailor’s Guide to Earth” vem sendo elogiado pela crítica gringa e apontado como um dos discos do ano. E, ao final da audição, fica difícil achar razões para contra-argumentar. A suavidade de “Breakers Roar”, o groove de “Keep It Between the Lines” e a sensibilidade de sua espantosa recriação de “In Bloom”, do Nirvana, derrubam a mais mal-humorada dialética. Sobre a versão do clássico grunge, Simpson declarou à revista Sin: “Essa canção sempre resumiu o que significa ser adolescente, e acho que ela diz a um garoto que ele pode ser sensível e compassivo – ele não precisa ser durão ou frio para ser um homem. Então eu quis fazer uma homenagem muito bonita e pura a Kurt”. Conseguiu. E de quebra, entregou um discaço.
Nota: 9,5
– Leonardo Vinhas (@leovinhas) assina a seção Conexão Latina (aqui) no Scream & Yell.