"Insomnica", Insomnica
por Leonardo Vinhas
Blog
11/05/2006

Para falar do Insomnica, antes é preciso falar do Íris, nome que inicialmente escondia um trabalho solo do multiinstrumentista curitibano Igor Ribeiro e que depois virou uma banda, que já chegou ao fim. No caminho, porém, o Íris deixou dois discos irretocáveis, Solitude (o tal disco solo, de 2003) e Bizri (com a banda, lançado em fins de 2004) e um histórico de shows indeléveis, pontuados por agressividade jazzy, suavidade roqueira e sensibilidade pop à Steely Dan.

Entretanto, a impossibilidade de Rubens K (baixo) e Fabiano Ferronato (bateria) – que formavam com Igor o núcleo central do Íris – se dividirem entre a banda e o Terminal Guadalupe fez com que Igor (que então assumia vocal, guitarra e trompete) desse um fim ao grupo a e lançasse seu terceiro disco, todo gravado, produzido e mixado em casa, sob um novo nome: Insomnica. Assim como em Solitude, no Insomnica, Igor assume voz, violão, baixo, guitarra, trumpete, flugelhorn, teclados e programações diversas, abrindo espaço também para participações muito especiais de nomes da cena curitibana. E o resultado não perde em nada para seus antecessores em sedução e beleza.

Diferenças há, e elas são perceptíveis à primeira audição: enquanto Solitude investia em climas mais próximos do free jazz, com muita experimentação e improvisação instrumental, este novo trabalho traz uma unidade musical montada sobre climas de bases de cool jazz e até trip hop, com um tom um pouquinho mais negro sobre a aquarela de fim de tarde que o som da banda faz pintar. As letras saíram todas em português, o que muda a sonoridade e até mesmo o jeito de vocalizar as canções, transparecendo uma certa influência do soul nacional dos anos 60, tipo Cassiano e Hyldon – esse último, aliás, parece "incorporar" em Rubens K enquanto ele assume vocais e violão da bonita Toda Paz e da breve Tempo No Quintal. Até o samba-soul aparece, gaiato e soturno, na insidiosa O que É que Você Vai Fazer?, descaradamente setentista.

Ainda no quesito "voz", a presença de Rodrigo Lemos (Poléxia) cantando nas duas versões de Certas Manhãs confere uma identidade pop que antes era apenas sugerida em uma ou outra canção. Não tão pop, mas cativantes de primeira, são Becos (uma instrumental!) e a avassaladora Meia-Noite, com seus grooves lânguidos e invocados, que já levou gente menos dada ao vernáculo de chamar o som de Igor de "music to fuck" (sem entrar em maiores detalhes, dá para dizer que são timbres e harmonias que mexem com o baixo ventre de qualquer um).

Esse Viagra musical é claro em vários momentos, principalmente os instrumentais, que ousam por terrenos pouco visitados nessas terras. Além da já citada Becos, há a abertura, Anoitecer, que destaca uma colagem de baterias feita a partir de gravações de Hamilton de Lôcco, do OAEOZ, sobre a qual se aplica um loop de trompete que faz a cama para a sevícia de Meia-Noite. E Adeus dá uma idéia do que Wim Mertens faria caso resolvesse experimentar formatos menos eruditos enquanto a lisergia dá as caras em 4:12 am, onde guitarras acidamente distorcidas duelam com um vocalise de Mariele Loyola, ex-Volkanas, atual Cores D Flores – banda que também empresta o guitarrista Maximiliano MacCoy para o desgoverno guitarrístico (quase metal) de 120 km/h.

Há ainda outros momentos a serem ressaltados – na verdade. Insomnica tem faixas que merecem ser comentadas uma a uma sem que haja desgaste de adjetivos. Mas o resultado se sobrepõe às caracterizações, atestam a evolução de Igor e nos fazem torcer pela continuidade de seu trabalho, seja com o nome que for. Como já escreveu o dramaturgo Mário Bortolotto, "o disco do Íris deveria vir com um selo na capa: 'Proibido para imbecis'". O mesmo pode se dizer de Insomnica.

Para adquirir o álbum é preciso falar diretamente com Igor Ribeiro, no email eegor_ribeiro@yahoo.com.br


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