"Às Vezes Céu", OAEOZ
por Marcelo Costa
Foto da banda: Theo Marques

maccosta@hotmail.com
13/02/2005

Quem faz do prazer de ouvir música uma obsessão, corre o risco de ficar saturado com tanta informação. Por outro lado, sempre me pergunto como moleques de 20 anos sabem tantas coisas sobre música sem ter ouvido um centésimo de tudo que é preciso ouvir. Antes que alguém atire a primeira pedra, gostaria de lembrar que já tive 20 anos, só que ainda hoje nada sei sobre música, além de que ela me faz sentir vivo.

Porém, transformar esse alimento para a alma (ou objeto de estudo do mundo que nos cerca) em "profissão" (ou vício) faz com que as coisas fiquem turvas, vez em sempre. Ian McCulloch uma vez disse: "São tantas novas bandas, e tanto lixo". No entanto, o grande barato da história acontece quando encontramos algo valioso no meio de toda essa sujeira. Às Vezes Céu, dito primeiro álbum do OAEOZ, é um desses casos raros de belas flores que nascem no asfalto, aumentando a fé e renovando a esperança em novas flores.

OAEOZ foi formado em 1997 em Curitiba e, de lá pra cá, já lançou duas demos (OAEOZ 1998 - De Inverno 1999) e dois CDs independentes (Dias 2001 - Take Um 2002). Às Vezes Céu é o primeiro trabalho gravado totalmente em estúdio pelo grupo. "É um disco de transição entre a primeira fase da banda e a atual. Posto isso, é com certeza nosso disco mais bem produzido, e paradoxalmente, o mais fiel ao que a gente é ao vivo", diz Ivan Santos, vocalista e principal compositor da banda, em papo por e-mail.

O álbum marca a estréia da nova formação da banda, que conta com dois novos guitarristas. André Ramiro e Carlos Zubeck se juntam a Hamilton de Lócco (bateria), Rodrigo Montanari (baixo) e Ivan, que agora assume o posto de vocalista deixado por Igor Ribeiro. "A música do OAEOZ sempre foi um jogo de dualidades, desde o começo. Às Vezes Céu mantém isso, só que de uma forma mais concisa e enxuta, mais focada", avalia o vocalista, que acredita que o som da banda mudou muito com a saída de Igor.

A mudança, felizmente, veio para o bem. A nova formação deu foco ao som do grupo, que soava disperso nos primeiros trabalhos, além de destacar excelentes letras. Às Vezes Céu abre com as guitarradas da excelente Lembranças (Não Valem Nada), uma ode ao tempo presente em formato hard rock. "Até brinco - que o riff - seria baseado no Beavis e Butt Head, naquela coisa de quando eles curtem um som e saem fazendo uma dança esquisita imitando a guitarra com a boca - tanananan tanananan", conta Ivan. "A letra é uma declaração de amor ao presente e a se viver o aqui e o agora, com todas as implicações que isso traz", completa. No meio da porrada, um improviso de jazz. E a paulada volta com base nas guitarras.

Vôo Baixo, a seguinte, tem introdução com violão e slide guitar, até cair em um rock de primeira. Dias Tortos é uma balada, e traz vários dos elementos que marcam o som da banda, como o vocal dramatizado, a combinação do acústico dos violões com o elétrico das guitarras, e um teclado conduzindo a boa letra: "A vida é fácil, eu é que sou complicado", canta Ivan. 3h30 começa com arranjo de trumpete, tocado por Igor, e a letra é uma adaptação de um texto de Sam Shepard enquanto Ausência tem uma longa introdução, remetendo aos primeiros trabalhos da banda.

A baladaça Dizem é outro dos grandes momentos do álbum. "Ela começa e termina com um breve arranjo para violoncelo e violino, feito pelo Rodrigo Lemos (Poléxia) a partir de arranjo original nosso", conta Ivan. "No final, tem um dueto vocal com a cantora suíça radicada em Curitiba, Edith de Camargo (Wandula), o que dá ainda mais dramaticidade à canção", explica. A letra, inspirada em um texto de Rubens K (Iris, Terminal Guadalupe), é dramática e lírica, ao mesmo tempo: "Alguns dizem que tenho talento pra melancolia / Qualquer tipo de fobia / Que tenho pena de mim / Dizem também que mantenho uma certa distância / que dura mais ou menos dois copos / E que depois me solto". O refrão, com auxilio de Edith na parte final, coloca o ouvinte na parede. "Eu não tenho muita certeza / Mas continuo tentando passar cada dia mais rápido / E pedindo desculpas por todo o mal causado".

A faixa título e Meia Volta são canções que exemplificam a dualidade que marca o som do OAEOZ. Ambas começam folk ao som de violões e terminam com ótimos solos de guitarra. Entre elas, Luz e Sombra, uma instrumental que demonstra a dualidade já no título. Horizontes, de Igor Ribeiro, deixa de lado o arranjo calmo da versão original (registrada no primeiro álbum do Íris) para ganhar mais peso e barulho. E em arranjo de violão, guitarra e gaita, Ajuda/Depois do Azul fecham um grande disco, daqueles que se ouve uma vez e, quando se percebe, está ouvindo de novo, e de novo, e de novo.


Entrevista com Ivan Santos
Primeiro registro totalmente em estúdio. Qual a sua avaliação sobre As Vezes Céu?
Eu avalio esse CD como um disco de transição entre a primeira fase da banda e a atual. Posto isso, é com certeza nosso disco mais bem produzido, e paradoxalmente, o mais fiel ao que a gente é ao vivo. Independente de qualquer coisa, ele tem a cara do OAEOZ, com seus altos e baixos, fragilidades e defeitos, qualidades e tropeços. E talvez isso seja o melhor do disco.

A saída do Igor, que acabou deslocando você para o vocal, mudou muita coisa na banda?
Mudou bastante, já que o Igor, junto comigo e o Camarão, foi um dos fundadores da banda. E ele e eu nos revezávamos tanto nos vocais principais, backings, quanto nas composições e instrumentos. Com a saída dele, eu tive que assumir os vocais e a maior parte das composições. O que naturalmente levou à entrada do André Ramiro e depois do Carlos Zubek, permitindo que eu deixasse com eles as guitarras e pudesse me preocupar mais com cantar, compor e tocar um violãozinho. Além disso, é claro que um cara como o Igor, que compõe, canta e toca vários instrumentos, faz falta em qualquer banda. Mas ele continua sendo nosso parceiro, tanto que co-produziu a parte musical do CD, fez a mixagem e foi fundamental para que o disco tivesse a cara que tem.

As Vezes Céu vai das guitarras pesadas de Lembranças até a suavidade de Dizem, duas das grandes canções do álbum (na minha opinião). Como você vê estes dois lados no som do OAEOZ?
A música do OAEOZ sempre foi um jogo de dualidades, desde o começo. Talvez isso fosse até mais evidente quando o Igor estava na banda. Havia o contraste da interpretação e vocal contidos dele, com o meu vocal e interpretação mais agudo e dramático. As baladas simples e singelas, combinadas com longas passagens instrumentais noise. As melodias pop com o experimentalismo. Era e é justamente a combinação disso, e às vezes, o seu embaralhamento, que faz o jeito da banda, do OAEOZ. Às Vezes Céu mantém isso, só que de uma forma mais concisa e enxuta, mais focada.

Lembranças é a primeira faixa do disco, e funciona como um "abre alas", uma espécie de "carta de intenções". A música toma como base um riff hard rock típico, quase clichê. Eu até brinco que seria baseado no Beavis e Butt Head, naquela coisa quando eles curtem um som e saem fazendo uma dança esquisita imitando a guitarra com a boca -"tanananan tanananan". A letra é uma declaração de amor ao presente e a se viver o aqui e o agora, com todas as implicações que isso traz. Ao mesmo tempo, pode ser interpretada como uma forma da gente dizer que ta pronto pra começar de novo, seja lá o que aconteça.

Dizem é uma balada arrastada, a primeira música que eu fiz no teclado, a partir de um texto do Rubens K (Íris, Terminal Guadalupe), meio autobiográfico, mas que ao mesmo tempo poderia estar falando de mim mesmo ou de qualquer um. Começa e termina com um breve arranjo para violoncelo e violino, feito pelo Rodrigo Lemos (Poléxia) a partir de arranjo original nosso. E no final, tem um dueto vocal com a cantora suíça radicada em Curitiba, Edith de Camargo (Wandula), o que dá ainda mais dramaticidade à canção.

A produção é totalmente independente, certo?
Como rolou tudo, desde a gravação até a finalização da bela capa?

Sim, a produção é nossa, minha e da Adri (Adriane Perin, jornalista), ou seja, do selo De Inverno Records. O processo todo durou pouco mais de um ano, começando em setembro de 2003, com os ensaios para composição, definição de repertório. Fevereiro e março de 2004 as gravações, no estúdio Nicos, aqui de Curitiba. A gente gravou as bases todas lá, cada um em uma sala separada, mas todos tocando ao vivo ao mesmo tempo. Gravamos trezes músicas em 25 horas, divididas em oito sessões em um período de dez dias. 90% do que você ouve no disco é o que foi gravado lá no Nicos entre 29 de fevereiro e 10 de março. Becapeamos todo esse material e levamos pro estúdio do Igor, onde fizemos a mixagem e as (pouquíssimas) gravações adicionais (alguns teclados, backings, vinhetas, etc). Isso foi até setembro/outubro. Aí, mais dois meses para prensagem e produção gráfica. Como tudo só ficou pronto no final de dezembro, optamos por lança-lo agora, no começo de 2005. A capa foi feita a partir de foto clicada por André Ramiro, nosso guitarrista e também montanhista. É uma foto do Pico Paraná, ponto mais alto do Sul do País.

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